Finalizada em: 27/06/2020

Capítulo Único

16 de julho de 2019

this dancing was killing me softly
i needed to hate you to love me


Uma vez a minha me disse que “uma pessoa que valoriza você, nunca se colocaria em posição de te perder” e ela tinha razão.
O salão é tão grande e arejado, mas está difícil para mim respirar aqui, pois os nossos corpos dançam em tão perfeita sintonia e graciosidade, contudo a dança parece estar me matando. E nem é por conta dos meus sapatos que estão espremendo os meus dedos uns nos outros. É por tudo. É por ele.
O lugar é tão bonito, tem algo clássico, as colunas greco-romanas que seguram o teto demonstram isso. Era para ser uma noite agradável, eu devia conversar com todos os outros funcionários e dançarinos e me divertir. Mas o que sinto é que meu coração está sendo amassado por uma bigorna de 70 toneladas e tudo porque ele está aqui. E estamos dançando.
Foi difícil recusar o pedido de quando ele apareceu, de repente, sem fazer algum escândalo ou chorar até desidratar. Então eu aceitei porque não tinha vontade de chorar e nem de fazer escândalo algum. Aceitei quando ele disse que queria falar comigo. É a primeira vez que o vejo depois de tanto tempo.
A música chega na metade e ainda não trocamos uma palavra. E em todo esse tempo fico procurando motivos para correr dali, e encontro um: eu não posso fazer isso.
Me solto de seus braços e corro por um caminho livre até o primeiro lugar que os meus olhos veem: a porta que dá para o jardim. Ar puro, ótimo.
Há uma linda fonte toda feita de granito com um cupido apontando uma flecha e água saindo da sua boca. Ando até ali e apoio às minhas mãos. Suspiro quando ouço passos.
- Essa é uma festa privada, você não deveria estar aqui. - Digo sem olhar para trás. Sei que é ele que está ali, sei que veio atrás de mim. Ele sempre vem. Ou vinha.
- Eu sei.
- Então porque veio? - Digo calma. Achei que estaria com raiva, mas não estou. Pela primeira vez percebo que toda a raiva e melancolia que senti se esvaiu e consigo tratá-lo decentemente.
- Para te pedir uma coisa.
toca o meu ombro nu e me vira, ficamos de frente um para o outro. O toque dos seus dedos faz subir uma comoção pela minha espinha, como se fosse um choque.
- Desculpas? Não precisa pedir isso , eu já te perdoei.
Tudo nele fica estático, é uma informação nova e ele deve estar pensando em como reagir.
- P-perdoou?
Gagueja e eu balanço a cabeça com um sorriso de lado. Ele tenta algum tipo de aproximação mais calorosa, mas é falha já que eu me esquivo.
- , acho que você não entendeu.
- O que? Achei que significasse que você ia me dar mais uma chance. Foi para isso que eu vim, foi para isso que subornei o segurança e implorei nos pés da sua mãe e do seu irmão para me deixar falar com você.
Ele diz com tanta emoção, mas aquelas palavras e o peso do seu olhar me fazem sentir absolutamente nada. O bom de se reconstruir do zero é que você percebe que vai ser muito difícil para alguém conseguir te derrubar de novo. E se derrubar, não é o fim do mundo.
- Te dar mais uma chance? Eu já te dei todas as chances possíveis. - Quase solto uma risada irônica e volto a encarar a fonte. Apoio os meus braços nela e fica ao meu lado. - E, não posso fazer isso para você agora, estou dando essa chance para outra pessoa no momento.
- Quem?! - Questiona, com aquele tom ciumento misturado com espanto e tristeza.
- Eu mesma. - Viro de lado para conseguir observar os seus olhos, há um claro alívio ali, como se reluzissem a luz da lua e de todas as lanternas do jardim.
- E você não consegue me incluir? - pergunta com um que de esperança na cara. Me seguro para não o chamar de patético. Estou tentando resolver isso como a adulta que eu construí ao longo dos últimos meses. Um ano para ser mais exata.
- Não e você sabe por que.
- Não, eu não sei.
- Então você não sabe e nunca entendeu o que aconteceu.
- Sim, eu sei. Você deixou que eu fosse embora.
A indignação floreia no meu rosto e aí vem o riso sarcástico olhando para os lados.
- Eu deixei que você fosse embora? você é inacreditável.
- Sim, você deixou. Naquele dia não fez o mínimo esforço para pedir que eu ficasse, inventou alguma coisa na sua cabeça que te fez ficar com tanta raiva que te deixou sem o mínimo afinco para entender o meu lado. Foi mais fácil deixar eu ir, né? Ao invés de resolver as coisas.
- Pare de ser cínico, falso e mentiroso. - Cuspo as palavras que vinha falando para o meu espelho finalmente na sua cara. - Deixar você ir foi a coisa mais difícil que eu já fiz na minha vida.
- Oh, sério? Não pareceu. Você não atendeu nenhuma das minhas ligações.
- Não acredito que passou tanto tempo e você nunca nem sequer parou pra pensar sobre isso? Do que estava acontecendo comigo naquela época? - Engulo em seco, não é como ter vontade de chorar, é como se ainda existir um enorme e feio sapo preso na minha garganta, e não sei como expulsá-lo.
- Claro que pensei.
- Mas ainda não faz ideia, não é? - não diz nada então contínuo. - Você nunca percebeu que eu tinha tanto medo de te amar? Porque todas as outras vezes que eu tentei amar, eu falhei. Eu sempre estava preocupada em ser o suficiente para fazer você ficar. Eu me preocupava se você ia mudar de ideia, de que você iria querer algo diferente, outra vida, outra pessoa, alguém que claramente não era eu. Eu me preocupava que talvez você nunca me quisesse afinal, que você tinha se apaixonado por uma ideia de mim e não pela pessoa que eu realmente era. E chegou um momento que eu descobri que estava certa.
- Da onde você tirou isso, ?
segura os meus ombros. Seu corpo todo se acende num estalo finalmente percebendo o ponto em que a gente virou para caminhos diferentes. Mas não tudo já que fez essa pergunta.
- Sério que você não sabe? - Ele nega com a cabeça. - Sério que você não lembra mesmo?

