Capítulo 16
Niall e eu sabíamos que eu tinha perdido meu anonimato quando fui identificada na reportagem que Jesse Curtis tinha vazado. Se não fosse por ele eu ainda seria anônima, e esse era só mais um item da lista que me fazia odiar Jesse com tanta intensidade. Por esse motivo, a coluna que ele tinha pedido para quinta-feira já estava pronta na segunda de manhã. Meu orgulho não deixaria que fosse diferente, de qualquer forma.
Rachel ainda não tinha chegado quando parei na minha baia. Pendurei minha bolsa preta no gancho debaixo da mesa, estiquei meu casaco na cadeira e, assim que meu computador ligou, acessei meus dados e enviei o arquivo da coluna direto para a impressora. Coloquei as duas folhas em uma pasta L e levei diretamente até Uriah, que estava ansioso para começar o trabalho.
— Bom dia, Uriah. – Desejei para o garoto a minha frente.
Ele me lançou um sorriso sedutor, o que me fez sorrir também.
— Oi, . – Ele apontou para a pasta. – Suponho que isso seja para mim.
— Bem-vindo a equipe! – Comemorei, de uma maneira irônica. – Preciso que anexe nessa pasta umas fotos que vou te mandar por e-mail. A impressora daqui não imprime colorido, por isso vai precisar ir ao setor C.
— Sem problemas.
— Quando anexar as imagens, deixe a pasta com a secretária de Jesse. Já identifiquei a pasta, ele vai saber o que é.
— Perfeito, deixa comigo.
Ele me deu uma piscadinha, e eu voltei para minha mesa, já mandando o e-mail para que Uriah pudesse imprimir minhas fotos. Já passava de vinte minutos do horário de entrada e Rachel ainda não tinha aparecido, o que estava me deixando nervosa. Tudo bem que ela não estava grávida há muito tempo, mas cuidado nunca é demais. Meia hora mais tarde, Rachel finalmente sentou-se em sua baia, o rosto verde e uma testa levemente luminosa, denunciando o suor. Fui até ela, sutilmente, esperando que ninguém tivesse notado seu atraso de praticamente uma hora.
— Você está bem? – Questionei, preocupada.
Ela desconsiderou minha preocupação com um gesto de mãos.
— Acho que os enjoos matinais começaram. – Explicou, olhando apreensiva para onde Chase estava. – Acha que eu já devo contar a ele?
Pensei por um momento.
— Acho que sim. Só para ele, pelo menos. Assim, se acontecer de novo, Chase já vai estar por dentro do assunto.
— Bem pensado. – Ela passou a mão na testa, fazendo uma careta de nojo. – Argh, odeio estar grávida. Preciso ir ao banheiro.
— Quer que eu vá com você?
— Não precisa. – Rachel se levantou sem dificuldade e se colocou a caminho do banheiro, enquanto eu voltava para minha mesa.
Mal havia sentado quando Uriah veio até mim.
— Deu tudo certo? – Perguntei quando ele chegou.
— Sim, já deixei com a secretária. Mas temos um problema maior.
Girei minha cadeira para ficar de frente para ele.
— Aí não. O que houve?
— Não estão conseguindo encaixar a entrevista dos Jonas para a data que a gente precisa. Falam que eles só têm agenda para abril.
— Abril? Precisamos dessa entrevista para pelo menos mês que vem!
— Eu disse que era um problema maior. – Resmungou Uriah, bufando.
Senti pena dele, porque até ano passado era eu quem cuidava dessas questões administrativas e burocráticas. Suspirei, tentando não demonstrar meu descontentamento. Tinham outros grupos para entrevistar para o especial de dez anos da PlayList, mas nenhum deles tinha planos de voltar depois de seis anos, como era o caso dos Jonas Brothers. A PlayList tinha que conseguir divulgar isso. Acreditava que parte do fechamento de agenda para entrevista era justamente para não vazar nenhuma notícia do retorno antes da hora, e eles iriam retornar, possivelmente ainda esse ano. Os boatos do retorno tinham muitos fundamentos e minha intuição nunca falhava.
— Eu precisava muito dos Jonas, mas se não conseguir de jeito nenhum, tenta os planos B. Vou te mandar um e-mail com a lista atualizada, está por ordem de preferência.
Uriah fez uma continência para mim.
— Sim, chefe.
Dei risada.
— Eu não sou sua chefe, Uriah. Sou só a .
Ele sorriu para mim.
— Pode deixar, chefe . – De brincadeira rolei os olhos, desistindo, e o dispensei para que pudesse finalizar seu trabalho.
Depois de um tempo digitando, decidi ir até a copa me servir um copo de café. Saí pela porta que levava ao mesmo corredor onde Jesse tinha me interceptado da outra vez e segui em direção a nossa pequena copa. Pelo horário achei que estava sozinha, mas encontrei Chase com sua xícara na mão misturando açúcar quando cheguei lá.
— Bom dia!
Ele se virou para mim, desengonçado, o que fez algumas gotas de café caírem no chão.
— Está para nascer alguém mais desastrado que eu. – Respondeu, sem graça, me encarando com um sorrisinho.
Dei risada, pegando umas folhas de papel para secar as poucas gotas que tinham se espalhado.
— Obrigada, .
— Tudo bem, foi minha culpa. Não queria ter te assustado.
Ele balançou a cabeça.
— Achei que só eu apreciava um bom café tão perto do meio-dia.
— Eu não aprecio. – Retruquei. – Mas esse ano está cheio de surpresas.
Fui até a máquina de café, colocando uma xícara limpa no compartimento vazio, apertei o botão para que a bebida saísse e assim que a máquina apitou, retirei a xícara. Cheguei até onde Chase estava a fim de colocar açúcar em meu próprio café e me apoiei na bancada ao lado dele, para fazer companhia. Ele não conhecia ninguém ali, e era bom ter um rosto amigo, mesmo se essa pessoa fosse sua subordinada.
— Desculpa a pergunta, mas te acho muito familiar. – Soltei, quando o silêncio se tornou estranho.
Além de que eu queria saber de onde conhecia esse homem, especialmente o sorriso dele.
Ele deu um gole em seu café antes de responder.
— Talvez seja meu irmão mais novo. – Disse, acanhado. Ergui uma de minhas sobrancelhas ainda confusa. – Oliver Collins? Surfista?
Procurei em minha mente de onde eu poderia conhecer um surfista já que eu não acompanhava esse tipo de esporte, porém não encontrei nada. Mas encontrei uma coisa: uma lembrança muito específica da época da faculdade onde alguém mencionava Oliver Collins e eu deixava a pessoa sem graça por não saber quem ele era.
Sorri envergonhada para Chase, finalmente me lembrando de onde o conhecia.
— Não é Oliver, é você.
— Eu?
Suspirei, sem conseguir segurar o riso.
— Chi Psi? – Questionei, me referindo a fraternidade a qual ele pertencia.
— Você está brincando!
Dei risada, quase deixando minha própria xícara de café tombar.
— Juro! Me lembro de você da Berkeley.
— Aquela festa!
— Sim! Eu era caloura, você era veterano.
— Caramba, que mundo pequeno!
Ele sorriu e fiquei constrangida, principalmente porque me lembrava claramente do beijo bêbado que ele tinha dado em mim. Estava torcendo em silêncio para que essa lembrança também não estivesse passando pela cabeça dele, mas pelo modo como o sorriso vacilou em seu rosto, ele provavelmente também tinha se lembrado.
— Não acredito que não me lembrei de você.
— Já faz muitos anos. – Desconversei. – E eu era uma pirralha.
— Sua blusa xadrez vermelha e seu inseparável all star branco – Falou baixinho.
— Aí meu Deus, você lembra disso? – Tanta coisa para lembrar e tinha que ser meu estilo absolutamente infantil que usava nos dois primeiros anos da faculdade? – A gente só se viu uma vez!
Ele riu, colocando a xícara vazia na mesinha atrás dele.
— Não exatamente. Bom, você só me viu uma vez. Na festa quando...
— Certo, claro! – Cortei, antes que ele mencionasse aquele beijo.
Parte de mim achava que ele só tinha falado disso para ter certeza de que eu me lembrava também, e pela sua expressão eu não o tinha decepcionado. Eu normalmente não teria problema em fazer piada com o acontecimento para espantar o constrangimento, mas seria bem estranho tocar nesse assunto agora, na copa da PlayList, sendo ele meu chefe e tudo mais.
— Eu meio que... te stalkeava.
— Chase! – Repreendi, de brincadeira.
— Fazíamos as mesmas aulas! – Defendeu-se.
Revirei os olhos.
— Devia ter me falado antes, assim eu poderia dizer que aconteceu alguma coisa legal na faculdade.
— Ter me conhecido? – Falou, galante.
— Não, ter um perseguidor maluco.
Ele riu, os dentes brancos faiscando.
— Vou fingir que isso não me magoou.
Bem quando ia pensar em uma resposta a altura, a porta da copa se abriu, revelando não apenas Jesse furioso, mas Jesse furioso com a minha pasta na mão.
— Posso saber o que é isso? – Questionou, sacudindo a pasta na minha cara.
Chase fechou a cara, pronto para entrar em minha defesa, mas eu acabei falando antes dele.
— É o que você me pediu na sexta. Uma coluna nova.
Jesse, vermelho de raiva, virou-se para Chase.
— E você, novato, leu a coluna absurda de antes de enviar ela para mim?
E agora que as coisas ficavam complicadas. Já estava tão acostumada em mandar as colunas direto para Jesse que me esqueci completamente que deveriam passar por Chase primeiro. Encolhi os ombros, pronta para ser engolida ao vivo por Jesse em plena segunda-feira.
— Li sim. – Disse Chase, para minha surpresa. – Inclusive achei incrível.
Jesse abriu um sorriso maligno, folheando a pasta.
— Então você acha incrível que... – Começou, procurando algo na página. – Ah, que “as meninas de hoje em dia que consomem conteúdos voltados para sua faixa etária, em sua maioria pré-adolescentes, não querem mais testes bobos que lhes digam quem será seu marido respondendo uma série de perguntas aleatórias. Querem uma verdade, querem ser levadas a sério.”, etecetera, etecetera, blá, blá, blá.
Admirei a cara de paisagem de Chase, fingindo que sabia daquilo o tempo todo, e tentei controlar a minha própria para esconder o fato de ter me esquecido de pedir aprovação para essa coluna.
Jesse nos olhou com ódio, a mim mais do que a Chase, aguardando uma opinião.
— Eu achei brilhante. E concordo com esse ponto de vista.
— Obrigada, Chase. – Agradeci baixinho, mesmo sabendo que ele não tinha lido o texto todo.
Jesse grunhiu.
— Não importa o que você acha, novato. Isso precisa vender. Nenhuma menina de doze anos vai pedir uma assinatura para a mãe para ficar lendo essas ladainhas feministas.
— Chase.
— Desculpa?
— Meu nome é Chase Collins. – Disse meu chefe, com firmeza. Pude notar que Jesse vacilou um pouco. – E eu acredito que é disso que as meninas precisam. Elas precisam de .
Jesse fechou a cara mais ainda e deixou a pasta na minha mão, com uma força um pouco maior do que a necessária.
— Refaça. – Disse simplesmente, saindo da copa sem aguardar meu protesto.
Assim que ele saiu, virei-me para Chase, olhando com súplica.
— Chase, eu... eu realmente lamento por ter te colocado nessa posição. Não lembrei que agora você também precisa aprovar as colunas.
Chase me olhou por alguns segundos e em seguida encarou a porta.
— Não gosto desse cara, sabe. – Apontou para minha pasta. – Posso ficar com isso?
Estendi a pasta para ele.
— Claro, fique à vontade.
— Preciso voltar agora, mas obrigado pela companhia no café. – Agradeceu, sorrindo.
— Por nada!
Ele se foi e fiquei encarando a copa, agora vazia. Eu estava no meio de uma guerra, sabia disso. Minha popularidade significava dinheiro, eu não era burra. Provavelmente poderia sair da PlayList e viver de internet que com certeza ganharia bem mais do que recebo na revista. Mas não seria eu. Não seria a carreira que eu sempre quis para mim.
Com um pesado suspiro, eu soube. Para conseguir o que queria, eu precisava enfrentar Jesse querendo me sabotar sempre. Eu precisava vencer a guerra.
— Olá, popstar. – Cumprimentei, acenando com a mão livre.
Que ódio desse homem estar tão lindo sempre que a gente estava longe um do outro! Ele estava com o cabelo grande e tinha colocado um brinco que ao invés de o deixar feminino só o deixava mais sexy. Quis passar a mão pelo seu cabelo e nesse momento senti uma saudade tão absurda que meus olhos quase marejaram.
— Antes de tudo, o texto está ótimo! – Exclamou, se referindo ao texto da coluna de mais cedo. – Estou indignado.
Suspirei.
— É, todos estão. Jesse é um grande filho de uma... argh! – Grunhi, socando o travesseiro ao meu lado.
— Puta, . – Niall disse, sorrindo malicioso. – Ele é um grande filho da puta, você pode dizer essa palavra.
Sorri, mas por dentro ainda sentia ódio.
— Arrogante, idiota, babaca, estúpido!
Niall gargalhou.
— Adoro seu jeito de xingar, você xinga com carinho. Parece que está xingando um... marido.
— Não é assim que eu xingaria um marido. – Retruquei.
— Como, então?
Fiquei em silêncio por uns segundos.
— Bom, não teria por que xingar, já que me casei com ele. Mas se fosse para dizer alguma coisa seria algo tipo, bobo, teimoso, bundão, coisa assim.
A gargalhada de Niall preencheu meu quarto e foi impossível não rir junto.
— Bundão. Bun-dão. Ah, não, eu preciso twittar isso.
Sorri.
— Me dê os créditos, por favor.
— Pode deixar. – Prometeu, piscando para mim. – Eu não posso falar muito, mas queria te mostrar uma coisa. Vou te mandar um link, mas promete que você só vai ler depois que a gente desligar.
— Mas eu sou muito ansiosa.
Ele arregalou os olhos.
— Promete, !
— Prometo, prometo. – Falei, erguendo minha mão que não segurava o celular. Uma notificação apareceu em minha tela no formato de um link. Tenho que dizer que me segurei muito mesmo para não abrir. – Recebido.
Ele suspirou.
— Ahn, Niall... queria saber...
— Sim?
Coloquei meu cabelo atrás da orelha, ensaiando o que iria dizer.
— Lembra daquela matéria dos dez anos de PlayList?
— Inesquecível, você só fala disso.
Revirei os olhos, mostrando o dedo médio.
— Enfim, não estamos conseguindo uma entrevista com os Jonas. Será que você conseguiria ajudar?
— Os Jonas? Tipo, Jonas Brothers?
— Sim.
Ele suspirou, pensando.
— O que eu ganho com isso?
— Hm, nada?
Ele fez um beicinho atrapalhado.
— Um beijinho?
— Muito caro.
— Um abraço?
— Hmm, dois segundos de abraço.
— Dez segundos.
— Cinco segundos e ponto final.
Niall riu, jogando a cabeça para trás.
— Fechado. – Ele ficou sério de novo. – Vou ver o que consigo.
— Meu herói!
Continuamos conversando por mais alguns minutos, e quando vi Niall olhando alguma coisa em seu notebook, soube que seria hora de desligar. Eu passava o dia bem, mas depois que falava com ele a saudade só parecia aumentar. E eu o tinha visto no sábado!
— Pode olhar o link agora. Boa noite, .
Sorri docilmente.
— Boa noite, popstar.
Curiosa, segui para o link assim que desligamos. Fiquei chocada quando terminei de ler. Todas as nossas conversas sobre ela passaram pela minha cabeça e não estava acreditando que aquele pesadelo finalmente terminaria. Que eu tinha minha resposta e que Niall teve coragem para fazer o que fez, da melhor maneira possível. Meus olhos marejaram de verdade dessa vez e não pude esconder minhas emoções de mim mesma quando li até o final.
Eita, gente. 2019 mal começou, e o saldo de relacionamentos que foram por água abaixo já está grande, viu? Nesta semana, quem resolveu colocar um ponto nas coisas foi o ex-1D, Niall Horan, e a atriz Hailee Steinfeld.
De acordo com fontes consultadas pelo assessor de Niall, o casal teria decidido se separar há “alguns meses”, sem dar maiores explicações.
“Hailee e Niall estavam fortes no meio do ano, mas terminaram há alguns meses e têm tentado ser discretos. Ela percebeu que tinha muitos projetos e sua agenda de trabalho estava insana. Ela estava começando a viajar para seu novo filme e percebeu que eles ficariam longe por um longo tempo. Eles realmente tentaram fazer dar certo. Definitivamente foi um ‘amor jovem'”. Juntos desde fevereiro de 2018, quando foram vistos em um show dos Backstreet Boys, Niall e Hailee terão realmente um período agitado em suas respectivas carreiras daqui em diante. O cantor deve começar a produzir seu novo álbum ainda em 2019. Hailee, por sua vez, segue em fase de promoção de Bumbleebee (mostramos o trailer dele aqui).
A gente espera que tudo esteja bem e que as coisas tenham terminado amigavelmente, né? Felicidades aos dois!¹
¹ Reportagem adaptada para fazer sentido à história, mas foi retirada do site:https://www.papelpop.com/2018/12/niall-horan-e-hailee-steinfeld-terminaram-o-namoro/
Capítulo 17
Niall riu baixinho do outro lado da linha.
— É, tipo ficar na minha casa. Eu sempre fico na sua mesmo, e você vai amar Los Angeles.
— É melhor que São Francisco?
— Ah, nada é melhor que São Francisco.
Sorri, olhando as horas no meu relógio.
— Niall, preciso voltar ao trabalho. Mas aceito seu convite. – Falei. – Só precisa prometer me levar na balada mais exclusiva da cidade.
— Óbvio que você vai conhecer o melhor da vida noturna. Ao contrário de certas pessoas, eu sou um ótimo guia turístico.
Revirei os olhos.
— Supera isso, Niall! Quando você vai parar de jogar Alcatraz na minha cara?
— Hmm... Provavelmente nunca.
Suspirei, derrotada, ainda que sem conseguir disfarçar o sorriso bobo.
— Agora é sério, preciso entrar, a gente se fala mais tarde. Tchauzinho, popstar.
— Bom trabalho, .
Triste, desliguei o telefone onde havia passado os últimos trinta e três minutos, exatamente, conversando com Niall Horan. Estava sentada em um banquinho na área externa, pela primeira vez em muito tempo não saindo para almoçar fora, e, mesmo que tenha ficado sozinha, foi bom mudar minha rotina.
Fevereiro chegou sem nenhuma boa notícia e, obviamente, e eu não tinha conseguido escrever a coluna de Jesse a tempo, mas tentei não ficar muito neurótica com essa parte. A coluna do mês estava quase pronta, e eu estava tranquila que pelo menos minha parte estava sendo feita. Afinal de contas, eu tinha plena consciência que ele precisava mais de mim do que eu dele, então tudo que poderia acontecer era só o mesmo de sempre.
Chase já estava sabendo da gravidez de Rachel, que ainda não tinha me informado o que faria a respeito dessa gestação. Eu sabia que ela tinha se resolvido com a mãe dela, mas não tinha certeza sobre como iria proceder. Quando me encontrei com Rachel e Uriah conversando próximos a minha baia já soube que aquele não era o melhor momento para perguntar.
— Ah, , escuta essa! – Exclamou Rachel animada, chacoalhando suas pulseiras coloridas. – Conta para ela, Uriah.
Uriah sorriu para mim.
— Consegui duas entrevistas para o mês que vem. Selena Gomes e Miley Cyrus.
— Oh... – Não eram os Jonas, mas pelo menos eu teria alguma coisa – Isso é ótimo, Uriah! Excelente trabalho.
Ele sorriu, tímido, apontando para minha amiga.
— Rachel me ajudou. Ela é boa em convencer pessoas.
— É, eu que o diga.
— Bom, preciso voltar. – Anunciou o rapaz. – Bom final de expediente para as duas.
Sorrimos uma para a outra e eu seria bem inocente se deixasse de notar o crush tremendo de Uriah por Rachel. Não seria por menos, Rachel normalmente já era linda. A gravidez tinha trazido um brilho mais natural a sua beleza, o que a deixava ainda mais estonteante. Era de se esperar que algo assim fosse acontecer.
— Ele gosta de você. – Falei enquanto me sentava.
Rachel sorriu, amorosa, olhando para as costas de Uriah, que se afastava.
— Ele é ótimo, mas deve ter uns vinte anos e eu estou grávida, lembra?
— Rach, idade é só um número.
— Mesmo assim me sinto uma pedófila dando moral para um cara seis anos mais novo que eu.
Dei de ombros, o cupido era ela, afinal de contas. E eu não podia forçar um romance com tanta naturalidade quanto Rachel Palm.
Jesse passou por mim mais de uma vez, mas não me cobrou a coluna, o que achei estranho. Ele normalmente não perdia a oportunidade de me humilhar em público, então o que parecia ser um alívio para algumas pessoas, na verdade me deixou aterrorizada. Não tinha me esquecido de sua ameaça e, por mais que jamais pudesse prová-la, o simples fato de tê-la feito já era o suficiente para que eu fizesse tudo que ele mandasse. Na cabeça dele, é claro, porque a realidade é que eu não descansaria até ver Jesse Curtis atrás das grades. De preferência na cadeia menos charmosa que existisse na Califórnia.
Estava quase finalizando meu trabalho do dia quando Chase me chamou. Fui até onde ele estava, mas, para minha surpresa, ao invés de simplesmente me dizer o que precisava, Chase me guiou para o que parecia uma das salas de reuniões.
— Entre, por favor, . – Pediu, dando um passo para que eu pudesse passar por ele. – Vai ser rápido.
Notei, tarde demais, que a minha pasta com a falha coluna do mês passado estava em suas mãos. Não consegui identificar sua expressão quando se sentou diante de mim, e não pude deixar de me sentir apreensiva.
— Está tudo bem?
Chase sorriu, cruzando suas mãos por cima da mesa.
— Sim, está tudo ótimo. – Ele segurou minha pasta, virando-a de frente para mim. – Fiz alguns apontamentos, que valem a pena serem alterados, ou acrescentados. Coisas mínimas, na verdade.
Abri o documento e, de fato, havia algumas anotações marcadas com uma caneta vermelha. Lembretes como “colocar a data da pesquisa aqui” ou “tente encontrar alguma testemunha com a faixa etária indicada para provar esse ponto”.
Ainda assim continuei confusa, de que adiantaria ele se dar o trabalho de corrigir meu trabalho todo se não fosse para publicá-lo? Sentei-me um pouco mais ereta na cadeira, com receio do que estava por vir.
— Suponho que tenha gostado do que leu, mas não entendi. – Falei, pouco à vontade.
— Tem razão, está muito bom. De verdade. Mas, e saiba que odeio concordar com ele, Jesse tem razão. Esse texto não é, e talvez nunca seja, o perfil da PlayList.
Minhas costas eretas murcharam completamente, mas tentei controlar minhas feições. Eu estava ali, acima de tudo, para aprender com meus erros. Achando que tudo estava perdido, aproximei a pasta para mais perto de mim.
— Bom, de qualquer forma eu agradeço por ter tirado um tempo para corrigir meu texto, mesmo que não seja publicado.
Os dentes de Chase faiscaram quando ele deu um sorriso quase infantil.
— Eu disse que não fazia o perfil da PlayList.
Cruzei os braços para ele, uma risadinha incontrolável escapando pela minha boca.
— Desculpa por falar com você assim e, por favor, não me demita, mas posso saber o que está rolando?
Meu chefe finalmente se rendeu a uma risada, me olhando com... orgulho?
