Estarei aqui à meia-noite.
Foram as últimas palavras que pensei antes que meus olhos se fechassem e eu me perdesse em sonhos.
Tudo começou com um casamento. Uma cerimônia de casamento. A minha cerimônia de casamento.
Na verdade, não foi bem assim que tudo começou. Tudo começou quando eu conheci Scott, se formos parar para pensar. Ou então quando eu nasci. Isso significa que tudo começou quando minha mãe engravidou do meu pai. Quando eles se conheceram. Quando mamãe nasceu. Quando minha avó casou-se com o meu avô. Quando a Inglaterra foi povoada. Quando os humanos começaram a existir. Quando a primeira célula viva nasceu. Quando a Terra nasceu. Big Bang, a Grande Explosão.
Mas o principal ponto foi o casamento. Então vou poupar vocês de toda a história da poeira estelar, e vou focar no dia 15 de janeiro. O dia que mudaria minha vida.
Nunca acreditei muito em destino, até o dia referido. Era impossível não acreditar. É claro que qualquer casamento muda a vida de uma mulher, mas não é sobre isso que eu estava me referindo.
As coisas não andavam tão perfeitas quanto eu queria desde a semana anterior. Os preparativos eram cansativos; os problemas inevitáveis me deixavam cada dia mais descrente. Sempre dizem que, se você não aguenta bem a semana antes do casamento, nunca vai aturar o casamento em si. Acho que Scott percebeu isso, embora eu tentasse desesperadamente ignorar.
E como ele vem me dizer, na hora do altar, que é jovem demais para se envolver num compromisso que jura a Deus ser por toda a vida? Repetindo: na hora do altar.
É claro que somos jovens demais. Minha mãe me disse que eu nunca deveria me casar com 21 anos. Mas vamos pôr as coisas em pratos limpos: Scott era o cara perfeito para mim. Loiro, 1,83m, olhos verdes de matar, físico esculpido como numa escultura de Michelangelo, 23 anos de idade, 20 anos na escola de teatro. Ator talentoso e com um salário de matar. Bom amante e companheiro fiel. Não deixava a tampa da privada levantada. Depilava o peito, as axilas e as costas. Generoso e cheio de cultura. Filho único, amava os pais. Amava cachorros. Amava crianças. Marido em potencial.
E lá estava eu, de vestido branco, um branco puríssimo, que contrastava com a noite. Mamãe chorou e me disse que eu era a noiva mais linda que ela havia visto. É claro que eu era: eu era sua única menina. Meu irmão gêmeo, Dean, falou que eu estava gostosa. Era o melhor elogio que eu poderia receber dele. Meu padrasto se emocionou e me deu um abraço forte. Alicia, minha dama de honra, ficou dando gritinhos e saltinhos o tempo todo, e me abraçou tanto que eu tive receio de meu vestido amassar. Ou cair. Lembre-se, eu estava usando um tomara-que-caia. Ou, no caso da noiva, tomara-que-não-caia.
- , é hora de ir, minha filha – anunciou Terry, meu padrasto-pai. Afirmei com a cabeça, e não pude evitar me lembrar de meu pai, que gostaria de estar comigo no dia de meu casamento. Ele me levaria ao altar no lugar de Terry, se não tivesse tido um enfarte quando eu e Dean tínhamos 7 anos.
Sorri para Terry, e fui abraçar minha mãe outra vez. Sussurrei, para que Terry não ouvisse:
- Acha que papai está feliz?
Mamãe hesitou. Essa hesitação devia ter me mostrado quão erradas as coisas sairiam. Eu devia ter saído correndo. Eu deveria ter dado uma de Julia Roberts em Noiva em fuga, com toda a certeza. Mas não o fiz. Não me arrependo, porém.
Por fim, ela respondeu, emocionada:
- Ele está muito orgulhoso de você, querida.
Mamãe e Dean saíram da saleta da noiva. Terry me deu o braço. Alicia se posicionou à minha frente. Nós fomos à porta de entrada da igreja. Clair de Lune começou a tocar, como eu queria. Alicia começou a andar à minha frente, como ensaiado. Todos os convidados estavam presentes, como esperado. E Scott estava me esperando no altar, como previsto.
Ele não estava sorrindo, e esse foi outro sinal. Eu não devia ter atravessado o salão. Devia ter dado meia-volta. Na hora, imaginei que fosse nervosismo. Eu estava nervosa.
Mas eu o atravessei. Desfilei com um sorriso nervoso no rosto, olhando cada pessoa presente diretamente nos olhos.
Eles eram meus convidados, e a obrigação deles era me fazer sentir amada, linda, até mesmo invejada. Eles fizeram seu papel.
O meu papel, por outro lado, era apenas ficar tensa, suar frio e saber que, no final, tudo iria dar certo. Eu estava-o cumprindo.
Sorri para Scott, ele engoliu seco. Aquela deveria ter sido a gota d’água. Mas não foi.
Ela se deu precisamente em:
- Scott Baker, você aceita como sua legítima esposa, para amá-la e respeitá-la, na saúde e na doença, na alegria e na tristeza, todos os dias de sua vida, até que a morte os separe? – Minha mãe começou a chorar ruidosamente. Achei isso muito fofo da parte dela.
Encarei Scott, sorrindo de alegria. Era isso, íamos finalmente nos casar! Pensei em começar a fazer a dancinha igual à de Chandler, em Friends, mas achei que isso seria impróprio para a ocasião. Então simplesmente mordi o lábio inferior, feliz.
- Eu não posso, . Desculpe. Ah, sim. Essa foi definitivamente a gota d’água.
Eu queria que houvesse um manual. Tipo, O Que Fazer Quando Seu Noivo Te Rejeita No Altar. Ou 50 maneiras de se livrar de convidados fofoqueiros. Talvez Exercícios de Respiração – Como Controlar A Raiva Em Locais Públicos Para Noivas!
Mas, neca. Eu realmente li muitas revistas sobre casamentos nos últimos meses. E eu posso garantir, jurar pela alma do meu falecido papai: nada havia me preparado para aquilo.
Scott e eu nos amávamos. Ele havia pedido minha mão em casamento num jantar romântico, como nos filmes. Eu pesquei a aliança na taça de champagne! Como ele ousava não casar comigo depois de quase me matar engasgada com os 24 quilates do anel de ouro? “Eu não posso, . Desculpe.”
Eu precisava mesmo era pensar rápido. Imaginei que um tapa no lindo rostinho de Scott seria bem merecido, mas acho que isso me faria perder a pouca classe que me restava.
Eu podia forçá-lo a se casar comigo. Imaginei a cena:
- Claro que você pode, seu bastardo de merda. Chega desse papo furado e diz sim logo. Padre, quer anotar aí que ele disse sim? Estamos casados, não é?
O padre olha inseguro para Scott. O bastardo de merda concorda fervorosamente com a cabeça, se mostrando intimidado. Final feliz.
E, é claro, eu podia matá-lo. Não que eu acredite que uma igreja católica seja um local apropriado para um homicídio, mas as circunstâncias desesperadoras pediam medidas desesperadas. Devo confessar que meu salto podia fazer um grande estrago no pescocinho de Scott...
- Essa será a última vez que você humilhará uma mulher, seu bastardo de merda!
Eu tiro uma de minhas sandálias e a pego, como uma flecha ou uma faca. Encosto o salto na lateral de seu pescoço e sussurro:
- Adeus, meu amor. – E cravo o salto com violência, mas uma classe inegável.
Final... trágico, mas ainda feliz. De alguma maneira.
Obviamente, não fiz nada disso.
