Capítulo Único
Jogou a mala no banco de trás e bateu a porta.
Deu os passos necessários para chegar a porta da casa, enquanto se permitia olhar ao redor e sentir a brisa da madrugada. O vento gelado batia contra as poucas partes expostas de pele que escapavam da jaqueta de couro e lhe lembrava que não estava inteiramente anestesiada.
Ainda sentia, ainda estava viva.
Tinham outros resquícios da vida que restara dentro de si, como por exemplo as lagrimas grossas que escorriam por seu rosto.
Fora muito difícil chegar até aquele ponto, mas era seu limite e estava tão cansada de sua própria vida que ser extrema já nem mesmo lhe parecia um esforço.
Olhou pela janela uma última vez, vendo agora a casa vazia e escura quase como um local mal assombrado. E talvez fosse, ou no mínimo amaldiçoado. Seria uma boa explicação para tudo o que havia acontecido desde que passara a morar ali.
Suas botas pisavam no chão molhado com firmeza, enquanto ela pensava mais uma vez antes de fazer o que queria.
Poderia simplesmente vender o imóvel e deixar que outra pessoa ou família lidasse com o fardo que viria junto da casa, mas se negava a deixar qualquer outra alma que fosse sofrer por causa daquela construção de madeira.
Desceu as pequenas escadas que separavam a varanda do quintal, de costas, sem encostar no pequeno balaústre que adornava a mesma e se colocou a encarar a construção mediana, que ficava no meio do nada.
Assim que os pés tocaram o cascalho novamente, tirou o isqueiro do bolso e com um suspiro, abriu a tampa do objeto e o acendeu.
Abaixou-se ativando a trava que manteria o fogo aceso e testou o objeto contra a madeira ensopada de etanol. O fogo se alastrou rapidamente naquele degrau.
Se levantou, tendo o rosto agora iluminado pela chama grande que crescia rapidamente e cada vez mais.
Jogou o isqueiro para dentro da varanda e se virou. Não queria ver o estrago, não queria estar ali para assistir tudo.
Entrou no carro e deu partida, acelerando antes mesmo de colocar o cinto de segurança e piscando rápido para que as lágrimas não lhe fizesse causar um acidente.
Passou pela porteira da propriedade e antes de fechá-la, usou o capô do carro para assinar o contrato que passava as terras para o nome de sua mãe, que voltaria de viagem sem entender nada.
Enfiou o contrato na pasta impermeável e abriu a porta do passageiro, tirando de dentro do porta-luvas o grampeador que havia guardado lá previamente.
Pregou os documentos na porteira, de forma que fosse impossível de abri-la sem ver.
A fumaça podia ser vista a distância, subindo pelos céus escurecidos pela noite, contando para que teus fantasmas estavam sendo parcialmente mortos.
Entrou no carro e dessa vez colocou o cinto, mandou uma mensagem para a mãe, que ela sabia que só chegaria quando saísse da zona rural e então pisou fundo no acelerador contrariada de manter as janelas fechadas pois não sentia o vento contra seus cabelos. Mas também não estava disposta a ter o interior do carro coberto pelo pó vermelho.
Era um dos poucos prazeres que conseguia ter naquele buraco que chamava de cidade natal, a velocidade.
Por mais que aquela cidade fosse pacata e interiorana, haviam alguns cidadãos que tentavam escapar da mesmice com corridas clandestinas madrugadas a dentro.
Foi onde conseguiu chegar mais próxima de sentir parte de algo, tinha sua equipe, que depois de algum tempo se tornaram sua família de coração e eram os maiores apoiadores da escolha que havia acabado de tomar.
Quem a visse no meio daqueles homens mal encarados e com má fama na cidade, nunca pensaria que eram eles quem diziam que ela devia viver sua vida do jeito que sempre sonhara, na estrada.
nunca tivera algo que realmente lhe prendesse ali, claro que sua família havia sido o grande motivo para que não jogasse seu emprego na loja de automóveis mais famosa da cidade ao lado pro ar e se entregasse as curvas sinuosas de seu país.
Mas as coisas mudaram quando seu pai adoeceu, ela se mudou para a fazenda para manter seus dois olhos no homem que havia passado direto da fila do juízo. E acabou vivendo na mesma casa até então, seis anos após a morte do patriarca.
Era filha única de pais separados, sempre viveu pulando de casa em casa com a mãe, ainda que amasse seu pai e tivesse a plena certeza que teria uma vida mais estável morando com ele, tinha medo do que a mulher faria se não tivesse que se responsabilizar com nada.
Quando chegou na cidade, a primeira parada foi a oficina de Gil. Onde sabia que todos os outros estavam lhe esperando para dizer tchau. Era óbvio que não partiria para sempre, havia um pedaço de seu coração com cada um daqueles brutamontes, mas precisava se dar uma chance de viver antes de aceitar que passaria o resto de seus dias naquela cidadezinha do interior.
- Princesa! - César cumprimentou quando viu o Golf GTI passando pelo grande portão do galpão.
- E aí seus manés! - Cumprimentou descendo do carro. - Prontos para perderem a melhor integrante da equipe de vocês?
- Mas eu não vou a lugar nenhum. - Daniel disse tirando uma gargalhada dela.
- Até parece que você acredita nisso, Dan.
- Eu já estou procurando um substituto para você. - Gil falou, balançando sua cerveja na direção de um garoto que ela lembrava já ter visto no meio do pessoal nas corridas.
- Eu vou ser trocada por um molequinho? - Ela falou fazendo uma careta. - Espero que você seja bom, garoto. Não vou gostar de voltar e saber que vocês se tornaram perdedores.
Ficaram algum tempo ali batendo papo e quando ouviram o caminhão dos bombeiros cortando a cidade com a sirene incômoda, soube que era a hora de dizer tchau.
Indo contra o que todos aqueles marmanjos acreditavam antes de conhecerem e se apagarem a mulher, trocaram abraços que eram tão apertados que poderiam ser de adeus, mas todos sabiam que era apenas um até logo.
deu um último aceno com a cabeça e uma piscada de olho antes de arrancar com o carro e sair cantando pneu.
- PARE DE ASSINAR O MEU PISO! - Gil berrou e ela gargalhou nem mesmo se dando ao trabalho de responder.
Ainda não estava nem perto do nascer do sol, então as ruas estavam vazias e em segundos ela já estava passando pelos limites da cidade e caindo na rodovia.
No trecho que conhecia, pode escancarar as janelas e pisar fundo no acelerador, evitando apenas os radares. Não seria muito inteligente uma multa de trânsito aleatória nessa altura do campeonato.
-
Era sua terceira semana de estrada e estava na hora de parar e encontrar uma lavanderia e encontrar uma oficina para dar uma olhada no carro, que nessa altura já precisava de uma nova revisão. Já tinha passado por três estados e conhecido diversos quartos de hotéis baratos, restaurantes de qualidade duvidosa e pontos turísticos peculiares. Seu serviço de nuvem já estava perto de ter o limite de armazenamento alcançado e ela não perdeu nenhuma oportunidade de fotografar as diversas vistas com as quais se deparou pelo caminho.
Passou por uma cidadezinha minúscula e mas de aparência acolhedora, parecia com a sua e por isso, resolveu que seria ali que passaria mais que uma noite.
Eram três da tarde quando ela estacionou na frente da primeira pousada que encontrou. A placa do lado de fora ostentava as inscrições "Repouso dos Canários" e ela achou que aquilo serviria.
Entrou na recepção apenas com os documentos e a carteira em mãos, até o celular ficou trancado no carro.
- Boa tarde, vocês tem vagas? - Perguntou educada para a garota na recepção que encarava a televisão com uma cara entediada.
- Boa tarde! - Respondeu com um sorriso caloroso e empolgação que fez com que acreditasse que a feição anterior havia sido um delírio. - Temos sim, para quantas pessoas?
- Uma só, três dias.
- Certo, certo, vou reservar um quarto para você.
Depois de fornecer os dados necessários, recebeu o cartão chave do chalé que ficaria hospedada e a garota perguntou se ela queria ajuda com a bagagem, que foi prontamente negada.
Caminharam lado a lado enquanto a garota discorria sobre os serviços oferecidos na pousada e nos arredores.
Até mesmo um parque natural com águas termais foi citado, e pensou que talvez passasse por lá, um dia a mais no seu prazo, não mataria, certo?
A recepcionista empolgada e jovem, se chamava Milene e se despediu da mulher após mostrar os aposentos.
se jogou na cama assim que fechou a porta, nem um pouco preocupada com o fato de que teria de buscar suas coisas.
Encarou o teto enquanto pensava no que havia achado dali até então. A pousada estava movimentada, mas não ao ponto de se tornar um local incômodo. Os chalés eram distantes uns dos outros e aconchegantes. Como pequenas casinhas e Milene havia explicado que havia tudo que ela poderia precisar na lista de serviços oferecidos, lavanderia era uma delas e agradeceu aos céus.