— Enviei o texto para uma conhecida minha, de Nova York, que trabalha na revista Seventeen e ela também adorou. Mostrou para a editora dela, que por fim te ofereceu cinco mil dólares para publicar na revista.
Meu queixo caiu.
Cinco mil dólares por um texto? Em uma revista adolescente de verdade?
— E eu só tenho que corrigir esses apontamentos e enviar o texto?
— Então você topa? – Perguntou, com entusiasmo.
— É óbvio que eu topo!
— Bom, só tem mais uma coisinha... – Começou, coçando os cabelos loiros.
— Aí, não... O que é?
— Ela quer te conhecer. Pediu para ir até a sede em Nova York no final desse mês. – Concluiu. – E é claro que Olivia já está ciente e todas as despesas, com exceção da alimentação, serão pagas pela PlayList. Podemos conversar com o gerente da unidade de Nova York e você pode fazer seu trabalho de lá pelo tempo que durar sua estadia.
Um texto vendido por cinco mil dólares e uma viagem de graça para Nova York. Eu estava mesmo no céu e nem mesmo Jesse poderia me fazer descer agora.
Até que me lembrei para onde deveria, de fato, ir ao final do mês. Ah, não. Esqueci completamente de Niall e Los Angeles, mas eu seria muito burra se negasse essa oportunidade. Ponderando seriamente, esse seria meu primeiro trabalho externo desde Mountain View, e estávamos falando de um texto no qual eu mesma nem coloquei tanta fé assim. Realmente não tinha outro jeito de fazer isso. Niall teria outra folga e eu teria outro final de semana para conhecer Los Angeles, porém eu talvez nunca mais fosse ter uma oportunidade como essa que se apresentava diante de mim. E, de repente, a escolha pareceu certa e óbvia, como se eu já soubesse o que faria o tempo todo. Se Niall gostava de mim, então ele iria entender isso.
— Ficarei o tempo que for necessário.
— Maravilha. Estão estipulando um prazo de duas semanas. Está bom para você?
Não estava tudo bem ficar duas semanas fora da minha casa e longe da minha rotina, mas eu iria até o fim. Nunca tinha ido para Nova York e, no fundo, algo me dizia que eu iria gostar muito da experiência.
— Claro, está ótimo. – Vendo que o expediente já tinha se encerrado, apontei para a pasta. – Acho melhor eu ir para casa resolver isso o quanto antes.
— Sem problemas.
Sentindo-me oficialmente dispensada, levantei-me da cadeira, me espreguiçando sutilmente. Tinha sido um longo dia e eu estava cansada. E aquela sexta-feira em especial prometia muito café e notebook no sofá da sala. E pretendia fazer uma pipoca ou comprar um McDonald’s, de repente, eu sempre ficava mais animada trabalhando com comida do lado. Ou quem sabe pedisse uns bolinhos de Khalan; já se fazia dias que não comia no Sweet Lime.
— Hm, ? – Chamou Chase antes que eu pudesse sair da sala.
— Sim?
— Eu estava indo para casa e pensei... bom, você quer ajuda? Podemos ir para uma cafeteria agora e eu posso te ajudar com isso. – Ofereceu, apontando para a pasta.
Eu não me sentia necessitada de ajuda, mas passar o tempo em sua companhia parecia ser melhor que o plano original. Além disso, fora Chase quem fizera os apontamentos, então em sua presença possivelmente seria muito mais fácil corrigi-los.
Ofereci um sorriso amigável para ele.
— Claro, vou só pegar minha bolsa.
— Te encontro no hall.
Fui em direção a minha mesa, com Rachel também pegando suas coisas e me olhando estranho. Aproveitando que estava em cima da mesa, peguei meu celular e mandei uma mensagem para Niall, tentando registrar minha tristeza em cada linha.
Hey, popstar. Desculpe, emergência no trabalho ☹ Não vou conseguir ir para Los Angeles, estarei em Nova York.
Mas depois conversamos sobre isso! Bjos – 18:02
— O que foi isso? – Perguntou Rachel, desconfiada, apontando para a sala de onde eu e Chase tínhamos saído.
Sorri para ela.
— Só a melhor coisa de todas!
— Deu para o seu chefe no trabalho?
Mostrei o dedo, de um jeito que minha mãe acharia bem deselegante.
— Alguém comprou meu texto! – Contei, entusiasmada. E claramente de qualquer jeito, porque estava tão ansiosa que não achava possível formar frases inteiras.
— Aquele texto que Jesse odiou? – Questionou, pendurando a bolsa preta no ombro e cruzando os braços.
— O próprio. – Concordei, colocando meu casaco.
Ela sorriu para mim.
— Sempre soube que você faria sucesso.
— Está pronta, ? – Perguntou Chase atrás de mim, na pior hora possível.
— Sim, vamos. – Falei para ele, encarando Rachel com o meu melhor olhar de “não pergunte nada agora”. – Até segunda, Rach.
— E o que foi isso? – Sussurrou quando Chase foi esperar o elevador no hall.
Revirei os olhos.
— Estamos indo trabalhar, Chase vai me ajudar. – Expliquei. – Só isso! – Acrescentei quando percebi que suas sobrancelhas continuavam arqueadas.
— Bom trabalho, então, workaholic. – Desejou minha amiga sugestivamente.
Dei uma leve bufada, pegando minha própria bolsa em cima da cadeira e acompanhando Chase em direção ao elevador.
Uma vez no térreo, Chase abandonou seus modos formais. Percebi como seus ombros já estavam mais relaxados e seus passos mais tranquilos. Aproveitei o silêncio para guardar meus óculos na caixinha e colocá-los dentro da bolsa que estava comigo. Eu sabia que estávamos indo para a cafeteria mais próxima do trabalho e sabia o caminho até ela, por isso caminhávamos em silêncio lado a lado, até que o silêncio ficou esquisito demais. Além disso, era a primeira vez que Chase e eu nos encontrávamos fora do trabalho e não sabia como seria conversar com ele de uma maneira mais informal.
— Você fica diferente sem óculos. – Comentou ele, com as mãos nos bolsos.
Parecia que ele tinha se obrigado a falar qualquer coisa só para nos livrar do silêncio pesado, e, apesar do comentário não render muita conversa, fiquei feliz por ele ter feito isso.
— É, estão um pouco fora de moda.
Ele riu.
— Ah, eu acho que o vintage cai bem em você.
Coloquei minhas mãos nos bolsos também, de repente tímida.
— Só os óculos mesmo.
Chegamos ao estabelecimento e, por conta do horário, estava bem vazio. O Palace Coffee era um lugar aconchegante e moderno, mas devo admitir que não aparecia por ali com tanta frequência. Raramente acordava cedo o bastante para tomar café, e, quando o fazia, obviamente Malai e o Sweet Maple já tinham minha lealdade.
Eu e Chase escolhemos uma mesa com bancos confortáveis, uma vez que eu provavelmente passaria umas boas horas ali. Eu tinha deixado meu notebook em casa, mas Chase me emprestou o dele e retirei minhas anotações, meu caderno e uma caneta da bolsa.
Como um cavalheiro, Chase se ofereceu para buscar um café para mim, que aceitei de bom grado. Mesmo que estivesse quente lá dentro, a temperatura ainda não passava de cinco graus e minhas mãos estavam congelando. Um café me ajudaria a esquentar.
— Aqui está. – Disse ele, estendendo o copo de café em minha direção.
— Obrigada, Chase. – Respondi, ao que ele devolveu com uma piscadela.
— Não há de que.
Sorri para ele, me abaixando para pegar minha borracha na bolsa, quando ele suspirou. O gesto deu a entender que eu tinha perdido um comentário importante.
— Aconteceu alguma coisa?
Chase corou; o que só provava que talvez eu não fosse gostar muito do que estava por vir.
— Olha, eu sei que agora sou seu chefe e tudo mais, mas preciso perguntar.
— O que?
— Você se lembra de mais alguma coisa da faculdade? – Questionou. – Algo mais... físico?
Ele queria saber sobre o beijo. Bem, talvez eu tenha sido despretensiosa demais com a minha própria lembrança para se referir a ela como um simples “beijo bêbado”. É claro que não foi só isso, afinal de contas, também estava bem bêbada. Como já devem saber, eu era realmente focada e mais introspectiva, porém tinha acabado de entrar na faculdade e estava doida para entrar no mundo universitário de cabeça. Nem hesitei quando minha colega de quarto me chamou para a festa da fraternidade Chi Psi, porque naquele dia em especial eu queria me divertir de verdade.
Eu estava exatamente do mesmo jeito que Chase informou, uma blusa xadrez vermelha e um all star branco. Usava uns shorts jeans simples, mas que no fim das contas acabou combinando com o resto. Ali estava eu, ingênua, novata e completamente bêbada rindo sozinha e... ali estava Chase, provavelmente muito mais bêbado que eu rindo de mim por estar rindo sozinha. Conversamos por um tempo e antes mesmo que eu me desse conta, estávamos aos beijos. Não lembro direito como aconteceu, mas lembro que fiquei lisonjeada porque Chase era mesmo lindo. Apesar de não me recordar, também tenho certeza de que os beijos não foram menos quentes do que minha mente me deixa lembrar, apesar da embriaguez.
Porém foi só isso. Um intenso beijo bêbado. Eu nunca mais vi Chase pelo campus; para ser sincera eu nunca nem o procurei. Ele estava no último ano e eu tinha acabado de entrar, era de se esperar que nossos caminhos nunca mais se cruzassem.
Mas aqui estávamos nós, anos depois, tendo a pior e mais constrangedora conversa jamais tida antes. O fato de ele querer saber disso mostrava que ele não poderia estar tão bêbado assim se lembrava desses detalhes e foi só por esse motivo que decidi ser sincera, não sem antes corar violentamente.
— É, eu lembro. Do... beijo. Na... festa. – Comentei, olhando para baixo. Um cara aleatório em um bar, tudo bem. Mas se lembrar disso com o próprio chefe? Embaraçoso total.
Até que me senti ridícula por estar constrangida. Eu era adulta ou não era? Olhei em sua direção de novo, determinada a fingir que lembrar daquilo não me envergonhava. As bochechas de Chase se coloriram de vermelho mais ainda e fiquei feliz pensando que pelo menos eu não era a única embaraçada com a conversa.
— Que bom. – Arqueei a sobrancelha. – Quer dizer, que bom que se lembra. Eu estava pensando que estava louco.
Dei risada, bebendo um gole do café.
— Está tudo bem, já faz muito tempo.
Ele estava brincando com o rótulo da sua embalagem de café.
— Sabe, eu tentei de achar no campus.
— Chase...
— Eu te achei, mas não consegui falar com você. – Comentou, rindo. – E depois eu fui embora e nunca mais te vi. Eu devia ter falado com você.
Suspirei, colocando o copinho na mesa de novo.
— Talvez? Nunca saberemos se de fato teria mudado algo.
Ele me encarou.
— Mudado algo tipo... você não estar namorando com uma celebridade agora?
— Eu não estou... como você sabe disso?
— Também leio notícias. E te sigo no Instagram. – Ele riu, mais para si mesmo. – Não que você tenha me notado por lá.
— Eu realmente não ligo mais para o meu Instagram. Está tudo uma loucura.
Bebi mais um gole de café, atenta a análise de Chase.
— Posso imaginar o que é ser famoso simplesmente por existir.
— Pode?
Ele suspirou.
— Cresci na sombra do meu irmão mais novo, Oliver Collins.
— Certo, o surfista. – Lembrei.
— E é frustrante as pessoas me conhecerem como “irmão de Oliver Collins” – Respondeu, fazendo aspas no ar. – Ou... “namorada de Niall Horan”.
Me remexi na cadeira, desconfortável, mas ao mesmo tempo não querendo negar meu título autoimposto. Niall tinha terminado com Hailee oficialmente, porém isso não poderia significar que automaticamente estávamos namorando. Deu a entender que quando quisesse ter um relacionamento sério comigo, ele diria isso com todas as letras, e o fato de não dizer estava me deixando maluca. Era somente por isso que estava na cafeteria, com Chase, meu novo chefe, claramente flertando comigo.
Eu poderia dar uma chance. Eu poderia ceder. Poderia até usar isso para Niall tomar vergonha na cara e admitir que me quer na vida dele de uma vez por todas. Esse último plano não daria certo se eu admitisse estar namorando com Niall, Chase parecia decente o suficiente para não dar em cima de uma mulher comprometida.
Mesmo assim não consegui negar. E Chase percebeu.
— Eu preciso saber.
— Sim?
— Você está namorando com ele? – Questionou, diretamente.
Eu precisava desconversar. Dizer sim seria mentira, mas negar não era uma opção para mim. Não mais, alguma coisa na maneira como eu pensava tinha mudado.
— Por que a pergunta?
Chase deu de ombros, mais interessado em encarar seu copo de novo.
— Eu conheço o cara. Ele não parece ser do tipo que namora.
Franzi o cenho, de repente assustada com o rumo da conversa.
— Conhece? Pessoalmente?
Ele me encarou de novo, se inclinando para frente.
— Pessoalmente.
Ele me desafiou com o olhar, mas não de um jeito maldoso. Chase estava me testando, queria saber o quanto me importava em saber sobre Niall para saber quais eram suas chances. E honestamente eu não queria saber as coisas horríveis que ele talvez fosse me contar sobre Niall, então só sorri para ele, tentando não demonstrar minha preocupação.
— Viemos aqui trabalhar ou discutir minha insossa vida amorosa?
Ele finalmente desistiu, me lançando um sorriso sem graça.
— Certo, desculpe.
Liguei o notebook e a postura formal de Chase foi voltando aos poucos. Imaginei que tendo conversado sobre isso, aquele silêncio do tamanho de um elefante não voltaria a nos intimidar, e estava certa. Pelo menos em relação ao nosso beijo de anos atrás; a conversa sobre Niall, porém, não seria esquecida tão cedo.
As horas se passaram tão depressa que quando olhei éramos os únicos no estabelecimento e se aproximava das onze da noite. Pelo menos fizemos um bom progresso no meu texto, que já estava praticamente uma folha maior que antes, devido aos acréscimos, inclusive excelentes, que Chase havia sugerido.
Ele se ofereceu para pagar meu café e uma carona para casa. Por conta do horário, eu não tive muita escolha a não ser aceitar, e ele insistiu que não seria problema nenhum.
Foi estranho estar em seu carro, como se fôssemos um casal, mas achei rude ir no banco de trás e trata-lo como meu motorista, quando ele claramente estava me fazendo uma gentileza. Ele estacionou na calçada paralela a minha e seria necessário atravessar a rua, mas não me importei. Chase, por outro lado, já tinha descido do carro para abrir a porta para mim, o que achei um tanto desconcertante.
Será que dava para ir para Nova York hoje mesmo e não precisar vê-lo por duas semanas?
— Boa noite, Chase. – Falei corada, já me afastando para atravessar a rua.
Ele, porém, veio em minha direção estalando um beijo no meu rosto. O cheiro de colônia pós barba e café me envolveu de maneira acolhedora e me senti flutuar, mas antes que fosse tarde demais fui para trás um pouco chocada.
Fiquei chocada porque o gesto pareceu natural demais para mim, espontâneo demais. Quer dizer, conversamos sobre coisas bastante pessoais, mas repassando nossa conversa na minha cabeça, não encontrei uma brecha onde esse tipo de comportamento seria bem-vindo.
— Me desculpa, eu realmente... – Ele pareceu se lamentar de verdade, os olhos gritando o que ele não podia dizer em voz alta.
— Está tudo bem. – Falei baixinho, mesmo que não estivesse. Eu estava ficando confusa de novo, e odiava isso. – Hm... até segunda, Chase.
Ele ainda estava corado quando colocou as mãos nos bolsos novamente, algo que notei que fazia sempre que estava nervoso.
— Se cuida, . – Disse por fim, sorrindo para mim e se afastando em direção ao banco do motorista.
Minha mente foi para um lugar onde fiquei pensando nos momentos que passei com Chase e seria mentira se eu dissesse que não me senti minimamente atraída em ter uma vida normal e confortável. Sem mídia, sem tabloides, sem namorado famoso. Imaginei como seria se tivesse cedido aos encantos do charme que exalava de Chase, fantasiando por um segundo que ele não era meu chefe e que nos conhecíamos desde a faculdade, porque ele tinha decidido falar comigo depois da festa. Agora estávamos noivos, íamos nos casar em junho e o primeiro bebê já estava nos nossos planos, assim como nosso cachorro adotivo, Scott, um Golden Retriever bagunceiro e enorme.
Então Niall voltou para os meus pensamentos com força. Mais precisamente porque assim que olhei na direção do portão da minha casa, ele estava ali me esperando.
E, aparentemente, tinha visto tudo.
Capítulo 18
Parte da minha decisão de não me explicar era justamente porque ele não quis assumir nada e, portanto, eu também poderia estar com quem bem entendesse. Me perguntei se Chase havia reconhecido Niall na porta e agido daquela forma na frente dele de propósito, mas ele parecia ser tão gentil que minha desconfiança se dissipou tão rápido quanto veio.
— Isso veio em boa hora. – Falei, apontando para as sacolas. – Faz tempo que está aqui?
Ele sacudiu a cabeça, se aproximando para depositar um beijo no alto da minha cabeça. Niall tinha cheiro de sabonete e suor, o que me fez pensar se ele teria saído de Los Angeles as pressas.
— Cheguei do aeroporto faz uns quarenta minutos. – Explicou, me acompanhando para dentro do prédio depois de travar o carro. – Peguei o primeiro voo para cá assim que li sua mensagem.
Corei, tentando mensurar o quanto ele se importava comigo a ponto de pegar o primeiro avião que apareceu na frente só para me ver no final de semana.
Uma vez dentro do apartamento, Niall depositou as sacolas em cima da mesa de centro da sala e voltou em dois passos me envolvendo em um abraço apertado. A verdade é que já se fazia muitas semanas que não nos víamos pessoalmente, e ligações e chamadas de vídeo nem sempre funcionavam para matar as saudades. Para ser sincera, nunca funcionavam. Eu sempre desligava meu celular com mais saudade dele do que antes.
E foi então que percebi o motivo pelo qual eu não consegui negar meu envolvimento com Niall, nem dar uma chance para Chase e nem ceder para o seu flerte.
Eu não estava apenas apaixonada. Não era um acontecimento bobo do qual me esqueceria daqui uns anos. Não era uma paixonite de colegial. Com o passar das semanas não notei que quanto mais me afundava no drama de Niall e sua caótica vida, mais me apaixonava por ele e mais o queria. Não, eu não estava somente apaixonada por Niall Horan.
Eu amava Niall Horan.
E parte de mim ansiava que estar presa em seu abraço sôfrego e apertado poderia significar que ele me amava também.
Nos afastamos depois de um tempo abraçados e ele tirou do meu rosto uma mexa do meu cabelo que tinha se soltado do coque improvisado.
— Senti sua falta, . – Murmurou aliviado, antes de me beijar.
Eu nem tive tempo de responder de volta, correspondendo ao seu beijo com tanta intensidade que me surpreendeu não ter cedido de uma vez. Tentávamos registrar com o tato toda a superfície do corpo um do outro, seus beijos passando da minha boca para o meu pescoço, e quando eu pensava que continuariam descendo pelo meu seio, voltavam para a minha boca, em um incitamento irritante e excitante ao mesmo tempo. Ele me levantou sem dificuldade me levando para o sofá e me sentou em seu colo, onde ignorei o desconforto da calça jeans apertada que não me permitia muito movimento e me entreguei para o momento. Vendo que ele não se daria ao trabalho tão cedo, eu mesma tirei a minha blusa, e pude ver em seus olhos que era algo que ele não estava esperando. Antes que fizesse perguntas, tirei a dele também, em uma tentativa clara de mostrar o que estava querendo.
Eu nunca tinha visto Niall sem camiseta e tive que tirar cinco segundos para apreciar a obra de arte que era o corpo dele. Ele sorriu quando notou o rubor em minhas bochechas, e se aproximou para continuar me beijando, nossos corpos se movendo no ritmo do beijo em uma provocação eletrizante de quem aguentaria mais tempo sem se render.
Eu mesma já estava quase desistindo, quando, para o nosso infortúnio, o celular dele tocou.
— Deixa para lá. – Ele rosnou, tentando puxar minha boca para a dele novamente.
Tentamos ignorar por mais uns segundos depois que o telefone parou, mas voltou a tocar logo em seguida. Niall resmungou, encostando a testa dele na minha.
— Eu fugi de LA sem falar para ninguém. – Balançou a cabeça. – Deve ser importante.
Sorri para ele, beijando sua bochecha e saindo do seu colo.
— Atende. – Falei, já em pé. – Mas não coloca a camiseta ainda.
Ele se afastou dando uma gargalhada e piscou para mim, enquanto eu mesma colocava a minha de volta.
Eu precisava mesmo era de um banho, mas tinha tomado apenas um café desde a hora do almoço e estava morrendo de fome. O cheiro da comida de Khalan instigava meu estômago como se me desafiasse a ignorá-lo. Logo que Niall encerrou a ligação e se reaproximou de mim, não preciso dizer que o clima não era o mesmo de antes e seria bem esquisito continuar de onde paramos. Por isso Niall, desconsiderando meu pedido, vestiu sua camiseta mesmo assim, vindo se juntar a mim ao redor da mesa de centro.
— Estou com fome. Mesmo. – Disse, já abrindo a sacolinha. Corri para a cozinha voltando com dois pratos rapidamente, e quando voltei Niall já tinha separado as caixinhas com os alimentos. – Me diga que tem bolinhos?
— Tem bolinhos. – Apontou para a caixa a minha esquerda, e eu a abri, pegando dois de uma vez.
Percebi que ele tinha feito uma seleção bem melhor dessa vez, com pratos que eu mesma nunca tinha provado.
— Parece que alguém andou comendo comida tailandesa em Los Angeles. – Provoquei, pegando um pouco de cada coisa antes de me sentar no chão da sala.
— É, mas nenhuma é tão boa quanto essa aqui. – Respondeu com a boca cheia de bolinho, o que foi o auge da fofura para mim. Me lembrou muito as fanarts de Niall versão desenho animado.
Meu celular emitiu um som de notificação de dentro da bolsa e, como poderia ser notícias do meu pai, me levantei para buscá-lo. Franzi a cara quando vi que, na verdade, era uma notificação do Instagram.
— O que foi?
— Achei que era meu pai. Mas é só a merda do Instagram.
— O que eles disseram dessa vez? – Quis saber, usando um guardanapo para limpar a boca.
Abri o aplicativo indo para a última notificação onde eu era mencionada. Revirei os olhos antes de ler.
— Aparentemente você foi flagrado. “@niallhoran visto há pouco no aeroporto de São Francisco”. – Li a legenda, acompanhada de cinco cliques de Niall. – “Depois da notícia no começo desse ano sobre Niall e Hailee estarem oficialmente separados, será que um romance com @ finalmente #vemaí?”
Olhei para ele como se também fizesse a pergunta e ele riu.
— Tem gente que não tem o que fazer. Deixa para lá, .
Mas eu não queria deixar para lá. Queria que ele simplesmente respondesse a maldita pergunta. Eu ia mesmo insistir, mas quando percebi que isso provavelmente renderia uma série de DR’s que eu não estava a fim de ter agora que tinha Niall comigo, relevei. Pelo menos por um momento.
— Como foi crescer com isso, Niall? Redes sociais, pessoas, ainda mais na banda que virou uma febre mundial em um nível tão gigantesco que chega a assustar.
De maneira que sempre acontecia quando eu mencionava a banda, Niall encolheu os ombros, sustentando sozinho um segredo que não podia dizer em voz alta. Ele terminou de mastigar o que estava comendo e ficou me olhando por pelo menos um minuto inteiro antes de suspirar.