10 de julho de 2018

you promised the world and I fall for it
I put you first and you adored it


O céu nunca teve tantas estrelas quanto agora. O prédio do tem um terraço grande e é tão frio, sinto como se estivesse parada na sessão de frios do mercado. Mas nada como uma manta dos Thundercats e o abraço dele para me esquentar. Estamos deitados olhando o céu, parece bem mais fissurado do que eu, e já faz alguns segundos que não falamos.
- O que você tanto tá olhando?
- As estrelas, o que mais seria? Sei ler o céu.
- Adoro o seu lado nerd. - Digo puxando a manta dos Thundercats e ele dá um sorriso de lado. – Então, você saber ler o céu?
- É como eu disse.
- Então prova.
- Lance o desafio.
Mordo a parte interna da bochecha enquanto observo o céu pensando, quando uma estrela me chama atenção e eu aponto para ela.
- Aquela ali. - parece acompanhar a direção do meu dedo. - Porque ela brilha mais do que todas as outras?
- Porque é a Estrela do Norte. Estrela Polar. Ou só Polar. Tem vários nomes. Ela brilha mais que todas outras.
- Porque ela brilha mais?
- Porque ela é única. - Ele faz uma pausa. - Igual você.
Ele diz e sou praticamente obrigada a olhar para ele. Sinto algo quente dentro do meu coração, às vezes faz com que toda a minha insegurança desapareça, só que depois ela volta. Eu não estava dando nada para aquele café que a gente tomou no começo do ano e olha só, ganhei um namorado. Lutadores costumam ser tão brutos, mas não, ele parece ter uma tranquilidade dentro dele, mas não escapa nem um pouco no quesito de serem fechados e muito determinados profissionalmente.
- O que foi? Você ficou calada de repente. - Ele fala simples, sem alarde, sem todo o tom da preocupação.
- Nada é que... Não estou acostumada com isso sabe? Elogios.
- Pois deveria. - Ele me olha desmanchando o nosso abraço, já que a minha cabeça estava deitada no seu braço. - Vou te elogiar muito ainda.
levanta só pra deitar novamente, dessa vez em cima da minha barriga. Eu passo meus braços por cima dele e ele passa os braços por cima dos meus. Fico com um sorriso idiota no rosto.
- A minha mãe me disse que você me olha como se eu fosse o mundo inteiro. - Diz e lembro do dia que fomos visitar a mãe dele. Morgan é super detalhista e com certeza deve ter avaliado o meu interesse no filho dela.
- Isso é ruim? - Arrisco e ele sorri.
- Não, quer dizer, podia ser melhor, sabe?
- Como assim? - Pergunto com receio. Sim, tudo que me envolve vem um pouco de receio junto. Eu não aprendi a não ser assim ainda, e quando se trata do esse receio dobra.
- Você não deveria me olhar como se eu fosse o mundo inteiro, deveria me olhar como se eu fosse te dar o mundo inteiro. Porque eu vou, prometo. Ele me beija, mas ali já caio na ideia de que tenho mundo inteiro.