Por fraqueza, isso é um fato. Meu estilo de strong independent woman não aflorou na hora, como eu desejaria. Em vez disso, minha personalidade adolescente tomou conta de mim.
E, como em Noiva em fuga, eu fugi. Saí correndo, em desespero, com a visão turva por causa das lágrimas. Escutei Dean berrando meu nome, não liguei. Não olhei para Alicia, mas sabia que seu rosto estaria tomado pelo choque. Tropecei algumas vezes, quase caindo em cima de um dos amigos atores de Scott, na penúltima fileira.
Saí da igreja infernal. Se você analisar, um dos maiores paradoxos. Mas eu não estava brincando ou exagerando quando prometi que nunca mais faria o sinal da cruz ao passar por ela.
Não fui rápida o suficiente para Dean, que me alcançou antes que eu fizesse alguma besteira, como me tacar na frente de um carro, ser atropelada e ir para o céu das noivas rejeitadas. Ele me segurou pelos braços, e tentou me abraçar, mas eu apenas o afastei. Reparei que ele carregava um casaco no braço, o que me deixou em parte agradecida. O frio estava de matar.
- , não vai embora – ele pediu, sem fôlego.
Girei meus olhos borrados de lágrimas pra ele, e respondi num tom de voz que condizia com a raiva que estava sentindo:
- Para quê? Fazer papel de palhaça na frente de todos os meus amigos? Não, obrigada, Dean.
Não achei que Dean fosse desistir tão rápido, mas provavelmente algo em minha fala o fez recuar. Ele apenas balançou a cabeça, num gesto de reprovação que aumentou minha ira. Não discuti, porém. Apenas peguei o casaco grosso, vesti-o, virei de costas e retomei minha corrida, levantando o vestido para não tropeçar.
Em nenhum momento eu escutei Scott gritando meu nome.
É. Meu primeiro noivado que não tinha terminado em casamento.
Eu sinceramente esperava que fosse o último.
A minha sorte era que não estava nevando, apesar de estarmos exatamente no meio de janeiro. Se o chão estivesse coberto de neve, a probabilidade de eu capotar, rolar a calçada até o meio da rua e se atropelada seria bem maior. E, apesar o meu instinto de morte estivesse aguçado, ele se inclinava mais para o homicídio, não suicídio.
Depois de correr por umas duas quadras, parei para pensar. Peguei uma garotinha me encarando com vislumbre nos olhos; ela não fazia a menor ideia do fracasso do meu casamento. Sua mãe me olhou assustada, e eu tive uma vontade enorme de gritar um “Tá olhando o quê? Nunca viu uma noiva abandonada, sua cachorra?”, mas eu tive pena da criança. Bom saber que eu me mantinha racional àquelas circunstâncias. E agora, ? Para onde ir?
“Um parque”, pensei. Seria um belo clichê, uma mulher de vestido branco e grinalda sentada num banco, rodeada de flores. Ela estaria chorando à visão das flores que a lembravam de seu buquê abandonado na igreja. Digno de fotografia.
Pena que eu não era uma modelo.
Vi uma Starbucks à minha frente, e imaginei que poderia entrar lá e pedir um mocca caprichado. Depois lembrei que não trazia comigo nada além do vestido branco, a grinalda irritante e as sandálias que me machucavam. Tirar a sandália era pouco elegante, então eu arranquei a grinalda. E taquei-a no lixo mais próximo. Um sorriso de satisfação fez-se ao que eu lembrei que, diferentemente dos casamentos tradicionais onde o pai da noiva arca com todas as despesas do casamento, o dinheiro daquela grinalda era de Scott. Para o lixo.
Ok, o que uma noiva sem um tostão faz no meio da rua? Sem ser o parque, é claro.
E se você falou encher a cara até ficar inconsciente e não precisar pagar, acertou!
Pé ante pé. Respiração profunda. , ignore os olhares.
Não sou uma garota de bares. Quando estava no colegial, era líder de torcida, então estava muitíssimo acostumada a beber nas festas após os jogos, nas casas dos jogadores de rúgbi.
Mas beber com seus colegas adolescentes era completamente diferente de sentar sozinha e ordenar ao barman uma dose de uísque. Uísque puro.
Para começar, a maioria dos presentes era do sexo masculino. Para ser sincera, eu estava cheia dos membros do sexo masculino. E, acredite, ninguém estava disfarçando em encarar a noiva deslocada.
O que eu não sabia era que aquele dia era a final do campeonato de futebol. E, como poderia ser esperado, toda a população londrina com testosterona estava com as cabeças grudadas na tela e suas canecas de cerveja quente nas mãos.
Para você perceber a situação, todos eles desviaram suas atenções da televisão e me olharam quando eu pus os pés no recinto. Quis debochar e perguntar a muitos onde estavam suas esposas, mas fiquei com medo de um deles, que parecia bastante bêbado. Melhor seguir o caminho até o barman, certeza.
- Um dose de uísque, por favor. Puro – acrescentei, com um tom de voz desafiador. O atendente comprou o desafio.
- Tentando se convencer a aparecer no casamento, lindinha? – ele perguntou, com um quê de riso.
- Tentando me convencer a não voltar lá e matar meu noivo – respondi, lançando um olhar ameaçador. Felizmente, ele se calou e trouxe a bebida.
Tentei tomar de um gole só, mas, droga, aquela bebida era horrível. Cuspi metade da dose, enquanto a outra metade descia queimando minha garganta. Olhei de esguelha para o barman, preocupada que ele fosse fazer outra piadinha, mas não havia motivos: como todos os outros homens, sua atenção estava novamente desviada à televisão.
- Um pouco forte para uma menina, não acha?
Escutei a voz a poucos metros de mim, e virei meu rosto automaticamente a ela. Pertencia a um cara, obviamente.
Um cara, não vou mentir, gatíssimo. Tinha um estilo meio roqueiro, ombros largos e olhos profundamente . Não que eu estivesse reparando muito na beleza do cara menos de uma hora depois de ser rejeitada no altar. Sem chance.
Ele era o único cara que não estava ligando para a televisão. Tinha em mãos um copo de algo que lembra muito vodca. Ok, aquilo era vodca. Pura. Ele estava quase tão decadente quanto eu, é o que eu digo.
- Não acho – retruquei, com desprezo. Olhei para o atendente, que estava distraído com o futebol, e gritei: - Ei, moço! Moço! – Não que ele tivesse me escutado, no fim das contas.
- Jack! – o cara gato do meu lado chamou, e o barman virou para ele. O cara gato me apontou com a cabeça e esclareceu: - A noiva está te chamando, dude.
- Outro desses – ordenei, com a voz alteada, e levantando o copo vazio. Olhei de esguelha para o cara gato, e ergui uma das sobrancelhas, sentindo uma vontade inexplicável de rir.
O cara gato não ficou para trás.
- Ei, Jack! – ele chamou novamente, e assim que Jack o encarou, completou: - Traz um desses pra mim também. Vou fazer companhia à nossa amiga, não é todo dia que vemos uma noiva aqui!
Não era como se ele tivesse pedido a minha permissão para sentar no banquinho ao lado do meu. Mas também não era como se eu fosse dona de todos os banquinhos.
É como o ditado: os incomodados, que se mudem. Eu não estava incomodada o suficiente para sair dali, obrigada. E ainda estava consciente, então teria que pagar pelas minhas bebidas.
Amores, eu só sairia dali com o coma alcoólico!
- Muito bem, você não pode estar pior que eu – o cara gato falou, arregaçando as mangas da camisa três quartos. – Isso seria deplorável.