— Na primeira vez que conversamos, ano passado, eu disse algo que não deveria ter dito. – Comentou, lembrando-se da nossa entrevista. – Você foi simpática comigo e disse que se eu não quisesse, você não publicaria meu relato. E você não publicou. ¹
Corei com a lembrança.
— Era o mínimo que eu poderia fazer para proteger sua vida particular.
— A gente ainda nem se conhecia, , e você foi sincera comigo e cumpriu com a sua palavra. Por isso nada, absolutamente nada, que eu te contar aqui hoje pode ir para em algum lugar, por mais bobo que seja. Você entende isso?
Ele ia mesmo me confiar segredos da banda que ninguém mais sabia a não ser os envolvidos? Os segredos que o mundo inteiro e todas as fãs queriam saber? Confiava em mim tanto assim e em tão pouco tempo?
Considerei isso um passo a mais no nosso relacionamento. Não é todo dia que seu quase namorado famoso te confia segredos mesmo você sendo quem é e trabalhando onde trabalha.
Senti que meus olhos brilharam.
— É claro que não vão sair daqui. Nada mesmo, eu juro. Pode confiar em mim.
Ele sorriu.
— Eu confio em você de olhos fechados. – Pegou mais alguns itens da mesa e colocou no prato, e eu aproveitei para pegar o último bolinho. – O que quer saber?
Eu deveria estar parecendo uma adolescente boba de novo. Tinham tantas coisas que eu gostaria de saber na época e coisas que eu queria saber agora, que simplesmente não sabia nem por onde começar.
— O lance de Harry com a touca. Verdade ou mito?
Niall riu.
— Tanta coisa interessante para perguntar e você quer saber disso?
Dei um tapa em seu braço como um meio empurrão.
— Decidi começar pegando leve. Responda!
— Ok. Mito.
— Você gosta do Nando’s de uma forma surreal?
— Mito!
— Liam tinha mesmo medo de colheres?
— Mito. – Falou, ainda rindo. – E, antes que pergunte, Louis detesta cenouras.
— Não brinca? – Perguntei, fingindo estar chateada. – Minha adolescência foi uma mentira.
— Reclame com as revistas adolescentes.
Fingi não perceber a alfinetada.
— Quem era o mais mulherengo? – Perguntei.
— Eu, óbvio.
Revirei os olhos.
— É claro que você responderia isso.
— Ok, era o Liam. – Cedeu, rindo.
— O mais rude?
— Louis.
— O mais fofo?
— Eu não sei? – Respondeu. – Harry, talvez. Ou Niall. Niall sempre foi o mais fofo.
Não consegui me impedir de revirar os olhos novamente.
— Ok, vou aceitar essa resposta. Você namorou com Amy Green?
— Mito. – Falou. – Eu era muito novo e não foi nada muito digno de nota. Nós éramos muito amigos e muito próximos, ela deixou o namorado e nós ficamos, mas não chegamos a namorar. Depois perdemos contato porque ela me achou babaca. Acho que as pessoas associam o fato de ela ser a primeira como muito importante. Mas não é.
— Coitada da Amy. – Ironizei, roubando um pedaço do espetinho do prato dele. – Você odeia quando as pessoas pegam comida do seu prato?
— Verdade. – Disse, puxando o espetinho de volta.
— Ei!
Ele bufou de brincadeira, me devolvendo o espetinho.
— Eu vou ser legal porque da última vez você me deu seu último. – Lembrou. – Mas não se acostume.
Mordi a carne de porco suculenta, contente por ter ganhado comida dele.
— Liam gosta de mulheres mais velhas?
— Ele prefere. Mas não é como se saísse procurando também.
— Hm, e Harry?
— Mito. Foi tudo uma articulação horrível da mídia e ele teve que conviver com isso. – Niall suspirou mais pesado, como se estivesse pensando no amigo. – Na verdade, acho que convive até hoje.
Larguei o palitinho agora vazio em cima da mesa, colocando no prato um pouco de arroz e mais carne apimentada. Khalan tinha mandado molho de laranja, e fiquei feliz porque ele quase nunca fazia.
— E então, Niall... Larry é real? – Quis saber, enquanto despejava molho por cima da carne.
— Ah, agora a bonita quer pegar pesado?
— Pesadíssimo. – Confirmei.
— Bom, todos nós suspeitávamos que talvez acontecesse alguma coisa ali. Mas se acontecia eles eram muito discretos, eu pelo menos nunca vi nada. Desculpa, acho que não é real.
— Então você não acha que sejam gays?
— Não, acho que não. Talvez Harry seja bi, mas ele nunca confirmou.
— E o que você tem a dizer sobre as pessoas questionando a sua sexualidade? – Falei, limpando o molho de laranja da boca com um guardanapo.
— As pessoas questionam isso?
— Bom, estou perguntando, não estou? – Alfinetei.
Ele me lançou um sorriso malicioso.
— Bom, nós estamos aqui, não estamos? – Devolveu, apontando para o sofá. – Eu aprendi a ignorar faz tempo. Ninguém tem nada com a minha vida. Mas, se você quer ter certeza, , eu sou hétero. – Provocou, acariciando minha perna mais próxima a ele.
Dei um tapa na mão dele para a gente não sair do assunto.
— Eu tinha minhas dúvidas, muito obrigada por esclarecer, Niall.
— Posso esclarecer bem melhor se quiser, de repente a gente pode ir para a ca...
— Muito engraçado. – Interrompi, fingindo não estar achando graça, mesmo que estivesse. – Zayn ficou magro porque se drogava?
O sorriso sumiu do rosto dele, que olhou para baixo, aparentemente tentando decidir como falaria.
— Ele não se drogava. Quer dizer, fumava para caramba e tudo, mas não usava drogas. – Niall olhou para mim, e em seu olhar pude notar que a situação de Zayn abalou a banda inteira. – Zayn entrou em depressão e ficou anoréxico. Não comia direito ou não dormia direito, ou os dois. Estava fraco, cansado e isso o deixava violento. Ele nunca fez nada de grave, mas já quase saiu no soco com um dos produtores uma vez. Era mesmo muito cansativo, mas foi pior para Zayn. Talvez o único de nós que realmente teve que sustentar um personagem que não tinha nada a ver com ele.
— Bancando o badboy?
Niall sorriu, terno, se arrumando no tapete.
— É, ele não era nada assim. Era mais na dele, e geralmente tímido. Mas quando estávamos só nós cinco ele era engraçado, otimista e um excelente ouvinte. Quando relatava como tinha sido seu encontro com uma garota Liam ficava zoando por ele ser romântico e sonhador até demais. – Niall riu, talvez se lembrando de algo. – Com certeza ele era o mais romântico de nós. Zayn talvez não tenha agido da melhor forma ao guardar os problemas para ele mesmo, mas nós sabemos o quanto ele sofreu. E se não foi fácil para a gente ver ele definhando, nem imagino como estava sendo para ele mesmo.
— Por isso ele quis sair. – Conclui.
Porém Niall balançou a cabeça.
— Zayn não saiu porque quis.
— Como assim?
— Ele foi convidado a se retirar.
— O que? – Gritei, em choque com a notícia.
— Acho que essa é a parte que ninguém sabe. De acordo com o Simon as atitudes dele estavam dando uma imagem ruim para a banda e ele foi convidado a se retirar depois da On The Road Again.
— Mas ele saiu antes.
— É, tente adivinhar o porquê. Eu também ficaria bravo se me tirassem de um projeto de anos depois de terem literalmente desgraçado minha cabeça. – Conjecturou. – Acho que abandonar a turnê e deixar todo mundo doido refazendo todos os arranjos vocais as pressas foi um presente de despedida de Zayn para Simon. – Completou, com um sorriso debochado.
Fiquei triste por ter julgado Zayn Malik tão mal e considerei ouvir as músicas dele para tentar compensar o fato de ser uma péssima fã. Passei anos com raiva dele por ter abandonado a banda porque, na minha cabeça de fã, o fato de Zayn ter saído contribuiu para a separação de todos.
— E então, Niall, a pergunta de um milhão de reais. – Continuei. – Vocês tinham mesmo a intenção de voltar depois da pausa?
Niall abandonou os talheres no prato, e eu notei que não tinha sobrado quase nada da comida. O cantor pareceu desconfortável, como se não soubesse como me dar uma notícia ruim.
— Não, . Depois que Zayn saiu não fazia mais sentido continuar. Então... nunca tivemos a intenção de voltar. – Confessou. – Não significa que não possa acontecer um dia, mas realmente não está nos planos.
Por mais tempo que tivesse passado e mais madura que eu fosse, foi muito difícil segurar as lágrimas quando ouvi a verdade sobre a pausa da banda.
— Minha directioner interior grita com essa confissão. E chora também. – Falei, olhando para ele.
— Estou feliz por todos, por mim, por termos conquistado o que conquistamos, e One Direction vai fazer parte da minha vida pelo tempo que eu viver. Ao contrário do que as pessoas pensam, eu tenho muito, muito orgulho disso. – Respondeu, como se o que ele disse pudesse me consolar de alguma forma.
E, na verdade, consolou mesmo. Era sim um consolo saber que ele pelo menos gostava de ter feito parte daquilo.
— A banda sempre significou muito para mim, Niall. Fazer parte dela, de alguma forma, foi o que me sustentou por toda a adolescência. A cada música nova, a cada clipe no ar e a cada álbum lançado, eu estava lá. Obrigada por ter aceitado ficar, mesmo depois do Zayn sair. Obrigada por cada vídeo aleatório que fizeram e por cada vez que me fizeram rir tanto. Até mesmo pelas vezes que me fizeram chorar. E fico feliz que a vida, Deus, o destino... fico feliz a quem quer que tenha te colocado no meu caminho para que eu possa te dizer isso.
Meu cantor preferido se arrastou pelo tapete para me dar um desajeitado abraço rápido, visivelmente emocionado com a minha declaração.
— Eu quem agradeço, , por ainda existir fãs como você.
Sentia que pela primeira vez desde Londres estávamos nos reaproximando de verdade.
— Acho que terão mais perguntas no futuro. – Avisei, me levantando.
Niall seguiu meu exemplo.
— E eu estarei aqui para responder a todas.
Me inclinei sobre a mesa para jogar na sacola todo o lixo e Niall aproveitou para comer a carne que tinha sobrado. Não achei uma boa ideia guardar o arroz que também sobrara, por isso joguei fora junto com o resto. Enquanto eu saía do apartamento para colocar o lixo no depósito, Niall lavou os dois pratos que tínhamos usado, e ficou me esperando na sala, com uma expressão confusa.
— Sabe, me abri para você essa noite. – Começou.
— Sim?
— Seria justo se fosse minha vez, agora.
Ponderei por alguns segundos, mas ele estava certo, era justo. Além disso eu não tinha nenhum segredo que não pudesse ser divulgado.
— Claro, por que não. O que quer saber?
— Quem era aquele homem que te trouxe para casa? – Perguntou, rápido demais, corando em seguida.
Niall estava com ciúmes. Controlou bem durante um bom tempo, mas pelo visto não conseguiu se segurar.
— Está com ciúmes, popstar?
Ele cruzou os braços, aparentemente incomodado.
— É óbvio.
Dei risada.
— Ninguém importante. – Admiti. – Era só meu chefe me dando uma carona. Trabalhei até tarde hoje. Ah, inclusive tenho uma novidade!
Ele semicerrou os olhos.
— Vou querer saber mais sobre seu chefe te dando caronas depois. – Bufou, o que só o deixou mais fofo. – Qual novidade?
— Aquela coluna que Jesse não aceitou. Foi vendida por cinco mil dólares para uma revista em Nova York. Por isso vou precisar ir até lá.
Niall abriu um sorrisão, me rodando pela sala.
— Isso é maravilhoso! Você merece, . – Acrescentou, quando parou de me rodopiar. – Falando em seu trabalho, também tenho uma novidade.
— Ah, não.
— Consegui a entrevista com os Jonas.
— Niall! Eu não acredito! – Gritei, pulando em cima dele. – Você. É. O. Melhor. De. Todos. – Completei, dando um beijo a cada palavra proferida.
Ele se permitiu ser bajulado, que notei ser algo de que ele gostava, e ficamos no sofá conversando por mais alguns minutos. O relógio se aproximava das duas da manhã quando conclui que já estava cansada.
— É bom ir dormir, vamos viajar amanhã à tarde. – Avisou.
— E para onde vamos?
— Surpresa. – Revelou, o sorriso lindo faiscando.
Eu odiava e amava surpresas. Fui tomar um banho e, quando voltei, Niall já tinha arrumado seu lugar no sofá-cama. A bem da verdade eu ia chamar ele para dormir comigo, mas já que ele tinha tomado essa iniciativa, deixei para lá. Joguei uma toalha limpa para ele e me aproximei para dar um beijo.
— Até amanhã, popstar. – Desejei, sorrindo.
Ele me puxou para um abraço.
— Durma bem, .
E eu dormiria bem. Ah, essa noite eu iria dormir muito bem.
Estávamos no carro há quase três horas de suspense e Niall não queria me dizer para onde estávamos indo. Eu não era completamente burra, então sabia que era para alguma praia, visto que ele me pediu para vestir roupas leves, pegar toalha, coberta velha, cobertas limpas e roupas limpas. Mesmo com o começo da primavera se aproximando o clima ainda não estava muito bom para um mergulho no mar, mas o dia estava ensolarado e eu tinha até conseguido me livrar da minha blusa de frio no caminho.
A viagem foi tranquila e necessária. Niall me perguntou mais coisas sobre Chase do que eu estava disposta a falar, porém acabei confessando sobre o beijo na festa da fraternidade. Ele ficou um pouco incomodado, mas bem que mereceu por ter feito o que fez quando beijou Hailee a pouquíssimo tempo atrás.
A estrada estava linda e depois de uma hora e meia de viagem paramos para comer alguma coisa na beira da estrada. O lugar era tão deserto que Niall nem precisou colocar o boné e o óculos de sol: éramos quase os únicos ali com exceção dos funcionários.
Se aproximava do fim do dia e não estava entendendo que lugar era esse onde a pontualidade em assistir ao pôr-do-sol era tão importante, mas Niall insistiu. Quando finalmente estacionou o carro no meio do nada, minha curiosidade quase entrou em ebulição.
— Não está pensando em me matar e enterrar meu corpo na floresta, está? – Perguntei, de brincadeira.
— Talvez.
Rimos, descendo do carro. Eu não via nada além de mato e me questionei se tinha me enganado sobre a praia. Pegamos as coisas no porta-malas, incluindo um violão que ele tinha trazido de Los Angeles e Niall usou seu celular para seguir uma série de coordenadas complexas. A trilha estava bem limpa e não tinha chovido por ali recentemente, então foi bem tranquilo andar de mãos dadas com ele por ali. Andamos por poucos minutos e quando finalmente saímos do mato e encontramos uma clareira que revelava a pequena praia, eu ofeguei.
O lugar era lindo. O mar tinha a cor dos olhos de Niall e a espuma parecia ser de mentira. Falésias enfileiravam o mar no formato de um arco, e a praia em si era tão surreal que deu a impressão de que eu iria direto para Nárnia se passasse por debaixo daquele arco. Os raios de sol querendo anunciar o fim do dia transpassava por ele, e me senti em um paraíso particular feito só para mim.
A praia era pequena em extensão de areia, e era muito acolhedora também, então não tinha muito para onde ir. Fui até um tronco caído, esperando Niall me deixar sentir o deslumbramento do lugar, quando percebi a cor da areia.
— É roxa! – Exclamei, rindo em seguida. – A areia é roxa!
— Bem-vinda a Pfeiffer Beach! – Anunciou, como se ele tivesse descoberto aquelas terras e a estava nomeando.
— Como descobriu esse lugar? – Questionei, ajudando Niall a arrumar nosso piquenique.
— Contatos. – Respondeu. – Consegui alugar para a gente hoje. Não vai vir mais ninguém aqui.
Niall tinha alugado uma praia inteira para nós. Eu não podia fingir costume com isso. Aliás, eu não podia fingir costume com nada que vinha dele.
Esticamos uma coberta velha na areia em frente ao tronco, colocando a caixa com as minhas coisas e o violão dele por cima. Em seguida Niall me pediu para ajudá-lo a procurar galhos secos para uma fogueira, e nos embrenhamos no meio da mata novamente para a missão. Deu um pouco de trabalho porque aparentemente não era qualquer galho que servia, mas conseguimos depois de uns minutos. Uma vez montada a fogueira, nos sentamos juntos diante dela. Estava me sentindo em um filme de romance e não queria sair dali nunca mais.
Niall tinha um plano. Ele não costumava ser cauteloso, mas também não era impulsivo a ponto de me levar para o meio do nada à toa. Como o sol estava indo embora, a possibilidade de entrar no mar se ia também, e o frio se aproximava. Niall pegou uma das cobertas para mim, enrolando-a no meu ombro, antes de se sentar na ponta do tronco caído.
— O que viemos fazer aqui, Niall? – Perguntei. – É lindo, mágico. Mas o que viemos fazer?
Ele pareceu nervoso, e se levantou para pegar o violão. Sentou-se com ele no colo, coçando a cabeça, claramente envergonhado.
— Bem, não está terminada, pensei em tocar ela para você só em Los Angeles. Mas essa música escrevi de coração. Ela é nova... e é nossa.
E ele começou os acordes de uma música lenta e serena, porém mais lindo que a melodia foram as palavras que saíram da sua boca.
My mind is complicated
Find it hard to rearrange it
But I'll have to find a way somehow
Overreacting lately
Find it hard to say I'm sorry
But I'll make it up to you somehow
Niall cantava de um jeito rústico, afinal éramos só nós e um violão em uma praia vazia. Eu já tinha ouvido ele cantar no ano passado ao vivo. Já tinha presenciado toda a emoção percorrendo uma música, já tinha ouvido cada nota voraz que escapava de seus lábios, mas isso era completamente diferente... Essa música me levou lágrimas aos olhos. Nenhuma emoção que eu senti naquele dia do show chegava perto de dizer o quanto era lindo ouvir ele cantar assim.
Did I miscalculate this?
Let's just go back to basics
Forget about what's coming on
'Cause I hate to see us like this
Breaking up on nights just like this
We should be shooting for them stars of gold
So tell me you want it
A thousand miles away from the day that we started
But I'm standing here with you
Just trying to be honest
If honesty means telling you the truth
Then I guess we lost our focus
And it's killing me that we could go to war like this
But I'm standing here with you
Just trying to be honest
If honesty means telling you the truth
Well, I'm still in love with you ²
Sim, eu também achava que tínhamos perdido o foco. Ali, no meio do caminho, alguma coisa nos tirou um do outro e não estávamos achando o caminho de volta. Não conseguíamos achar o caminho de volta, mas nós tentamos. Nós tentamos e persistimos, simplesmente porque era para ser. Não conseguia imaginar em que momento da minha vida notei que o que sentia pelo Niall era algo muito mais forte do que pensei, mas estávamos ali agora, naquele lugar lindo, onde ele estava tentando me mandar um recado.
E ali estava ele, cantando uma música para mim, dizendo que ainda estava apaixonado por mim, com uma emoção tão dolorida na voz que fez meus olhos marejados finalmente expelirem uma lágrima.
Quando ele tocou a última nota, seus olhos também estavam úmidos, apesar de ele ter os enxugado antes que chorasse.
— Essa música, ela é... Niall, ela é linda. – Murmurei, me arrastando para mais perto dele.
Niall colocou o violão no chão e deixou que eu me aninhasse a ele, seu abraço mais quente do que o fogo que nos cercava.
— Eu não devia ter falado aquelas coisas. Eu queria tentar fazer dar certo com você e não devia ter usado minha vida para te afastar.
— Niall, não...
— Espera. – Pediu. – Eu não deveria ter usado minha vida para te afastar, porque... porque ela te afastou mesmo. Ficamos completamente longes um do outro por semanas e eu odiei cada segundo. Cada vez que pensava que tinha encontrado um anjo que estava perdendo era uma tortura para mim.
Levantei a cabeça, inclinando-a para o lado.
— Você não chegou nem perto de me perder, Niall.
Ele sorriu de maneira sofrida.
— Cheguei sim. Quando aconteceu aquilo com Hailee eu fiquei... Eu fiquei tão...
Niall suspirou, sem saber como se sentia. E fiquei com pena dele por isso.
— Foi muito doloroso para mim, mas já passou. Eu perdoo você.
Levantei meu pescoço para convidá-lo, e ele aceitou, passando os dedos gentilmente pela minha face antes de me beijar. Me beijou e me abraçou ao mesmo tempo, como se tivesse medo de que eu saísse correndo dali.
— Se você ainda estiver apaixonada por mim, ...
— Eu estou. Eu estou muito – Confessei, baixinho. – E nunca deixei de estar.
— Então saiba que nada nem ninguém vai ficar entre nós. Nem Hailee, nem seu Instagram idiota, nem seu chefe e nem ninguém. Se você me aceitar agora... seremos só você e eu. Como deveria ter sido há muito tempo. – Proclamou, me olhando tão ardente e intimamente que me senti nua. – Não posso me dar o luxo de perder mais um segundo agora que encontrei a única mulher no mundo que eu amo. Porque eu te amo, . Eu amo você.
Foram aquelas três palavras que assoprou para longe toda a insegurança que eu acumulava há meses. Foram aquelas palavras que me fizeram lembrar de que o amor é o que a gente faz e que eu tinha sorte por ter um amor assim. E foram as três palavras mais lindas que alguém já me disse.
— Eu te amo, Niall Horan. – Me estiquei para selar meu sentimento em seu lábio macio e gelado. – Eu amo você.
Voltamos a nos beijar, mas dessa vez foi diferente. O céu estava mais escuro e as chamas da fogueira mais convidativas. O clima era frio, mas acho que nenhum dos dois se importou. Niall me tomou no colo para me apoiar em cima da coberta que estava no chão, me beijando com tanta avidez quanto eu correspondia seus beijos.
Carícias desinibidas e íntimas foram trocadas antes de ele, com uma delicadeza que eu não esperava, tirar a roupa que eu vestia. A necessidade de estarmos juntos era maior do que qualquer pudor. Os beijos eram distribuídos pelo meu corpo nu, enquanto analisava Niall, na sombra do pôr-do-sol, despir-se na minha frente, antes de voltar para beijar cada pedaço de mim que ele podia. Inverti nossas posições ficando por cima dele, suas mãos abandonando qualquer traço de delicadeza ao segurar meus cabelos, enquanto me inclinava para frente a fim de sentir sua boca na minha mais uma vez.
Era algo que não esperava para o fim daquele dia, e o fato de termos nos declarado acendeu em mim um amor muito maior do que eu achava que sentia. Pareceu impossível viver um relacionamento a distância agora que eu sabia que ele me amava, com todas as letras.
Deitada com Niall em cima da areia, totalmente nua, com as sombras da fogueira dançando com o vento, eu nunca tinha me sentido tão confortável, tão amada e nem tão segura.
¹ Trecho relatado em 05.Arms Of Stranger, spin-off da fanfic
² Tradução da música aqui
Capítulo 19
Alcancei o portão de desembarque procurando apenas uma pessoa. Pela primeira vez eu não me importava com notícias, fofocas nem nada que antes tiraria meu bom humor, e tudo isso porque se faziam mais de um mês que eu não via Niall.
E sim, hoje eu estava disposta a relevar absolutamente qualquer coisa por ele.
A primeira coisa que eu fiz foi rir da placa “ Horan ” ao lado de um buquê de flores exageradamente grande, porque isso não tinha nada a ver com o tipo de coisa que Niall faria. E a segunda foi sair correndo ignorando toda minha dignidade – mais uma vez – e indo direto para os braços dele.