5 de setembro de 2018

rose-colored glasses all distorted
set fire to my purpose and I let it burn


- Você sabe o que achei lá em casa, ? - Minha mãe diz quando passo por ela com um cesto de roupas. Com toda certeza, ela ainda não superou o fato de que finalmente saí de casa e vem me visitar regularmente, é uma viagem curta de duas horas de carro. Fica sentada na cozinha e nós conversamos enquanto faço as minhas coisas.
- Nem imagino. - Digo jogando a roupa na máquina. Mamãe fuma um cigarro, usando seu suporte dourado de sempre enquanto lê o jornal. Ela tem uma séria aversão à coisas eletrônicas e teve que parar de beber por conta do beribéri, agora fuma mais que uma chaminé.
- Aqueles seus óculos cor de rosa que você usava quando era criança. Lembra deles, querida?
- Sim, eu lembro. - Dou risada e mamãe bate o jornal na mesa chateada. Ela quem limpava toda a minha bagunça por causa dos óculos. Mas eu os adorava.
- Usava em teimá-los e fazia bagunça pela casa toda porque deixava tudo distorcido.
Vou até a cozinha quando ouço meu celular tocando. Está em cima do balcão e o tiro do carregador para atender. Jason é um dos amigos que eu e temos em comum, seu nome aparece na tela e recordo que tinha me mandado mensagens mais cedo que eu ignorei pois estava muito ocupada.
- Jan, acho bom ser importante, está atrapalhando minhas tarefas do dia. - Digo risonha, mas é péssimo porque ele não me responde no mesmo tom de brincadeira e sinto que a notícia não vai ser boa.
- Oi, , pelo visto você ainda não está sabendo.
- O quê? - Pergunto receosa e ao mesmo tempo ansiosa. Ele usa aquele tom das más notícias que conheço.
- É o Lewis... Ele morreu.
Abro a boca e não digo nada. Mamãe ergue as sobrancelhas para o meu rosto estático. Quase não consigo acreditar. Lewis era tipo um irmão para o , não éramos muito próximos, mas eu sabia o quanto ele foi importante pro . A família de Lewis quem se solidarizou para adotá-lo quando seus pais morreram. Foi Lewis quem deu todo o apoio que ele precisava naquele momento, eles eram melhores amigos. Imagino o quanto ele deve estar devastado agora.
- O que? Jason? Como?
- Uma briga. Coisa feia. Achei que o tinha te contado.
- Não... Ele não disse nada. - Engulo sentindo a garganta secar e encho um grande copo com água. Engulo tudo em três goles.
- Enfim, não estou conseguindo falar com ele, pode checar se ele está bem?
Balanço a cabeça, mesmo sabendo que Jan não pode me ver.
- Claro. Eu te aviso.
- Obrigado, .
E então desliga. Disco o número de , mas é inútil, ele não atende. Corro até o quarto para vestir uma calça e pegar a minha bolsa.
- Mãe... Aconteceu uma coisa ruim, vou precisar sair. Tudo bem se ficar aqui um tempo?
- Claro, querida, é o seu namorado? - Confirmo chateada.
- Certo, não esqueça de tomar suas vitaminas, por favor.
Ela balança as mãos e continua a fumar. Suspiro contando que ela vai ficar bem e saio de casa.
Não é difícil desvendar onde estaria, conhecendo como o conheço, só tinha um lugar que ele iria se uma tragédia dessas acontecesse. A SWERVE, academia onde ele treina boxe. Está quase vazia, e passo direto até a área destinada a lutas, passo pelo ringue e logo o vejo. está em cima do tatame, sem camisa dando socos e murros no saco de pancada pendurado no teto. Está suado e um detalhe: suas mãos estão nuas, não usa luva alguma.
Sei o que está fazendo. Canalizando toda a sua tristeza e luto num saco de pancadas. A dor nos nós dos dedos não lhe atinge e ele não me ouve quando peço para parar.
- .
Digo e ele nem sequer me olha. Está tão suado e vermelho, já deve estar aqui faz um tempo.
- . - Chamo de novo, ele finalmente para e olha para trás para me ver ali, parada, fora do tatame. Mas logo em seguida, volta a esmurrar o saco, só que cada vez mais fraco e devagar, até seus braços caírem sem forças e os joelhos baterem no chão. Saio correndo na sua direção e o envolvo num abraço. Segurando suas mãos queimadas e envolvendo seus dedos com os tendões lesionado a.
É a primeira vez, desde que nos conhecemos, que o vejo chorar.

23 de setembro de 2018

I saw the signs and I ignored it
you got off on the hurtin' when it wasn’t yours


A dor de uma perda sempre parece trazer um fardo para se carregar. Não sei de fato como ele se sente, mas consigo pressentir. Minha mãe vive com problemas de saúde por conta do beribéri, e não sei o que faria caso alguma coisa acontecesse com ela um dia.
Nas últimas duas semanas tentei fazer de tudo para que se sentisse melhor, mas nada o ajudava a expulsar aquela melancolia. Não quis ir ao enterro e também não quer mais falar sobre Lewis. Ele afirma que está bem, e a falta de humor é a justificativa de estar focado nos treinos e em possíveis oportunidades para se tornar profissional, mas não acredito nisso, sei que precisa de apoio. Estou dormindo na casa dele faz uns dias, as noites são sempre mais solitárias e não deixo de notar o quão forte ele me abraça quando vamos dormir. Não o via chorando desde aquele dia, até ontem quando teve algum tipo de crise.
Estou ignorando o meu celular, o grupo DANCY não para de me ligar porque estou faltando alguns ensaios para ficar com o . Acho decepcionante eles não terem um pingo de empatia com a situação. Sempre ensaiei cinco dias por semana, demorei para enfiar na minha cabeça, mas sei que sou uma boa dançarina. Não é o melhor grupo de dança que existe, eles são talentosos, mas nenhum um pouco amigáveis.
Mas não é o número deles que está na tela no momento. É um bem conhecido. Matt, o meu irmão mais velho.
- . - Diz quando atendo. - Você não vai vir?
Ele pergunta em meio a vozes de felicitação no fundo, vozes de toda a minha família. Arregalo os olhos e percebo que o dia que eu estava adiando chegou. Fiz o meu cérebro se esquecer dele porque não conseguia me perdoar por aquilo. Era o aniversário da nossa mãe.
- Mamãe está perguntando de você.
- Não vai dar, Matt. - Lamento falando baixinho, vou até o quarto e vejo que ainda está dormindo. - Dê parabéns a ela por mim por favor, tenho um presente guardado.
- É o ?
- Sim, ele teve uma crise ontem. Não quero deixá-lo sozinho.
- Tudo bem. - Ele responde seco. Estou odiando a ideia tanto quanto ele porque queria tanto estar lá. Temo por ambos os lados porque precisa de mim. Antes de mim do que de outra pessoa.
- Eu vou ligar pra ela mais tarde, ok?
- Ok, , tchau.
- Tchau, Matt.
E desligo e deixo o celular na cômoda. está finalmente acordando e se espreguiçando aos poucos e tenho uma ideia. Ele levanta e vai até o banheiro. O sigo observando enquanto se abaixa até a pia para escovar os dentes.
- , estava pensando, e se a gente fosse no aniversário da minha mãe? Se sairmos agora dá pra aproveitar um pouquinho.
Ele bagunça o cabelo olhando para baixo. A voz rouca responde:
- Desculpe, , não estou no clima para festa.
Suspiro, já deveria suspeitar da sua resposta. Era uma pergunta burra, mas ao mesmo tempo poderia ser uma ótima solução.
- Tenho que ir para Swerve, Brandy disse que a minha defesa está uma droga. Não vou ser bom e conseguir um contrato bom com uma defesa ruim.
Diz e reviro os olhos ao ouvir o nome de Brandy, seu treinador que me detesta tanto quanto eu o detesto. Brandy vive dizendo que sou uma distração para e a carreira dele.
Eu morro de medo de um dia acabar dando ouvidos a ele.