- Ah, acredite – eu rebati, observando o barman vindo com as doses de uísque -, seria impossível você estar pior que eu. – Terminei a frase com consternação, e uma ponta de depressão também. Nossa, eu estava mal.
- Minha banda – ele começou, esticando as mãos para receber as bebidas de Jack. Agradeceu e murmurou um “Põe na minha conta”, antes de concluir: - Minha banda foi negada pela gravadora. Pela outra gravadora. A oitava. – E tomou um gole de seu copo, fazendo careta. – Puta merda, essa coisa é forte.
- Só é forte para garotas – eu comentei com displicência, pegando meu próprio copo e tomando um gole. Não pude reprimir uma tossida. – E garotas idiotas – acrescentei. – Para mim, por exemplo, é bastante tranquilo. – E tomei mais um gole, só para tossir outra vez.
O cara gato – e integrante de banda – riu e continuou: - De qualquer forma, fui expulso da banda. Parece que a culpa daqueles fracassados não conseguirem um contrato é minha. Filhos da puta.
O modo como ele falou “fracassados” me lembrou de algo... Só não pude saber o que era. A culpa devia ser do uísque.
- São homens – eu lamentei. – São todos assim. Uns bastardos. Vê o meu noivo, por exemplo. – Dei uma pausa para tomar mais um mega gole de uísque, acabando com o conteúdo do copo. – Depois de tanto tempo planejando aquela merda de casamento, me diz não no altar! Como ele teve a coragem? – eu lamentei, batendo com o copo na mesa. O uísque já não estava forte.
Encarei o cara gostoso, me perguntando por que ele parecia tão familiar. Ele parecia meio assustado comigo, mas eu apenas sustentei o olhar que ele me lançava.
- É, você está pior que eu – ele por fim admitiu, virando o resto do uísque como eu havia feito antes. – Jack, mais uma rodada na minha conta! – ele berrou para o barman, que pareceu irritado por ter que desviar os olhos da televisão.
- Eu sei – eu choraminguei, desejando que a bebida chegasse logo. Eu podia apagar logo de uma vez, não? Estava começando a ficar angustiada. Mas então a bebida chegou.
- Ah, obrigada! – eu agradeci a Jack, de um modo meio suplicante.
- Valeu, mate – o cara gato disse, e levantou o copo, como num brinde: - Às nossas vidas fodidas.
- Às fodidas! – eu exclamei, batendo meu copo no dele com um ruído mais alto que o normal.
Tomamos um grande gole do uísque e nos encaramos, parecendo um pouco mais felizes.
- Sou – ele falou repentinamente, depois de fazer uma careta pela bebida.
Foi aí que eu lembrei.
-EEEEEEEEEEEI! – gritei e, se não fosse pelo campeonato de futebol, todos os homens olhariam para mim, certeza. – Você é o ! Sabia que eu conhecia você de algum lugar!
- Eu te conheço? – ele perguntou, apreensivo. – Eu não transei com você, né?
Caí na gargalhada.
- Não, , você não transou comigo. – fez uma expressão de alívio, e isso me incomodou um pouco. Seria essa a segunda rejeição do dia? – Por quê? Seria tão ruim transar comigo?
pareceu horrorizado, e meu estômago revirou.
- Quê? Não, não seria ruim transar com você, é só porque... Espera, não que eu vá transar com você ou algo assim, mas é que... Porra, eu não sei quem você é! – Eu ri com sua frustração.
- Você já foi colega de banda do meu irmão, . Dean , lembra?
engoliu rapidamente a bebida em sua boca.
- Espera, você é a ? , gêmea do Dean?
Confirmei com a cabeça e um sorriso. Ele parecia abobalhado.
- Não acredito! Quem adivinharia que a chefe de torcida ia ser largada no altar? – E começou a rir.
Sabe o que eu devia ter feito? Eu deveria ter me ofendido e largado tudo para trás, fingindo um choro. Ainda seria uma boa desculpa para não pagar o primeiro uísque.
Mas quem eu queria enganar? Eu era uma perfeita vaca quando estava no colegial. Principalmente com todos os caras que não eram jocks, como . E como Dean, também. Não posso realmente dizer que eu e Dean éramos irmãos muito próximos na escola. Apenas não interprete mal: eu amava meu irmão. Mas ele podia ser menos loser, não?
É claro que isso era bobagem de colegial. Com 21 anos, eu percebia que o meu comportamento era completamente fútil. E eu havia mudado. A faculdade havia me mudado. E, tá, eu admito: era de Psicologia!
- É – eu concordei. – Meio difícil de imaginar um cara que não ia me querer – completei. – No colegial as coisas funcionavam de outra maneira.
se espreguiçou.
- Com certeza. No colegial, eu e os caras íamos pra sua casa e tínhamos a esperança de te imprensar na parede quando o Dean não estivesse vendo.
Pisquei os olhos algumas vezes, só para depois achar graça no que ele havia dito.
- Uma vez o Matthew conseguiu – confessei, me lembrando do garoto franzino e branquelo de olhos muito verdes. Não era exatamente o tipo de garoto com quem eu seria vista, mas na ocasião, ninguém ficaria sabendo. E eu sempre tive um fraco por roqueiros, apenas ninguém sabia disso!
- Ele fez questão de contar isso pro resto de nós – respondeu, rindo.
Balancei a cabeça em sinal de reprovação, mas com um sorriso disse:
- Sabia que, de todos vocês, não devia ter escolhido o Matt. Mas ele estava me dando mole.
virou o resto do uísque no copo e, após um barulhinho de aprovação, rebateu:
- Agora você falou como um verdadeiro macho, .
E eu não pude evitar cair na gargalhada.
Acho que se meu plano de beber até cair e no chão ficar fosse concretizado, o dia 15 de janeiro não seria tão especial. Talvez fosse o dia da minha morte. Mas aí eu não me lembraria, ou contaria isso a vocês.
E não seria tão divertido quanto realmente foi.
me salvou do coma alcoólico. Quando eu digo “salvou”, eu quero dizer que de verdade salvou.
Ok, deixe-me explicar.
Tudo mudou quando, depois de pedir mais uma rodada de uísque, comentou:
- Não sei o que é pior, nossas vidas fracassadas ou o modo como reagimos a ela. – Ele encarava o copo de uísque com desconfiança, ou uma certa dúvida.
- Como assim? – perguntei. Ah, vai, dá um desconto. Apesar de não estar inconsciente, eu já estava um pouco altinha. Só um pouquinho.
Mas eu nunca fui muito inteligente mesmo.
me encarou com seus olhos profundamente , e eu confesso que estremeci um pouquinho. Qual é, quem poderia imaginar tanta profundidade vinda de ?
- A gente devia parar de beber – ele disse subitamente. Fiquei preocupada em receber um sermão digno de mamãe depois das festas que eu ia com os jogadores, mas parecia pensativo em vez de repressor.
- Não, a gente não devia – contestei. Tomei um gole de uísque. – Eu ainda nem estou desacordada! – reclamei, pensando que a bebida podia ser um pouquinho mais eficiente.
riu.
- E qual é a vantagem de estar desacordado? – ele desafiou, descansando o copo.
- Não precisar pagar a conta – eu respondi, com uma súbita vontade de gargalhar.
- Eu ouvi essa, noiva – escutei Jake falando, perto de nós. Não pude evitar sorrir bebadamente. – Não vou mais te servir álcool, querida.
Foi irônico, mas me divertiu.
se intrometeu:
- Põe tudo aqui na minha conta, Jake – ele disse tranquilamente. – Eu e a estamos de saída.
- Estamos? – eu perguntei, surpresa e risonha.
Ele concordou com a cabeça e pegou o casaco grosso, levantando-se.