— Eu não acredito que chegou antes de mim. – Murmurei, abraçando mais forte. Ele tinha o melhor cheiro do mundo, colônia masculina misturada com sabonete caseiro, e os cabelos molhados da sua nuca denunciavam um banho recente.
— Eu queria fazer uma surpresa. – Se afastou, me estendendo o buquê.
— Ah, eu estou surpresa.
Niall sorriu, vencendo o espaço que nos separava para me beijar.
— Você está amassando as flores. – Brinquei.
— Que se dane as flores. – Devolveu. – Fiquei um mês sem ver você.
— É verdade.
— Posso comprar flores novas depois. – Sussurrou, voltando a me beijar de novo.
Dessa vez não interrompi, porque realmente senti falta dele de uma maneira inexplicável. Não sei quanto tempo ficamos ali, nos abraçando na frente de todo mundo, mas depois de um tempo considerável me afastei, sorrindo para ele.
— É melhor a gente ir.
Ele concordou, corando.
— Vamos procurar sua mala.
Com a mala encontrada, nos dirigimos para o carro dele, que não reconheci, porque mais uma vez era diferente dos carros que ele costumava alugar. Era mais simples, ainda que moderno, parecia mais casual do que o normal. Eu não entendia muito de carros, então deixei para lá.
Meu retorno de Nova York estava rendendo bastante expectativas, principalmente porque foi a primeira vez que interagi de verdade com o meu Instagram, e até abri uma caixinha de perguntas. A maioria das perguntas era sobre Niall, obviamente, mas não respondi essas e isso não passou despercebido pelo público. No geral eu percebi que estava gostando de ter pessoas interessadas em mim de verdade, e pedi a Brooke, que estava cuidando de mim em Nova York, para tirar várias fotos dos nossos passeios pela cidade para publicá-las no meu feed, que outrora estava bem desatualizado. No meu tempo livre, transcrevi tudo que Niall havia me contado sobre a banda em meu bloco de anotações, simplesmente porque estava entediada o suficiente para trabalhar em uma matéria que eu jamais publicaria. O segredo dele estaria guardado comigo, para sempre.
Quando chegamos em frente ao meu prédio, Niall pegou minha mala enquanto eu me diria para o portão do prédio com um buquê com flores parcialmente amassadas.
— Tem garagem nesse prédio? – Perguntou.
— É velho, mas nem tanto. – Retruquei. – Mas você pode deixar aí na frente, como sempre.
Niall ergueu as sobrancelhas.
— E como vai proteger ele da chuva?
Interrompi o portão semiaberto para encará-lo.
— E porque se importa? Você sempre deixa ele aí na rua.
Meu cantor favorito abaixou minha mala para me dar um sorriso sem graça.
— Caso ainda não tenha entendido, eu estou te dando um carro.
Olhei para Niall e para o carro atrás dele, e para Niall de novo, sem conseguir esconder o choque em meu rosto.
— Você está me dando... o que?
O sorriso no rosto dele murchou um pouco.
— Esse carro.
Abri a boca e fechei três vezes antes de dar as costas e seguir pelo corredor em direção ao elevador. Escutei Niall lutando com minha mala e o portão, por fim conseguindo trancá-lo, até se juntar a mim no saguão.
— Você não vai aceitar, né?
Olhei para ele.
— Não, eu não vou aceitar.
— Hm, você pode considerar um empréstimo? – Sugeriu.
— Um empréstimo?
— Sim, o carro é meu e estou te emprestando. E você paga sua própria gasolina. E se quiser eu posso até cobrar umas parcelas pelo aluguel.
Ponderei a proposta. Eu não me sentiria mais tirando vantagem dele se tivesse que pagar, mas, por outro lado, os custos com gasolina e parcelas provavelmente me renderiam os mesmos gastos que pedir um Uber, no fim das contas.
Entramos no elevador que havia chegado no térreo, um de frente para o outro.
— Eu estou ouvindo o que está pensando, e a resposta é não.
— Está ouvindo?
— Sua cabeça está praticamente gritando: Uber!
Revirei os olhos, saindo do elevador e finalmente destrancando a porta para entrar em casa.
— No caso, acho que Uber vale mais a pena. Pode ficar com seu carro.
Niall colocou minha mala em um canto vindo até mim.
— Desculpa fazer isso sem te consultar. Achei que ficaria feliz com a surpresa.
Suspirei, passando a mão no cabelo dele.
— Não precisa se desculpar. Eu fiquei feliz, mesmo.
— Mas?
Sentei no encosto do sofá.
— Mas esse tipo de situação ainda é muito estranha para mim, Niall. Eu não posso aceitar qualquer coisa que não seja um presente normal. A gente se conhece a, sei lá, sete, oito meses?
Ele riu, sentando-se ao meu lado.
— Entendo.
— Só tenho medo de me acostumar com isso e... e acabar.
— Não tem porque acabar. Vamos ficar juntos enquanto formos felizes um com o outro. Não basta?
Bastava? Namorar seu ídolo de adolescência já era surto o suficiente, eu não podia esperar que a qualquer momento Niall Horan fosse me pedir em casamento, que futuramente compraríamos uma casa adorável no subúrbio de Londres quando as crianças viessem e ficássemos juntos para sempre. Eu não podia me permitir refletir sobre o quão real e sólido era nosso relacionamento, e se esse para sempre tinha mesmo possibilidade de existir. Éramos um casal recente, estávamos nos conhecendo e eu não fazia ideia do rumo que nossa relação estava tomando. Quando me lembrava que Niall morava em Londres, tudo piorava.
E isso levava a questão mais preocupante, de fato. Por quanto tempo iríamos durar? O que ia acontecer depois que ele terminasse de gravar o novo álbum? E porque nunca havíamos conversado sobre isso?
Percebi que Niall tinha razão. Ficaríamos juntos pelo tempo que fôssemos felizes assim.
Concluí que bastava.
— Basta sim, Niall. – Concordei. – E vou fingir que você não está me dando um carro só para eu não pegar mais caronas com Chase.
Disse a última parte só para provoca-lo, mas foi engraçado ver ele corando mesmo assim.
— Você sabe que eu jamais faria isso.
— Sei?
Ele balançou a cabeça, rindo, enquanto eu pedi um tempo para fazer toda minha higienização pós viagem, com direito a um banho revigorante e roupas quentes e confortáveis. Apesar da primavera se aproximando, o tempo ainda estava gelado, por isso escolhi uma calça de moletom e uma blusinha de manga longa. Já estava quase indo para a sala, quando retornei para o quarto para colocar uma meia também. Totalmente confortável.
— Sei que temos sido fiéis a Khalan nos últimos tempos, mas tomei a liberdade de pedir uma pizza, para variar. – Informou Niall do sofá, quando apareci na sala.
— Pizza. Legal. Bem americano. – Aprovei, me juntando a ele, que zapeava pelo serviço de streaming. – O que vamos assistir?
— Algo com muito sangue.
Fiz uma careta.
— Sério? Vai mesmo bancar de machão para cima de mim?
— Bancar de machão?
— É, até parece que você nunca assistiu um filme do Nicholas Sparks.
— Eu já assisti. – Retrucou. – Aos trailers.
Sorri, apoiando a cabeça em seu ombro.
— Ok, algo com muito sangue então.
Depois de um debate muito desnecessário sobre o Dwayne Johnson estar ou não muito gostoso em Skyscraper, Niall acabou decidindo que iríamos ver Deadpool 2, e eu não ousei fazer nenhum comentário sobre Ryan Reynalds ou o Senhor Ciumento acabaria desistindo de assistir esse também. Vinte minutos mais tarde, desci para pegar nossa pizza que havia chegado, me juntando a Niall no tapete para a sessão pipoca sem pipoca.
Quando o filme acabou, começamos a arrumar a bagunça que tínhamos feito com pizza, cobertas e farelos de um biscoito que encontrei no armário. Fiz um monólogo recheado de detalhes sobre meus dias em Nova York, aproveitando para comentar com Niall que Cristine amou conhecer os Jonas e curtiu muito fazer a entrevista com eles. Pensar no especial de dez anos me lembrou que haveria uma festa de comemoração.
— Niall. – Chamei, quando ele saiu do banheiro.
— Sim?
— Quero que venha comigo na festa de aniversário da PlayList. – Convidei. – Se quiser, é claro. E puder. Se a agenda estiver livre e...
— . – Interrompeu, sorrindo. – É claro que eu vou.
— Mesmo?
— Preciso ver com meus próprios olhos se toda a encheção de saco valeu a pena. Estou tão feliz que finalmente acabou!
Dei um soco no braço dele.
— É o trabalho da minha vida. Mostre algum respeito!
Niall me puxou para um abraço, rindo.
— Estou muito, muito orgulhoso de você, . O mundo inteiro vai saber quem você é, escreve o que eu estou falando.
Sorri contra o peito dele.
— Você sabe mesmo levantar a autoestima de uma mulher.
Ele deu de ombros.
— Um dos meus muitos talentos.
Niall se aproximou do armário do corredor para pegar o travesseiro e a coberta de sempre, mas eu o impedi.
— Pode abandonar o sofá desconfortável para sempre, Niall Horan. E abandone os quartos de hotel também. – Garanti, estendendo as mãos para o meu quarto de um jeito teatral. – Você é sempre bem-vindo para dormir aqui.
Ele colocou a mão no queixo, pensativo.
— E você, vai dormir aonde?
— Engraçadinho.
Não queria pensar que amanhã ele iria embora de novo. Não queria pensar em como a despedida será triste e que eu não tinha decidido se ficaria com aquele carro ou não. Só deitei nos braços do meu popstar favorito, desejando que essa noite em especial tivesse mais de mil horas.
Meu sorriso brotou na face quando reconheci o cabelo falho e grisalho do meu pai.
Apertei o botão que permitiria sua subida e fiquei de plantão na porta do apartamento esperando que ele chegasse.
— Pai! – Exclamei, quando ele apareceu.
Ele deu um sorriso cheio de pés de galinha.
— Oi, filhota.
— Como você está magro, pai, está comendo direito? – Questionei depois de abraça-lo, me lembrando do que ele tinha me dito no ano novo. Acho que ele se lembrou também, porque sorriu.
— É claro que sim.
— Sinto dizer, mas acho que acabei com todo seu sham... – Niall se interrompeu quando deu de cara com meu pai no meio da sala. E acho que vale a pena mencionar, ele não vestia nada a não ser uma frágil toalha ao redor da cintura. – Hãa, oi.
Meu pai achou graça. E para alguém que sentia tanto orgulho do seu abdômen, Niall estava bastante tímido.
— Presumo que seja o Niall. Muito prazer. – Disse meu pai, colocando as mãos no bolso e zero incomodado em conhecer meu namorado praticamente nu.
— Eu acho que vou... me vestir. Com licença.
— Eu gostei dele. – Aprovou meu pai, com uma piscadinha. Porque ele não podia ser um pai normal, meu Deus?
— Não que eu não esteja feliz, mas o que faz aqui? – Desconversei.
— Consulta com um cardiologista.
— Pai?
Ele ergueu as mãos.
— Está tudo bem, . – Garantiu. – É só acompanhamento depois do que aconteceu.
O encarei por cinco segundos antes de assentir.
— Tudo bem. Que bom que está se cuidando. E cadê a mamãe?
— Eu vim sozinho, ela ficou cuidando do jardim.
Dei risada.
— Conseguiram salvar alguma coisa naquele jardim?
— Ei, eu tentei, está bem? – Meu pai circulou pelo ambiente, parando ao lado do sofá, onde um cavalete desmontado abrigava a última pintura que eu tinha tentado fazer. – Ora, o que temos aqui?
Corei, encarando o quadro que tinha feito de Niall sem perceber, na época. Parecia que tinha sido há anos.
— O último. Perdi a prática.
Niall apareceu na sala no momento exato que meu pai ergueu o quadro.
— Desculpe, Sr. . Niall Horan, muito prazer. – Disse, erguendo a mão para o meu pai.
Mas o homem se deteve em encarar o quadro e Niall repetidas vezes. E riu.
— Agora eu entendi tudo. Por isso não queria me mostrar, hein?
Niall, desistindo do aperto de mão, veio até onde o meu pai estava, encarando o quadro.
— Foi você que pintou?
Assenti.
— Foi.
— E sou eu?
Corei ainda mais.
— É.
Meu pai olhou para Niall, estendendo o quadro para ele.
— Acho que deveria ficar com isso.
— Excelente ideia. – Concordou Niall, encantado, admirando a pintura. – Ninguém nunca tinha me pintado assim antes. Tem tanta paixão, vida e... amor. – Terminou, sussurrando.
Consegui dar um sorriso mínimo.
— Que bom que gostou.
Ficamos os três em um silêncio desconfortável por quase um minuto.
— Querem ir tomar café da manhã?
— Bom plano. – Disse meu pai, já se dirigindo para a porta.
Aproximei-me mais de Niall.
— Desculpe por isso, mas tenho que ir trocar de roupa. – Disse baixinho e escapei para o quarto.
Coloquei a primeira roupa que vi na frente, para não deixar o pobre Niall ainda mais desconfortável. Fomos para o Sweet Maple devagar, comigo sustentando a maior parte da conversa, para o alívio de ambos, e para nossa sorte o local ainda não estava muito cheio.
Niall e eu nos sentamos de frente para o meu pai, enquanto Malai vinha com o cardápio.
— Xruṇ s̄wạs̄di̒, Niall! – Disse ela a um Niall radiante ao meu lado por ter sido reconhecido. – Olá, . Quanto tempo, querida.
Sorri para ela, pegando o cardápio que tinha me oferecido apesar de já saber o que eu iria pedir.
Malai olhou para o meu pai por três segundos antes de apontar para um quadro atrás dela.
— Richard ! Que prazer tê-lo em nosso restaurante. Seja muito bem-vindo.
Meu pai agradeceu o carinho com um leve aceno de cabeça.
— Eu quem agradeço por ter a honra de decorar seu restaurante.
Meu pai, sempre tão humilde. Ao meu lado, Niall parecia confuso, olhando do meu pai para o quadro de Malai.
— Espera aí. – Pediu, olhando alguma coisa no celular, em seguida virando-se para mim. – Porque não me disse que seu pai era o Richard ?
Dei risada.
— Eu disse.
— Não, não disse. – Niall frisou, olhando para o meu pai de novo. – Eu tenho um quadro seu. Na minha casa. Eu tenho um quadro do pai da minha namorada na minha casa e nem sabia disso.
Richard deu risada, como se Niall tivesse acabado de contar a piada mais engraçada do mundo.
— Sou um sonhador, Horan. – Meu pai disse. – Tive muitos nãos até abrir minha galeria em San Diego.
— Só para depois fechar tudo e se mudar para o fim do mundo. – Completei.
— Não fala assim de El Monte. É uma cidade incrível.
— Pode ser. – Tentei ser educada. – Não tive a oportunidade de passear muito.
O resto do café da manhã se passou tranquilamente, Malai vindo até nossa mesa com intervalos de tempos curtos e bem desnecessários para verificar se precisávamos de alguma coisa. Correção: se meu pai precisava de alguma coisa.
Porque essa é a minha vida, aparentemente. Fui criada por um artista famoso por dezoito anos, só para seis anos depois me apaixonar por um popstar.
Carma? Sorte? Não saberia dizer.
No fim de tudo Malai não nos deixou pagar a conta e eu achei engraçado a fama local do meu pai, faziam muitos anos que não via isso acontecendo.
Meia hora depois, Niall e eu o acompanhamos até seu carro, onde ele se despediu e agradeceu ao café da manhã, finalmente voltando para El Monte.
— Mais uma da série: despedidas que eu não queria ter que lidar hoje. – Resmunguei.
— Não fica assim.
— Fácil falar. As pessoas que eu amo tem a tendência em morar em outras cidades. – Niall em LA, meus pais no fim do mundo, Harriet em San Diego.
Niall me abraçou no caminho para casa.
— Pelo menos você tem um namorado gatíssimo que pausa a agenda só para te ver.
— Um namorado exibidíssimo, talvez.
Uma vibração chata no meu bolso me fez erguer o celular.
— Tem certeza que quer ver isso agora? – Questionou.
Tinham várias notificações do Instagram, mas, para meu alívio, a fonte de vibrações eram as mensagens de Rachel.
Rachel
Podemos nos encontrar? 11:37
Eu vou ter esse bebê. 11:37
Preciso de toda ajuda que puder 11:37
É menina 😍❤️ 11:38
Sorri para o meu celular, encantada que no fim tudo se resolveu para ela.
— Rachel vai ter uma menina. – Anunciei, respondendo a ela que iria até sua casa assim que Niall fosse embora.
Quando aceitei entrevistar Niall Horan naquele dia eu não fazia ideia da sucessão de acontecimentos malucos que iria enfrentar dali para frente. Ser exposta na internet, ganhar popularidade na coluna a ponto de precisar de uma equipe, ganhar dinheiro extra por escrever colunas em uma revista em Nova York, ser fonte de críticas, ver minha melhor amiga amadurecer e se tornar mãe, fazer novos amigos, me conhecer melhor.
Não gostava de pensar que conhecer Niall era o responsável por toda a mudança na minha carreira e nas minhas relações pessoais. Não.
Eu gostava de pensar que era por causa dele que tudo isso acontecia. Querendo ou não, conhecer a Niall foi como conhecer a mim mesma.
E eu amava ele por isso.
Capítulo 20
Abandonando a tarefa de procurar o salto dourado que tinha usado no natal, encarei a barriga plana e chapada da minha amiga.
— Qual barriga?
Rachel revirou os olhos.
— Ninguém sabe que estou grávida ainda, preciso achar um pai para minha filha.
Eu dei risada, voltando a procurar o meu sapato.
— E o que vai dizer a ele quando o bebê nascer quatro meses antes?
— Eu me viro. – Falou, andando até mim. – Disfarça ou não?
— Rachel, desencana. Você ainda não tem nenhuma barriga.
Ignorando completamente minha opinião, ela foi até o espelho examinar sua silhueta, virando-se de um lado para o outro no espelho.
— Definitivamente não. – Concluiu, tirando o vestido e colocando o roupão, ao mesmo tempo que eu ia para a sala atrás da minha sapateira.
Rachel e eu estávamos no meu apartamento nos arrumando para a festa da PlayList, que aconteceria em pouco tempo. Eu não me arrumava com uma amiga provavelmente desde o ensino médio e, apesar de gostar de fazer isso sozinha, a presença de Rachel havia deixado tudo melhor.
O vestido que eu escolhi – ou seja, que Rachel escolheu para mim – era verde esmeralda completamente colado no corpo, moldando-se a curvas que eu nem sabia que tinha, e se abria em uma fenda até metade da minha coxa esquerda, com glitter em cada metro quadrado da peça. As alças eram finas e delicadas, contornando o vestido com um glorioso decote que deixava boa parte das minhas costas à mostra. Consegui combinar com vários acessórios dourados que me davam um ar de nobreza, e por isso era importante encontrar meu salto dourado. Rachel havia feito em mim uma maquiagem verde que achei que ficaria exagerada, mas ficou linda; a sombra escura ressaltou a cor dos meus olhos sem parecer artificial e, apesar de não ter o costume de usar cílios postiços, devo admitir que aquela maquiagem com certeza pedia. Eu fiz suaves ondas em meu cabelo e prendi só no topo. Acreditei que me sentiria mais à vontade com o cabelo solto para não parecer tão vulgar com toda aquela pele a mostra e estava certa.
Enquanto eu já estava quase pronta apenas procurando meu calçado, Rachel havia trago um total de seis vestidos de festa para meu apartamento pois ainda não tinha se decidido por nenhum deles. Seus longos cabelos escuros estavam cheios de bobes e ainda faltava passar o batom e colar seus cílios na maquiagem neutra que havia feito em si mesma.
— Rachel, se não se decidir logo, nós vamos nos atrasar. – Bufei, fechando minha sapateira e indo até o quarto atrás dela.
— Achou?
— Não. Talvez tenha deixado em Londres. – Murmurei, entristecida, abrindo a porta do meu guarda roupa mais uma vez. – E será que você pode se decidir? Eu juro que aquele violeta ficou lindo em você.
— E que tal esse? – Quis saber, estendendo um vestido azul royal longo diante de mim.
Analisei.
— É, acho que esse é mais bonito. Prova!
Ela me obedeceu, tirando o roupão mais uma vez.
— Eu vou me mudar. – Anunciou. – Me ajuda aqui?
Fui até ela, prendendo os botões e subindo o zíper.
— Para onde?
— Acho que vou ficar perto da minha mãe, talvez não seja boa ideia continuar morando lá agora. Quer dizer, vou ter um bebê.
Terminei o que estava fazendo antes de virar ela de frente para mim.
— Você pode morar comigo. – Ofereci, sincera. Eu queria ajuda-la.
Rachel sorriu, agradecida.
— Eu amei que você tenha oferecido, mas aqui só tem um quarto e eu não quero te sujeitar a ouvir choro de criança quando você ainda é tão nova.
Revirei os olhos.
— Você é apenas dois anos mais velha que eu.
— E isso faz toda a diferença. – Falou, dando uns passos para trás. – E então?
Sorri.
— É esse, Rach.
E era mesmo. O azul era de um tom tão bonito que fazia a pele dela brilhar e a saia rodada e brilhante de seda fazia Rachel parecer uma linda princesa indiana saída diretamente de um conto de fadas.
Rachel ficou tão feliz de ter encontrado um vestido que nem o tirou, completou a maquiagem apenas colocando o roupão por cima para não sujar.
Como uma última tentativa, resolvi investigar a mala que tinha levado para Londres.
Um sorriso apareceu em meu rosto quando encontrei o que procurava.
— Achou! – Comemorou Rachel, agora totalmente pronta, aparecendo na minha frente.
Radiante, tirei minha roupa sem graça para colocar o lindo vestido, que ficou tão perfeito quanto no dia em que eu comprei. Aproveitei para prender os acessórios e amarram o sapato, por fim aplicando o batom nude mais uma vez.
— Meu Deus, você está muito linda. – Murmurou Rachel, com admiração.
Me senti corar.
— Você está estonteante!
Uma vez prontas, corremos para fora do apartamento já que eu estava atrasada para buscar Niall no aeroporto. Seguimos para o carro que Niall havia dado para mim e Rachel me ajudou a colocar o endereço do aeroporto no GPS.
Bom, o carro. No fim das contas decidi ficar com ele. Niall e eu fizemos um acordo e eu garanti que pagaria pelo carro. E ele, na condição de “melhor namorado do mundo”, de acordo com ele mesmo, me deu cinquenta por cento de desconto e as parcelas que eu pagaria de aluguel na verdade vou pagar para comprar o veículo. Precisei concordar que a longo prazo vale mais a pena que pedir Uber para o resto da vida.
A festa aconteceria na recepção do W San Francisco e ficava perto de onde eu morava. Eu sabia que estava dando a maior volta do mundo para buscar Niall no aeroporto, mas não me importei e ele acabou concordando que preferia chegar na festa comigo.
Vinte minutos depois, cheguei na pequena rotatória da área de embarque e desembarque, onde ele disse que estaria. Avistei Niall superelegante em seu terno, com a gravata propositalmente do mesmo tom do verde do meu vestido e acenei para ele, estacionando em sua frente. Rachel aproveitou a deixa para sair do banco do passageiro e ir sentar-se no banco de trás. Apertei o botão do porta-malas para que ele pudesse colocar suas malas lá dentro e em seguida ele sentou-se ao meu lado, mas sem o sorriso que eu esperava.
O meu sumiu um pouco.
— Oi! – Falei, me inclinando para um beijo. O que recebi foi um estalo murcho e frio. – Aconteceu alguma coisa?