1 de outubro de 2018

: sinto muito não pode ir amanhã, mas vou torcer por você daqui eu prometo xoxo

- COMO ASSIM VOCÊ NÃO VAI? - grita ao telefone quando atendo. Ela nem sequer se deu o trabalho de responder a minha mensagem. Me ligou dois minutos depois que enviei.
Acontece que amanhã ela vai fazer a sua primeira estreia como estudante de teatro em uma peça. e eu somos amigas desde o colégio, e ela quer que eu esteja presente na sua primeira apresentação.
- Desculpa, , prometo que vou na próxima. vai fazer uns testes na Philadelphia, e eu prometi ir com ele.
- Está brincando?
- Porque eu estaria?
- , sinto muito, mas tá na hora de eu te dizer uma coisa: pare com isso.
- Parar com o que? - Digo baixinho e me assusto quando ela muda o tom de voz para falar comigo.
- Parar de pausar a sua vida, já vai fazer um mês que estou te vendo assim e até aqui aguentei calada, mas não aguento mais isso.
- , mas eu não...
- Não vem com essa. Quantos ensaios do seu grupo de dança você já faltou? Não foi no aniversário da sua mãe e já faz quanto tempo que vocês não se veem? Você tá na casa do e ela parou de ir te visitar. Quantos convites para sair você já recusou quando eu e Jason chamamos? Você não faz mais nada por causa dele.
- , ele perdeu uma pessoa importante. Ninguém supera isso de uma hora para outra.
- Mas você não devia colocar ele em primeiro lugar na sua vida por estar passando por um momento difícil. Todo mundo passa , e, sinceramente... - Ela faz uma pausa como se ponderasse se deve ou não dizer o que vai dizer. - Eu não o vejo retribuindo todo o esforço que você está fazendo. Eu sei que você tem essa neura de nunca achar que é boa o suficiente para alguém e fazer de tudo para ser. Até passar por cima de si mesma, mas não faz isso, por favor, vai com calma.
Sei que quer me ajudar, mas sinto uma pontada no estômago quando ela fala um dos meus problemas. E os meus pensamentos giram, se batem se perguntando se ela tá mesmo certa.
- Certo, eu... Vou tentar. Prometo.
- Fico feliz de ouvir isso. - Dou um leve sorriso. - Sei que você tem essa apresentação importante na sexta, vou estar lá pra te ver brilhar.
- Obrigada , de verdade.
- Não tem de que, amiga, e acho bom você aparecer na minha próxima apresentação, se não apareço para puxar os seus cabelos.
Solto uma risada e ela ri também, nesse momento percebo que estou com saudades. Já fazia mesmo um tempo que não nos víamos.
- Tudo bem, pode deixar que eu vou.
Ficamos alguns minutos conversando até desligar.
Olho para a porta do quarto que está entreaberta e vou até ali nas pontas dos pés. está na cama com um notebook no colo. Ele mal percebe quando entro, mas me abraça quando subo na cama, me alinhando no seu peito. Olho para tela e ele está procurando entre documentários de MMA.
Lembro do que a minha amiga disse a poucos minutos e decido perguntar. Eu tenho que ter certeza.
- ?
- Hã?
- Você vai na minha apresentação, né? - Pergunto, ele não responde nada. - Na sexta?
- Ah, sim.
Murmura sem tirar os olhos da tela. O DANCY faz sempre apresentações anuais junto a outros grupos. Estamos ensaiando para essa a meses.
Fico ali deitado junto a ele e apesar das poucas palavras, eu me apego àquele “sim”.