Não sabe quanto tempo passou ali, quieta, só esperando seu corpo se acostumar com o colchão, mas quando viu que o sol começava a baixar, se colocou de pé e foi buscar suas coisas, queria estar instalada antes do jantar.
Andou até onde havia estacionado o carro e então realmente passou pelos portões da pousada com o carro, estacionando na pequena garagem perto do chalé.
Tirou as malas que estavam no porta-malas e juntou suas coisas jogadas pelo carro e foi tomar um banho quente quando tudo já estava amontoado num canto perto do sofá.
Saiu com uma toalha no cabelo e o roupão branco enorme do hotel, fora sua estadia mais bem paga até então.
-
No dia seguinte, acordou tarde o suficiente para perder o café da manhã, ligou na recepção pedindo o serviço de lavanderia e avisou que passaria na mesma para pegar algumas informações.
Quando suas roupas foram levadas por uma camareira simpática, ela terminou de calçar suas botas e pentear os cabelos. A roupa escura não era exatamente a melhor pedida para aquele dia quente, mas era o que ela podia ter visto que literalmente todas as suas outras opções precisavam ser lavadas.
Se arrependeu de não ter lavado-as antes. E agora só tinha mais um par de calcinhas limpas, a calça jeans escura e a camiseta preta que usava.
Pegou as chaves do carro e dirigiu até a saída, parando de novo na entrada, já que sairia atrás de uma oficina assim que falasse com a recepcionista.
- Bom dia, preciso que você me salve. - Ela pediu com uma careta.
- Você não me parece uma donzela em apuros. - Milene brincou tirando uma risada da mais velha.
- Preciso de um espaço para dar uma olhada no meu carro, sabe se algum mecânico poderia me fazer esse favor?
- Podemos tentar com o , mas eu não sei se ele mexe em carros chiques igual ao seu. Mas ele é ótimo! Sempre arruma o meu quando dá problema.
- Ah não, eu quem vou mexer, quero só o espaço e talvez um refil de óleo.
- Você sabe consertar carros? Não tem cara de mecânica.
- Eu sei muita coisa sobre carros, principalmente como acelerá-los.
- Uau! - Disse realmente surpresa, a mulher realmente tinha uma energia completamente badass, mas Milene pensava que ela tinha um carro daqueles apenas por beleza. Afinal era um carro lindo. - Eu posso te dar as coordenadas, mas se você quiser que eu lide com o cara, espere cinco minutinhos. Meu horário de almoço está chegando.
- Eu te espero, é bom que você me indica um restaurante bom, estou faminta.
- Sim, senhora! - Fez uma continência com dois dedos e riu, indo se sentar num dos sofás do hall.
Seu telefone tinha algumas mensagens de sua mãe, lhe contando as novidades de casa. Ao contrário do esperado, a mulher resolveu manter o terreno e construir uma casa nova. Que jurou que nunca passaria mais de 24 horas seguidas dentro.
- Como está a viagem, princesa? - Daniel perguntou quando atendeu a ligação.
- Está ótima, acho que vou ficar uns dias a mais nessa cidade.
- Devo perguntar o porquê ou vou ficar traumatizado?
- Vou dar uma olhada no carro antes de seguir. Acho que vou precisar trocar os pneus, o clima está esquisito.
- Só isso, princesa? Nenhum romance de verão?
- Não, mas aqui tem piscinas naturalmente aquecidas.
- Eu devia ter insistido para viajar com você.
- Podemos ir? - Milene perguntou silenciosamente, não querendo interromper a conversa da mulher.
- Dan, eu tenho que ir, vou tentar um espaço numa oficina.
- Boa sorte com isso, manda notícias pros caras, estão todos preocupados.
- Vou mandar, e se cuidem! - Se despediram e a mulher se levantou. Enfiando trocando as chaves pelo celular no bolso.
e Milene entraram no carro e a segunda indicou primeiro o caminho do restaurante, visto que o estômago de reclamava. Almoçaram e então foram para a oficina de .
- , está aí? - Milene perguntou quando entrou no galpão, estava estacionando o carro do outro lado da rua ainda.
- Qual a boa da vez? - O homem corpulento saiu de debaixo de um carro antigo que estava no meio do espaço.
- Uma turista está precisando de uma oficina.
- E cadê ela? - Perguntou vendo que a garota estava sozinha.
- Uau, é uma oficina e tanto que temos aqui. - disse entrando e notando os carros antigos que estavam estacionados ali.
- Essa é a , , esse é o .
- E aí, cara! Tudo bem?
- E aí, qual é sua questão?
- Ela só queria um espaço para mexer no carro. - Milene respondeu.
- Entende de carros? - Ele perguntou surpreso.
- A cara engana, grandão, mas sou apaixonada. - Disse simples. - Tem como você me ceder um espaço na sua caverna? Juro não incomodar, pelo menos não muito.
- Claro, vou abrir um espaço para você. Já vai trazer o carro hoje?
- Se der, vai ser ótimo! Ainda tenho alguns quilômetros pela frente.
- Eu vou deixar vocês e voltar pro trabalho. - Milene disse e não tardou a se despedir.
ainda perguntou mais algumas coisas para o homem de roupas surradas, enquanto conversavam, percebeu que ele precisava se esforçar para ter a cara de mau. manobrou um fusca que estava por último na lista de prioridades mais para os fundos do galpão e explicou que ela poderia ficar a vontade.
- Vou buscar o carro. - avisou, parando de olhar para o motor do Opala que o homem mexia antes das duas mulheres chegarem. - Você viu que a ordem da ignição tá errada? Acho que alguém tentou sabotar esse motor.
Saiu andando e o homem foi conferir, ficando completamente embasbacado com o conhecimento da mulher. Ela tinha uma postura tão confiante e tranquila, a curiosidade sobre como sabia tanto de carros era inevitável, mas quando o Golf GTI passou pelo portão, ele se tocou.
Ninguém tinha um dos carros mais rápidos produzidos no país para passear na cidade. Ela era uma corredora.
- Você corre?
- Como adivinhou? - Bateu a porta do carro e puxou o capô.
- Amante de carros, nariz em pé, carro rápido… Não é tão difícil.
- Hey! - Se fingiu de ofendida. - A soberba não é porquê eu corro.
- É porque se acha boa no que faz. - Constatou deixando-a sem palavras. - Seu tipo é bem comum.
- Está muito inserido no contexto, devo deduzir que você sabe do que está falando pois já esteve no meio. Mas largou por algum motivo.
- A cidade baniu os rachas.
- Que vida triste. - Ela comentou e então levantou um olhar travesso pra ele. - Sente falta de correr?
- Claro! Adrenalina é igual outras drogas, viciante.
O papo rendeu e acabou que ela passou mais tempo enchendo o homem de perguntas que realmente mexendo no carro. Ele era intrigante com suas respostas diretas e sem nenhum prolongamento do assunto. E ela decidiu que queria saber mais.
- Estou indo nessa. Você acha que consigo pneus aqui com entrega rápida? - Ela perguntou quando decidiu que era hora de ir embora.
- Posso tentar conseguir em uns cinco dias para você, eu não tenho nenhum desse tamanho no estoque.
- Poderia me fazer esse favor? Tô preocupada com essas chuvas esquisitas na estrada.
- Você corre clandestinamente e tem medo de chuva? - Perguntou irônico.
- Eu preciso voltar pra minha equipe, grandão. Vou terminar minha viagem e voltar pra casa.
- E qual seu destino?
- As praias do nordeste.
- Passei minha lua de mel no porto. Acho que você vai gostar.
- Você é casado? Caramba, uma caixinha de surpresas! Ou devo dizer caixona? - Ele gargalhou.
- Viúvo.
- Oh, sinto muito, grandão.
- Cara, você se lembra que meu nome é , né?
- Sim, grandão. Mas você nem tem cara de .
- E eu tenho cara de quê?
- Ainda estou decidindo. - Falou se afastando agora com o celular nas mãos. - Ah, vou confiar em você, não toque no meu motor. Mas se quiser relembrar seus velhos tempos.
Jogou a chave do carro pro homem que pegou num reflexo. Deu meia volta e saiu do galpão, iniciando seu caminho até a pousada.
- Princesa! - Ele chamou, devido ao chaveiro eu suas mãos, e se apressou porta a fora. - Quer uma carona?
- Acho que vou aproveitar que a noite está bonita e ir caminhando até a pousada, conhecer a cidade e etc.
- Cuidado para não se perder pelos bares.
- Eu não sei se perder é a palavra que eu usaria, grandão. Talvez achar seja mais apropriada. - Disse rindo e voltou a andar. - Até amanhã, . Te vejo às oito?