- E vamos para onde? – eu quis saber, também me agasalhando com o casaco que Dean havia me entregado, e que eu havia tirado ao longo da conversa com .
- Para minha casa – ele respondeu. – Tomar café. E curar a bebedeira.
- Você pretende dirigir assim, ? – eu perguntei de brincadeira. Não me parecia nenhuma loucura ir para a casa de um cara que não via há anos, quando nós dois estávamos bêbados e ele era completamente gostoso. Vai que eu ainda tinha chances de uma noite de núpcias?!
Ele começou a andar em direção à saída, e eu o segui, dando um tchauzinho para Jake. Eu não havia gostado do bartender, mas estava sendo simpática. Ok, o uísque tinha me deixado bem simpática.
Quando alcancei , ele se deu ao trabalho de responder:
- Nham, meu apartamento é logo na rua de trás.
Nunca fui muito boa em matemática. Mas qualquer idiota saberia que cara gostoso + lindos olhos + talento da parte dele para a música + algumas rodadas de uísque + apartamento perto do bar + Um Passado + uma mulher rejeitada e deprimida = SEXO!
Porra, como era difícil me equilibrar naqueles saltos.
Peraí, subir escadas? estava maluco ou o quê?
Rá, perfeito. Se uma pessoa não consegue achar as chaves de casa, como vai encontrar meu ponto G?
Entrei no apartamento devagar, mas não por timidez – era meio impossível ficar tímida depois de tanto uísque – e sim porque meus pés me matavam. Sinceramente, de quem tinha sido a ideia daqueles sapatos?
Ah, sim. Alicia. Ela me pagaria por isso.
Mais tarde.
Logo que olhei para a sala, a primeira coisa que me chamou atenção foi um sofá. Não um sofá qualquer, mas um sofá enorme, daqueles que a gente deita, rola 360 graus e não cai. Aliás, duas pessoas girariam 360 graus deitadas naquele sofá sem cair na boa.
Nem preciso comentar que flashes de um sexo selvagem imaginário entre eu e se passaram pela minha mente involuntariamente. Mas tudo bem, porque a culpa era da bebida.
Ou assim eu preferia acreditar.
- – eu chamei, com a voz meio chorosa, enquanto ele fazia um arremesso de molho de chaves numa saladeira a 4 metros de distância -, temos mesmo que curar a bebedeira? – Meu tom de voz saiu suplicante, e fez com que risse.
- Acho que não – ele respondeu, indo em direção ao sofá e se largando nele, enquanto eu seguia seus movimentos com os olhos e ele dizia: - Não acho que a gente vá conseguir evitar a ressaca de amanhã, mesmo.
Senti um impulso enorme de correr até o sofá, me largar em cima dele e começar a beijá-lo. E sentir suas mãos nas minhas costas. E arrancar suas roupas. E o resto você já sabe.
Comecei a rir da minha ideia, e fui andando devagar até ele, tentando lhe lançar um olhar sedutor. Não que eu estivesse em meu momento mais sedutor, considerando que eu era uma ex-noiva, bêbada e chorosa, com os pés absolutamente fodidos. Mas você sabe: uma vez dona de sex appeal, sempre dona de sex appeal!
Não comentando sobre o estágio entre a gravidez e a lipoaspiração.
Ele ergueu o olhar para mim, mordendo levemente o lábio. Aquilo era um bom sinal e, Deus, como ele ficava sexy com aquela expressão safada! Agora só faltava ele se levantar, segurar minhas pernas, me tacar naquele sofá enorme e...
As coisas nunca acontecem como a gente espera.
- Tentando me seduzir, ? – ele perguntou, rindo mas esfregando as palmas das mãos em um gesto involuntário. Pega com a boca na botija. Sabendo-se lá o que botija é.
Olha, vou te contar uma coisa: a bebida é uma merda. Ela manda o seu orgulho para o espaço. Foi por isso que minha mente começou a formular respostas incríveis.
- Estou. Será que dá para você vir me comer logo de uma vez?
O clássico da garota ousada (leia-se: vadia).
- Não sei. Você é seduzível?
Meio copiada do filme Um amor para recordar. Minha originalidade me surpreende às vezes.
- Meu filho, ainda não estou nesse estágio de bebedeira. Tem uma garrafa de Heineken aí?
Dando uma de garota esnobe. Você sabe como elas são irresistíveis para os garotos teimosos.
Mas, diante da minha incoerência, tudo o que saiu foi:
- Estou. Você é seduzível? Tem uma garrafa de Heineken aí?
E é exatamente isso o que eu chamo de fracasso.
gargalhou e eu o imitei, sem saber o motivo. Ele não respondeu, mas foi até a cozinha e voltou com seis – é isso aí, seis - cervejas.
Tive que anotar mentalmente, para futura fofoca, que eu não era tão alcoólatra quanto minha mãe pensava.
Ele abriu uma garrafa e me entregou, abrindo uma para si em seguida e deixando as outras na mesinha central, de frente para o sofá. Sentou-se em seguida ao meu lado, mas continuou calado, tomando um gole da bebida. Comecei a desconfiar da masculinidade dele. Qual é, eu falo que estou tentando seduzi-lo, pergunto se ele está caindo na minha e a única parte que ele capta é a da cerveja?
- Você é gay? – perguntei de súbito, o encarando com um olhar confuso.
Ele cuspiu metade da cerveja que estava na boca. Confissão, eu pensei, deprimida.
- Não, claro que não! – ele respondeu, parecendo assustado. Como um homossexual que tem medo de se revelar. Que desgraça.
- Não se preocupe, não vou contar a ninguém – eu retruquei, virando a garrafa em mais um gole de cerveja. Apenas pensava no puta azar que eu tinha. Quando ele tinha virado gay? Qual é, ele sempre fora um dos gatos do colegial...
- Porra, , eu não sou gay - ele disse em tom baixo, me encarando seriamente.
Ok, o uso do palavrão fez com que eu passasse a confiar um pouco mais em suas negações.
- Então prove que você não é gay, – eu desafiei, deixando a garrafa de lado.
Ele deu um sorriso de canto, um pouco debochado e cínico. Delicioso.
Chegou mais perto de mim, largando a garrafa de cerveja junto às outras.
- E como – ele murmurou de leve ao meu ouvido – você espera que eu o faça?
- Acho que você pode pensar por si mesmo – eu respondi, rindo.
Ele se levantou de súbito, e foi até um aparelho de som que estava em cima de um móvel cor de tabaco. Eu fiquei curiosa para ver o que ele estava fazendo, mas entendi em seguida que ele escolhia um CD dentre uma pilha ao lado do aparelho de som.
Estava um pouco impaciente, mas me acalmei assim que reconheci as primeiras notas da música que havia começado a tocar. Fechei os olhos, achando incrível o fato de ele ter escolhido uma das minhas músicas favoritas: Say When, do The Fray.
- Vem dançar – falou . Incrivelmente, seu tom de voz não denotava um pedido, mas sim uma ordem. Até eu, bêbada como estava, me senti intimidada, apesar de soltar uma risadinha antes de levantar.
Ele me deu a mão e me conduziu até o centro da sala, onde não havia nenhum móvel em que nós pudéssemos esbarrar. Quando chegou ao espaço, me girou por debaixo de seu braço erguido, e depois puxou pela cintura. Eu tentei dar um passo à frente, mas tropecei nele e acabei rindo novamente.
- Shiu – ele sussurrou ao meu ouvido, parecendo estar bem mais sóbrio que eu. – Numa dança, o cavalheiro conduz a dama, . – Ele fez sua tentativa: colocou o pé direito à frente, mas eu não o acompanhei, por me sentir meio perdida.