6 de outubro de 2018

É péssimo. Horrível.
Sei que estraguei tudo, mas não acho que merecia tantas palavras maldosas. Talvez eu tenha merecido mesmo.
está ao meu lado numa falha tentativa de me consolar. Um erro meu quase estragou toda a apresentação do nosso grupo. Não acredito que errei em algo tão banal e quase torci o tornozelo, que agora dói como se alguém tivesse pisado em cima com botas de metal. Não sei o que mais me chateia: o modo como todos os meus colegas de dança me trataram quando me expulsaram do grupo ou fato de que não está aqui como disse que estaria.
Pedi a que não tocasse nesse assunto, ela se ofereceu para me deixar na minha casa, mas eu neguei. Não posso ir para casa desse jeito eu preciso de uma boa explicação que não me faça sentir tão lixo como estou me sentindo agora. Aquela insegurança me arrebata de novo, mas é um alívio quando o encontro em casa. Seria triplamente doloroso saber que deixou de ir me ver para se encontrar com outra mulher.
- Ainda bem que você está acordado. - Digo quando entro no seu apartamento. Não consigo entonar voz, estou tão triste que é difícil ficar com raiva. está sentado no sofá olhando para cima. Acordado não é bem a palavra certa, ele parece preso num estado entre sonolência e desperto.
- ? - Finalmente me olha e eu me aproximo. Consigo ver seus olhos vermelhos e toda aquela bagunça em cima da mesa de centro. Está chapado. Percebo que há mais de um copo ali, com certeza estava em companhia dos amigos da academia. Eles bebem como se tivessem três fígados.
- Pra isso que você não foi me ver? Se drogar? - Pergunto chateada, seu rosto parece que morre ao perceber o que fez. E um silêncio horrível se instala, eu tento desabar ali na frente dele, mas o máximo que consigo é falar baixo. - Sabe, foi péssimo. Quase torci o pé e me expulsaram do grupo. Mas você nem liga para isso, né?
Cruzo os braços e dou as costas querendo me enfiar de baixo de um chuveiro e deixar que a água me levasse junto pelo ralo. Mas ele vem atrás de mim e segurando no meu braço me gira gentilmente.
- , me desculpa. - Ele faz uma pausa fecha os olhos, deve estar pensando em algo coerente pra dizer enquanto a maconha destrói os seus miolos. - Eu... Sinto muito. Não queria que isso tivesse acontecido. Estava lembrando do Lewis, o pessoal acabou vindo aqui pra casa, quando vi estava desse jeito e não queria aparecer assim.
Mordo a parte interna da minha bochecha, é um pouco difícil de entender, mas ainda mais quando ele cita Lewis porque sei que foi uma perda difícil. Está sendo um período tão lastimoso, e acredito que preciso ser boa para como ele foi para mim nos últimos meses. Antes que ele decida me trocar ou coisa do tipo. Ao mesmo tempo que estou cansada de ouvir tantas ‘desculpas’ tantos ‘sinto muito.’
- Tudo bem.
- Não parece que está tudo bem.
- Estou chateada por causa do grupo.
Decido ceder, mas ainda desanimada. O DANCY não era o grupo perfeito, mas ainda assim era o meu grupo de dança, o primeiro que me aceitou e doía ter sido chutada desse jeito.
- , você não precisa deles.
Ele fala, mas não consigo me convencer. Apesar de não serem os melhores eu preciso deles sim. É a única coisa que diz, é algo que qualquer um diria.
- Olha, vou te compensar. - Puxa o meu queixo com a ponta dos dedos. - Vamos jantar amanhã no Le Garssan, você adora o macarrão de lá, não é?
- É. - Digo e ele me dá um selinho.
- Então, pronto, está marcado.
Devia dizer que é como se estivesse lendo meus pensamentos, mas ele não está. Porque não penso que é com um jantar no meu restaurante preferido que as coisas vão se ajeitar, por mágica voltarem a ser como eram. Mas eu tenho mania de me agarrar as mais improváveis probabilidades.

7 de outubro de 2018

Finalmente volto ao meu apartamento depois de dias. Está do jeito que deixei, e lembro que é porque mamãe parou de me visitar. Ela sempre mexia em alguma coisinha, não que eu não gostasse, na verdade eu adoro quando faz isso. Lembro do porquê estou com saudades, faz um tempo que não nos falamos, espero que não tenha ficado muito chateada por eu não ter ido no seu aniversário.
De manhã estava indo atrás de outros grupos de dança, mesmo que tentasse me convencer a seguir solo, é difícil ser solo numa carreira de dança. Você raramente consegue algo estando só. E quando chego em casa durmo até por volta das cinco, quando acordo a primeira coisa que faço é ligar para minha mãe. Chama e chama, até que quando alguém atende, não é ela, é Matt e parece um tanto preocupado.
- Matt? Porque está com o celular da mamãe?
- , estou tentando te ligar o dia todo.
- Desculpa, eu estava ocupada resolvendo umas coisas. O que aconteceu?
- Mamãe está no hospital.
Daí tudo parece acontecer tão rápido. Do momento que Matt me explica o que aconteceu faço as coisas o mais rápido que consigo. É um segundo para ir no quarto trocar de roupa. É um segundo para descer até a garagem e ligar o carro. Também é um segundo para escrever tudo errado na mensagem que envio para cancelando o jantar. Ele não responde de imediato, provavelmente ainda está treinando.
Começo a achar que devo jogar meu celular fora, pois só atendo ligações para receber notícias ruins.
Maldita teimosia. É o que penso o caminho todo até o hospital, mamãe sempre fora relutante a ingestão das vitaminas e isso sempre preocupou muito Matt e a mim, a gente sempre teve muito medo que ela desenvolvesse alguma outra doença como Pelagra ou sei lá.
Não há música no rádio que me acalme o caminho inteiro até o hospital, que parece ser mais longo do que geralmente é. Quando a gente precisa muito chegar em um lugar parece que a distância dobra de tamanho. Estaciono na primeira vaga que encontro e os meus saltos batem no piso conforme ando freneticamente, extremamente desconfortáveis, mas foram os primeiros que encontrei. Encontro Matt andando para os lados e o abraço sem delongas, encosto a cabeça no seu ombro e pergunto:
- Como ela tá?
- Estável. Estão esperando resultado de alguns exames. Agora ela está tomando soro com as vitaminas. – Passo a mão pelo rosto olhando para as portas.
- Posso ver ela?
- Acho que sim, vou perguntar pra enfermeira. - Mamãe simplesmente não havia tomado os remédios, teve uma fraqueza e falta de ar e acabou caindo. Desmaiou na hora, felizmente só teve uma concussão quando atingiu o chão. O pior teria sido bater a cabeça na mesa.
Checo meu celular novamente, mas nada do . Então decido mandar outra mensagem.

: Estou no hospital. Poderia vir aqui?