-
- Bom dia, grandão!
- Caiu da cama, princesa? - Ele perguntou vendo a mulher na porta do galpão antes mesmo que ele tivesse chegado para abri-lo.
- Ou nem deitei nela. Você nunca vai saber. - Deu de ombros.
- Vou ligar pro fornecedor hoje, alguma especificação, senhorita?
- Mesmo modelo, por favor.
Naquele dia, já estava mais confortável, vestia legging preta e uma camiseta da mesma cor, já que grande parte de seu guarda-roupa tinha tons escuros, nunca vestia algo muito diferente.
Testou o motor e procurou em todos os lugares possíveis daquele capô, cogitou até entrar debaixo do carro vendo o se descobria qual era o barulho esquisito que ouvia quando acelerava. E não deu outra. Uma embalagem esquisita e grudenta de plástico metalizado estava presa debaixo do carro e ela tirou aquilo e saiu de debaixo do carro segurando aquilo com as pontas dos dedos e uma careta de nojo.
- Onde fica a lixeira? - Perguntou e levantou a cabeça para olhar para ela. Não escondendo o riso ao ver a cara de nojo que ela fazia.
- Ali no canto. Onde achou isso?
- Debaixo do carro. Eu não quero saber da procedência disso não.
Passou por ele indo até a lixeira, e quando voltou parou olhando o motor também.
- Qual o problema dessa gracinha?
- Isso está bem gasto, tá vendo? - Apontou para uma das tubulações de combustível.
- Sabe o que isso parece?
- Sei, mas não sei se quero saber sobre.
- Pois eu quero. - Disse animada e abriu a porta do passageiro, olhando no piso e não encontrando nada, procurou debaixo do banco e lá estava ele.
O cilindro estava até camuflado pela cor vermelha, quem olhasse rápido veria apenas um extintor, mas era esperta demais.
- Você precisa descobrir onde estão rolando. - Ela disse, saindo do carro com o cilindro de Nitro em mãos.
- Não.
- Por favor, grandão! A gente pode até ser uma dupla!
- Não inventa, princesa.
- Vamos! O que te custa?
- Você não vai me deixar em paz, né?
- Não. E vou piorar.
- E tem como piorar?
- Claro! Ainda não estou te assediando.
- Eu é quem não iria reclamar, princesa. - Ele disse e ela gargalhou.
- Você tem sorte de ser muito gostoso pra essa frase não ter me feito perder todo o tesão.
- A culpa é do seu chaveiro.
- Nas corridas de lá, todo mundo me conhece por princesa. Esse não foi o problema.
- Não combina com você.
- Exatamente.
- Vou aderir mesmo assim. Até você largar o "grandão".
- Ah, mas eu não vou largar, não. - Molhou os lábios com a ponta da língua. - Vamos almoçar? E seu trabalho hoje é descobrir com o dono dessa banheira onde vamos correr hoje.
- Eu não corro mais, .
- Seja meu copiloto, então.
-
realmente não sabia onde estava com a cabeça quando topou sentar atrás do vontade do Golf naquela noite. Só de pensar em correr, sua mente girava, o estômago embrulhava e o coração disparava. Quando desceram do carro na saída da cidade que não tinha um posto policial, ele suava frio.
- Fica calmo, cara. Quem vai dirigir sou eu.
- Continua sendo preocupante. - Ele brincou e ela bateu com o ombro na lateral de seu corpo.
- Eu vou ganhar e você vai ver que não precisava disso.
- Ainda lembra da rota não é? - Perguntou em relação ao trajeto que o dono do Opala descreveu, eles haviam comprado um fast-food para o almoço apenas para que a mulher fizesse o reconhecimento da pista.
- Ora, ora! Não pensei que voltaria a te ver nessas coisas, . - Um cara franzino que devia ter quase a mesma idade que os cumprimentou.
- Estou acompanhando a Princesa aqui. - Ele mostrou a mulher. - Ela quem vai correr.
- Apostando na ajudante, cara?
- Ela é turista.
- Bom saber. É um prazer, senhorita. Sou Duncan.
- É um prazer, Duncan. - Ela correspondeu o cumprimento e se aproximou dele. - Você parece saber o que está rolando a mais tempo, onde me inscrevo?
-
A corrida seria uma volta completa ao redor da cidade, realmente nada muito complexo, mas com algumas curvas mais perigosas, devido a montanha nas quais a rodovia havia sido construída.
Todos os competidores já estavam a postos. A partida havia sido definida por sorteio e estava em 4°.
Enfiou o pé no acelerador apenas para aquecer o motor, vendo o ponteiro subir. O sorriso de antecipação surgiu em seu rosto.
Todos os presentes estavam atentos, a garota de jeans colado caminhou até o meio da pista. Gritando as última instruções, levantou a mão que segurava um tecido verde.
olhou para o carro ao lado, vendo o rapaz concentrado a sua frente. Ele parecia ser bem jovem.
Voltou a olhar para frente, segundos antes da garota abaixar a bandeira. A partida foi dada, e arrancou.
quase subiu numa moto e foi acompanhar tudo de perto, mas achou melhor esperar que eles aparecessem na linha de chegada.
conseguiu uma boa colocação logo no começo, apenas um carro estava na sua frente e lhe fechava todas as vezes que ela tentava passar adiante.
- Filho da puta! - Xingou quando a mesma coisa aconteceu pela terceira vez.
No retrovisor, viu que a distância entre ela e o terceiro colocado estava diminuindo, e imaginou que aquela seria sua chance.
Mais da metade do trajeto foi feito com os três primeiros carros perigosamente colados. Na penúltima curva, se deixou ser ultrapassada.
Sabia que agora o primeiro se preocuparia somente com ele e esperou a última reta do circuito chegar. Ele não conseguiria fechar os dois ao mesmo tempo.
Assim que a última curva terminou, ativou o botão do combustível modificado e então, passou a quarta marcha e enfiou o pé no acelerador sem dó.
Dito e feito, agora estava em primeiro. Com uma distância razoável entre o segundo e terceiro colocados.
Quando chegou no fim e a bandeira foi balançada, jogou o carro pro acostamento e saiu, agora com um sorriso vitorioso no rosto.
A multidão ovacionava-a, havia quebrado um recorde. Por segundos de diferença.
- Devo dizer que estou surpreso, princesa. - se aproximou ao ver que ela procurava por ele.
- Parabéns, garota, você quebrou o recorde! - Um estranho parabenizou e ela agradeceu sorrindo.
- Eu te falei pra você ser meu copiloto! Eu nunca tinha corrido sozinha! - O sorriso genuíno dela praticamente mostrava todos os dentes.
- Sempre tem uma primeira vez. - Ele falou e ela o abraçou, no calor do momento.
A graça das corridas era exatamente essa, cada vitória era uma coisa diferente, como se fosse a primeira vez.
- Eu devia saber que você não traria qualquer um, . Parabéns, Princesa. Estou honrado de ter perdido pra você. - Duncan disse escorado no carro e ela percebeu que ele era o cara que estava lhe fechando. Típico.
- Foi você quem trouxe ela, ? Vocês treinaram juntos? - Alguém que ouviu a conversa perguntou.
- Foi por isso que ela quebrou seu recorde? - Outro estranho perguntou e ela se virou pra ele com uma sobrancelha arqueada.
- O recorde era seu, grandão? VAMOS BEBER PRA COMEMORAR.
-
já havia recebido o comprovante da transferência de seu prêmio e agora estava sentada num bar junto com e outros corredores, Duncan incluso.
- Você voltou pras corridas em grande estilo, cara. Trouxe literalmente uma princesa! - Ian, o rapaz que estava ao lado de na largada disse para , quando já estavam todos meio alterados.
- Se ela não tiver dono, por favor, me avisem! - Duncan disse e ela largou uma gargalhada.
- Eu não tenho dono, idiota! Mas você é que não vai ser.
- Esqueci que você caiu direto nas garras do . - Ele falou risonho e levou seu olhar a que revirava os olhos.
-
- Hoje foi divertido. - Ele falou enquanto andavam pela cidade. Estavam mais próximos da casa dele do que da pousada dela, o dia já estava nascendo e eles nem estavam mais tão bêbados assim.
- Divertido? Foi incrível! Eu quebrei o seu recorde!
- Isso foi porque eu parei de correr.
- Tem a ver com a sua esposa?
- Não. Eu parei um pouco antes, quando começamos a pensar em ter filhos.
- Algo muito trágico aconteceu? - Ela perguntou e logo se corrigiu. - Não precisa responder se não quiser.
- Não, não foi nada demais. A morte dela foi natural, nem chegamos a estar grávidos ou algo do tipo.
- É engraçado ver um cara do seu tamanho dizer que ficaria grávido. - Ela disse num tom divertido.