- E desde quando – eu comecei, enquanto ele insistia na dança com o outro pé, sem obter um bom resultado – você é um cavalheiro, ?
See you there, don’t know where you come from
Te vejo lá, não sei de onde você vem Unaware of the stare from someone
Desatenta ao olhar de alguém Don’t appear to care that I saw you
Não parece se importar que eu te vi And I want you
E que eu te quero
- Eu posso ser um cavalheiro quando eu quero – ele rebateu, rindo. Por um momento, nossos olhares se encontraram, e eu senti um frio na espinha. Qual era a minha? Eu não estava ali por puro sexo selvagem e sem o menor sentimento?
Ele me girou novamente, e depois tentou voltar aos passos. E eu ainda estava alegrinha demais para acompanhá-lo.
- Desiste, – eu alertei, rindo.
- Não desisto tão fácil.
What’s your name? ‘Cause I have to know it
Qual é o seu nome? Porque eu preciso sabê-lo You let me in and begin to show it
Você me deixou entrar e começou a mostrar isso We’re terrified ‘cause we’re heading straight for it
Nós estamos apavorados porque estamos nos dirigindo diretamente a isso Might get it
Talvez consigamos
Ele me levantou, e eu me impressionei com a sua força – afinal, eu já não era uma modelo anoréxica, e aquele vestido me deixava mais pesada que nunca -, e depois pôs meus pés em cima dos dele. O próximo movimento foi bem mais fácil, apesar de nós não estarmos dançando propriamente. Eu me sentia a Bella de Crepúsculo, sendo guiada na dança com Edward no final do filme. Sempre a achei meio incompetente, mas, parando para pensar, ela conseguiu agarrar o vampiro gostoso no final de tudo, né?
You’ve been the song playing on the background
Você tem sido a música tocada ao fundo All along but you’re turning up now
O tempo todo, mas você está aparecendo agora And everyone is rising to meet you, to greet you
E todos estão ansiosos te conhecer, te cumprimentar
Turn around and you’re walking toward me
Você se vira e está andando na minha direção I’m breaking down and you’re breathing slowly
Eu estou desmoronando e você respira lentamente Say the word and I will be you man, you man
Diga a palavra e eu serei seu homem, seu homem
- Como estou me saindo como cavalheiro macho? – perguntou, descendo as mãos para minha cintura e me prendendo ali.
- Acho que eu te reconheço como cavalheiro – respondi, sorrindo e erguendo minhas mãos para seu rosto. – Mas ainda preciso de uma confirmação quanto à parte do heterossexual.
Não foi exatamente uma surpresa quando ele me beijou.
Say when and my own two hands
Diga quando e minhas duas mãos Will comfort you tonight, tonight
Irão te confortar essa noite, essa noite Say when and my own two arms
Diga quando e meus dois braços Will carry you tonight, tonight
Irão te carregar essa noite, essa noite
Se eu fosse mais romântica, diria que nosso beijo começou com lábios apenas grudados, e que ele depois pedira permissão com a ponta da língua, e eu a concedera. Mas como eu não sou tão romântica (e estava menos romântica ainda depois de ser largada no altar) e estava meio bêbada, isso seria uma mentira das grandes.
Nosso beijo foi intenso e quente desde o início – qualquer tipo de joguinho fora por água abaixo, porque nossos objetivos eram óbvios. Nós não nos sentiríamos solitários naquela noite.
We’re coming close, and then even closer
Estamos nos aproximando, e daí mais perto We bring it in, but we go no further
Nos entrosamos, mas não vamos mais longe We’re separate, two ghosts in one mirror
Estamos separados, dois fantasmas em um espelho No nearer
Longe
Tudo foi ficando mais e mais quente – desde nossos corpos até nossos pensamentos. me puxava pela cintura com muita força e eu agarrava seus cabelos, entregue.
Eu fui andando lentamente, sem deixar de beijá-lo nem por um segundo, em direção ao sofá. me puxou quando sentou no mesmo, e eu pus minhas pernas em torno de sua cintura, um pouco incomodada pela saia do vestido, enquanto ele desviava os beijos para meu pescoço.
Primeiro tirou meu casaco, e eu me senti exposta com o vestido de noiva. As lembranças ruins do dia quiseram vir à tona, mas eu não deixei que isso me atrapalhasse ou impedisse. Na verdade, eu me sentia mais feliz que tudo, apesar de não saber se era apenas efeito do álcool.
Ele tirou seu casaco e blusa, e eu observei com malícia seu peito nu. Depositei beijos por toda sua face, enquanto sentia suas mãos descerem o zíper do meu vestido.
Não era a lua-de-mel com a qual eu sonhara. Mas era mais do que eu podia pedir.
Some of this was here before us
Uma parte disso estava aqui antes de nós All of this will go after us
Tudo disso irá depois de nós It never stops until we give in
Isso nunca irá parar até que nós desistamos
Nós dois de roupas íntimas, a respiração pesada.
Não houve muita resistência daí para a nudez.
E acompanhada por um suspiro e mais um beijo, a música acabou.
Say when and my own two hands
Diga quando e minhas duas mãos Will comfort you tonight, tonight
Irão te confortar essa noite, essa noite
Para mim, sempre foi muito constrangedor acordar em uma cama alheia. Quando eu era líder de torcida, digamos que isso era uma constante, mas minha reação nunca mudava: eu sempre tinha vontade de sair correndo, fingindo que nada havia acontecido.
Quando comecei a namorar Scott, as coisas não se transformaram, como se era de esperar. Eu apenas controlava esse impulso de vergonha, em vez de realmente catar minhas roupas e ignorar o cara ao meu lado, como eu fazia antes.
Mas Scott era meu noivo. Não era como se ninguém soubesse que nós fazíamos sexo, ou que isso fosse uma coisa errada. Quero dizer, por favor. Até minha mãe uma vez viera me perguntar como era o desempenho sexual do meu noivo!
Que, caso tenha nascido sua curiosidade, era bastante razoável, obrigada. Numa escala de 0 a 100, eu diria 85, já que a vez do posto de gasolina foi meio inesquecível.
Não, não vou entrar em detalhes.
Enfim, o fato é: assim que eu abri os olhos, na manhã seguinte, e percebi que me encontrava naquele quarto escuro, gemi com a perspectiva de ter que encarar o ex-companheiro de banda do meu irmão. Repeti mentalmente “Tomara que ele não esteja acordado, que ele não esteja acordado, Deus!”, usando a lei da atração de O Segredo.
Mas assim... Digamos que eu sempre soube que era tudo idiotice.
Para começar, tive esperanças. Olhei para o lado e vi de olhos fechados, parecendo estar em um profundo sono. Não pude deixar de reparar nos braços fortes e nus dele, e também fiquei um bom tempo observando a forma embaixo dos cobertores que eu sabia ser seu belo traseiro. Veja bem, eu não ia me esquecer da gostosura daquele cara nem em um milhão de anos!
Sendo bastante sincera, eu não ia me esquecer da noite anterior nem se vivesse para sempre. E sem aquele papo furado de “eu estava bêbada e não me lembro de nada”. Uma ova! Em uma escala de 0 a 100, eu soletro: N-O-V-E-N-T-A-E-N-O-V-E, completamente digno!
Porque, é claro, eu deixaria o 100 guardado para o futuro... Nunca se sabe o que ele reserva!
Levantei da cama com cuidado, procurando não fazer o menor barulho e não me movimentar demais ao que eu me descobria. Aliás, assim que eu tirei as cobertas, senti um frio da porra, apesar da calefação. Quase desisti do meu plano de sair sorrateiramente e voltei para a cama. Quase.