O guardo no bolso quando Matt acena para mim me guiando até o quarto dela.
Quando entro ela está na cama, num sono pleno. Ou pelo menos parecia, mamãe odeia hospitais, se estivesse acordada com certeza estaria reforçando o quanto queria ir para casa, e para tirarem ela dali pois já está bem. Chego bem perto para segurar as suas mãos. Felizmente não foi nada sério, mas fico imaginando sempre o pior e, com certeza, não estaria preparada caso acontecesse agora, nesse exato momento. Pois estou tão confusa quando a minha lista pessoal de prioridades, tão frágil ao ponto de quebrar.
- Por que você tem que ser tão teimosa, hein? – Sussurro, mas sei que mesmo dormindo ela está me ouvindo.
Olho o celular e novamente nada.
Ser teimosa deve ser coisa de família.

8 de outubro de 2018

: Já estou em casa, não precisa mais vir.
: Sinto muito, , tive que ficar na SWERVE. Envolvia uma oportunidade incrível.
Sinto muito.

São cinco da manhã e é isso que sou obrigada a ler quando jogo as chaves da mesa e os sapatos na sala. Nem sei explicar o que estou sentindo, é tristeza e raiva, temperadas com decepção. Sou um vulcão de lágrimas a entrar em erupção, e é isso que faço.
Choro por tudo, como uma bebê chorona. Choro por 27 minutos ininterruptamente no banheiro da minha suíte. Sinto uma solidão profunda, devastadora, invencível, arrebatadora e inexplicável.

10 de outubro de 2018

I gave my all and they know it
you turned me down and now i’ts showing


diz que gosto de me martirizar, e acho que está certa. Esse deve ser o único motivo para eu estar aqui, em frente a Swerve. Como uma idiota que gosta de segundas chances e de explicações por mais esfarrapadas que sejam.
Cada passo que dou pela academia é lento, doloroso e, ao mesmo tempo, cansativo. Passo por toda academia e pelo ringue de luta, nenhum sinal, mas sei que está aqui. A Swerve tem uma ala de jogos, aposto em ir por ali antes de perguntar para alguém. Logo no corredor escuto vozes, mas paro na metade e não entro na sala quando dizem o meu nome.
- E você já contou pra , né? - Pergunta uma voz grossa. Lembro de ser de alguns colegas de academia do , mas não lembro exatamente de quem.
- Ainda não. - Ele responde. Me escolho mais, grudada a parede. É feio ouvir a conversa dos outros. Alerta a minha consciência, mas não é hora para ter consciência. Estou brava e triste, estou no meu direito de ouvir uma conversa que ainda por cima, se trata de mim.
- Mas se já assinou os papéis a opinião dela não deveria valer?
O que? Papéis? Do que eles estão falando? Não tenho nem sequer ideia, nenhuma pista, não lembro de ter comentado nada. Porque não comentou. andou tão focado com esses tais assuntos da Swerve, a gente mal conversou sobre isso.
- Opinião da não vale de nada quanto a isso.
Crack.
Acho até que literalmente piso num pedaço de vidro, mas é só o meu coração quebrando quando ouço a frase. Bem clichê, mas não tem forma melhor para explicar. Daí não quero ouvir mais nada, e saio daquele corredor em passos silenciosos. Passo por toda a academia com a boca entreaberta e os olhos acessos, sem acreditar ainda no que ouvi.
Quando entro no carro fico parada com as mãos no volante olhando para frente. A minha opinião não vale... De nada?
Lágrimas escampam dos cantos dos meus olhos e eu deixo que escorram. A inconformidade é devastadora. Como ele pode dizer que a minha opinião não importa em determinada coisa sendo que considero o que ele pensa em cada mísera coisa que faço? Outro ponto no qual sempre me criticou, ao qual nunca vi problema. Até agora.
Engulo o soluço e aperto o pé no acelerador. Antes de me lamuriar embaixo do meu cobertor até de madrugada, preciso limpar os meus vestígios do seu apartamento. É para lá que ‘corro’ impulsionada por toda a raiva que estou sentindo para pegar as minhas coisas.

27 de outubro de 2018

we'd always go into it blindly
I needed to lose you to find me
I needed to hate you to love me