- Cala a boca, princesa. - Ele revidou.
- Eu não. Não disse nada… - Foi interrompida por um beijo repentino ao qual nem teve reflexos para responder.
- Desculpa, eu não devia, né? - Perguntou quando se afastou pois não havia tido nenhuma resposta.
- Calma, eu fui pega de surpresa, tenta de novo. Dessa vez eu vou estar pronta. - Ela disse e ele riu fraco antes de beijá-la pela segunda vez.
- Agora fez mais sentido. - Ele disse, largando a cintura dela e ela se segurou no braço dele ao sentir que estava um pouco bamba das pernas.
- Agora eu preciso te levar pra casa. - Ela sussurrou.
- A minha ou a sua?
- Qualquer uma.
- Ótimo, porque a minha está bem ali. - Apontou e foram caminhando de mãos dadas até lá.
O clima leve e descontraído sumiu assim que a porta foi fechada atrás de . esperou somente que a porta fosse trancada para atracar os lábios do homem que reflexivamente agarrou-a pela cintura com uma mão, enquanto a outra a segurava pela nuca.
O beijo era rápido e sedento. E quando ela precisou separar as bocas para que pegasse fôlego, mordeu o lábio inferior do homem devagarinho, o que fez ele enroscar os dedos nos cabelos da nuca dela e puxá-los. Inclinando a cabeça dela para trás, que atendeu ao pedido silencioso de bom grado.
O primeiro suspiro realmente audível, escapou dos lábios da mulher e foi multiplicado pelo resto do amanhecer e uma parte da manhã.
-
Quando se deitaram lado a lado na cama, com as respirações ofegantes, se ajeitaram para dormir e o fizeram aconhegados um no outro.
Era a primeira vez que dormia com alguém que não conhecia a vida toda e a primeira vez que levava alguém para casa desde que perdera a mulher. E ainda assim, nada daquilo pareceu estranho.
-
Quando acordou estava sozinha na cama. O sol batia forte na janela fina e ela se perguntou como havia conseguido dormir tanto naquele estado. A voz irritante de sua consciência respondeu que era porque havia sido desmontada pelo mecânico ao qual pertenciam os lençóis que estava embolada.
Se levantou procurando suas roupas e as encontrou dobradas na poltrona. Reconheceu sua calça jeans e as meias, apenas. A camisa era muito maior que ela, pelo cheiro (que ela não pode evitar conferir) soube que pertencia ao homem. Um bilhetinho com uma caligrafia preguiçosa pedia desculpas, e ele estava por cima de um pacote com uma cueca boxer. Ela entendeu o recado.
Tinha também uma toalha dobrada, um recado silencioso de que ela poderia tomar banho caso quisesse, e ela achou muito querido da parte de .
Não negou a permissão e entrou no banheiro do quarto ainda nua com tudo em mãos. Deixou tudo na bancada da pia e entrou no box, ligando um jato de água gelado em si e agradecendo o toque refrescante da chuveirada forte.
, que estava na cozinha preparando um almoço, que era suficiente para os dois mesmo que ela não quisesse ficar, ouviu a porta do banheiro bater e soube que ela havia acordado.
-
- Bom dia, grandão. - Cumprimentou quando apareceu na sala já vestida e arrumada na medida do possível.
- Boa tarde, já. Descobri qual das princesas você é, a Bela Adormecida.
- Realmente, dormi mais que a cama. - Ela disse se aproximando dele ainda sem saber realmente como agir.
Ela ainda o considerava um desconhecido, então se sentia acanhada por ter acordado na cama dele. Nunca havia lidado com isso, normalmente tratava o cara como os amigos que provavelmente eram, comiam algo juntos, talvez transassem mais uma vez antes de ir embora e era isso. Afinal, qual era o protocolo para depois de dormir com um conhecido?
E essa repentina timidez não passou despercebida pelos olhos de , que lhe abriu um sorriso torto antes de perguntar se ela queria almoçar.
- Eu não vou recusar, estou faminta! - Disse e seguiu-o para a cozinha.
- Meu fornecedor me enviou um e-mail ontem à tarde, esqueci de te dizer. Seus pneus chegam só na segunda, tem problema?
- Problema algum. - Ela disse enquanto se sentava na bancada onde ele havia indicado. - Estou gostando da cidade, não vai ser problema algum continuar aqui mais uns dias.
- Eu ia perguntar se não vai comprometer seu orçamento da viagem, mas você ganhou uma corrida ontem. - Ele disse se servindo e gesticulou para que ela fizesse o mesmo.
- Realmente não é o caso, eu saí de Entre Rios preparada para quase tudo.
- Como assim?
- Se eu te contar a história toda, pode ser que você me expulse de sua casa.
- Só estou mais curioso, o que a Princesa fez? - Perguntou e o restante do almoço foi baseado em contando tudo o que tinha lhe levado para aquela cidadezinha.
Depois que ela chegou à conclusão de sua viagem, ele ainda tentava absolver a informação de que ela havia incendiado a própria casa antes de cair na estrada.
- E você vai voltar? Mas para onde?
- Eu tinha grana guardada do apartamento que eu tinha antes do meu pai adoecer. Então dei entrada numa casa mais perto da oficina do Gil, aquele amigo que eu falei, e a gente vai começar um negócio de restauração de carros antigos.
- Caramba! - E sua afirmação era genuína, mas uma pequena parte de si murchou.
Quando acordou, horas atrás, com a mulher enlaçada a si, deixou a cabeça viajar e criar alguns cenários do que aconteceria depois da noite que tiveram juntos. Seu favorito era o que ela decidia ficar na cidade e eles repetiam a foda incrível que tiveram várias e várias vezes.
E ouvi-la contando a história, jogou tudo o que havia pensado lixo. Ela não ficaria e ele tão pouco deixaria que ela ficasse mais que o necessário. Era um sonho incrível e ela tinha o direito de realizá-lo.
-
Como as três diárias de terminariam, inocentemente ou nem tanto assim, ofereceu para a mulher ficar no quarto de hóspedes até que trocasse os pneus de seu carro e inocentemente aceitou o convite.
Mas, em nenhuma das noites seguintes, o convite chegou a dormir no quarto, todas as noites acabavam ofegantes na cama de , e aquilo era incrível.
Mas a segunda-feira chegou.
E nem mesmo era meio-dia quando os quatro pneus do Golf GTI terminaram de ser substituídos. Mas ficou na oficina para ajudar , mesmo que ambos sabiam que não tinha nenhuma necessidade.
E fecharam o galpão juntos e foram para casa juntos, com atrás do volante do Golf e ela fez o jantar, como uma despedida e um agradecimento. E eles transaram de novo.
Mas na manhã seguinte, acordou cedo, antes mesmo de o sol começar a clarear o céu.
Juntou suas roupas e saiu do quarto silenciosamente, mesmo que já conhecesse o suficiente para saber que ele só acordaria se ela o sacodisse ou jogasse no chão.
Não queria arriscar ter de se despedir.
Era um fato imutável que se sentia apaixonada pelo grandão de cara fechada, mas havia se comprometido com si mesma.
Havia deixado de dar notícias para casa a alguns dias, para não ter que se explicar e provavelmente já estavam preocupados com as mensagens secas e simples que a mulher enviava.
Era hora de partir, ou não conseguiria ir nunca mais.
No meio de suas coisas, encontrou o caderninho e a caneta que havia deixado no fácil quando arrumou suas coisas no domingo à tarde.
,
Eu não sei exatamente como escrever isso e talvez você ache que eu devesse lhe dizer tudo o que tenho para dizer nas próximas linhas pessoalmente.
Mas entenda, meu coração é fraco demais para permitir que eu te diga tchau olhando nos olhos. E você sabe disso também.
Esse tempo que tivemos juntos, foi definitivamente o tempo da minha vida, mas essa mesma vida, é solo.
E eu estou tirando coragem sabe-se de onde para partir agora.
Essa não é uma carta de adeus, grandão. Meu peito se tornou muito seu nesses poucos dias nossos para que eu te garanta que sumirei da sua vida para sempre.
Mas também não te peço que me espere.
Você vai saber me encontrar, da mesma forma que eu sei te encontrar, restará a nós saber quem será o primeiro corajoso.
Largou o papel preso na geladeira por um ímã de farmácia, e saiu batendo a porta devagar. Passou a chave na tranca e jogou a mesma por debaixo dela.
Guardou as malas restantes no carro e então entrou pela porta do motorista. E deu partida no carro sem olhar para trás.
Deu os passos necessários para chegar a porta da casa, enquanto se permitia olhar ao redor e sentir a brisa da madrugada. O vento gelado batia contra as poucas partes expostas de pele que escapavam da jaqueta de couro e lhe lembrava que não estava inteiramente anestesiada.
Ainda sentia, ainda estava viva.