Mas, sendo eu uma mulher muito determinada, encarei o frio e a nudez, e fui até a sala catar minhas peças de roupa. Ah, sim, aquele maldito vestido.
Erro meu. Assim que abri a porta do quarto, que dava para a sala sem nem ao menos a presença de um corredor, a claridade alcançou meus olhos. E ao que pareceu, meu cérebro também. Dei um gritinho pela dor aguda que atingiu minha cabeça. Seja bem-vinda, Ressaca!
Foi aí que apareceu o , completamente acordado e peladão - exatamente isso, tão pelado quanto eu -, falando com naturalidade, enquanto eu sentia meu crânio explodindo em mil pedacinhos:
- Os remédios estão na terceira gaveta do armário da cozinha, achei que você ia querer. – Ele andou calmamente até o pedaço de pano que ele reconheceu como sua cueca, numa pilha de roupas ao lado do sofá onde o que mais chamava atenção era meu vestido, e a vestiu. E eu ainda estava estática, tentando me acostumar à dor de cabeça. – Vou fazer café, se você quiser...
Ele deixou a frase em aberto, e pareceu se adiantar para a cozinha. Subitamente, porém, parou no meio do caminho, deu meia-volta e se encaminhou a mim, que estava sem palavras. Roubou um selinho demorado (que por acaso fez as minhas pernas tremerem) e, com um sorriso, disse:
- E bom dia, , antes que você fuja daqui sem nem falar comigo. – E seguiu para a cozinha.
Espera. Como ele sabia?
Eu, hein. Cada um que me aparece.
- E aí, quais são os planos para hoje?
Hm. Boa pergunta. A resposta pode ser resumida em algumas palavras aleatórias.
Sofá. Aspirina. Chocolate quente. Cobertor. Lenços de papel. Diário de uma Paixão. Heineken. Licor. Amarula. Vodca. Tequila. Barra de chocolate. Batatas fritas. Pipoca doce. Telefone desligado. Mais aspirina. Tesoura. Vestido. Tesoura. Pulsos.
- Acho que vou ficar em casa – comentei, tentando não parecer uma suicida. Ou pior, uma fracassada. – E você?
A conversa estava meio forçada, uma vez que eu nunca sabia o que fazer nessas situações pós-sexo. Fingi estar muito interessada no meu café, e percebi que ocasionalmente ria antes de tomar um gole da caneca. Foi aí que ele começou a falar.
- Ah, tenho umas coisas a resolver hoje – ele respondeu, dando de ombros. Repare bem que ele não quis me dizer qual era o tipo de coisas. Isso me deixava maluca. – Coisas de perdedor.
- Então talvez eu devesse te ajudar – eu comentei, tomando mais um gole de café. Café preto, café bom. – Esqueceu que eu sou perdedora também?
- Verdade. Você está no fundo do poço.
- Estou – tive que concordar. Incrivelmente, não estava com vergonha de ser uma fracassada na frente dele. Acho que pelo fato de ele ser tão fracassado quanto eu. – Também andei pensando em matar o meu ex-noivo. Ou me matar. Ainda não decidi o que quero mais.
- Se quiser ajuda com o cara, é só me chamar – ele respondeu após rir, e eu o acompanhei. – Em troca, você podia me ajudar a matar meus ex-companheiros de banda. Assassinatos a mais, assassinatos a menos...
- Injusto – argumentei, finalmente terminando minha caneca de café. – Quantos caras têm na sua banda?
- Quatro. Cada um com o cérebro do tamanho de um chiclete. Nem vão te dar trabalho – ele garantiu, e por um momento eu tive uma visão infantil de um roqueiro com a parte superior da cabeça formada por uma bola de chiclete, podendo ser facilmente estourada a partir de qualquer pressão com o dedo indicador.
- Imagino que um chiclete seja grande para eles – discordei, me lembrando da época quando via meu irmão ensaiando com a banda. era um ótimo músico. – Assim como para o Scott. Seu cérebro se aproxima gradualmente ao tamanho de um grão de areia.
se levantou, pegando minha caneca e levando-a, junto à dele, à bancada da pia.
- Vou concordar. Só sendo muito burro para te dizer não.
Enquanto proferia essas palavras, virou-se para mim. Não pude reprimir um sorriso, e meu corpo respondeu com calor ao elogio.
Quero dizer, aquilo tinha sido um elogio, não é mesmo?
Tive uma vontade imensa de ficar perto dele, em vez de todo o plano suicida. me fazia bem, e eu nem ao menos sabia o porquê. Eu apenas tinha uma paz de espírito maior quando estava ao seu lado, e não sentia as cobranças de todo mundo em cima de mim.
Um clichê veio à minha cabeça, sem que eu pudesse evitar: com , eu podia ser eu mesma.
Mas tudo o que é bom acaba. E, bom, eu estava muito bem, não? Tinha encontrado um cara legal, que tinha botado toda a bebida na conta dele, tinha bom gosto musical e fazia um sexo maravilhoso. Tudo o que eu podia querer naquele momento.
- Bem – eu me levantei, sentindo o vestido infernal pesando. Queria tirar aquela porcaria -, acho que é hora de ir embora.
Parei para observar sua reação.
Seu rosto se mostrava impassível. Seus olhos , completamente ilegíveis. Sempre odiei esse tipo de pessoa, ininteligível. Mas naquela hora, o mistério parecia sedutor.
Ele não sorriu, e seu rosto não se fechou. Ele apenas me encarou, fixando nossos olhares e ali permaneceu.
E eu ainda tentando entender se ele queria que eu fosse ou ficasse.
Não pude medir quanto tempo nós ficamos nos encarando. Pareceram horas, mas o bom senso me diz que durou menos de um minuto.
Não me refreei, tive que perguntar:
- Você quer que eu vá embora?
Tive certeza que meus olhos refletiam receio. Se ele dissesse que queria minha ausência, eu seria rejeitada duas vezes em menos de um dia. O pesadelo de qualquer mulher.
- Claro que não – ele respondeu, com um sorriso de lado. – Pensei que fosse me ajudar com minhas coisas de perdedor.
Sorri de volta, me sentindo finalmente aconchegada.
Fiquei me perguntando quais eram as coisas de perdedor por pouco tempo, para ser sincera. Eu não estava realmente me importando com que porcaria eu ia fazer, mas sim com quem ia fazer. A companhia de me fazia tão bem que eu tenho certeza que, mesmo se ele me chamasse pra participar de um ritual suicida, eu ia me divertir.
Até morrer, claro. Depois, não sei como ficaria a situação. Hm.
Para a análise crítica da situação, eu estava tão animada em sair com que me esqueci do meu vestuário completamente inapropriado e chamativo. Felizmente, enquanto eu esperava se trocar para sairmos de casa, eu reparei em uma figura encostada na parede, me encarando com um sorriso brincando nos lábios.
- Não vai tirar esse vestido, ? – perguntou, já equipado com calças, tênis e um casaco que parecia incrivelmente quentinho e confortável.
Analisei bem a pergunta. Estava sentada no bendito sofá, usando o maldito vestido. Fechei os olhos, lembrando-me da noite anterior, e sentindo aquele gostinho de quem quer mais. Tiro, facilmente.
- Se você quiser – ele continuou, me fazendo abrir os olhos e olhá-lo –, eu tenho umas roupas da minha prima aqui. Também te empresto um casaco, deve estar frio demais lá fora.
Ah, era isso.