Faz dias que não falo com , não atendo suas ligações, não respondo suas mensagens e me finjo de morta quando o porteiro telefona dizendo que ele está aqui e quer subir. São dias de monólogos autodestrutivos comigo tentando entender a situação e tudo que aconteceu.
Quando me olho no espelho, vejo tudo que odeio, vejo até coisas que talvez nem existam. Atribuindo a culpa daquilo tudo em cima de mim. Poxa, o que eu fiz de errado? Amar demais? Quase não consigo encarar o reflexo. Estou me odiando tanto, na verdade nunca consegui ter esse amor próprio que todo mundo tanto fala.
Eu sempre achei muito mais fácil dar amor para os outros, fazer as coisas pelos outros do que por mim mesma. Também acho muito difícil gostar de mim mesma através de tantos ‘defeitos’, imperfeições, justificativas para me colocar para baixo.
Mas em meio a tantas crises de choro, maratona de séries antigas e comidas engorduradas vim percebendo algumas coisas. Ao invés de repetir para mim mesma que tinha estragado tudo tentei focar em outras coisas. E me admira que tive que ficar sozinha por alguns dias para perceber isso.
Quando tentei fazer uma maquiagem esfumaçada que vi no Youtube, percebi que os meus olhos ficam vividos quando faço um delineado. Quando fui hidratar o cabelo, vi que fico melhor de cabelo solto, eu vivo usando preso por causa da dança e por achar que meu rosto fica mais robusto quando o solto. Talvez fosse neura da minha cabeça, mas não deveria me importar se fica robusto ou não. É o meu cabelo e o meu rosto. Também percebi que adoro e fico ótima usando vestidos vermelhos. Numa das numerosas sessões com o espelho, vejo que as minhas orelhas não são tão grandes quanto eu achava. Sou muito flexível. Inúmeras coisas boas em mim que eu insistia em mascará-las, me impondo defeitos e esquecendo que elas existiam. Não somente na aparência física.
Você é incrível. Quem deixar você escapar um dia não sabe a mulher que está perdendo.
Mamãe, Matt, ... Tantos que já me disseram isso tantas vezes. Não sou nem capaz de contar. Sempre achei papo furado, mas eles têm toda razão.
Eu sou incrível.
Foi a primeira coisa positiva que repeti para mim mesma em dias na frente daquele espelho até que percebi que esse tempo todo eu sempre estive odiando a pessoa errada.
Estava com ódio de mim mesma e triste com , porque na minha cabeça eu tinha estragado tudo. Era por minha culpa que ele estava agindo do jeito que estava. E me senti assim porque sou insegura. Agora estou com ódio dele e com dó de mim mesma. Porque eu fiz de tudo por aquele imbecil e ele nem sequer deu valor. Como pude fazer isso comigo mesma?
É como se todo esse tempo eu estivesse usando aqueles óculos cor de rosa que costumava usar quando era criança. Porque eles deixavam tudo distorcido. Era legal quando eu era criança, mas agora não faz nada bem ver as coisas como elas não são. Como se eu mesma tivesse ateado fogo em alguma coisa e ficado ali, vendo queimar, esperando me queimar.
Estou em um dos meus ataques de raiva no momento que o interfone toca e o porteiro me avisa que está lá em baixo. Desde o dia que percebi todas essas coisas não parei de falar com o espelho, mas ao invés de me xingar como eu estava fazendo, eu o xingo dos nomes mais horríveis que se possa imaginar, mamãe estaria orgulhosa, ela sempre foi boca suja. Se tivesse dardos com certeza estaria atirando todos contra alguma foto dele. Mas a minha munição no momento é uma caixa com todas as suas coisas.
Eu o odeio.
Nunca vou conseguir me amar com ele por perto.
A campainha toca e não perco tempo para atender, quero me livrar dessas coisas logo.
- , eu preciso falar com você. - Ele dispara quando eu abro a porta. Normalmente, adoro reparar no seu visual, se a sua barba está ou não feita, se penteou o cabelo e ficar admirando. Mas é a última coisa que me passa a cabeça. Ainda me importo, até dói fazer isso, mas o ódio dentro de mim consegue ser maior.
- Ah, nossa! Finalmente apareceu, eu estava te esperando. - Cuspo ironia, lhe dou as costas deixando a porta para pegar a caixa.
- Sim, eu preciso te contar uma coisa...
mal dá um passo para dentro e larga a caixa com todas as coisas dele bem na frente dos seus pés.
- É, eu sei. Agora você pode ir. - Reviro os olhos lembrando daquela conversa que escutei na academia. Não entendi nada no início, mas foi pior quando esbarrei com Brandy e ele me agradeceu por ter saído da vida do , disse que os caminhos parecem que tinham finalmente se aberto para o . A mudança para Los Angeles já estava marcada. É, lutadores são mesmo muito focados profissionalmente. O propósito dele está se concretizando, quanto ao meu, está tentando sobreviver nas cinzas depois de ter sido queimado com ácido. Ele olha da caixa para mim reconhecendo as suas coisas, surpreso.
- Você não sabe o que está...
- Sim, eu sei. Está tudo aí, não se preocupe em voltar para pegar algo mais. Seja feliz em Los Angeles. - Respondo com o sorriso mais sarcástico que consigo dar. está estático, não entendo por que todo espanto. - Por que essa cara? Eu estou facilitando o processo.
- É só que eu não estou acreditando que você está fazendo tanto descaso por eu estar indo embora e nem pensar na gente....
- NA GENTE? - Digo alto, mas volto ao tom normal. Não quero gritar não quero fazer escândalo. - Eu não pensei na gente? eu fiquei os últimos meses só pensando na gente, só pensando em você. - Não consigo segurar e aponto o dedo na sua cara. - Quem fez todo o descaso foi você.
- Caralho, eu não estava legal. O Lewis era como um irmão para mim, e ele morreu, .
- Eu sei disso, só que pra beber com os seus amigos você estava bem, né? Pra isso o Lewis nunca morreu.
Digo lembrando de todos os vacilos que eu relevei com essa mesma desculpa. Respiro fundo para o meu sangue não ferver. fica mudo e acho melhor assim.
- Olha, não quero discutir. Só... Feche a porta quando sair por favor.
Digo e caminho até o quarto, fechando a porta logo em seguida. Deito na cama ouvindo o barulho da porta da frente bater forte. Achei que seria mais fácil fazer isso.
Foi bem mais fácil dizer tudo para o espelho.