Tinham outros resquícios da vida que restara dentro de si, como por exemplo as lagrimas grossas que escorriam por seu rosto.
Fora muito difícil chegar até aquele ponto, mas era seu limite e estava tão cansada de sua própria vida que ser extrema já nem mesmo lhe parecia um esforço.
Olhou pela janela uma última vez, vendo agora a casa vazia e escura quase como um local mal assombrado. E talvez fosse, ou no mínimo amaldiçoado. Seria uma boa explicação para tudo o que havia acontecido desde que passara a morar ali.
Suas botas pisavam no chão molhado com firmeza, enquanto ela pensava mais uma vez antes de fazer o que queria.
Poderia simplesmente vender o imóvel e deixar que outra pessoa ou família lidasse com o fardo que viria junto da casa, mas se negava a deixar qualquer outra alma que fosse sofrer por causa daquela construção de madeira.
Desceu as pequenas escadas que separavam a varanda do quintal, de costas, sem encostar no pequeno balaústre que adornava a mesma e se colocou a encarar a construção mediana, que ficava no meio do nada.
Assim que os pés tocaram o cascalho novamente, tirou o isqueiro do bolso e com um suspiro, abriu a tampa do objeto e o acendeu.
Abaixou-se ativando a trava que manteria o fogo aceso e testou o objeto contra a madeira ensopada de etanol. O fogo se alastrou rapidamente naquele degrau.
Se levantou, tendo o rosto agora iluminado pela chama grande que crescia rapidamente e cada vez mais.
Jogou o isqueiro para dentro da varanda e se virou. Não queria ver o estrago, não queria estar ali para assistir tudo.
Entrou no carro e deu partida, acelerando antes mesmo de colocar o cinto de segurança e piscando rápido para que as lágrimas não lhe fizesse causar um acidente.
Passou pela porteira da propriedade e antes de fechá-la, usou o capô do carro para assinar o contrato que passava as terras para o nome de sua mãe, que voltaria de viagem sem entender nada.
Enfiou o contrato na pasta impermeável e abriu a porta do passageiro, tirando de dentro do porta-luvas o grampeador que havia guardado lá previamente.
Pregou os documentos na porteira, de forma que fosse impossível de abri-la sem ver.
A fumaça podia ser vista a distância, subindo pelos céus escurecidos pela noite, contando para que teus fantasmas estavam sendo parcialmente mortos.
Entrou no carro e dessa vez colocou o cinto, mandou uma mensagem para a mãe, que ela sabia que só chegaria quando saísse da zona rural e então pisou fundo no acelerador contrariada de manter as janelas fechadas pois não sentia o vento contra seus cabelos. Mas também não estava disposta a ter o interior do carro coberto pelo pó vermelho.
Era um dos poucos prazeres que conseguia ter naquele buraco que chamava de cidade natal, a velocidade.
Por mais que aquela cidade fosse pacata e interiorana, haviam alguns cidadãos que tentavam escapar da mesmice com corridas clandestinas madrugadas a dentro.
Foi onde conseguiu chegar mais próxima de sentir parte de algo, tinha sua equipe, que depois de algum tempo se tornaram sua família de coração e eram os maiores apoiadores da escolha que havia acabado de tomar.
Quem a visse no meio daqueles homens mal encarados e com má fama na cidade, nunca pensaria que eram eles quem diziam que ela devia viver sua vida do jeito que sempre sonhara, na estrada.
nunca tivera algo que realmente lhe prendesse ali, claro que sua família havia sido o grande motivo para que não jogasse seu emprego na loja de automóveis mais famosa da cidade ao lado pro ar e se entregasse as curvas sinuosas de seu país.
Mas as coisas mudaram quando seu pai adoeceu, ela se mudou para a fazenda para manter seus dois olhos no homem que havia passado direto da fila do juízo. E acabou vivendo na mesma casa até então, seis anos após a morte do patriarca.
Era filha única de pais separados, sempre viveu pulando de casa em casa com a mãe, ainda que amasse seu pai e tivesse a plena certeza que teria uma vida mais estável morando com ele, tinha medo do que a mulher faria se não tivesse que se responsabilizar com nada.
Quando chegou na cidade, a primeira parada foi a oficina de Gil. Onde sabia que todos os outros estavam lhe esperando para dizer tchau. Era óbvio que não partiria para sempre, havia um pedaço de seu coração com cada um daqueles brutamontes, mas precisava se dar uma chance de viver antes de aceitar que passaria o resto de seus dias naquela cidadezinha do interior.
- Princesa! - César cumprimentou quando viu o Golf GTI passando pelo grande portão do galpão.
- E aí seus manés! - Cumprimentou descendo do carro. - Prontos para perderem a melhor integrante da equipe de vocês?
- Mas eu não vou a lugar nenhum. - Daniel disse tirando uma gargalhada dela.
- Até parece que você acredita nisso, Dan.
- Eu já estou procurando um substituto para você. - Gil falou, balançando sua cerveja na direção de um garoto que ela lembrava já ter visto no meio do pessoal nas corridas.
- Eu vou ser trocada por um molequinho? - Ela falou fazendo uma careta. - Espero que você seja bom, garoto. Não vou gostar de voltar e saber que vocês se tornaram perdedores.
Ficaram algum tempo ali batendo papo e quando ouviram o caminhão dos bombeiros cortando a cidade com a sirene incômoda, soube que era a hora de dizer tchau.
Indo contra o que todos aqueles marmanjos acreditavam antes de conhecerem e se apagarem a mulher, trocaram abraços que eram tão apertados que poderiam ser de adeus, mas todos sabiam que era apenas um até logo.
deu um último aceno com a cabeça e uma piscada de olho antes de arrancar com o carro e sair cantando pneu.
- PARE DE ASSINAR O MEU PISO! - Gil berrou e ela gargalhou nem mesmo se dando ao trabalho de responder.
Ainda não estava nem perto do nascer do sol, então as ruas estavam vazias e em segundos ela já estava passando pelos limites da cidade e caindo na rodovia.
No trecho que conhecia, pode escancarar as janelas e pisar fundo no acelerador, evitando apenas os radares. Não seria muito inteligente uma multa de trânsito aleatória nessa altura do campeonato.
-
Era sua terceira semana de estrada e estava na hora de parar e encontrar uma lavanderia e encontrar uma oficina para dar uma olhada no carro, que nessa altura já precisava de uma nova revisão. Já tinha passado por três estados e conhecido diversos quartos de hotéis baratos, restaurantes de qualidade duvidosa e pontos turísticos peculiares. Seu serviço de nuvem já estava perto de ter o limite de armazenamento alcançado e ela não perdeu nenhuma oportunidade de fotografar as diversas vistas com as quais se deparou pelo caminho.
Passou por uma cidadezinha minúscula e mas de aparência acolhedora, parecia com a sua e por isso, resolveu que seria ali que passaria mais que uma noite.
Eram três da tarde quando ela estacionou na frente da primeira pousada que encontrou. A placa do lado de fora ostentava as inscrições "Repouso dos Canários" e ela achou que aquilo serviria.
Entrou na recepção apenas com os documentos e a carteira em mãos, até o celular ficou trancado no carro.
- Boa tarde, vocês tem vagas? - Perguntou educada para a garota na recepção que encarava a televisão com uma cara entediada.
- Boa tarde! - Respondeu com um sorriso caloroso e empolgação que fez com que acreditasse que a feição anterior havia sido um delírio. - Temos sim, para quantas pessoas?
- Uma só, três dias.
- Certo, certo, vou reservar um quarto para você.
Depois de fornecer os dados necessários, recebeu o cartão chave do chalé que ficaria hospedada e a garota perguntou se ela queria ajuda com a bagagem, que foi prontamente negada.
Caminharam lado a lado enquanto a garota discorria sobre os serviços oferecidos na pousada e nos arredores.
Até mesmo um parque natural com águas termais foi citado, e pensou que talvez passasse por lá, um dia a mais no seu prazo, não mataria, certo?
A recepcionista empolgada e jovem, se chamava Milene e se despediu da mulher após mostrar os aposentos.
se jogou na cama assim que fechou a porta, nem um pouco preocupada com o fato de que teria de buscar suas coisas.
Encarou o teto enquanto pensava no que havia achado dali até então. A pousada estava movimentada, mas não ao ponto de se tornar um local incômodo. Os chalés eram distantes uns dos outros e aconchegantes. Como pequenas casinhas e Milene havia explicado que havia tudo que ela poderia precisar na lista de serviços oferecidos, lavanderia era uma delas e agradeceu aos céus.
Não sabe quanto tempo passou ali, quieta, só esperando seu corpo se acostumar com o colchão, mas quando viu que o sol começava a baixar, se colocou de pé e foi buscar suas coisas, queria estar instalada antes do jantar.