Niall suspirou, colocando o cinto de segurança, mas continuei parada.
— Não, tudo certo. – Ele disse, mas ainda estava com o semblante irritado. Olhei para o relógio. Tinha me atrasado cerca de quinze minutos.
— Niall, não parece estar tudo bem. – Insisti. Ele lançou um olhar nervoso para Rachel, que sabiamente estava se fingindo de surda naquele momento, e encostou a cabeça na poltrona do banco. – Fala comigo.
Uma buzina atrás de mim me lembrou que eu tinha que sair daquela área.
— É melhor a gente ir. – Ele disse, apenas.
Dei de ombros, imaginando que ele não iria falar nada naquele momento, e me pus a caminho do hotel. De acordo com o GPS que Rachel, mais uma vez, havia configurado enquanto eu dirigia, chegaríamos lá em quarenta minutos, cerca de uma hora depois do início da festa. Elegantemente atrasados.
Niall ficou cerca de vinte e seis minutos contados sem falar comigo, e eu sei disso porque ficava conferindo o relógio a todo momento.
— Fiquei te esperando um tempão. – Começou.
Lancei um olhar nervoso de relance para ele.
— Meu Deus, eu só me atrasei por quinze minutos. – Reclamei. – Eu perdi meu sapato e estava procurando. Sinto muito por ter demorado.
Ele deixou escapar um suspiro e balançou a cabeça, aproveitando o sinal vermelho para me dar um beijo de verdade na minha bochecha direita.
— Desculpa, acho que estou cansado.
Concordei.
— Tudo bem. Significa muito para mim você ter vindo mesmo assim.
Pelo canto do olho pude ver que ele sorriu.
— Foi por isso que eu vim.
O ar ficou mais leve e o caminho até o hotel prosseguiu sem problemas. Quando chegamos ao saguão, abandonamos o veículo, que seria estacionado pelo manobrista, e seguimos em direção ao salão de eventos. Uriah estava muito adulto em seu terno slim e fingi não perceber como seu rosto ficou vermelho quando viu Rachel. Parecia que ele estava ali justamente esperando por ela. A parte engraçada foi Rachel também ficar nervosa por ver ele ali.
— Uriah. Oi. Não esperava te ver aqui.
Apesar de nervoso, Uriah conseguiu sorrir.
— Bom, eu... eu trabalho aqui. Certo?
Rachel riu.
— Certo! Certo, claro.
Eu e Niall olhamos um para cara do outro tentando não rir, mas acho que fomos tão sutis que Uriah finalmente nos notou atrás de Rachel.
— , uau, você está linda. – Elogiou, virando-se para o meu namorado. – E você veio mesmo! Prazer em conhece-lo, Niall.
— Ouço coisas muito boas sobre você. – Niall disse, educado. – O prazer é meu.
— Hm, Niall, que tal procurarmos Olivia? Ela estava doida para te conhecer. – Falei, mesmo que tivesse acabado de inventar a história.
— Vou junto. – Anunciou Rachel, claramente não entendendo a deixa.
— Hm, porque não procuramos um lugar para sentar enquanto isso, Rachel? – Ofereceu Uriah.
Rachel concordou.
— Pode ser, boa ideia.
Os dois se afastaram, e toda a risada que segurei durante o diálogo mais esquisito da minha vida escapou, junto com a de Niall.
— Eles se pegaram. – Falei.
— Eles com certeza se pegaram.
— Provavelmente no escritório.
— Hm, acabei de imaginar uma cena. – Falou ele, parando de rir, com os olhos brilhando de desejo. – Bem que você poderia trabalhar até mais tarde um dia desses.
— Você é um pervertido.
— É, eu tento.
Apesar do bom-humor, eu sabia que alguma coisa ainda estava incomodando Niall, mas deixei para lá. Entramos no salão, decorado de maneira bem exagerada, o que eu sabia que era obra de Jesse, e só para contrariar Olivia. Ela era a fã número um do “menos é mais”. Leds nas cores rosa e roxo oscilavam de uma abertura no teto e um espelho tomava toda a parede do salão a esquerda, fazendo ele parecer muito maior do que de fato era. Havia um palco e uma pista de dança de tamanho médio a frente, e as mesas estavam abastecidas com um aparelho de jantar completo, com todos os três garfos.
— Quando disseram que a festa era formal não estavam brincando, não é? – Niall comentou, apontando para a mesa.
— ! – Escutei Chase me chamar antes que eu tivesse a chance de responder. Ele estava com um smoking azul marinho que destacava e muito seus olhos azuis.
Ele não tinha notado Niall, e percebi quando notou assim que seu sorriso vacilou um pouco.
— Boa noite, Chase! – Cumprimentei, enroscando meu braço no de Niall para ele se acalmar. – Niall, esse é meu chefe, Chase. Lembra dele?
— Chama o Collins pelo primeiro nome? – Niall disse, mas não olhou para mim ao perguntar, olhou para Chase. – Ah sim, ouvi dizer que ficaram bem íntimos. Rolou até beijo de língua.
Corei da ponta da unha do dedão do pé até a raiz dos meus cabelos.
— Niall! – Repreendi.
Chase fez uma careta.
— Bom, prazer em revê-lo. – Disse ele, tentando não se constranger.
— É, não posso dizer o mesmo. – Niall resmungou, debochado.
Dei um puxão em seu braço, mas ele deve ter se esquecido que eu existo.
— Niall, se controla!
— Esse cara é um idiota. – Niall sussurrou para mim, mas não se importou em baixar o volume de sua voz. Aparentemente a intenção era que Chase ouvisse mesmo.
— Niall, eu sinto muito que tenha dado alguma impressão ruim, mas...
— Sem problemas, Collins. Diz para teu irmão que eu mandei um ‘oi’. – Interrompeu, tirando meu braço do seu. – Vou beber alguma coisa, aproveite a companhia dele.
E. Simplesmente. Foi. Embora.
— O que foi isso? – Murmurei para mim mesma, vendo Niall se afastar, até olhar para os olhos gentis e preocupados de Chase. – Por favor, não me demite.
Chase, pela primeira vez na noite, riu, dando um gole na sua bebida.
— Eu não vou te demitir. Mas te aconselharia a trocar de namorado, de repente. – É claro que ele aconselha.
— Estou bem com o namorado atual, obrigada. – Falei, rindo. – Aconteceu alguma coisa entre vocês? Ele geralmente é ciumento, mas não assim.
Chase deu outro gole.
— Nada em especial, só nunca nos demos bem. Ele gosta bastante do meu irmão, mas nunca foi com a minha cara. Oliver adora ele. Queria poder dizer o mesmo.
Sorri.
— Te garanto que ele é incrível. – Meu sorriso bobo deve ter deixado Chase com náuseas, porque o gole foi maior dessa vez.
— Bom, antes de todo esse drama, e desde já desculpa atrapalhar sua festa, mas tenho um recado de Jesse.
— O que aconteceu?
O semblante dele ficou sério e eu fiquei apreensiva.
— A partir de segunda Jesse te quer no escritório de Nova York. Por dois meses. Aparentemente os diretores gostaram de você e queria que fizesse um treinamento com os colunistas de lá.
Eu tinha certeza absoluta que Jesse só fez isso para eu ficar o mais longe que eu pudesse da Califórnia, mas mesmo assim a raiva veio.
— Quem ele pensa que é? – Chiei. – Que inferno. Quem avisa na sexta à noite que você precisa mudar de cidade? Onde eu vou ficar?
Chase colocou as mãos nos bolsos.
— Bom, ele disse que era um problema seu.
— Ai, meu Deus!
— Mas, caso não se lembre, fui transferido de Nova York. Ainda não vendi meu apartamento, se quiser pode ficar lá.
Eu entendia até demais todo ataque de ciúmes de Niall. Então vamos lá. Tinha acabado de ver a parte mais feia de Niall ao vivo – o ciúme. Para depois meu chefe anunciar que eu tinha dois dias para me preparar para uma mudança que nunca pedi – para um estado a cinco mil quilômetros do homem que eu amava. Para então me dizer que eu não tinha nem casa onde ficar e, depois do meu choque, oferecer seu apartamento de graça.
— Eu não sei. – Falei, olhando para onde Niall tinha ido.
— Se serve de consolo, eu faço um contrato de locação. Você pode mudar as fechaduras e tudo. – Ofereceu, pegando outra taça quando um garçom passou por nós. Fiz o mesmo, só para ter uma desculpa para ficar sem responder.
Saboreei a bebida, que era doce e alcóolica, sentindo o olhar penetrante de Chase sobre mim. Eu sabia que era uma ideia ruim, mas como iria achar um lugar para morar em dois dias? Em contrapartida, sabia que Niall não gostaria nem um pouco desse plano, mas eu não podia depender de ele gostar de tudo que eu faço para sempre.
— Vou ficar em um hotel nessa semana. – Decidi. – E então vejo o que fazer a longo prazo. Muito obrigada por tentar resolver.
Ele sorriu.
— Aproveite a festa. – Falou, fazendo um brinde.
Festa? Eu ia atrás de Jesse Curtis para saber porque ele achou que seria uma boa ideia me tirar de São Francisco. Longe de Niall, de Rachel, dos meus pais, da minha vida chata, pacata e monótona, mas minha. Finalmente o achei, encarando o jardim do lado externo do salão.
Jesse usava terno todos os dias, então estava zero diferente do normal. Ele poderia ser bonito se não fosse tão idiota.
— Boa noite. – Anunciei. Minha expressão zangada deve ter sido boa, porque ele sorriu.
— Srta. . Está radiante. – Elogiou. Filho de uma puta. – Imagino que o Sr. Collins tenha passado meu recado.
— De fato, passou. Quero saber o motivo.
— Você é a nova estrela da PlayList, ninguém contou? – Anunciou, como quem informa a morte de alguém. – Seu showzinho na Seventeen nos colocou no topo. E agora Nova York e Seattle estão brigando por você. Deixei que Nova York a levasse. Já foi lá uma vez.
Não, ele fez isso porque Seattle ainda era perto demais. Perto demais. Nova York ficava do outro lado do país e pude ver pelo sorriso maquiavélico em seu rosto que ele sabia o que estava fazendo.
— E se eu não quiser ir? Posso me demitir. – Eu estava blefando e ele sabia. Mesmo assim se aproximou de mim, perto o bastante para me tocar, mas não o suficiente para alguém perceber alguma coisa errada. Puxou um calhamaço xerocado do terno, colocando em minha mão.
— Reconhece isso?
O conteúdo do que ele me mostrou me deixou lívida. Se não fosse o verde da minha maquiagem eu provavelmente seria feita de culpa e traição.
— Onde conseguiu isso? Estava...
— Na sua mesa. Para todo mundo ver. – Comentou. – Estava na sua mesa de trabalho e, portanto, não conta como objeto pessoal.
— Não estava, em momento nenhum eu tirei da bolsa.
Jesse suspirou, olhando para a mesa onde Niall estava com Rachel e Uriah e depois sorriu.
— Você é diabólica. Ele sabe porque ficou com ele? Sabe que você vai publicar isso?
— Eu jamais publicaria isso! – Quase gritei.
Jesse guardou o conteúdo novamente em seu terno, se afastando de mim.
— Se você não for para Nova York, vai publicar. Se você não fizer tudo que eu mandar, vai publicar. Simples assim.
— Ele não vai acreditar. – Falei, mais para as suas costas.
— Você não sabe, Srta. . – Falou. – Boa estadia, querida. – Disse educado, antes de se afastar.
Perdi o chão, esqueci meu nome e não podia acreditar que eu tinha deixado com que Jesse vencesse – de novo. Não podia acreditar que ele conseguiu mexer na minha bolsa, que ele usou aquelas mãos nojentas para investigar o que não lhe dizia respeito.
Ainda estava furiosa com Jesse, mas voltei para o salão a fim de conversar com Niall. A conversa parou no momento que aproximei deles.
— Niall, podemos conversar lá fora? – Chamei.
Ele deu um suspiro chateado e concordou, me seguindo para o jardim, do lado oposto de onde eu estava com Jesse.
— O que foi aquilo com Chase? – Perguntei.
— Eu não gosto de como ele te olha. – Foi tudo o que disse, enquanto se dirigia para um banquinho desocupado na área externa.
— Isso não é motivo para tratar os outros sem educação! – Repreendi, depois suavizei a face. – Por favor, me conta o que tem de errado.
Sentei ao lado dele, cruzando minha perna por cima da fenda aberta.
— Tudo, , está tudo errado. – Começou. – Você nunca nem viu minha casa porque sua vida é em São Francisco. Sabíamos que não seria fácil, mas parece que só eu me esforço! Você nunca vai para lá, nunca me surpreende e nunca se importa em dividir esse fardo comigo. Sempre espera que eu venha até você. E estou exausto do trabalho, fiquei no estúdio o dia inteiro e vim direto para cá, e ainda tive que esperar quase vinte minutos até que fosse me buscar.
Fiquei quieta por um momento.
— Isso não é justo. Você sabe que seu trabalho é muito mais flexível que o meu.
— Até onde eu sei você tem folga aos finais de semana, coisa que nem eu tenho muitas vezes.
— Mas eu não sou rica, Niall Horan! Como espera que eu pegue um avião para Los Angeles toda semana? Nem todos nós ganhamos milhões por mês.
Ele bufou.
— Eu não ganho milhões por mês. O novo álbum está difícil.
— Meu Deus, você trabalha escrevendo umas músicas! Pode escrever essas músicas de qualquer lugar!
Foi a coisa errada a se dizer e quis recolher as palavras de volta no momento que elas deixaram minha boca.
— É isso que você acha que eu faço? Escrevo umas músicas? – Ele sorriu, sem humor nenhum, e sua expressão não me magoaria mais se eu tivesse dado um soco nele. – Minha vida não é só glamour, . Eu também tenho problemas. Tenho problemas com o álbum, tenho problemas com estresse, tenho problemas de família. Briguei com meu irmão ontem, você sabia? Claro que não, você só sabe falar de você, da PlayList e mais um pouco do quanto sua vida é absolutamente sem graça.
Nunca na minha vida me senti tão envergonhada. Ele estava completamente certo. Eu fazia isso. Acho que nunca nem o ouvi falando sobre a mãe, a não ser para me comparar com ela na primeira vez que a gente saiu, e não foi por ele ser misterioso nem nada, realmente parecia que eu não me importava.
— Desculpa eu ter dito aquilo. – Falei. – Você sabe que eu sou sua fã número um.
— Tudo bem.
— Você está magoado. – Constatei.
— Sim, muito.
— Me desculpa? Vou melhorar. Prometo. Vou me esforçar para ir para Los Angeles, vou até para a Irlanda se você quiser. Vou para onde você quiser. Não preciso ficar te esperando, Niall. Vamos nos encontrar, juntos. É assim que fazemos. Você me perdoa?
Nem eu mesma me perdoaria, mas Niall me surpreende fazendo que sim e beijando minha boca de uma maneira respeitosa. Não tinha como eu falar de Nova York agora e eu não sabia o que dizer, mas precisava ser logo.
— Eu perdoo se mudar de emprego. Não gosto do seu chefe.
Dei uma risada alta.
— Uma pena, terá que se contentar comigo nesse emprego mesmo.
Minha risada era superficial porque eu sabia que depois que ouvisse sobre Nova York, ele com certeza me arranjaria outro emprego.
Capítulo 21
Nova York era surreal de fantástica. Quem fosse para lá nunca mais pensaria em voltar. Na primeira semana me estressei com a moradia. Na segunda semana me adaptei com a moradia, um lugar simples, mas que conseguia pagar, porém me estressei com a seriedade da cidade, com os tons frios que coloriam as roupas dos transeuntes, com o sol primaveril tímido que não iluminava o suficiente, e com a comida.
Principalmente com a comida.
Mas depois de um mês no meu novo apartamento cinza e monótono comecei a gostar da vista da minha janela no Brooklyn. Comecei a gostar de tomar café todas as manhãs, e andar apressada pela calçada se tornou natural para mim. Gostei de caminhar pela cidade, e, se desconsiderar o cheiro, andar de metrô não era assim tão ruim.
Eu precisei de um mês para me apaixonar por Nova York. Ainda faltavam duas semanas para ir embora, porém já estava com saudades.
Niall não ficou feliz quando eu contei que precisaria me mudar por um tempo. Na verdade, foi o total oposto disso: ele ficou horas sem falar comigo. Mas depois ele mesmo conseguiu um apartamento para mim, o que considerei uma oferta de paz. Para não perder meu apartamento em São Francisco, Rachel se mudou para lá de forma permanente, para “treinar”, ou pelo menos era o que ela dizia.
Meu relacionamento com Niall era público, decidimos formalizar no meu Instagram quando ele veio para Nova York no final de abril, para o meu aniversário. Ficou por uma semana comigo e me levou para muitos lugares como a perfeita turista que eu era. Quando eu via ele dessa forma, feliz e leve, era quase possível esquecer o mar de distância que nos separava um do outro. Quase.
Da segunda vez que veio, ficou pouco mais de três dias e mal saímos do apartamento. Ele continuava tentando escrever suas músicas e eu não atrapalhava. Quando terminava alguma estrofe, cantava para mim com o violão que tinha trago consigo. Ele fez isso com umas três músicas, mas, mesmo que eu tenha dito que eram lindas, ele murmurava algo sobre não serem boas o bastante e descartava a letra. Até que fiz graça pedindo para ele se inspirar em mim para escrever e ele não riu.
Não toquei mais no assunto.
E agora, estava no UCSF Medical Center, em São Francisco, duas semanas antes do esperado, entrando na área cardiológica, onde meu pai havia sido internado.
Jesse Curtis não tinha deixado que eu viesse, mas não liguei para o que ele pensava porque Tom Von der Berg, o CEO da unidade de Nova York, havia permitido. Na verdade, ele havia exigido que eu viesse ver meu pai. Ao que parecia ele também me seguia no Instagram e estava ciente da situação no dia que divulguei sobre o estado de saúde dele.
Meu pai estava fraco havia dias, mesmo sendo acompanhado pelo cardiologista, até que em uma das consultas que fazia em São Francisco simplesmente não conseguiu ir embora. O médico dele, um homem que beirava os quarenta e poucos anos, Dr. Theodore Abraham, decidiu que interná-lo era a melhor opção.
Richard era tão teimoso que achou mesmo que eu não iria descobrir, mas graças a minha incrível tenacidade e capacidade de persuasão, minha mãe acabou me contando o ocorrido. E vim embora assim que soube.
Dei entrada na minha ficha de visitante, disse o nome do paciente e praticamente corri até o quarto onde ele estava. Quando entrei vi que ele estava acordado, mas levou o indicador a boca, pedindo silêncio.
Demorei um pouco para entender o motivo, até que vi minha mãe deitada sobre o colo dele, dormindo, enquanto ele, carinhosamente, lhe acariciava a cabeça.
— Ela não dormiu a noite toda. – Explicou, fazendo um gesto para que eu me aproximasse.
Cheguei perto dele, depositando um beijo em sua testa gelada.
— Como você está pai? – Quis saber, sentando-me em uma poltrona vaga próxima a janela.
Meu pai me encarou intensamente e eu tinha certeza de que ele responderia algo genérico como “estou bem”. Mas ao invés disso, falou:
— Cansado. Estou muito, muito cansado. – Murmurou, com um longo suspiro para dar ênfase as suas palavras. – Parece que... nada. Deixa para lá.
— Parece o que? Me fala.
Ele não me respondeu, continuou encarando minha mãe que dormia tranquilamente, enquanto duas lágrimas grossas escorriam pelas suas bochechas. Meu pai era um artista. Ele era sensível, conseguia interpretar coisas que ninguém mais conseguia, conseguia ver cores onde ninguém mais enxergava. Já vi meu pai explanando sua sensibilidade de forma adorável enquanto explicava seus quadros para os leigos que visitavam a galeria em San Diego, já vi meu pai ficar duas horas mexendo pacientemente potes de tinta só para que ficasse da cor exata do verde que ele precisava, já vi meu pai perder seu precioso tempo ajudando minha mãe a fazer coisas que não tinham nada a ver com seu trabalho, mas nunca, nunca mesmo, eu tinha visto meu pai chorar. Não assim.
— Pai?
— Sim.
— Me fala o que está acontecendo.
Ele olhou para mim, mas era como se não estivesse mais ali. O homem cheio de vida que eu conhecia tinha se perdido em parte do caminho e notei como ele estava realmente magro, os ossos do pescoço marcando toda sua mandíbula, as olheiras em formato de bolsas embaixo dos olhos e a pele cinza e os olhos opacos.
Era a imagem de alguém que desistiu e eu não suportava ver isso acontecendo. Não com o homem mais corajoso e otimista que eu conhecia.
— Eu estou perdendo, . – Sussurrou, voltando a fazer cafuné no rosto adormecido da esposa. – Eu sinto que estou forçando meu próprio coração a bater e isso me esgota. Eu queria ser forte, mas não consigo.
Ele não olhava para mim ao dizer isso.
— Pai. – Chamei. – Pai, você é forte. Você é a pessoa mais forte que conheço. Se tem alguém que pode fazer isso, esse alguém é você.
Os olhos castanhos do meu pai ficaram mais escuros quando ele chorou. Ele chorou de verdade. Em silêncio para não acordar minha mãe, mas chorou. Segurei sua mão porque em vinte e cinco anos eu nunca tinha visto meu pai chorar e não sabia o que fazer, mas ele segurou minha mão de um jeito forte.
— , estou muito doente. – Falou, dando um beijo na minha mão antes de soltá-la. – Apenas... apenas um transplante pode me salvar agora, filhota.
Fui para trás.
— Tudo bem, pai. Tudo bem. Eu ajudo. Eu vendo tudo que precisar, eu ajudo a pagar. – Exclamei, a voz subindo uma oitava. Droga, eu venderia até a mim mesma se isso ajudasse. – Eu tenho um dinheiro guardado, sei que não é muito, mas ajuda e te...
— . – Me interrompeu. – .
— O que?
— O problema não é o dinheiro.
Murchei. Se não era isso, era o que?
— Não?
Ele suspirou antes de dizer:
— Trinta e sete.
— Trinta e sete? Trinta e sete mil dólares? É o valor da cirurgia? Está barato não está?
Meu pai sacudiu a cabeça.
— Não, , trinta e sete pessoas. Trinta e sete pessoas na fila de um transplante. Como eu posso torcer para trinta e sete pessoas morrerem para que eu possa ter um coração? Como posso exigir que quase quarenta pessoas morram para que eu tenha a chance de viver um pouco mais?
E esse era meu pai. Altruísta até no único momento da sua vida que ele poderia ter sido egoísta.
— Você não estaria torcendo para as pessoas morrerem, pai. – Tentei argumentar. – Quer dizer, se chegar sua vez, você não vai querer?
Ele me olhou com seus olhos molhados mais uma vez.
— A espera é de dois anos. E eu não vou viver por mais dois anos. – Sentenciou. – Não com esse coração.
Eu estava chocada demais, triste demais e partida demais para responder de imediato, mas quando as palavras finalmente encontraram minha boca, minha mãe se levantou, assustada.
— Quem? – Perguntou, desorientada.
Sorri para ela.
— Oi, mãe.
Ela se levantou para vir até mim, tentando não chorar.
— Oi, querida. Seu pai... seu pai está bem, eu não disse? – Falou, rápido demais, se inclinando para um abraço. – Eu falei que ele estava.
Suspirei.
— Mãe, ele... ele já me contou.
Ela se interrompeu a centímetros do meu abraço, olhando para o meu pai antes de se virar para mim.
— Oh, . Oh, eu sinto muito.