16 de julho de 2019

I need to lose you to love me


- Eu tive medo de te amar, mas eu amei. E me apeguei nesse medo de que você nunca fosse me amar de volta como eu sou. Eu não estava sendo eu. Eu era uma personagem que seguia um roteiro e dançava igual aquelas bonecas nas caixas de música.
- Eu... - engole em seco antes de falar, passa a mão pelos cabelos, cerra os punhos. Parece tão desconfortável. - Nunca percebi.
- Você nunca perguntou. - Continuo determinada, não quis ter essa conversa antes, mas agora quero dizer tudo, porque estou segura. Porque levei meses tentando me repor, com a ajuda da minha família e dos meus amigos. A começar pela minha carreira de dançarina que nunca esteve tão bem, essa festa não é nada mais que uma comemoração com os Red Rocks, meu novo grupo de dança. - E você nunca ligou para os meus problemas, para as minhas crises. A minha mãe quase morreu e você não se importou nem em saber se eu estava bem. Matt ficou comigo no hospital de madrugada porque as suas ‘oportunidades’ eram mais importantes. Mas tudo bem, eu não quero voltar nesses assuntos.
Cruzo os braços e o vejo tentando se aproximar, mas não encosta um dedo em mim, deve saber que vou rejeitar.
- Você acha que ir embora foi uma coisa boa para mim? Não teve um minuto que não tenha parado de pensar em você. - Franzo a testa chocada com tamanho cinismo. É um cínico e insiste em esfregar isso na minha cara.
- Você me substituiu em dois meses como se parecesse muito fácil! - Exclamo. Foi péssimo quando descobri, mas fico feliz em olhar para trás e ver que é mais uma das coisas pelas quais eu superei. - E não venha me dizer que é mentira. Brandy fez questão que eu soubesse disso, ele me odiava mais do que eu odiava a mim mesma.
não espera que eu tenha tantas informações, mais um sinal de que ele nunca se importou. Nem mesmo depois de ter ido embora. O que é ótimo, nada no mundo conseguiria me fazer mudar de ideia nesse momento.
- , eu... Sinto muito de verdade. Eu sei que fiquei ausente, sei que vacilei muito com você, mas eu nunca passei por algo tão pesado como a morte do Lewis. Fiquei arrasado e canalizei toda a minha atenção na luta e talvez tenha te deixado de lado. - Os olhos dele brilham e consigo ver que está sendo sincero. Mas a verdade do não é a minha. E não aguento mais a mesma desculpa ou qualquer outra desculpa.
- Talvez tenha me deixado de lado? Você me deixou completamente de lado. – Repito frisando bem o peso das suas palavras. – E já faz quase um ano, porque você fica usando o Lewis como justificativa? Você acha que, mesmo depois de morto, ele merece carregar o fardo de assumir as suas responsabilidades? Os seus vacilos? - Pergunto baixo, sabendo que o Lewis é um assunto delicado, mas todo mundo acha um jeito de lidar com assuntos delicados, e está na hora do aprender também. - Admite a sua culpa , eu juro que você não vai morrer por isso. Todo mundo acha um jeito de lidar com perdas de modo que não interfira na vida das outras pessoas. E você deixou a sua interferir muito na minha.
- É, e me arrependi, mas ainda acho que você tá sendo... - Consigo ver a água se formando nas suas córneas. É, ele ainda sofre muito com a perda do meio irmão. - Um pouco injusta.
- Injusta? - Ergo as sobrancelhas. E não adianta, talvez ele nunca perceba, nunca entenda. E não tenho a paciência de uma professorinha de primário para ficar explicando a vida toda. Tem coisas que se a gente não aprende com outras pessoas, a gente tem que aprender sozinho, se não a gente ‘apanha’ pelo lado que tentou nos ensinar. E pela última vez tento dizer do modo mais esclarecedor que consigo. Sem gaguejar ou sentir os olhos lacrimejando. - Eu te coloquei em primeiro lugar e esqueci o resto do mundo por você, . Eu passei a amar menos as pessoas para poder te amar mais. Eu ignorei todo tipo de possíveis amizades, só para lhe dar o máximo de atenção. Eu sempre coloquei os seus problemas acima de qualquer outro, até mesmo dos meus. Eu estava ao seu lado, todas as vezes em que você precisa de um ombro amigo. E você? O que você fez por mim, a não ser me causar lágrimas? Admita que, ao contrário de você, eu tentei e cansei de tentar. Cansei de odiar a mim mesma por sua culpa, eu cheguei à conclusão que eu só ia conseguir me amar se eu te perdesse. Então não, não duvide quando eu digo que foi a coisa mais difícil que fiz, porque foi.
Sei que cada palavra deve estar entrando pelos seus ouvidos e percorrendo seus neurônios, se embolando nos seus miolos porque as palavras tem força, não tanto quanto as atitudes, mas elas têm. Um dia ele vai acordar e refletir sobre tudo o que eu disse e usar essa reflexão para mudar. Repensar suas atitudes, não tenho certeza disso, nem quero ter, é mais uma das minhas possibilidades improváveis das quais gosto de acreditar. Dou um sorriso de lado por que ele não reluta, não rebate e finalmente entende que já é hora de terminar e fechar esse capítulo.
Sou eu quem se aproxima e apoia a mão esquerda no seu ombro direito.
- Adeus, , para nós.
Lhe dou as costas e lhe deixo uma última vez.
Quando volto ao salão é como respirar de novo. A minha mãe acena feliz e está ali também me chamando, as duas estão bem empolgadas. O lugar ficou incrível de novo para mim, mesmo que ainda fique perambulando por aí a presença dele não me afeta mais.
Percebe que o sapo foi embora e que jamais vou usar aqueles óculos cor de rosa novamente.

and now the chapter is closed and done
and now it's goodbye, it's goodbye for us






Fim.



Nota da autora: Não foi aos 45 do segundo tempo, foi no final do segundo tempo da prorrogação! Cai de paraquedas nesse ficstape e entreguei a fic no limite do segundo prazo, mas gostei muito de escreve-la espero que tenham gostado de ler!



Outras Fanfics:
  • Best Mistake (Outros/ Em Andamento)
  • 24. Insomnia (Shortfic/Finalizada)


    Nota da beta: Qualquer erro nessa fanfic ou reclamações, somente no e-mail.


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