Andou até onde havia estacionado o carro e então realmente passou pelos portões da pousada com o carro, estacionando na pequena garagem perto do chalé.
Tirou as malas que estavam no porta-malas e juntou suas coisas jogadas pelo carro e foi tomar um banho quente quando tudo já estava amontoado num canto perto do sofá.
Saiu com uma toalha no cabelo e o roupão branco enorme do hotel, fora sua estadia mais bem paga até então.
-
No dia seguinte, acordou tarde o suficiente para perder o café da manhã, ligou na recepção pedindo o serviço de lavanderia e avisou que passaria na mesma para pegar algumas informações.
Quando suas roupas foram levadas por uma camareira simpática, ela terminou de calçar suas botas e pentear os cabelos. A roupa escura não era exatamente a melhor pedida para aquele dia quente, mas era o que ela podia ter visto que literalmente todas as suas outras opções precisavam ser lavadas.
Se arrependeu de não ter lavado-as antes. E agora só tinha mais um par de calcinhas limpas, a calça jeans escura e a camiseta preta que usava.
Pegou as chaves do carro e dirigiu até a saída, parando de novo na entrada, já que sairia atrás de uma oficina assim que falasse com a recepcionista.
- Bom dia, preciso que você me salve. - Ela pediu com uma careta.
- Você não me parece uma donzela em apuros. - Milene brincou tirando uma risada da mais velha.
- Preciso de um espaço para dar uma olhada no meu carro, sabe se algum mecânico poderia me fazer esse favor?
- Podemos tentar com o , mas eu não sei se ele mexe em carros chiques igual ao seu. Mas ele é ótimo! Sempre arruma o meu quando dá problema.
- Ah não, eu quem vou mexer, quero só o espaço e talvez um refil de óleo.
- Você sabe consertar carros? Não tem cara de mecânica.
- Eu sei muita coisa sobre carros, principalmente como acelerá-los.
- Uau! - Disse realmente surpresa, a mulher realmente tinha uma energia completamente badass, mas Milene pensava que ela tinha um carro daqueles apenas por beleza. Afinal era um carro lindo. - Eu posso te dar as coordenadas, mas se você quiser que eu lide com o cara, espere cinco minutinhos. Meu horário de almoço está chegando.
- Eu te espero, é bom que você me indica um restaurante bom, estou faminta.
- Sim, senhora! - Fez uma continência com dois dedos e riu, indo se sentar num dos sofás do hall.
Seu telefone tinha algumas mensagens de sua mãe, lhe contando as novidades de casa. Ao contrário do esperado, a mulher resolveu manter o terreno e construir uma casa nova. Que jurou que nunca passaria mais de 24 horas seguidas dentro.
- Como está a viagem, princesa? - Daniel perguntou quando atendeu a ligação.
- Está ótima, acho que vou ficar uns dias a mais nessa cidade.
- Devo perguntar o porquê ou vou ficar traumatizado?
- Vou dar uma olhada no carro antes de seguir. Acho que vou precisar trocar os pneus, o clima está esquisito.
- Só isso, princesa? Nenhum romance de verão?
- Não, mas aqui tem piscinas naturalmente aquecidas.
- Eu devia ter insistido para viajar com você.
- Podemos ir? - Milene perguntou silenciosamente, não querendo interromper a conversa da mulher.
- Dan, eu tenho que ir, vou tentar um espaço numa oficina.
- Boa sorte com isso, manda notícias pros caras, estão todos preocupados.
- Vou mandar, e se cuidem! - Se despediram e a mulher se levantou. Enfiando trocando as chaves pelo celular no bolso.
e Milene entraram no carro e a segunda indicou primeiro o caminho do restaurante, visto que o estômago de reclamava. Almoçaram e então foram para a oficina de .
- , está aí? - Milene perguntou quando entrou no galpão, estava estacionando o carro do outro lado da rua ainda.
- Qual a boa da vez? - O homem corpulento saiu de debaixo de um carro antigo que estava no meio do espaço.
- Uma turista está precisando de uma oficina.
- E cadê ela? - Perguntou vendo que a garota estava sozinha.
- Uau, é uma oficina e tanto que temos aqui. - disse entrando e notando os carros antigos que estavam estacionados ali.
- Essa é a , , esse é o .
- E aí, cara! Tudo bem?
- E aí, qual é sua questão?
- Ela só queria um espaço para mexer no carro. - Milene respondeu.
- Entende de carros? - Ele perguntou surpreso.
- A cara engana, grandão, mas sou apaixonada. - Disse simples. - Tem como você me ceder um espaço na sua caverna? Juro não incomodar, pelo menos não muito.
- Claro, vou abrir um espaço para você. Já vai trazer o carro hoje?
- Se der, vai ser ótimo! Ainda tenho alguns quilômetros pela frente.
- Eu vou deixar vocês e voltar pro trabalho. - Milene disse e não tardou a se despedir.
ainda perguntou mais algumas coisas para o homem de roupas surradas, enquanto conversavam, percebeu que ele precisava se esforçar para ter a cara de mau. manobrou um fusca que estava por último na lista de prioridades mais para os fundos do galpão e explicou que ela poderia ficar a vontade.
- Vou buscar o carro. - avisou, parando de olhar para o motor do Opala que o homem mexia antes das duas mulheres chegarem. - Você viu que a ordem da ignição tá errada? Acho que alguém tentou sabotar esse motor.
Saiu andando e o homem foi conferir, ficando completamente embasbacado com o conhecimento da mulher. Ela tinha uma postura tão confiante e tranquila, a curiosidade sobre como sabia tanto de carros era inevitável, mas quando o Golf GTI passou pelo portão, ele se tocou.
Ninguém tinha um dos carros mais rápidos produzidos no país para passear na cidade. Ela era uma corredora.
- Você corre?
- Como adivinhou? - Bateu a porta do carro e puxou o capô.
- Amante de carros, nariz em pé, carro rápido… Não é tão difícil.
- Hey! - Se fingiu de ofendida. - A soberba não é porquê eu corro.
- É porque se acha boa no que faz. - Constatou deixando-a sem palavras. - Seu tipo é bem comum.
- Está muito inserido no contexto, devo deduzir que você sabe do que está falando pois já esteve no meio. Mas largou por algum motivo.
- A cidade baniu os rachas.
- Que vida triste. - Ela comentou e então levantou um olhar travesso pra ele. - Sente falta de correr?
- Claro! Adrenalina é igual outras drogas, viciante.
O papo rendeu e acabou que ela passou mais tempo enchendo o homem de perguntas que realmente mexendo no carro. Ele era intrigante com suas respostas diretas e sem nenhum prolongamento do assunto. E ela decidiu que queria saber mais.
- Estou indo nessa. Você acha que consigo pneus aqui com entrega rápida? - Ela perguntou quando decidiu que era hora de ir embora.
- Posso tentar conseguir em uns cinco dias para você, eu não tenho nenhum desse tamanho no estoque.
- Poderia me fazer esse favor? Tô preocupada com essas chuvas esquisitas na estrada.
- Você corre clandestinamente e tem medo de chuva? - Perguntou irônico.
- Eu preciso voltar pra minha equipe, grandão. Vou terminar minha viagem e voltar pra casa.
- E qual seu destino?
- As praias do nordeste.
- Passei minha lua de mel no porto. Acho que você vai gostar.
- Você é casado? Caramba, uma caixinha de surpresas! Ou devo dizer caixona? - Ele gargalhou.
- Viúvo.
- Oh, sinto muito, grandão.
- Cara, você se lembra que meu nome é , né?
- Sim, grandão. Mas você nem tem cara de .
- E eu tenho cara de quê?
- Ainda estou decidindo. - Falou se afastando agora com o celular nas mãos. - Ah, vou confiar em você, não toque no meu motor. Mas se quiser relembrar seus velhos tempos.
Jogou a chave do carro pro homem que pegou num reflexo. Deu meia volta e saiu do galpão, iniciando seu caminho até a pousada.
- Princesa! - Ele chamou, devido ao chaveiro eu suas mãos, e se apressou porta a fora. - Quer uma carona?
- Acho que vou aproveitar que a noite está bonita e ir caminhando até a pousada, conhecer a cidade e etc.
- Cuidado para não se perder pelos bares.
- Eu não sei se perder é a palavra que eu usaria, grandão. Talvez achar seja mais apropriada. - Disse rindo e voltou a andar. - Até amanhã, . Te vejo às oito?
-
- Bom dia, grandão!
- Caiu da cama, princesa? - Ele perguntou vendo a mulher na porta do galpão antes mesmo que ele tivesse chegado para abri-lo.
- Ou nem deitei nela. Você nunca vai saber. - Deu de ombros.
- Vou ligar pro fornecedor hoje, alguma especificação, senhorita?