Minha mãe finalmente colocou seu braço ao meu redor, e me permiti ser consolada por ela, por tudo que ela representava para mim. Em algum momento que não reparei ela nos guiou para onde meu pai chorava na cama, abraçando nós duas com os resquícios de força que ele ainda tinha. Eu não podia mensurar a ideia de que meu pai estava morrendo, não podia aceitar isso, assim como não podia aceitar não saber qual seria nosso último abraço em família.
E se esse fosse o último? E se a ceia de ano novo do ano passado fosse a última? E se meu último natal com ele já tivesse ocorrido e não soubesse disso?
Como eu poderia viver assim?
Uma vibração no meu celular me despertou do terror que estava vivendo.
@niallhoran
Deu tudo certo? Você está bem?
Estou mandando pelo instagram pq aqui não tem sinal
@
Oi, amor
Não está nada bem
Ele precisa de transplante
@niallhoran
Ah, não
Eu sinto mt,
@
Podemos conversar depois?
Preciso de vc mais tarde
@niallhoran
Me de uma boa razão para eu não ir até SF agora mesmo
De verdade
@
Não tenho nenhuma
Mas não precisa vir
Acho que preciso ficar sozinha
@niallhoran
Td bem
Até mais tarde, fica bem
Amo você
@
Amo você
Sequei os olhos, voltando para a poltrona que estava ocupando antes. Meus pais estavam abraçados silenciosamente enquanto eu falava com Niall e meu pai sorriu. Mas antes que ele pudesse falar o que estava pensando, meu celular começou a vibrar. Achando que era Niall, estava pronta para recusar, afinal ele sabia que eu estava com meus pais, mas era Rachel. Ela também sabia disso, por isso achei melhor atender.
— Oi, Rach.
—. – A voz dela soava urgente do outro lado da linha. – Sei que está de folga, mas acho que gostaria de saber.
— O que houve?
— Acabou de chegar dois policiais no escritório de Jesse. Estão lá dentro há uns dez minutos. Ouço gritos e ameaças e “vou chamar meu advogado”. – Ela suspirou. – Acho... eu acho que alguém processou ele.
Merda.
— Ok, Rachel, aguente firme que estou indo.
Desliguei e olhei para os meus pais, que me encaravam
— Já vai? – Minha mãe quis saber.
Levantei, pegando minha bolsa.
— Surgiu um problema no trabalho. – Olhei para o meu pai, indo até ele para beijá-lo no rosto. – Volto amanhã, está bem?
Ele concordou.
— Tudo bem.
Olhei para os meus pais da porta.
— Eu amo vocês.
Eles sorriram para mim.
— Nós te amamos, filhota. – Disse meu pai, sorrindo.
— Promete que vai estar aqui amanhã. Promete.
O sorriso dele vacilou um pouco, mas continuou lá.
— Eu prometo.
Quem sabe se eu o fizesse prometer ele conseguisse se segurar até receber um doador. Quem sabe se eu renovasse a promessa todos os dias ele não fosse embora. Quem sabe isso fosse o bastante. E, se não fosse o bastante, tinha que ser o suficiente.
Porque meu pai nunca quebrava promessas.
Como já estava no centro, cheguei a PlayList quinze minutos depois, a tempo de ver Rachel pulando na cadeira e Uriah cochichando ao seu lado.
Na verdade, todo mundo estava cochichando. Cada um parecia ter sua versão dos fatos e quando cheguei a minha mesa de costume, temporariamente ocupada por Cristine, a outra colunista, Rachel se levantou, vindo até mim.
— Está uma loucura. – Falou, me puxando com ela em direção a copa.
— O que aconteceu? – Ela continuou me puxando e só parou quando entrou na copa e fechou a porta. – Rachel?
Ela levou as mãos à barriga, algo que fazia quando se sentia insegura. Estava grávida de quase seis meses agora, e a barriga surgiu ainda no mês passado e do nada.
— Jesse foi processado. – Falou. – E está muito, muito bravo.
A porta se abriu, revelando Uriah, e Olivia e Chase vieram logo atrás dele.
— O que está acontecendo?
Olivia sorriu para mim. Desde o sucesso da minha coluna de especial de dez anos da PlayList acho que cresci no conceito dela.
— Nada com que precise se preocupar. – Garantiu. – Só queria saber se estava bem. Coisas estranhas aconteceram.
— Tipo o que?
Chase e Olivia se encararam, e até Uriah e Rachel ficaram quietos.
— Jesse usou recursos da empresa para que você ficasse em Nova York.
Fui para trás.
— O que? Ele pagou para me manter longe?
Chase assentiu.
— A secretária dele descobriu e contou para outra assistente. Começaram a conversar e descobriu que a assistente já tinha sido assediada por ele. No fim fizeram um processo coletivo no qual nove funcionárias declararam assédio. – Chase suspirou. – Talvez ele conseguisse se livrar de um. Mas de nove?
— Dez. – Falei.
Todos olharam para mim e me estiquei, incomodada.
— Isso não importa. O importante é que acabou. Certo? – Falei, encarando especialmente Olivia.
— Acabou, . Eles vão levar Jesse daqui e vai voltar tudo como sempre foi. A Billbord não se importa de não ter um representante aqui desde que continuemos seguindo as normas impostas. E depois desse escândalo eu duvido que eles queiram mandar mais alguém.
Fiquei triste com a possibilidade de Tom Von der Berg perder o emprego, porque na verdade ele era muito legal, mas logo me recompus.
Com a notícia do assédio e desvio de verba, talvez fosse o suficiente para manter Jesse longe. Eu sabia que se eu não tivesse provocado Jesse naquele dia, nada disso estaria acontecendo. Ele não teria colocado um alvo nas minhas costas e nem desviado dinheiro da revista.
Mas eu sabia que se não fosse o alvo nas minhas costas, Nadine nunca iria descobrir o desvio e esse processo coletivo nunca teria acontecido.
— Vamos voltar para o escritório. – Disse Olivia. – E para você dois. – Falou, apontando para Uriah e Rachel. – Depois temos que conversar. Não sei se o RH vai permitir que trabalhem juntos depois... disso. – Falou por fim, apontando para a barriga de Rachel.
Virei na direção dela, que arregalou os olhos para mim sem muita sutileza.
— Claro, Olivia.
Olivia e Chase nos deixaram e eu cruzei os braços, olhando para Rachel e Uriah.
— E então? – Questionei.
Rachel bufou.
— Minha mãe nunca me deixaria em paz se eu não dissesse quem era o pai do bebê. – Justificou-se.
Arregalei os olhos.
— E?
— E eu disse que Uriah era o pai do bebê. – Confessou, deixando Uriah com um sorriso enorme.
Encarei o rapaz.
— Você concordou com isso? Sabe que não é seu.
— Eu não ligo. – Disse. – Queria ajudar.
Era muita notícia para um dia só. Apertei a ponte do nariz.
— Olha só, não estou querendo ser rude nem nada, mas... Rachel você é indiana e Uriah, você é negro. O que vão dizer se o bebê nascer ruivo? Sabe, como o pai dele.
Rachel pensou.
— Uma deformação genética?
— Tenho certeza que vamos pensar em alguma coisa. – Disse Uriah.
Balancei a cabeça, saindo da copa. Estava fazendo uma nota mental para questionar Rachel sobre esse plano brilhante mais tarde, mas por ora, com a notícia sobre meu pai, o que Jesse tinha feito e o fato de ele ainda dispor do maior segredo da minha vida e estar prestes a revelar para o mundo, coloquei essa conversa no final da minha lista de prioridades.
E estava certa em fazer isso, porque quando abri meu e-mail mais tarde, tinha uma mensagem de Jesse, com um documento em formato word anexado.
Baixei o documento, onde estava escrito todas as palavras que Niall me disse aquele dia, do mesmíssimo jeito que eu tinha anotado em meu bloco de anotações quando fiquei entediada. Junto com o artigo tinham várias fotos do caderno, na minha própria caligrafia, para provar que tinha sido eu. Centralizado bem no centro do documento, li com um aperto no estômago:
escrito por
E no corpo do e-mail, logo acima do documento, a mensagem mais ardilosa que Jesse Curtis poderia escrever:
Você tem certeza de que vai publicar essa notícia, Srta. ?
Capítulo 22
O sábado incrível conhecendo a cidade, o show à noite, a live com os fãs no dia seguinte. Ah, foi incrível.
Niall estava rindo, mais confortável do que jamais pensei que estaria durante um talk show. Sua calça de alfaiataria cor-de-rosa era puro contraste com o fundo azul do cenário e o sofá marrom onde estava sentado. A camisa branca sem botões o vestia perfeitamente, e dei uma risadinha interna do meu lugar na plateia ao encarar meu vestido: rosa e branco. Ele disse que seria legal se a gente fosse combinando, já que o apresentador faria a pergunta que todos queriam perguntar. Quem diria que Niall Horan fosse tão brega namorando.
Apesar de sim, nosso relacionamento ser público e o mundo inteiro nos ter visto nos braços um do outro, em nenhum momento dizemos com as palavras “estamos namorando”. Nem mesmo um para o outro. Simplesmente nos deixamos levar sem rótulos e agora nos encontrávamos diante dessa situação peculiar.
Não que fôssemos negar. Seria estúpido fazer isso.
— Niall, temos uma matéria sobre Hailee, aqui. – Ia dizendo Jimmy Fallon.
Niall revirou os olhos.
— Achei que a gente já tinha superado essa fase.
Jimmy deu de ombros, colocando a matéria no telão.
— A gente com certeza superou, mas será que ela superou?
A matéria dizia:
”Nada de namorar mais narcisistas”
— Você se acha narcisista, Niall? – Perguntou, com um sorriso debochado de quem garante que a pergunta não é séria.
— Tenho certeza que não.
— Qualquer narcisista diria isso!
Eles riram, e Niall passou a mão pelo cabelo, esquecendo totalmente do penteado que tinha demorado horas para ser feito. Acho que ele se lembrou, porque afofou o topete e, infelizmente para ele, o gesto não passou despercebido para o apresentador.
— Ah, olha isso, arrumando o cabelo.
— Eu sou apenas vaidoso. – Defendeu-se o loiro, mas de onde eu estava conseguia ver um par de bochechas irlandesas coradas.
E, não mais que de repente, o olhar de Jimmy encontrou o meu.
Oh, não.
— Não tem ninguém mais sincero que uma namorada. – Pontou, gesticulando para mim. – É sua namorada, certo? – Acrescentou, para Niall.
Ele piscou para mim, se arrumando na cadeira.
— Óbvio.
— Diga-me, , e a propósito sou seu fã, você acha que essa matéria é sobre ele?
Dei risada, segurando com força o microfone que colocaram na minha mão.
— Como eu poderia saber? – Respondi, nervosa, fazendo Jimmy balançar a cabeça.
— De um jornalista para o outro, de repente?
— É mesmo meu fã! – Brinquei.
— Claro, até te sigo no Instragram. – Ele seguia mesmo. Eu chequei depois.
Eu faria outra gracinha para o foco sair de mim, mas por trás do tom de zombaria de Jimmy e do sorriso tranquilo de Niall, percebi que eles queriam mesmo saber. Jimmy, pelo entretenimento e Niall... porque aquilo era totalmente sobre ele e seu caráter.
É possível ser individualista e ainda ser generoso e colocar outra pessoa como prioridade, e era isso que ele fazia. Perdi as contas de quantas vezes Niall viajou de avião para me ver, atravessando a Califórnia só para que minha rotina se alterasse o mínimo possível. Ou de quando, mesmo nitidamente cansado, ele me ligava e a gente conversava por horas, ou quando sempre me dava preferência para escolher o que iríamos comer.
Niall não era narcisista, estava muito longe disso.
Sorri antes de falar.
— Não parece ser sobre ele. – Disse, convicta.
Jimmy cruzou os braços de maneira exagerada.
— Porque? Porque acha isso?
— Porque qualquer pessoa que fale isso sobre Niall, simplesmente não o conhece. – Respondi sem nem pensar. O sorriso de Niall ficou ainda mais terno e a mesma pessoa que colocou o microfone nas minhas mãos veio retirá-lo. Graças a Deus meus cinco minutos de fama tinham acabado.
— Depois dessa resposta, acho que nunca mais ninguém vai citar a Hailee para você.
Eu ri, e Niall balançou a cabeça e apoiou a cabeça nos cotovelos, curvando-se para frente.
— Espero que não.
O resto da entrevista se passou sem problemas, e pude notar que ele estava realmente à vontade e se divertindo. Era de longe a versão de Niall que eu mais gostava.
Após o final do programa, Niall me levou para uma boate em Los Angeles, me apresentando a vários de seus amigos. Não conhecia nenhum deles e esqueci seus nomes assim que foram pronunciados, mas foi divertido da mesma maneira. Bebi mais do que deveria, revelando para Niall a baladeira que sempre existiu dentro de mim. Como estava dirigindo, ele mesmo permaneceu sóbrio, o que deu a ele tempo de tirar muitas fotos absolutamente horrorosas que fizeram eu me arrepender de existir quando as vi na manhã seguinte.
Quando acordamos, fizemos uma live no Instagram, respondendo às perguntas mais idiotas que encontrávamos no bate papo. Com o passar do tempo, aparentemente se tornou um jogo, e vencia quem dava a pior resposta possível.
— Kiera Storm quer saber: , você já nadou pelada? – Leu Niall em voz alta.
Gargalhei.
— Sim, já nadei pelada... com o Niall!
Esperamos três segundos até o bate papo se encher de “OMG”, “ISSO É VERDADE?” e “ QUANDO FOI ISSO?”, enquanto ríamos para a tela. Obviamente eu nunca tinha feito isso, mas foi engraçado e divertido fingir que sim.
— É verdade, estávamos no meu iate e eu sugeri que a gente desse um mergulho. Mas estava sem roupa de banho...
— Ele simplesmente sugeriu que eu entrasse nua, achando que eu não ia aceitar.
— Mas ela aceitou! – Ele gritou para a câmera, fazendo uma cara muito exagerada como se admirasse minha coragem.
— Aceitei e foi ótimo.
Niall me cutucou.
— , você não está contando a melhor parte.
Eu não consegui pensar em nenhuma história, então cutuquei ele de volta.
— Ah, conta você.
Niall segurou uma risada.
— Estávamos nadando pelados e felizes quando... eles chegaram. Wen está perguntando se a polícia chegou. – Niall riu, forçado. – Não, Wen, foram os... tubarões.
— Sim, nadamos pelados com os tubarões! – Confirmei, mas não me aguentei e comecei a rir por causa dos comentários desesperados, desmentindo toda nossa história com o ato. – Não, Kiera Storm, eu nunca nadei pelada e nem pretendo. – Acrescentei, olhando para Niall, que sorriu.
— Riley pergunta: Niall já disse que te ama?
Niall olhou para mim, terno. Ele não teria lido essa pergunta se não quisesse que eu a respondesse. E, pelo visto, esse parecia ser o fim do jogo, porque eu não conseguia me ver mentindo sobre isso.
— Sim. Ele disse. – Confirmei, mas olhando para ele. – Vou manter os detalhes dessa história conosco, por enquanto.
— Eu te amo, . – Ele disse, me fazendo corar.
O surto nos comentários foi catastrófico demais para acompanhar, então eu desisti.
— Gigi Hold sugere que eu a peça em casamento, . Olha! – Niall me apontou um comentário “POR FAVOR, APENAS SE CASEM”, e eu ri de maneira educada. Niall se levantou, ficando de joelhos e olhando no fundo dos meus olhos.
Eu não sabia como dizer para ele que não queria que ele brincasse com uma coisa dessas, então só sorri.
— Niall.
— . – Pelo canto do olho as pessoas continuavam com o “AI MEU DEUS VAI ACONTECER?????”. – Você aceita... encerrar essa live agora mesmo para nossa despedida de domingo?
Gargalhei, e aproveitei que Niall ficou em pé para pular no colo dele.
— Oh, sim, sim, mil vezes siiiim!
Ele me colocou no chão, pegando a câmera do tripé.
— Agora vamos nos despedir que tem uma longa jornada até São Francisco.
Fiz um biquinho chateado.
— Até mais!
Niall desligou o celular, o fantasma de seu sorriso ainda brincando em seus lábios.
— Eu queria ter te encontrado antes.
— Como assim?
Ele deu de ombros.
— É só mais legal fazer isso quando você está junto. – Respondeu, apontando para o celular. – Deixa as coisas mais leves. Na verdade, eu não tinha feito uma live tão legal há anos.
— Não tem como isso ser verdade.
— Mas é. Geralmente eu abro a câmera e fico só cantarolando, não tenho coragem de ler as perguntas. E, geralmente, a música basta para eles.
— Mas não para você. – Completei.
— Não para mim. – Niall sentou no sofá, me puxando para que eu me sentasse no espaço vazio entre as pernas dele. Colocou sua cabeça na curva do meu pescoço, inalando o cheiro. – Até começar essa live eu sempre soube que tinha uma coisa faltando, só não sabia o que era.
— E descobriu?
Ele me abraçou forte, os lábios chegando perto do meu ouvido.
— Você. Faltava você.
Sorri, me virando para que pudesse ver seu rosto.
— Você é incrível, Niall. Eu amo você.
Não entendia como eu realmente podia amar uma pessoa que eu conhecia há tão pouco tempo, nem quando esse sentimento ficou tão forte. Não entendia como minha vida deu essa guinada e Niall Horan acabou se tornando a primeira pessoa pela qual me apaixonei e o único homem que amei na vida.
Sei que já o amava antes de conhece-lo. Sei como soa estranho dizer que o conheço há pouco tempo sendo que faziam pelo menos nove anos que eu descobri sobre sua existência na Terra.
Mas o amor que sinto agora é diferente. Ele se tornou real, e era tão firme e tão sólido que eu quase podia tocá-lo.
Foi difícil me separar de Niall no domingo à noite, quando ele me acompanhou até o aeroporto. Dois dias se passavam muito depressa e eu não fazia ideia de quando seria nosso próximo encontro. Ele tinha começado a gravar as músicas do novo álbum e sua agenda estava uma completa bagunça. Nossa conexão, apesar do cansaço, se renovava todas as vezes que a gente se via, mas não era o suficiente, nem de longe. Chorei o caminho todo de Los Angeles a São Francisco, e estava me segurando para não chorar agora, quando fui forçada a encarar a realidade.
Advogados da PlayList discutindo com o advogado de Jesse Curtis, que nem deveria estar ali, Olivia tentando acalmar os dois lados e Chase acudindo uma sôfrega Nadine, a secretária que começou com os processos, do ódio que exalava de Jesse. Uma grávida Rachel sendo forçada por Uriah a permanecer no lugar e pelo menos vinte pessoas ao redor da mesa de Olivia, tentando assistir aquele circo.
Depois do episódio do processo de Jesse, ele recorreu. Disse que foi ameaçado e que nada daquilo era verdade, que as mulheres que o processaram se juntaram para prestar essa alegação apenas porque não concordavam com a maneira que ele geria o espaço. E foi além: informou que as mulheres fizeram isso sob o pedido de Olivia e que eu tinha sido a principal editora do plano, tendo todos os motivos para isso, uma vez que tinha sido “banida” para Nova York.
As alegações eram tão absurdas que os advogados da PlayList tiveram que intervir. Jesse estava nervoso, mas isso não o impedia de usar sua arrogância para esconder que ele sabia que tinha perdido.
Quando Olivia conseguiu se fazer ouvir, encaminhou os advogados da PlayList, Jesse e seu advogado para uma sala de reuniões mais privativa, Chase levou Nadine para beber uma água e eu fiquei onde estava, tentando captar qualquer coisa pela parede de vidro da sala de reuniões.
— Era típico dele fazer alguma coisa assim. – Resmungou Rachel. – Ele destruiu toda a animação para o chá de bebê.
— Não destruiu, nada. – Uriah interveio. – Nosso bebê é que vai salvar o dia, você vai ver.
Não deixei passar o uso do pronome no plural, arqueando as sobrancelhas para Rachel.
— Deixa isso pra lá, . – Falou, fazendo um gesto de desprezo com as mãos.
Cruzei os braços, me lembrando do nervosismo deles um com o outro no dia da festa da PlayList.
— Qual é, vocês estão tipo, ficando?
— Não! – Rachel gritou, mas Uriah disse “Sim”, ao mesmo tempo.
Olhei de um para o outro.
— E então?
— Talvez? – Rachel respirou fundo. – Olha eu não sei o que está acontecendo, estou grávida e ele me deixa confusa.
— Eu não quero te deixar confusa. – Uriah disse, afagando as costas dela.
— Você claramente espera que formemos uma grande família feliz e ainda não sei como me sinto sobre isso.
Para minha surpresa, Uriah sorriu, compreensivo.
— Sem pressão, Rach. Me avise quando souber.
Acho que deixou Rachel surpresa também, porque ela piscou umas três vezes antes de responder, gaguejando:
— É, sim, claro. Obrigada.
Uriah apertou a mão dela, dando a deixa de que iria pegar um copo de água para ela. Ambas acompanhamos ele saindo em direção à copa, e me virei de volta para Rachel, assoviando.
— Se você não se casar com aquele homem, eu caso.
Ela riu, abraçando a barriga.
— Ele é bom pra mim. Mas ainda é tudo muito recente. Não quero depender de homem nenhum.
Fixei meu olhar nela.
— Você sabe que eu estou aqui, sempre que precisar. Certo?
— Eu sei, .
— E você pode continuar na minha casa pelo tempo que quiser.
Rachel corou.
— Sobre isso...
— O que foi?
— Me senti muito culpada fazendo você dormir no sofá da sua própria casa. Por isso... consegui alugar um apartamento aqui perto. Espero que não fique chateada.
Tínhamos passado boa parte de uma noite planejando a reorganização dos móveis para que ela pudesse alocar um berço e uma cômoda pequena e, devo confessar, meu coração ficou muito ansioso para receber um bebê no meu dia a dia. Por mais que tenha demonstrado minha infelicidade por não morar mais com o bebê, jamais ficaria chateada com a independência da minha amiga.
— Rach, jamais ficaria chateada. Estou feliz por você, sério! Ajudo da maneira que puder!
— É por isso que você já é a melhor madrinha do mundo!
Sorri, me aproximando para um abraço.
Eu já tinha até esquecido o que nos tinha levado aquele assunto, quando Olivia nos interrompeu.
— . Se importa de vir aqui um minuto?
Dei um sorriso para Rachel e acompanhei Olivia através de um longo corredor, com salas de reunião que eu nunca tinha conhecido.
— Harvey, o advogado de Jesse, quer conversar com todas as mulheres do prédio em particular. É sua vez, .
Ela tinha uma expressão quase culpada em sua face, mas assenti, entrando na sala.
Harvey me aguardava sentando em uma mesa de oito lugares, com um sorriso que deveria ser tranquilo, mas para meus olhos atentos parecia extremamente ensaiado. Ele deveria estar na casa do quarenta e tinha uma aparência ordinária, mas seu charme deveria trabalhar muito em seu favor, porque sorriu cordialmente na esperança que eu me desarmasse do que quer que fosse.
Mas não funcionou, e ele percebeu, pigarreando ao estender a mão para mim.
— Muito prazer, Srta. , sou Harvey, representante de Jesse Curtis e gostaria de fazer algumas perguntas.
Arqueei as sobrancelhas.
— Sou obrigada a responde-las sem meu próprio advogado?
— Não, mas seria importante para o caso se respondesse.
— Importante para o caso a favor que você está construindo? – Ri, debochada. – Me resguardo.
Harvey torceu os lábios, mas não insistiu. Retirou um papel de uma pasta que estava em cima da mesa, entregando para mim.
— Sem problemas. Basta assinar esse termo então, Srta. .
Franzi o cenho, balançando o conteúdo do papel para o advogado que aguardava, ansioso.