Apesar de um pouco decepcionada, recuperei-me facilmente do desnorteamento. Pigarreei e depois sorri com todos os dentes, levantando-me. Ele fez sinal com a cabeça para que eu o acompanhasse até seu quarto, e eu estremeci... Ao ver sua cama desarrumada, tive vontade de me jogar ali e não sair mais: não queria voltar para casa ou falar com muitas pessoas. Com , porém, eu poderia conversar. Quase deitei e me agarrei ao colchão, implorando para que ele me deixasse ficar ali.
Achei muito deprimente, entretanto, e logo desisti. Lembrei-me de , e procurei-o com os olhos pelo quarto, até pegá-lo me observando com um sorriso brincalhão. Fiquei imaginando se ele estava lendo meus pensamentos, ou qualquer coisa assim... De qualquer forma, corei com a ideia.
Percebi que ele já tinha peças de roupas em mãos, então me adiantei para pegá-las, com as mãos estendidas. Quando já estava quase alcançando-as, desviou as roupas de minhas mãos, afastando-as de mim. Arregalei os olhos, surpresa, mas tudo foi esclarecido quando eu encarei a expressão dele, risonha e marota.
Mordendo os lábios, tentei pegá-las novamente, mas ele levantou os braços, mantendo-as fora de meu alcance. Não segurei a gargalhada, mas ele riu junto comigo, e começou a andar pelo quarto de costas, protegendo as peças atrás de seu corpo. Fui atrás dele, em um comportamento extremamente infantil, mas eu não estava ligando muito.
Eu o persegui pelo quarto, embora ele sempre conseguisse desviar de mim. Foi quando ele subiu na cama, ficando em pé e segurando as roupas numa altura que quase chegava ao teto.
- Nunca vai pegar, ! – ele dizia, e em seu rosto eu podia ver um ar tão infantil que dava vontade de apertar suas bochechas.
Não só as bochechas, mas melhor deixar quieto.
- Vou sim – desafiei, subindo na cama também e pulando até ele, que apenas ria. Durante meu curto percurso até ele, me desequilibrei e quase caí, mas me reergui a tempo. Fiquei pensando que seria muito mais conveniente se eu caísse em cima dele, mas eu nunca tenho essas sortes!
Apoiei-me no ombro dele, ficando nas pontas dos pés e dando pulinhos para alcançar as roupas, entretanto o vestido pesava muito, me fazendo pular baixo demais para conseguir. Estava quase desistindo e pedindo penico, como fazia quando criança, mas mais uma vez me surpreendeu.
Não vi muito bem o que aconteceu; foi rápido e eu estava demasiado distraída para entender bem. Mas percebi que me pegou no colo, como se pega uma noiva (e eu ainda parecia uma), e desmontou em cima da cama, me carregando junto.
E foi um momento bom. Ficamos os dois deitados, rindo e ofegantes, mas ele ainda mantinha a mão com as roupas afastada. Deitei sobre seu peito, me sentindo... Feliz. Só feliz.
- Eu proponho um pedágio – ele começou, e eu me arrumei na cama para olhar seu rosto – pelas roupas.
Mordi o lábio inferior, forçando uma expressão levada.
- Qual?
Ele não respondeu, apenas me olhou nos olhos. Senti sua mão ir ao encontro do braço que me apoiava no colchão, apenas segurando-o.
- Qual? – eu repeti, sentindo uma leve falta de ar.
riu, quase sem emitir som, e em um estalo roubou-me um selinho.
Fiquei atônita novamente, mas sentindo um impulso quase irreprimível de gritar. Meus olhos desfocaram por um momento, porém assim que pude enxergar com clareza, um sorriso se formou em meu rosto sem permissão.
- Vai trocar de roupa, – ele pediu, fazendo um carinho de leve no meu queixo com seu polegar.
Eu apenas concordei com a cabeça, levantando-me com o objetivo de ir ao banheiro. Antes que eu saísse da cama, no entanto, senti um tapa no meu traseiro. Virei para trás e me deparei com gargalhando, enquanto jogava a cabeça pra trás. Rolando os olhos de implicância, segui até o banheiro sem lhe dizer nada.
Fechei a porta, só para encostar-me a ela e rir até perder o fôlego.
- Certo. Por que estamos aqui mesmo? – eu indaguei, olhando em dúvida para e depois voltando a encarar a mureta de pedra.
- Porque a vingança é para os fracos – ele respondeu, franzindo a testa e tirando sua mochila dos ombros. – E eu sou fraco.
- Seja bem-vindo – eu comentei, dando uma espiada no conteúdo da mochila, que ele estava abrindo na hora. – E o que exatamente é esse lugar? – continuei, a curiosidade aguçando ao ouvir barulhos metálicos vindos da bolsa.
Seriam armas? Minha imaginação fértil criou uma cena onde me entregava uma pistola e um canivete, pegando seus próprios e me convidando a entrar em uma guerrilha. É claro que eu aceitaria.
- Esse – ele disse – é o lugar onde a banda ensaia. O Ashton é o dono, então a gente faz o barulho que quiser. – estava rindo, mas sua expressão endureceu ao que ele analisou suas palavras. – Quero dizer, até eles me expulsarem daquela merda – ele finalizou, voltando sua atenção à mochila.
Percebi que ele tirava latinhas de lá dentro. Não estava entendendo muito bem o que ia acontecer, até ele destampar uma das latas e me entregar.
Era um spray.
- Destruição de propriedade privada? – perguntei retoricamente, na tentativa de argumentar.
Ele deu de ombros.
- Eles merecem – concluiu, tirando duas latinhas e segurando uma em cada mão, depois de largar a mochila no chão. Olhou pra mim então, e passou a língua entre os lábios, creio eu que inconscientemente. Sorriu e disse: - Liberte-se, .
Ele começou a usar os sprays, e eu ainda não acreditava que estava prestes a cometer um crime.
Que, ok, nem era um crime hediondo ou qualquer coisa do tipo. Mas ainda assim. Crime. Ah, dane-se.
Foi meu último pensamento antes de começar a pichar.
“Scotty broxa e precisa de Viagra!”
“SCOTT COOOORNO!”
“Scott, vá se foder!”
Não seria certa a descrição de todas as ofensas feitas ao meu ex-noivo: o nível era baixo demais. Não era o tipo de coisa que eu costumava fazer, mas eu não estava me importando, nem um pouco. Vingança era para fracos, mas era um dos maiores prazeres da vida.
Mesmo que Scott nunca soubesse das pichações; mesmo que aquilo fosse para sempre um segredo meu e de , eu sabia que a satisfação de fazer algo, qualquer coisa, me acompanharia para sempre.
.
Suas frases, sempre destinada aos caras da banda, estavam em um nível bem abaixo do meu, mas eu tive orgulho dele. Sem contar que foi um aprendizado para mim: juro que eu não tinha ouvido falar em metade daqueles palavrões!
Ri uma vez e, mesmo sem querer, acabei interrompendo no meio de uma de suas injúrias. Ele parou o que estava fazendo e olhou para mim, sorrindo. Leu o que eu tinha escrito e soltou uma risada rouca, em seguida andando até a minha direção.
Só percebi o que ele ia fazer quando o vi agitar o spray.
Tarde demais.
- , socorro, para com isso! – eu gritei, mas estava gargalhando tanto que era impossível levar alguma palavra a sério. Virei de costas e comecei a correr, entretanto sem dar muita distância dele. Cada centímetro do meu corpo em breve estaria coberto com tinta azul, mas eu decidi que não ficaria por menos: revidei toda a sujeira, cobrindo o garoto de tinta roxa.