- Mesmo modelo, por favor.
Naquele dia, já estava mais confortável, vestia legging preta e uma camiseta da mesma cor, já que grande parte de seu guarda-roupa tinha tons escuros, nunca vestia algo muito diferente.
Testou o motor e procurou em todos os lugares possíveis daquele capô, cogitou até entrar debaixo do carro vendo o se descobria qual era o barulho esquisito que ouvia quando acelerava. E não deu outra. Uma embalagem esquisita e grudenta de plástico metalizado estava presa debaixo do carro e ela tirou aquilo e saiu de debaixo do carro segurando aquilo com as pontas dos dedos e uma careta de nojo.
- Onde fica a lixeira? - Perguntou e levantou a cabeça para olhar para ela. Não escondendo o riso ao ver a cara de nojo que ela fazia.
- Ali no canto. Onde achou isso?
- Debaixo do carro. Eu não quero saber da procedência disso não.
Passou por ele indo até a lixeira, e quando voltou parou olhando o motor também.
- Qual o problema dessa gracinha?
- Isso está bem gasto, tá vendo? - Apontou para uma das tubulações de combustível.
- Sabe o que isso parece?
- Sei, mas não sei se quero saber sobre.
- Pois eu quero. - Disse animada e abriu a porta do passageiro, olhando no piso e não encontrando nada, procurou debaixo do banco e lá estava ele.
O cilindro estava até camuflado pela cor vermelha, quem olhasse rápido veria apenas um extintor, mas era esperta demais.
- Você precisa descobrir onde estão rolando. - Ela disse, saindo do carro com o cilindro de Nitro em mãos.
- Não.
- Por favor, grandão! A gente pode até ser uma dupla!
- Não inventa, princesa.
- Vamos! O que te custa?
- Você não vai me deixar em paz, né?
- Não. E vou piorar.
- E tem como piorar?
- Claro! Ainda não estou te assediando.
- Eu é quem não iria reclamar, princesa. - Ele disse e ela gargalhou.
- Você tem sorte de ser muito gostoso pra essa frase não ter me feito perder todo o tesão.
- A culpa é do seu chaveiro.
- Nas corridas de lá, todo mundo me conhece por princesa. Esse não foi o problema.
- Não combina com você.
- Exatamente.
- Vou aderir mesmo assim. Até você largar o "grandão".
- Ah, mas eu não vou largar, não. - Molhou os lábios com a ponta da língua. - Vamos almoçar? E seu trabalho hoje é descobrir com o dono dessa banheira onde vamos correr hoje.
- Eu não corro mais, .
- Seja meu copiloto, então.
-
realmente não sabia onde estava com a cabeça quando topou sentar atrás do vontade do Golf naquela noite. Só de pensar em correr, sua mente girava, o estômago embrulhava e o coração disparava. Quando desceram do carro na saída da cidade que não tinha um posto policial, ele suava frio.
- Fica calmo, cara. Quem vai dirigir sou eu.
- Continua sendo preocupante. - Ele brincou e ela bateu com o ombro na lateral de seu corpo.
- Eu vou ganhar e você vai ver que não precisava disso.
- Ainda lembra da rota não é? - Perguntou em relação ao trajeto que o dono do Opala descreveu, eles haviam comprado um fast-food para o almoço apenas para que a mulher fizesse o reconhecimento da pista.
- Ora, ora! Não pensei que voltaria a te ver nessas coisas, . - Um cara franzino que devia ter quase a mesma idade que os cumprimentou.
- Estou acompanhando a Princesa aqui. - Ele mostrou a mulher. - Ela quem vai correr.
- Apostando na ajudante, cara?
- Ela é turista.
- Bom saber. É um prazer, senhorita. Sou Duncan.
- É um prazer, Duncan. - Ela correspondeu o cumprimento e se aproximou dele. - Você parece saber o que está rolando a mais tempo, onde me inscrevo?
-
A corrida seria uma volta completa ao redor da cidade, realmente nada muito complexo, mas com algumas curvas mais perigosas, devido a montanha nas quais a rodovia havia sido construída.
Todos os competidores já estavam a postos. A partida havia sido definida por sorteio e estava em 4°.
Enfiou o pé no acelerador apenas para aquecer o motor, vendo o ponteiro subir. O sorriso de antecipação surgiu em seu rosto.
Todos os presentes estavam atentos, a garota de jeans colado caminhou até o meio da pista. Gritando as última instruções, levantou a mão que segurava um tecido verde.
olhou para o carro ao lado, vendo o rapaz concentrado a sua frente. Ele parecia ser bem jovem.
Voltou a olhar para frente, segundos antes da garota abaixar a bandeira. A partida foi dada, e arrancou.
quase subiu numa moto e foi acompanhar tudo de perto, mas achou melhor esperar que eles aparecessem na linha de chegada.
conseguiu uma boa colocação logo no começo, apenas um carro estava na sua frente e lhe fechava todas as vezes que ela tentava passar adiante.
- Filho da puta! - Xingou quando a mesma coisa aconteceu pela terceira vez.
No retrovisor, viu que a distância entre ela e o terceiro colocado estava diminuindo, e imaginou que aquela seria sua chance.
Mais da metade do trajeto foi feito com os três primeiros carros perigosamente colados. Na penúltima curva, se deixou ser ultrapassada.
Sabia que agora o primeiro se preocuparia somente com ele e esperou a última reta do circuito chegar. Ele não conseguiria fechar os dois ao mesmo tempo.
Assim que a última curva terminou, ativou o botão do combustível modificado e então, passou a quarta marcha e enfiou o pé no acelerador sem dó.
Dito e feito, agora estava em primeiro. Com uma distância razoável entre o segundo e terceiro colocados.
Quando chegou no fim e a bandeira foi balançada, jogou o carro pro acostamento e saiu, agora com um sorriso vitorioso no rosto.
A multidão ovacionava-a, havia quebrado um recorde. Por segundos de diferença.
- Devo dizer que estou surpreso, princesa. - se aproximou ao ver que ela procurava por ele.
- Parabéns, garota, você quebrou o recorde! - Um estranho parabenizou e ela agradeceu sorrindo.
- Eu te falei pra você ser meu copiloto! Eu nunca tinha corrido sozinha! - O sorriso genuíno dela praticamente mostrava todos os dentes.
- Sempre tem uma primeira vez. - Ele falou e ela o abraçou, no calor do momento.
A graça das corridas era exatamente essa, cada vitória era uma coisa diferente, como se fosse a primeira vez.
- Eu devia saber que você não traria qualquer um, . Parabéns, Princesa. Estou honrado de ter perdido pra você. - Duncan disse escorado no carro e ela percebeu que ele era o cara que estava lhe fechando. Típico.
- Foi você quem trouxe ela, ? Vocês treinaram juntos? - Alguém que ouviu a conversa perguntou.
- Foi por isso que ela quebrou seu recorde? - Outro estranho perguntou e ela se virou pra ele com uma sobrancelha arqueada.
- O recorde era seu, grandão? VAMOS BEBER PRA COMEMORAR.
-
já havia recebido o comprovante da transferência de seu prêmio e agora estava sentada num bar junto com e outros corredores, Duncan incluso.
- Você voltou pras corridas em grande estilo, cara. Trouxe literalmente uma princesa! - Ian, o rapaz que estava ao lado de na largada disse para , quando já estavam todos meio alterados.
- Se ela não tiver dono, por favor, me avisem! - Duncan disse e ela largou uma gargalhada.
- Eu não tenho dono, idiota! Mas você é que não vai ser.
- Esqueci que você caiu direto nas garras do . - Ele falou risonho e levou seu olhar a que revirava os olhos.
-
- Hoje foi divertido. - Ele falou enquanto andavam pela cidade. Estavam mais próximos da casa dele do que da pousada dela, o dia já estava nascendo e eles nem estavam mais tão bêbados assim.
- Divertido? Foi incrível! Eu quebrei o seu recorde!
- Isso foi porque eu parei de correr.
- Tem a ver com a sua esposa?
- Não. Eu parei um pouco antes, quando começamos a pensar em ter filhos.
- Algo muito trágico aconteceu? - Ela perguntou e logo se corrigiu. - Não precisa responder se não quiser.
- Não, não foi nada demais. A morte dela foi natural, nem chegamos a estar grávidos ou algo do tipo.
- É engraçado ver um cara do seu tamanho dizer que ficaria grávido. - Ela disse num tom divertido.
- Cala a boca, princesa. - Ele revidou.
- Eu não. Não disse nada… - Foi interrompida por um beijo repentino ao qual nem teve reflexos para responder.
- Desculpa, eu não devia, né? - Perguntou quando se afastou pois não havia tido nenhuma resposta.
- Calma, eu fui pega de surpresa, tenta de novo. Dessa vez eu vou estar pronta. - Ela disse e ele riu fraco antes de beijá-la pela segunda vez.