— Está de sacanagem? Quantas mulheres você fez assinar essa porcaria?
— Todas. – Disse, de imediato.
— Ai, meu Deus. Isso é inacreditável!
— Srta. , você está perdendo o controle. – Começou Harvey, tentando, de um jeito péssimo, me acalmar.
— É claro que estou perdendo o controle!
— Eu disse que tinha algumas perguntas, era só respondê-las! – Tentou defender-se, exasperado.
— E então no lugar disso você me pede para assinar um termo onde eu dou ciência de que nunca fui assediada por Jesse Curtis sob nenhuma circunstância?
— Você foi?
Respirei fundo, abaixando o papel.
— Quantas?
Ele ficou confuso.
— Quantas o que?
— Quantas delas assinaram? – Harvey prendeu seu olhar no meu, tentando ver se eu estava blefando ou se cederia. Ele cruzou as pernas debaixo da mesa, me analisando com sua face de arrogância. – Quantas?
— Todas elas, Srta. .
Assenti, me levantando e levando o papel comigo.
— Onde está indo? Isso é confidencial.
— E ilegal também, imagino. – Só imaginava mesmo, eu não fazia ideia do que estava falando.
Saí andando pelo corredor, avistando Olivia na porta que dava acesso ás baias.
— Você assinou isso?
Ela negou.
— Respondi as perguntas. – Bufei, passando por ela. – , o que você vai fazer?
Só continuei seguindo em frente.
— Algo que eu com certeza vou me arrepender. – Murmurei, mais para mim mesma.
Avistei Uriah, que era o mais próximo de mim, e pedi sua cadeira emprestada.
— Atenção a todos! – Gritei, chamando atenção de todos e usando o resto do bom senso que tinha me restado. Uma justa causa vinha a caminho, mas quem ligava? – Atenção!
As pessoas pararam o que estavam fazendo aos poucos para olharem para mim, e a adrenalina de ser justa era tão forte que nem me deu tempo de sentir vergonha ou timidez.
— Quantas mulheres aqui já conversaram a sós com Jesse Curtis? – Perguntei. Algumas mulheres levantaram as mãos, tímidas, outras com mais convicção, mas era impossível que somente aquelas mulheres tivessem tido contato com ele. Suspirei. – Sei que estão assustadas, mas isso é importante. Quem mais?
Encorajadas umas pelas outras, mais mulheres começaram a erguer as mãos. Rachel, entendendo a deixa, contou as mãos levantadas.
— Das que levantaram as mãos, quantas foram assediadas de alguma forma?
As mãos se abaixaram rapidamente e não voltaram a subir. Até mesmo as autoras do processo se mantiveram inertes, o que não foi bom para mim e vi isso no rosto presunçoso de Jesse, ao aparecer na porta para avaliar minha pequena manifestação.
— Eu fui conversar com Jesse algumas vezes. E em todas elas sofri assédio, se não sexual, moral. Esse tipo de conduta é errado. Pior que isso, me fizeram assinar um termo dizendo que eu nunca fui assediada. Mas sabe do que mais? – Rasguei o termo no meio, escutando alguns suspiros espantados. – Não vou colaborar com uma mentira. Eu fui assediada, e lugar de assediador é na cadeia. Vocês vão colaborar?
Uma a uma, as mãos foram para o ar. Vinte e três. Contamos vinte e três mãos no alto, o que foi assustador. Como um cara seguiu impune por tanto tempo depois de vinte e três mãos serem expostas dessa forma?
Jesse estava nervoso, mas nem um pouco preocupado. Me olhava com tanto ódio que se tivesse algum poder ele poderia me rasgar de dentro para fora.
— Sejam fortes. Não assinem nada, não respondam nenhuma pergunta. – Olhei para Jesse e Harvey. – Não vou assinar.
Desci da cadeira antes que um verdadeiro tumulto começasse. As mulheres que não tinham passado por isso acolhiam as demais, algumas que já tinham assinado o termo pediam os dela de volta e Harvey não teve outra saída a não ser rasgar todos.
No meio da confusão, não vi Jesse chegando perto de mim.
— Você não deveria ter feito isso. – Disse, baixo e ameaçador. – Eu te avisei, .
E se foi em direção ao elevador, com Harvey em seu encalço.
Não consegui pensar em mais nada porque com toda a euforia daquela noite Rachel acabou adiando o chá de bebê para o dia seguinte e Olivia liberou todo mundo para casa.
Com isso, eu e ela nos preparamos para irmos embora, agora que morávamos juntas, mas Rachel aparentemente tinha outros planos.
— Fiquei pensando no que Uriah disse e acho que devia só seguir, não ficar pensando muito. – Ela disse.
— O que isso significa?
Rach sorriu.
— Nada demais. Ele me chamou para jantar agora, então te vejo mais tarde.
Uriah apareceu atrás dela, com a jaqueta pendurada no ombro.
— Pode vir também se quiser, !
Neguei.
— Estou exausta, vou direto para casa. Mas divirtam-se!
Acenei para os dois e fui depressa em direção ao estacionamento onde meu carro estava.
A noite tinha sido um circo, mas pelo menos tinha acabado. No que eu pudesse frustrar Jesse, eu frustraria.
Mas eu jamais iria adivinhar, se tivessem me perguntado, que a frustrada seria eu. Na ânsia para proteger minha honra, acabei perdendo algo muito maior. A sensação de nó na garganta veio depois de ver as flores amassadas na entrada do prédio. O ódio impregnado na pétala pisada era visível em cada flor espalhada. Veio depois de vê-lo tão decepcionado, depois de ver que ele estava chorando, depois que eu desci do carro e senti meu coração se quebrando dentro de mim, bem ali na calçada.
O nó na garganta veio quando percebi o que tinha perdido.
Niall só pode olhar para mim, com tanto desdém, o celular aberto em uma página que eu não queria olhar, porque já sabia o que veria. E quando finalmente conseguiu dizer alguma coisa, a tristeza em sua voz era mais despedaçada que as pétalas a nossa volta.
— O que foi que você fez, ?
Capítulo 23
Desde quando eu tinha conhecido Niall Horan tínhamos passado por muita coisa, muitos momentos marcantes, muitos deles difíceis. Tinha a questão da minha fama não requisitada, que tinha chamado mais atenção do que eu precisava, nosso namoro a distância e toda a bagagem emocional que ainda não tínhamos dividido um com o outro.
Nosso caminho até ali tinha valido totalmente a pena, pelo menos para mim, então era quase impossível segurar as lágrimas vendo ele me olhar daquela maneira, tão desapontado.
— O que você fez, ? – Repetiu, a voz contida, calma e áspera. Teria sido melhor se ele estivesse gritando comigo, além de que o modo como ele usou meu nome inteiro me fez suspirar de frustração.
— Eu realmente sinto muito. – Comecei falando, tentando me aproximar. Niall, porém, deu um passo para trás, me fazendo recuar.
— Não, você não sente.
— Eu nunca quis que isso tivesse acontecido. – Tentei novamente. Ele riu, mas não era uma risada de bom humor.
— Ah, queria sim. Ou então não teria escrito isso.
— Era um caderno particular! Eu estava em Nova York entediada e sem nada para fazer, e em um momento de pura adrenalina me fantasiei escrevendo essa matéria só porque eu podia escrevê-la, só porque você foi incrível e confiou isso a mim! – Falei rapidamente, com medo que ele me interrompesse de novo. – Mas eu jamais publicaria isso! Não era para ninguém ter lido isso, Niall!
Meu popstar preferido balançou a cabeça.
— Isso não vem ao caso! – Retrucou. – Não era para ter documentado isso em lugar nenhum. Era o segredo mais bem guardado da minha carreira. Não apenas meu, mas um que envolve outras quatro pessoas, em especial uma.
Lembrei do título do texto que Jesse tinha me enviado no outro dia, algo como Zayn ter sido expulso da banda, e logo associei que a matéria divulgava a verdade sobre a saída de Zayn Malik da maior boyband dos últimos anos.
— Eu sinto muito. Não deveria ter escrito nada, mas, eu juro, nunca quis trair sua confiança.
Ele balançou a cabeça de novo, olhando para o chão.
— Era sobre isso o tempo todo, não era? Desde aquela primeira entrevista você só queria arrancar informações sobre a banda! Por isso se aproximou de mim, não foi? Para ganhar minha confiança.
Recuei como se tivesse levado um tapa.
— Agora você está sendo irracional! – Tentei argumentar. – Foi você que me procurou no Instagram, você que veio atrás de mim até São Francisco, você que me chamou para sair, você que me arrastou para a loucura da sua vida! Tudo que fiz foi me apaixonar por você, droga! Nunca quis nada de você, Niall, nunca!
Se ele tinha ouvido a razão na minha voz, não demonstrou. Niall se desvencilhou facilmente da minha mão que automaticamente tinha segurado o pulso dele, a expressão dura.
— Eu não devia ter confiado em você. Contar o maior segredo da minha vida para uma jornalista, onde eu estava com a cabeça! – Resmungou, puxando uns fios de cabelo.
Suspirei.
— Sei que está nervoso, mas te juro que não tive nada a ver com isso.
Ele riu de novo, uma risada feia e fria.
— Pelo amor de Deus! – Exclamou, apontando o celular na minha cara. – É a sua letra! São as suas anotações!
— Eu nunca disse que não tinha escrito isso. Inclusive admitir foi a primeira coisa que eu fiz. – Falei. – Só estou dizendo que não era do meu interesse ganhar dinheiro com isso.
— Ah, claro, porque sua revistinha não vai ganhar absolutamente nada por ter divulgado isso, não é mesmo?
E foi o pior momento possível para me lembrar que a reportagem, seja o que for, estaria associada a PlayList e no que isso poderia significar.
— A PlayList também não tem nada a ver com isso. Foi o Jesse, ele...
— Foi eles que publicaram, , tiveram tudo a ver com isso!
— Niall, você não entende! As coisas que posso perder com isso, eu..
— Perder? – Interrompeu, os olhos cintilando de mágoa. – Sou eu o grande perdedor do dia! Você ainda vai receber uma boa grana e ofertas de emprego por anos.
— Niall...
— Eles não vão sobreviver depois do processo que receberão.
Então era isso que significava.
— Por favor, Niall, não faz isso. Você vai acabar prejudicando pessoas inocentes.
— Eu? Eu vou prejudicar pessoas inocentes? Você está se ouvindo?
— O único que você poderia prejudicar é Jesse Curtis, quem publicou isso aqui! – Apontei para o celular dele, a tela já desligada, tentando inutilmente me fazer ser ouvida. – Mas ele não trabalha mais lá, então sim, pessoas totalmente inocentes! Isso pode até ser ruim para as negociações da PlayList com a Billboard!
Niall passou a mão pela cabeça, frustrado.
— Onde eu estava com a cabeça? – Resmungou de novo, quase para si mesmo.
— Não sei o que posso fazer para te provar que jamais faria isso. – Suspirei, sincera. – Eu sinto muito, Niall. De verdade. Mas não fui eu quem publicou isso.
Como se fosse possível, ele endureceu suas feições ainda mais, a mágoa dando espaço ao ódio que eu jamais imaginei que pudesse vir dele.
— Mas foi você quem escreveu. – Disse por fim, como se isso por si só fosse a única coisa responsável pela notícia que tinha vazado.
— Eu... – Me atrapalhei sob seu olhar austero. – Niall, eu nunca, jamais queria que tivessem encontrado isso. Por favor, eu...
Ele balançou a cabeça, o que por si só já me fez parar de falar, pegando o buquê de flores amassadas no chão.
O sorriso era tão estranho nele que fiquei com medo, de alguma forma, de ter quebrado Niall para sempre.
— Como posso acreditar em qualquer coisa que saia da sua boca agora, ?
Ao som do meu sobrenome, a primeira lágrima finalmente escapou dos meus olhos, mas eu mordi o lábio inferior, em uma tentativa idiota de controla-las.
— Sou a mesma de sempre.
Ele encarou as flores destruídas e eu aproveitei para sutilmente secar outra lágrima que escorreu sem a minha permissão.
— Eu sou a mesma de sempre, Niall! – Falei mais alto. – A mesma por quem você pegava o avião para atravessar o estado, a mesma por quem você se apaixonou! Ainda sou a mesma pessoa que te pintou em um quadro, aquela mesma garota que você levou para Londres e a mesma que beijou em uma praia deserta ao redor de uma fogueira. Niall, por favor. Eu ainda sou a mesma sobre quem você canta.
Ele demorou um pouco para responder, absorvendo minhas palavras. E quando falou de novo, desejei que não o tivesse feito.
— Eu não sei mais quem você é. Nem sei se eu te conheço. – Ele suspirou, me estendendo o buquê despedaçado.
Automaticamente estendi os braços para pegá-lo, e Niall colocou a mão no bolso.
— É para você. – Ele gesticulou para as flores murchas e sem vida. – Acho que ficaram mais parecidas com a sua personalidade agora.
Arfei, sem me importar mais em esconder que chorava.
— Niall...
Ele deu de ombros, indo na direção de seu carro de sempre.
— Tenho uma bagunça enorme para resolver. – Disse, de costas para mim. – Adeus, .
Ele abriu a porta do carro e foi tudo que ele precisou fazer para eu jogar as flores na calçada e ir até ele.
— Niall... popstar...
Ele se virou de supetão.
— Não me chama assim. – Pediu, antes de entrar no carro e fechar a porta, me deixando do lado de fora. Antes de arrancar com o carro, porém, abaixou o vidro para me encarar. – Nunca mais me chame assim.
Eu sabia que ele estava furioso, eu também estaria. Mas tinha certeza que estava mais magoado que qualquer coisa.
E o modo como consegui ver seus ombros chacoalhando enquanto ele partia me garantiu que ele se sentia tão miserável quanto eu, sozinha, no meio da calçada deserta.
Não precisa ser um super gênio para saber que eu não estava no menor clima de comemoração. Minutos depois de eu ter subido para meu apartamento e tomado um banho, Rachel chegou em casa, radiante de felicidade. Era um momento horrível para estragar a felicidade dela, mas eu não consegui esconder o que eu sentia e ela me fez contar tudo. Tínhamos ligado para Madie Scott, da Comunição I, naquela mesma hora e a equipe dela já estava trabalhando para solucionar o ocorrido o mais rápido possível. Fiquei quase uma hora no telefone com Olívia, que tentou a todo custo encontrar provas de que Jesse estava por trás disso, depois de eu explicar pelo menos três vezes como ele poderia ter tido acesso as minhas anotações. O problema durou quase a noite toda, então eu obviamente tive uma noite horrível e uma manhã pior ainda, principalmente depois de ter checado minhas redes sociais. Mesmo que a PlayList tirasse a notícia do ar, ela já tinha sido printada e estava sendo replicada em várias páginas de fofoca. Eu estava sendo citada em várias delas, com algumas fãs me acusando da mesmíssima coisa que Niall tinha dito.
Apesar disso tudo, eu respirei fundo e tentei com todas as minhas forças não demonstrar o quão arrasada estava perto de Rachel, especialmente porque ela estava animada com o chá de bebê.
— , eu não preciso de uma festa. – Disse Rachel pela terceira vez somente naquela manhã, enquanto eu a ajudava com os toques finais nas lembrancinhas que ela iria distribuir para os convidados. – De verdade.
— Precisa sim. – Retruquei. – Acho que uma festa é exatamente do que precisamos agora.
Na verdade, eu não pensava assim, mas se ficasse falando talvez uma hora eu mesma acreditasse nisso.
Rachel suspirou, interrompendo o laço cor-de-rosa que estava fazendo em uma das embalagens e me encarando, séria.
— Você nunca precisa fingir para mim, . Pode me dizer exatamente o que pensa, e eu nunca te julgaria.
Perdendo completamente a pose, assenti, minhas feições com certeza devem ter se esmaecido pois ela pareceu preocupada, porém aliviada.
— Só não sei como vou sair dessa. A gente terminou? Ele vai me processar? Até ontem a gente se amava, e agora? O que acontece?
Minha amiga terminou o lacinho antes de sair de trás da mesa e vir para o meu lado.
— Eu não sei, . Mas eu duvido que o amor por alguém suma da noite para o dia desse jeito.
— Some, se a pessoa em questão tiver feito algo imperdoável.
Ela concordou.
— Mas você não fez nada. Uma hora ele vai aceitar isso e vai voltar a falar com você. Na verdade... – Ela voltou para onde estava, me entregando meu celular. – Tenta ligar para ele, as vezes ele está mais calmo.
— Mas ainda faltam umas trinta lembrancinhas!
— Eu me viro por enquanto.
Concordei, pegando meu celular da mão dela e indo até meu quarto. Desbloqueei meu celular, indo até nossas mensagens e quase morrendo um pouco por dentro. As mensagens que mandei ontem ainda estavam lá, todas sem respostas, irrisórias e solitárias. Se ele não tinha nem me respondido uma mensagem de texto eu duvidava muito que fosse atender minha ligação, mas mesmo assim, tentei.
Tentei pelo menos três vezes, e todas foram para a caixa postal. Ele não queria falar comigo e, sendo honesta, eu em momento nenhum tinha me colocado do lado dele, para entender o que ele estava sentindo agora. Desde o começo do nosso relacionamento ele tinha sido muito discreto ao falar sobre a banda, provavelmente pensando exatamente nisso, no fato de eu ser uma agente de comunicação e trabalhar com o público mais jovem.
Me peguei recordando de todas as conversas onde questionava algo relacionado a banda e ele desconversava, ou quando entre uma risada e outra ele ficava sério e não me dizia qual era o motivo. Desconversava quando perguntava se ele não falava mais com os outros meninos e o porquê, e também quando quis saber se ele tinha ido no show de algum deles.
Depois me lembrei do dia que ele baixou completamente a guarda e me contou tudo que tinha sido forçado a guardar para si mesmo. Parte de mim acha que foi até um alívio poder compartilhar o segredo com alguém que não estava envolvido no assunto, e eu me senti tão feliz na época que nem me ocorreu refletir mais a fundo o que aquilo significava para o nosso relacionamento.
Aquela conversa foi o que mudou tudo. Depois daquele dia nos unimos de tal forma que não tínhamos mais filtros entre nós, e era tão bom estar em um relacionamento assim que nem tive tempo para a reflexão.
E eu só percebi isso depois que perdi tudo.
Decidi já trocar de roupa para o chá, que seria dali a uma hora e meia. Em homenagem ao bebê de Rachel, que era menina, decidi usar um vestididinho lilás florido e alegre, e prendi meu cabelo todo em um rabo de cavalo no alto. Completei com um par de brincos pequenos de strass e uma rasteirinha.
Me encarei no espelho e suspirei, frustrada, voltando para a cozinha, onde Rachel ainda estava embalando as lembrancinhas. Ela inclinou a cabeça, chateada.
— Nada?
Neguei.
— Caixa postal.
— Sinto muito, .
— Tudo bem, não é culpa sua. Falta muito? – Perguntei. – Posso terminar essas para você ir se arrumar.
Rachel deu de ombros.
— Já estou praticamente pronta, falta só meu vestido. Uriah vai pegá-lo na casa da minha mãe e levar para mim lá no salão.
Sorri de verdade pela primeira vez no dia.
— Falando em Uriah...
Ela gemeu.
— Não precisamos falar dele, .
Acho que ela estava com medo de me deixar magoada, o que era legal da parte dela, mas isso seria egoísmo da minha parte se não a ouvisse.
— Você me ouviu sobre meu problema com Niall, então quero receber notícias boas. – Abri os braços de um modo teatral, como se ela fosse fazer uma apresentação. – Me atualize sobre seu drama.
Terminamos uma lembrancinha ao mesmo tempo, nos esticando para pegar outra. Vi pelo canto dos olhos que só faltavam aquelas, e quando olhei para frente de novo, Rachel estava sorrindo.
— Está bem. – Comentou, se arrumando na cadeira. – Uriah tem vinte e três anos, e não vinte, como eu imaginei.
— Qual o seu problema com a idade?
— Agora, nenhum. Julguei Uriah muito mal, já namorei homens mais velhos que ele que não tinham nem metade da maturidade que ele demonstra.
— Ele parece ser realmente maduro. – Pontuei, tentando associar o comportamento profissional de Uriah a como ele se comportaria fora do ambiente de trabalho.
— Além de maduro ele tem uma inteligência emocional de outro mundo! Eu dei diversos foras nele antes de aceitar tomar um café porque não queria me relacionar com uma criança. – Rachel corou, terminando de amarrar sua lembrancinha antes de mim. – Mas mesmo que Uriah seja daquele jeito todo elétrico e divertido, quando estamos juntos eu que me sinto uma criança. O jeito como ele expressa suas opiniões, e o modo como me defendeu da minha mãe...
Arqueei a sobrancelha.
— Sabe, você nunca me contou como isso aconteceu. – Afirmei, colocando minha lembrancinha finalizada junto com as demais. – Como ele se tornou o pai do bebê, do nada.
— Ah. – Rachel corou de novo. – Bom, estávamos almoçando um dia, você já estava em Nova York, quando minha mãe apareceu no restaurante. Você conhece minha mãe. Logo saiu metralhando Uriah com todos os seus ideais conservadores, dizendo que ele era um patife e perguntando quando íamos nos casar.
— Ah, não. – Me solidarizei.
— Ah, sim! E antes mesmo que eu pudesse dizer que Uriah não tinha nada a ver com o bebê, ele disse para minha mãe que eu já era uma mulher independente e que tinha tudo sob controle. Disse que iria cuidar de mim muito bem, mas que ela não podia me forçar a casar. Nós duas ficamos encarando Uriah um tempão, e depois disso minha mãe virou a melhor amiga dele.
— Em momento nenhum ele afirmou que era o pai do bebê. – Observei.
— Mas não negou também. E minha mãe acha que ele é o pai, Uriah não se importa com isso, então começamos esse boato e agora todo mundo parece acreditar nisso.
— Rachel, vocês conversaram sobre isso?
— Muito. Nos dias que se passaram me senti super super mal pelo que tinha acontecido e disse para Uriah que falaria com minha mãe e que devia desculpas a ele, não consegui desmentir para minha mãe naquele dia porque fiquei com medo. Mas ele foi muito gentil, disse que se eu quisesse ele me ajudaria com o bebê e me deu tanto suporte emocional que eu chorei de verdade.
Sorri para ela.
— É realmente estranho o comportamento dele, se considerar a idade. Quer dizer, não é exatamente o sonho de todo homem ter filhos aos vinte e três anos. Mas fico feliz por você ter se encontrado nele.
Rachel sorriu, vindo me abraçar. Quando se afastou, seus olhos estavam pontilhados.
— Ele acabou se mostrando um ótimo colega de equipe, e me surpreendi quando notei que era meu amigo. Na verdade, o melhor amigo que já tive. – Ela colocou a mão na barriga. – E agora ele é algo muito maior que isso.
— Fico feliz por você ter seguido seu próprio conselho, Rach.
Nos levantamos da mesa, e eu fui arrumando as coisas que íamos levar para o salão enquanto Rachel terminava de se arrumar. Peguei o bolo que tínhamos comprado mais cedo naquele dia, e Rachel apareceu na cozinha já pegando a caixa com as lembrancinhas. Tínhamos separado um esmalte cor-de-rosa e uns docinhos dentro de cada saquinho e amarramos com fitinhas da mesma cor do esmalte, que seria entregue apenas para as mulheres. Tinha ficado muito fofo. Além disso, Rachel resgatou uma brincadeira antiga para entreter os convidados. Ela pegou meu cavalete de pintura e colocou um bloco de anotações gigante no lugar da tela. Com um canetão preto escreveu “Adivinhe meu nome”. A ideia era que os convidados tentassem adivinhar o nome da bebê, mas o bônus mais legal de todos era que todo mundo só iria descobrir no dia do nascimento.