Pichamos um ao outro por bons minutos, apenas gargalhando e ofegando, até perceber que seu spray tinha chegado ao fim. Larguei minha latinha de qualquer jeito no chão, e não pude evitar correr até ele, dando um abraço forte. Senti algo que não pude reconhecer: era uma espécie de carinho, misturado com amizade e excitação.
Foi quando ele me beijou. Nossas línguas se encontraram, como não haviam feito desde a noite anterior, nossos hálitos se misturaram e nossos corpos se grudaram um ao outro. me empurrou até a mureta pichada, encostando minhas costas nela e segurando meu corpo, limitando meu espaço.
Não reclamaria de falta de espaço, porém. Todo o espaço que eu queria estava ali, eu tinha certeza disso.
Contudo, ainda havia algo de errado que martelava em minha mente. Acho que era simplesmente o fato de eu não conhecer a pessoa com quem estava me envolvendo tão rapidamente. Sim, ele era um tremendo gostoso. E sim, ele me fazia rir como ninguém. Mas como aquilo poderia dar certo, se eu não sabia quem realmente era?
Eu simplesmente não tinha estrutura emocional para ser machucada novamente. Não podia me permitir cair em outro buraco, tão fundo quanto aquele onde Scott me deixara. E o medo da decepção me fez partir o beijo tão intenso, no momento em que lágrimas se formavam em meus olhos.
não me perguntou o que estava acontecendo, apenas me encarou nos olhos. Pela sua expressão, ele percebeu meu conflito interno, mas eu não podia precisar sua reação quanto a ele. Senti uma lágrima cair pela bochecha, mas logo a secou; eu o agradeceria pelo gesto, porém estava confusa demais.
- Acho melhor eu ir – eu falei, apertando os olhos fechados.
Ele não me pediu para ficar; apenas concordou com a cabeça e se afastou, desgrudando nossos corpos. Senti um vazio por dentro, mas sabia que não podia ficar enquanto não estivesse entendendo o que estava acontecendo comigo.
Não quis me despedir. Nada de último beijo, último abraço, última palavra a ele. Preferi apenas seguir meu caminho, então me adiantei para afastar-me dali.
- Ei, – ele chamou e, relutante, olhei para ele. – Sei que precisa pensar.
Concordei veementemente com a cabeça, mas não disse nada.
- Mas espero que no final, você conclua a mesma coisa que eu.
O enigma chamou minha atenção, então eu perguntei:
- Qual a sua conclusão?
Ele deu um sorriso de canto.
- Estarei aqui à meia-noite.
E, me deixando sem resposta para a pergunta, pegou a mochila largada no chão e andou em passos largos e firmes na direção oposta a mim.
Só me restava voltar para casa. E eu já nem sabia o que considerava ser meu lar.
- , eu estava morrendo de preocupação! – Alicia exclamou, assim que me viu à porta. – O que aconteceu com você? Por que está toda suja? Ai, meu Deus, cadê o seu vestido? De quem são essas...
Minha cabeça girava de confusão, e, apesar de ser minha melhor amiga, Alicia só piorava as coisas.
- Preciso de um banho, amiga – disse simplesmente, implorando com os olhos. – E de uma boa cama.
Alicia ainda me encarava assustada, de modo que eu adicionei:
- Por favor, Alicia. Juro que explico depois.
Ela mordeu o lábio inferior, como sempre fazia quando estava sendo contrariada. Mesmo assim, me puxou para dentro de sua casa, me levando até seu banheiro. Entregou-me uma toalha e deixou uma pilha de roupas limpas em cima da bancada da pia. Antes de sair do banheiro, me deu um beijo no rosto.
Tomei um banho quente e relaxante, vendo toda a tinta azul sair com a água. Lamentei por isso, mas não queria pensar muito: apenas terminei o banho e vesti as roupas de Alicia, dobrando as que havia me emprestado e deixando-as sobre a tampa do vaso sanitário.
Saí do banheiro, logo me deparando com a cama do quarto. Sem pensar duas vezes, deitei. Estarei aqui à meia-noite.
Foram as últimas palavras que pensei antes que meus olhos se fechassem e eu me perdesse em sonhos.
Pisquei algumas vezes depois que acordei. Olhei o relógio na mesa-de-cabeceira ao lado da cama. Meia-noite e quinze.
Dei um pulo. Não sabia o que estava fazendo, mas sabia que tinha que fazer.
Mas estava atrasada. E sem pensar duas vezes, saí correndo.
Correndo de verdade. Correndo da casa de Alicia, passando por ela, que estava deitada no sofá da sala, sem dar nenhuma explicação.
Correndo pela rua, com passadas automáticas que me levariam ao ponto de encontro. Não fazia ideia de como eu sabia chegar lá, mas minhas pernas faziam o caminho com tamanha naturalidade, que era como se estivessem programadas para aquilo desde sempre. “Que ele esteja lá”, pedi em meu íntimo.
Ele estava.
Cheguei ofegante, resultado de um bom tempo sem ir à academia, me tirando todo o preparo físico. Estava escuro, mas eu sabia que ele estava sorrindo. Só a imagem em minha mente me fez sorrir de volta.
- Achei que você não estaria mais aqui – confessei, tentando repor o ar. Apoiei-me na mureta, tentando ficar em equilíbrio. Não sabia se ousava olhar para , agora que ele estava ficando mais e mais perto.
- Eu sabia que você estaria – ele riu, finalmente tocando em mim. Senti seu toque e seu cheiro me invadirem, e me senti completa então.
Ele me beijou uma vez: um selinho rápido. Eu retribuí, dando dois selinhos em sua boca. Ele me deu três selinhos rápidos, e eu gargalhei com a brincadeira boba.
- Pensou nos seus problemas? – ele questionou, me abraçando. Suspirei e admiti:
- Não, caí no sono.
Ele riu de novo, passando as mãos pelo meu cabelo.
- Sabe – eu comecei, e ele passou a prestar atenção em mim, segurando meu rosto com as mãos de modo a deixar nossos olhares se encontrarem – não faço ideia de como isso pode dar certo.
não respondeu, apenas continuou me encarando. Seus olhares então se desviaram para meu nariz, desceram para minha boca, foram até meu pescoço e subiram novamente para meu rosto. Ele me apertou mais contra seu corpo e deu uma mordidinha de leve no meu lábio.
Sem conseguir me conter, eu sussurrei:
- Como isso vai dar certo?
Ele não pensou muito para responder:
- Não tenho a mínima ideia. Mas vai dar. Eu te prometo isso, .
Depois me beijou novamente, deixando nossas línguas brincarem, como gostavam de fazer. As palavras e aquele beijo selaram o que seria o começo da nossa história.
E tudo por causa de um não casamento. O melhor não casamento de todos.
Fim.
Nota da autora:
Nhai! Fiz essa shortfic como um presente de aniversário para a minha amiga-quase-irmã-best-friend-forever-dude, a Lívia. Entretanto, com o aniversário de um ano do site, pensei que os dois mereciam esse presente: ela por ser uma das pessoas mais importantes da minha vida, e ele por ser o melhor site de fanfics de toda a web, beijos. PARABÉNS!
E para todas que leram a fic, muito obrigada pela atenção. Espero que vocês gostem e que, se gostarem, comentem!
A ideia da fic veio de um filme que eu vi (que eu ACHO que se chama Tinha Que Ser Você), onde um cara (velho e feio) encontrava a Emma Thompson num café, e eles se conheciam e passavam o dia juntos... Tá, eu sei que é clichê, mas e daí?, eu gostei!
Qualquer erro, por favor enviem um e-mail para mim, e não para o site. Se quiserem, também podem me mandar um tweet para @summer_giirl, e eu não me incomodo nem um pouco de ser followada, ok?! xx. Marii-Marii