- Agora fez mais sentido. - Ele disse, largando a cintura dela e ela se segurou no braço dele ao sentir que estava um pouco bamba das pernas.
- Agora eu preciso te levar pra casa. - Ela sussurrou.
- A minha ou a sua?
- Qualquer uma.
- Ótimo, porque a minha está bem ali. - Apontou e foram caminhando de mãos dadas até lá.
O clima leve e descontraído sumiu assim que a porta foi fechada atrás de . esperou somente que a porta fosse trancada para atracar os lábios do homem que reflexivamente agarrou-a pela cintura com uma mão, enquanto a outra a segurava pela nuca.
O beijo era rápido e sedento. E quando ela precisou separar as bocas para que pegasse fôlego, mordeu o lábio inferior do homem devagarinho, o que fez ele enroscar os dedos nos cabelos da nuca dela e puxá-los. Inclinando a cabeça dela para trás, que atendeu ao pedido silencioso de bom grado.
O primeiro suspiro realmente audível, escapou dos lábios da mulher e foi multiplicado pelo resto do amanhecer e uma parte da manhã.
-
Quando se deitaram lado a lado na cama, com as respirações ofegantes, se ajeitaram para dormir e o fizeram aconhegados um no outro.
Era a primeira vez que dormia com alguém que não conhecia a vida toda e a primeira vez que levava alguém para casa desde que perdera a mulher. E ainda assim, nada daquilo pareceu estranho.
-
Quando acordou estava sozinha na cama. O sol batia forte na janela fina e ela se perguntou como havia conseguido dormir tanto naquele estado. A voz irritante de sua consciência respondeu que era porque havia sido desmontada pelo mecânico ao qual pertenciam os lençóis que estava embolada.
Se levantou procurando suas roupas e as encontrou dobradas na poltrona. Reconheceu sua calça jeans e as meias, apenas. A camisa era muito maior que ela, pelo cheiro (que ela não pode evitar conferir) soube que pertencia ao homem. Um bilhetinho com uma caligrafia preguiçosa pedia desculpas, e ele estava por cima de um pacote com uma cueca boxer. Ela entendeu o recado.
Tinha também uma toalha dobrada, um recado silencioso de que ela poderia tomar banho caso quisesse, e ela achou muito querido da parte de .
Não negou a permissão e entrou no banheiro do quarto ainda nua com tudo em mãos. Deixou tudo na bancada da pia e entrou no box, ligando um jato de água gelado em si e agradecendo o toque refrescante da chuveirada forte.
, que estava na cozinha preparando um almoço, que era suficiente para os dois mesmo que ela não quisesse ficar, ouviu a porta do banheiro bater e soube que ela havia acordado.
-
- Bom dia, grandão. - Cumprimentou quando apareceu na sala já vestida e arrumada na medida do possível.
- Boa tarde, já. Descobri qual das princesas você é, a Bela Adormecida.
- Realmente, dormi mais que a cama. - Ela disse se aproximando dele ainda sem saber realmente como agir.
Ela ainda o considerava um desconhecido, então se sentia acanhada por ter acordado na cama dele. Nunca havia lidado com isso, normalmente tratava o cara como os amigos que provavelmente eram, comiam algo juntos, talvez transassem mais uma vez antes de ir embora e era isso. Afinal, qual era o protocolo para depois de dormir com um conhecido?
E essa repentina timidez não passou despercebida pelos olhos de , que lhe abriu um sorriso torto antes de perguntar se ela queria almoçar.
- Eu não vou recusar, estou faminta! - Disse e seguiu-o para a cozinha.
- Meu fornecedor me enviou um e-mail ontem à tarde, esqueci de te dizer. Seus pneus chegam só na segunda, tem problema?
- Problema algum. - Ela disse enquanto se sentava na bancada onde ele havia indicado. - Estou gostando da cidade, não vai ser problema algum continuar aqui mais uns dias.
- Eu ia perguntar se não vai comprometer seu orçamento da viagem, mas você ganhou uma corrida ontem. - Ele disse se servindo e gesticulou para que ela fizesse o mesmo.
- Realmente não é o caso, eu saí de Entre Rios preparada para quase tudo.
- Como assim?
- Se eu te contar a história toda, pode ser que você me expulse de sua casa.
- Só estou mais curioso, o que a Princesa fez? - Perguntou e o restante do almoço foi baseado em contando tudo o que tinha lhe levado para aquela cidadezinha.
Depois que ela chegou à conclusão de sua viagem, ele ainda tentava absolver a informação de que ela havia incendiado a própria casa antes de cair na estrada.
- E você vai voltar? Mas para onde?
- Eu tinha grana guardada do apartamento que eu tinha antes do meu pai adoecer. Então dei entrada numa casa mais perto da oficina do Gil, aquele amigo que eu falei, e a gente vai começar um negócio de restauração de carros antigos.
- Caramba! - E sua afirmação era genuína, mas uma pequena parte de si murchou.
Quando acordou, horas atrás, com a mulher enlaçada a si, deixou a cabeça viajar e criar alguns cenários do que aconteceria depois da noite que tiveram juntos. Seu favorito era o que ela decidia ficar na cidade e eles repetiam a foda incrível que tiveram várias e várias vezes.
E ouvi-la contando a história, jogou tudo o que havia pensado lixo. Ela não ficaria e ele tão pouco deixaria que ela ficasse mais que o necessário. Era um sonho incrível e ela tinha o direito de realizá-lo.
-
Como as três diárias de terminariam, inocentemente ou nem tanto assim, ofereceu para a mulher ficar no quarto de hóspedes até que trocasse os pneus de seu carro e inocentemente aceitou o convite.
Mas, em nenhuma das noites seguintes, o convite chegou a dormir no quarto, todas as noites acabavam ofegantes na cama de , e aquilo era incrível.
Mas a segunda-feira chegou.
E nem mesmo era meio-dia quando os quatro pneus do Golf GTI terminaram de ser substituídos. Mas ficou na oficina para ajudar , mesmo que ambos sabiam que não tinha nenhuma necessidade.
E fecharam o galpão juntos e foram para casa juntos, com atrás do volante do Golf e ela fez o jantar, como uma despedida e um agradecimento. E eles transaram de novo.
Mas na manhã seguinte, acordou cedo, antes mesmo de o sol começar a clarear o céu.
Juntou suas roupas e saiu do quarto silenciosamente, mesmo que já conhecesse o suficiente para saber que ele só acordaria se ela o sacodisse ou jogasse no chão.
Não queria arriscar ter de se despedir.
Era um fato imutável que se sentia apaixonada pelo grandão de cara fechada, mas havia se comprometido com si mesma.
Havia deixado de dar notícias para casa a alguns dias, para não ter que se explicar e provavelmente já estavam preocupados com as mensagens secas e simples que a mulher enviava.
Era hora de partir, ou não conseguiria ir nunca mais.
No meio de suas coisas, encontrou o caderninho e a caneta que havia deixado no fácil quando arrumou suas coisas no domingo à tarde.
,
Eu não sei exatamente como escrever isso e talvez você ache que eu devesse lhe dizer tudo o que tenho para dizer nas próximas linhas pessoalmente.
Mas entenda, meu coração é fraco demais para permitir que eu te diga tchau olhando nos olhos. E você sabe disso também.
Esse tempo que tivemos juntos, foi definitivamente o tempo da minha vida, mas essa mesma vida, é solo.
E eu estou tirando coragem sabe-se de onde para partir agora.
Essa não é uma carta de adeus, grandão. Meu peito se tornou muito seu nesses poucos dias nossos para que eu te garanta que sumirei da sua vida para sempre.
Mas também não te peço que me espere.
Você vai saber me encontrar, da mesma forma que eu sei te encontrar, restará a nós saber quem será o primeiro corajoso.
Com carinho,
Largou o papel preso na geladeira por um ímã de farmácia, e saiu batendo a porta devagar. Passou a chave na tranca e jogou a mesma por debaixo dela.
Guardou as malas restantes no carro e então entrou pela porta do motorista. E deu partida no carro sem olhar para trás.
Fim
Nota da autora: Gente, eu peguei esse ficstape e pensei num enredo, depois eu fui escrever e pensei em outro, aí assisti Velozes e Furiosos dez dias antes do prazo final pra entrega e comecei tudo do zero.
Me lembrem de nunca mais nessa vida inventar de mudar roteiro em cima da hora.
Mas acabou que eu gostei. Infelizmente ou felizmente minha marca registrada são mulheres impulsivas e que não tem medo do surto.
BRB
Outras Fanfics:
Hunting the Hunter | Olhar 43 | 01. For a pessimist, I'm pretty optimistic
Qualquer erro nessa fanfic ou reclamações, somente no e-mail.
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