Meu palpite: Rachel não fazia ideia de qual nome daria e inventou essa brincadeira só para ter opiniões. Ela negou.
Levei o bolo até a porta e o entreguei a Rachel, que o colocou dentro das caixas com as lembrancinhas. Em seguida voltei para pegar o cavalete e minha bolsa, antes de finalmente trancar a porta.
Durante o caminho a conversa permaneceu leve, e desviamos da nossa rota para buscarmos Olivia e sua filha, que iriam de carona conosco. Fiquei apreensiva quando vi Sabine, apesar de One Direction não ser da época dela, eu sabia que ela era super fã de Harry Styles e, por isso, conhecia a banda. Mas, para minha surpresa, a garota sorriu para mim, compreensiva, e isso foi o bastante para eu ter certeza que aquele dia seria bom.
E foi mesmo. Tinham facilmente umas cinquenta pessoas no salão, o que era um bom sinal, já que por causa da confusão de ontem com Jesse, a festa teve que ser remarcada às pressas e quase todo mundo compareceu. Eu me entrosei com uma das tias de Rachel de quem gostei muito, provavelmente porque era uma das únicas que nunca tinha ouvido falar de Niall Horan e nem de mim. Uriah foi levar o vestido de Rachel e acabou ficando para a festa. Sue apresentou seu “genro” para a família inteira e praticamente ouvi Rachel pensando que já era tarde demais para desmentir a história sobre o verdadeiro pai de sua filha.
Foi mesmo um dia incrível, Rachel abrindo os presentes, o cavalete com os nomes fez o maior sucesso e haviam até nomes masculinos por lá. Realmente me diverti apesar do meu estado de ânimo, mas lá pelo fim da festa, quando as pessoas começaram a ir embora e eu fiquei sozinha em um canto, me peguei pensando no que estava fazendo no sábado passado, há exatamente uma semana, todos os momentos bons convertidos em saudade no meu coração.
Como eu poderia ter imaginado a guinada que a minha vida daria em apenas sete dias?
Capítulo 24
- In Touch
e Niall Horan ainda estão juntos?”
- Ok!
Compromisso com a verdade: entenda o caso que chocou o país
- Time
Boatos sobre fim da banda One Direction são, enfim, negados por ex-integrante
- People
Um mês. Um mês sem respostas, um mês sem perdão, um mês sozinha, um mês sendo perseguida por todas as revistas estúpidas que existiam nos Estados Unidos.
— Só achei quatro! – Disse Rachel, otimista, encarando as revistas. – Sabe, estão diminuindo.
— Vão perder o interesse em você logo, . – Contribuiu Olivia, alisando minha mão de um jeito quase maternal.
Choraminguei na mesa onde estávamos, sem parecer nem um pouco adulta.
— As pessoas ainda me olham torto.
Olivia suspirou, balançando os longos cabelos enquanto me olhava, resignada.
— Vamos descobrir como Jesse fez isso, ok? – Prometeu.
— Sim e então poderá voltar para o escritório! – Rachel completou.
As duas me olhavam com pena e eu odiava isso.
— Não basta ter sido afastada do trabalho por algo que eu não fiz, ainda dependo de provas contra aquele babaca.
— Te prometo que tem um mundo de gente trabalhando nisso. – Olivia disse. – Tenha só mais um pouco de paciência.
Assenti, fulminando a capa das quatro revistas com o olhar. A verdade é que eu deveria ter sido demitida, mas Olivia conseguiu convencer os outros dois escritórios que eu não era culpada. Deram um prazo para que resolvêssemos a situação, mas já se passou um mês e não tínhamos conseguido nenhuma prova que pudesse me livrar dessa.
Minha sorte era a excelente gestão financeira que eu não tinha aprendido com o meu pai, então eu tinha uma reserva de emergências bem generosa e as contas seriam pagas. Se eu não recuperasse meu emprego logo, porém, talvez fosse a hora de desistir e começar a entregar currículos, começando tudo do zero.
Dando um grande adeus a carreira incrível que eu teria na PlayList se fosse até o final.
Só que eu não queria isso. Desde o primeiro dia naquele lugar eu luto para entregar o melhor de mim. Quando me colocaram sorrateiramente em uma coluna que ninguém mais queria escrever, quando me deram um quadro falido que quase não tinha mais solução nenhuma, quando por fim marcaram uma entrevista com Niall Horan, tudo mudou. A revista começou a receber acessos, conseguimos muitas entrevistas com grandes nomes e a minha reportagem em comemoração aos dez anos de revista foi um sucesso de vendas. Meu nome era citado em vários veículos de comunicação e nem em todas as notícias eu era namorada de Niall Horan. Era apenas . As pessoas analisavam meu estilo de roupas, faziam críticas sobre o modo como escrevia, compilavam meus “melhores cinco”, do tipo: cinco melhores colunas, cinco melhores frases, esse tipo de coisa.
Eu não tinha lidado muito bem com o afastamento, porque a PlayList, e principalmente a iTeen, eram a minha casa, minha carreira, eram meu tudo. Só percebi o que eu joguei fora ao entrar de cabeça em um relacionamento quando eu perdi tudo que tinha conquistado em tão pouco tempo.
Sim, talvez eu não tivesse conquistado nada disso sem o envolvimento de Niall. Talvez eu ainda estivesse na mesma. Quem sabe? Pelo menos eu ainda teria um emprego. Seria monótono, sem emoção e eu não teria destaque algum, muito menos uma equipe, mas no mínimo seria como era antes, um ano atrás.
Estava no Coffee Palace, era ali que me encontrava com Olivia e Rachel de vez em quando para elas me atualizarem sobre o caso. Às vezes Rachel almoçava comigo, as vezes eu almoçava sozinha, mas de qualquer forma achava legais esses encontros. Era uma forma de não pirar.
Depois de ajustarmos alguns pontos, Olivia e Rachel saíram, me deixando sozinha com meu copo de café intocado. Chateada, peguei meu celular para mandar uma mensagem para Niall.
Ele ainda não tinha me respondido, nenhuma delas, e um mês tinha se passado sem que eu tivesse qualquer resposta sua. Ele me odiava. Assisti duas entrevistas e li mais três onde ele me pintava como o monstro que eu já achava que era, o que me partia o coração. Mesmo sendo cruel, eu ainda achava nele um consolo que eu nunca tive antes, então sempre mandava mensagens. Se ele lia ou não, não saberia dizer. Visualizei a lista de mensagens que eu tinha mandado ao longo da semana, acrescentando as novidades recentes.
Rachel se mudou hoje – 14:33
Esse apartamento fica vazio sem ela – 14:33
Meu pai está muito mal, teve que ir para a UTI hoje, mas minha mãe disse que é só precaução – 23:19
Pelo menos ele já está em SF, caso precise de algo – 23:19
Estava bonito no programa hoje – 16:08
Acho que devíamos conversar como dois adultos, Niall – 18:08
Estou com saudades – 00:14
Niall, isso não é saudável, alguma hora você vai ter que falar comigo – 08:17
Te ouvi quando precisou – 08:17
O carro é meu mesmo? Ou você quer vir pegar de volta? De verdade, não ligo. 14:43
Meu pai ainda não desceu da UTI, se quer saber. Estou preocupada com ele, popstar – 22:01
Esqueci de contar – 09:50
Voltei a pintar esses dias. Decidi reproduzir um dos quadros mais famosos do meu pai para dar de presente para ele quando voltar da UTI – 09:50
Não vai ficar igual, mas acho que ele vai ficar feliz – 09:50
Fui visitar o apartamento novo da Rachel hoje – 12:31
Fiquei lá um tempo, já que não tenho um emprego – 12:31
Minha mãe disse que meu pai está melhorando, mas ainda segue na UTI – 21:07
Já é um bom sinal. Vou correr com esse quadro – 21:07
Hettie apresentou a namorada para a família hoje – 14:00
Eu não estava lá em San Diego para ver como foi, mas acho que nada bom, porque minha tia saiu do grupo da família – 14:00
Achei bem homofóbica – 14:01
Meu pai piorou de novo – 07:55
Estou com medo, Niall – 07:55
Bom, Olivia ainda não tem novidades sobre a PlayList – 17:29
Preciso provar que Jesse roubou minhas anotações e publicou algo no meu nome o quanto antes – 17:30
Queria que estivesse aqui – 17:30
Encarei a lista de mensagens não respondidas de novo e fui pagar meu café intocado, triste e com pena de mim mesma. Estava quase chegando no meu carro, quando um Chase arfante, porém sorridente, chegou até mim.
— Chase?
Ele respirou fundo, recuperando o fôlego.
— Vi você indo embora... tive que... correr muito. – Falou, entre um fôlego e outro.
Dei risada, meio sem graça.
— Bom, está tudo bem, pode levar o tempo que precisar.
Ele encostou na lataria do carro, e o sorriso dele me deixou levemente esperançosa.
— Pensando bem, preciso que me diga o que está acontecendo agora mesmo.
Chase riu, mostrando uma fileira de dentes brancos e perfeitos.
— Pegamos ele, .
Levei as mãos a boca.
— Pegaram... ele? Jesse? – Chase assentiu. – Mas como?
Ele balançou a cabeça.
— Financeiro. Descobriram que foi pago ao escritório de Nova York para te manter por lá, desviando dinheiro. Lembra-se disso?
— Sim, me lembro.
Ele suspirou, colocando a mão nos bolsos do terno.
— Voltaram a analisar as finanças, talvez tivessem deixado passar alguma coisa.
— E tinham?
— Acharam uma coisa estranha, mas na época não importou muito. Em novembro do ano passado, foi feita uma transação de vinte mil dólares para uma empresa de papel do norte do estado. Até aí normal, a gente comprava papel, não é? Um valor estranho, mas tudo dentro da normalidade. – Chase apertou a ponte do nariz, tentando se concentrar. – Porém no mês anterior, outra transação foi feita para a mesma empresa, no mesmo valor, e coincidentemente, um dia depois da sua notícia sobre a banda.
Eu não estava acompanhando o raciocínio, e estava ficando cada vez mais ansiosa.
— E porque eles resolveram investigar?
— Paramos de imprimir as revistas antes dessas compras, por isso. Depois da segunda transação de vinte mil dólares, ficou muito evidente que algo estava errado.
— E então? Qual a grande sacada?
— Primeiro chamaram dois assistentes, que garantiram que não era aquela empresa que fornecia papel para a PlayList e que desde que deixamos de vender revistas impressas, os papéis eram comprados em papelarias comuns. Eles apresentaram as notas das compras e foram dispensados. Só então tivemos a grande sacada.
— Que foi...?
— A primeira transação de vinte mil dólares coincidentemente também foi um dia depois daquela matéria sobre você em novembro, vazada pela PlayList.
Ai. Meu Deus.
— Sim, Jesse praticamente admitiu para mim que foi ele quem publicou! – Confirmei, falando mais alto do que deveria.
— Pois então!
— Espera, e a empresa de papel?
— Localizada. A empresa se chama Scott. Como em...
— Madie Scott! – Completei por ele, absolutamente chocada.
Lembrei-me de quando precisei dela no mês passado e ela foi super solícita, mas ao mesmo tempo não tinha resolvido meu problema. Lembrei-me de quando precisei dela no ano passado, quando a mesma sugeriu que eu falasse com Jesse. O que ela tinha dito?
— Vazou, . Alguém publicou sem minha autorização e como todos usamos a mesma base, é impossível identificar quem foi. – Ela olhou ao seu redor, tentando inutilmente procurar um rosto culpado. – Pode ter sido qualquer um aqui.
Tinha sido ela mesma. O tempo todo. Eu tinha pedido ajuda para a única pessoa que não me ajudaria.
— Pegamos ele, ! – Chase comemorou e eu, sem pensar, pulei nos braços dele, emocionada.
— Eu não acredito! O que acontece agora? Posso voltar para o trabalho?
Chase assentiu.
— Nossos advogados foram atrás dele, e com isso acredito que os advogados de Niall vão nos deixar em paz também. Com o desvio de verba e os assédios, duvido que esse homem vai ter um dia sequer de paz, a contar de hoje. Não posso garantir que ele vai ser preso, mas vai pagar uma boa multa. – Chase sorriu. – Venha para o escritório amanhã e alinhamos tudo, .
Aliviada. Estava aliviada e provavelmente iria dormir tudo que não tinha conseguido nesse último mês. Ao menos uma coisa dando certo, se considerar meu relacionamento fracassado e o meu pai doente.
— Muito obrigada, mesmo. Queria poder agradecer a todos vocês.
Ele se empertigou, se desencostando do carro.
— Ah, mas você pode. – Disse, esticando o braço para mim. – Happy hour, vamos?
Fiz uma careta.
— Ah, eu realmente...
Chase arqueou as sobrancelhas, empurrando mais ainda o braço em minha direção.
— Estarão todos lá.
Desisti, pegando o braço dele.
— Ok, que seja. Vamos!
E juntos fomos até o pub na outra esquina, onde muito dos nossos colegas já estavam. Cumprimentei as pessoas com quem trabalhava há mais de um ano, descobri com mais profundidade os crimes que Jesse cometeu e quantas leis infringiu ao fazer o que fez e quais as possíveis consequências para ele.
Aproveitei para agradecer a todos, e Olivia pagou as cervejas de todo mundo. Estava apreciando, até então, mas cervejas de graça me lembrou de Niall e isso me deixou triste. Decidi que no dia seguinte, logo depois de falar com Chase, iria até Los Angeles. Agora que eu tinha provas da minha inocência, não sairia da frente da casa de Niall até ele me ouvir. Mesmo que a gente terminasse para sempre, ele precisava saber que eu jamais trairia sua confiança.
Dormi melhor naquela noite, tanto pelo desfecho incrível e provavelmente mais por conta de todo álcool que bebi. Já deixei minha mala pronta, porque no dia seguinte, confrontaria Niall, quantas vezes precisasse.
E dessa vez ele iria me ouvir.
Eram seis e quinze da manhã quando acordei com meu celular tocando. Ninguém me ligava naquele horário, então achei melhor atender, poderia ser importante.
— Alô?
— . – A voz da minha mãe suspirou do outro lado da linha. – Seu pai desceu para o quarto, querida. – Anunciou.
Só não parecia muito feliz ao dar essa notícia e isso foi o bastante para me acordar.
— Por que isso não é bom?
Escutei ela reprimindo um soluço.
— Porque... porque não há mais nada que possam fazer, meu bem. Seu pai prefere ficar no quarto e receber visitas.
Como assim não há mais nada que possam fazer? Como assim ele prefere? Ele precisa preferir o que é melhor para ele!
— Mãe, o que quer dizer com isso? – Perguntei, minha voz falhando.
— Eu... seu pai... , por que não vem até aqui? Podemos conversar melhor e seu pai quer ver você.
Suspirei, derrotada.
— Estarei aí em meia hora. Amo vocês.
Desliguei o telefone, indo direto para o banheiro. Me sequei e me vesti rapidamente, prendendo meu cabelo em um rabo de cavalo uma vez que eu não tinha ânimo nenhum para me arrumar além do socialmente recomendado.
Passei pelo quadro inacabado parado na sala com um aperto no peito. Analisando o projeto, se eu me dedicasse mais algumas horas ele poderia ficar bom e eu poderia mostrar para o meu pai ainda amanhã. Com certeza não chegava aos pés do quadro original, mas eu estava convicta de que meu pai amaria o esforço. E, mesmo que fosse mentira, iria dizer que era mil vezes melhor que o dele.
A doença do meu pai se agravou muito no último mês. Depois que ele foi para a UTI não tive mais contato com ele, então se faziam pelo menos duas semanas desde a nossa última conversa. Seu cardiologista conversou comigo e com a minha mãe sobre a possibilidade de transplante versus a quantidade de tempo que meu pai aguentaria esperando na fila e as chances não eram ótimas, mas também não eram impossíveis. Com os remédios corretos e o acompanhamento periódico, meu pai conseguiria esperar até chegar um coração compatível.
Minha mãe estava do lado de fora do quarto quando cheguei, o que me dizia para ficar em estado de alerta.
— Oi, . – Disse, vindo me abraçar. Quando nos separamos notei que seus olhos estavam vermelhos e inchados, e mesmo depois de me abraçar ela apenas se sentou em um dos bancos do corredor. – Ele quer falar com você.
Inclinei a cabeça. Estava tão preocupada com meu pai que nem pensei em me colocar no lugar da minha mãe, como a perfeita egoísta que eu era. Mas falaria com ela depois, meu pai precisava de mim.
— Oi, pai. – Murmurei, entrando no quarto semiescuro. – Como está?
Ele riu, levantando o braço para que eu fosse até ele.
— Como alguém cujo coração erra todas as batidas. – Respondeu, apertando minha mão.
Revirei os olhos.
— Pai, isso não tem a menor graça.
— Ah, ver seu bom humor sumindo... Isso me parte o coração, . – Brincou, limpando uma lágrima falsa com sua mão livre.
— Muito cedo para fazer piadinhas de coração! – Briguei, nervosa. – Acabou de sair da UTI.
Meu pai me analisou, o brilho de divertimento ainda estava em seus olhos, e então ele apertou minha mão e arregalou os olhos.
— Pai? Pai! Pai, o que aconteceu?
— Eu... minha filha ficou séria demais com o mundo e acho que... meu coração parou. – Soltei minha mão da dele, cruzando os braços, exasperada.
— Pai!
Mas ele apenas riu, uma risada cansada e difícil, mas ainda era sua risada.
— Era tão difícil te tirar do sério.
— Acabou seu repertório agora?
— Jamais, sempre terei piadinhas enquanto meu coração continuar batendo.
— Argh, eu não tenho psicológico para isso!
Ao ver que eu estava prestes a chorar, meu pai puxou minha mão de novo, e eu fui até ele, me aninhando a ele como pude na cama pequena. Quando criança eu fazia isso o tempo todo, por isso era de se imaginar que eu não caberia ali. Mas eu coube. Ele estava tão magro e fraco que fiquei com medo de machucá-lo. Só não disse nada, porque sabia que não era isso que ele queria. Ele queria que eu o ouvisse.
— Ainda lembro de você me dizendo que não iria voltar para San Diego. – Falou, perto do meu ouvido.
— Você ficou magoado.
— Fiquei. – Confessou. – Mas eu mesmo te ensinei a ser independente e conquistar seu espaço no mundo. E foi justamente isso que você fez. Então, eu só fiquei magoado porque não teria você perto de mim o tempo todo, e não porque não apoiava sua decisão.
Aquilo era novidade para mim.
— Verdade?
Senti seu sorriso quando ele beijou meu cabelo.
— Verdade. Você não imagina o quão orgulhoso eu sou de você, filhota. De tudo que conquistou durante toda sua vida.
Dei uma risadinha.
— Quando muito fui medíocre. Não consegui o cargo de presidente do grêmio, sequer fui uma das primeiras na minha turma. Não passei no teste de líder de torcida, em nenhum dos três, e foi um parto passar na prova de francês no último ano, nem tenho muitos amigos. Na faculdade fui tão medíocre quanto.
Meu pai me beijou de novo.
— Mas você ainda é a melhor pessoa que eu conheço. – Falou. – Você é engraçada, espontânea e extremamente leal. Você é forte, honesta e independente. Seu senso de justiça é muito afiado e você detesta se sentir injustiçada sim, mas não suporta ver outras pessoas sofrendo injustiças. Você não tem muitos amigos, verdade, mas preserva todos que conquistou com muito cuidado. Sabe como é, o que importa é a qualidade, não a quantidade. E não me importa, , que não seja presidente do grêmio, líder de torcida nem nada disso. O que importa é a mulher incrível que você se tornou, o orgulho da minha vida, o melhor presente que eu poderia ter recebido.
Àquela altura eu já estava chorando. Levantei a cabeça do ombro do meu pai para vê-lo e ele aproveitou para me beijar na testa.
— Obrigada, pai. Você é meu melhor exemplo, em qualquer coisa.
Ele riu.
— Não, você que é o meu. Toda vez que vou fazer alguma coisa, penso: “O que a faria?”
— Claro, aí você vai lá e faz o extremo oposto?
— Ah, graças a Deus, minha garota está de volta!
Ri com ele, mas depois fiquei séria.
— Porque quis sair da UTI, pai?
Ele suspirou.
— Não quero passar meus dias em um hospital. Mas já que eu sou obrigado, prefiro passar em um quarto onde minha esposa e minha filha possam estar comigo.
Eu não podia obrigar ele a se alimentar por sonda até aparecer um coração. Eu não podia pedir para o meu pai fazer mais o que ele já estava fazendo. Já sabia que seria assim, e não significava que eu aceitava, mas a vida era dele e eu não podia dizer a ele como vive-la.
— Estou fazendo um quadro para você.
Seus olhos se iluminaram, como sempre acontecia quando a gente falava de pintura.
— É mesmo? Como ele é?
Demorei um pouco para responder.
— Hmm... estou refazendo o Mar Aberto. – Ele me olhou, os olhos arregalados. – Eu sei que é arriscado e não vai ficar igual, mas...
— Tenho certeza de que já está mil vezes melhor que o meu.
Eu ri.
— Você ainda nem viu!
Continuamos conversando sobre pintura até dar a hora de eu ir para a PlayList, até porque eu via o quanto ele estava lutando para ficar acordado por minha causa. A enfermeira veio trocar seu remédio duas vezes, e fiquei chocada com a quantidade de medicação que meu pai precisava tomar para continuar vivo. Eu não queria nem imaginar como era a UTI.
— Eu vou voltar amanhã com o quadro pronto. Acho que você vai gostar. – Disse, enquanto beijava sua bochecha gelada.
— Tenho certeza de que vou.
Peguei minha bolsa e já estava na porta, quando me virei.
— Você vai estar aqui amanhã, pai?
— Claro que sim. – Respondeu sorrindo.
— Prometa.
Seu sorriso vacilou, mas ele assentiu.
— Eu prometo, filhota.
Sorri.
— Te amo muito, pai.
— Não mais do que eu te amo.
Com um último sorriso, deixei a sala, torcendo para que a renovação da promessa, seja lá onde fosse computada, tivesse sido o suficiente para que eu pudesse vê-lo amanhã.
Estava quase meia hora atrasada, mas consegui chegar na PlayList sem muitos incidentes.
— Desculpe a demora, estava com meu pai. – Disse a Chase, que foi surpreendido enquanto bebia seu café. – Me desculpe, bom dia!
Ele limpou a boca com um guardanapo e sorriu.
— Bom dia, . – Esticou o pescoço procurando alguém, e quando Olivia assentiu, ele se levantou. – Vem comigo, por favor.
Aí não, eles iriam me demitir? Porque a Olivia estava indo junto? Porque uma moça do recursos humanos estava indo junto?
Entramos nós quatro em uma pequena sala de reuniões, e cada um ocupou uma cadeira lado a lado, me deixando sozinha em um lado da mesa.
— Bom dia, . – Falou Olivia, sorrindo.
— Bom dia!
— Essa aqui é a Queen, ela trabalha no RH. Vai nos ajudar a conduzir o que Chase e eu temos para te falar, ok?
— Oi, prazer. – Eu só estava ouvindo mais ou menos, a ansiedade estalando feito faíscas no meu corpo.
— Bom, vou começar dizendo que estamos muito aliviados por finalmente termos resolvido o problema com Jesse. Ele está solto, por enquanto, mas o promotor falou comigo e temos material o suficiente para que ele seja preso por um bom tempo. Não tem como se safar dessa.
— Fico aliviada.
— Além disso, ciente de que você estava sendo chantageada, gostaria de dizer que se acontecer qualquer episódio desse no futuro você está convidada a contar com o RH para te auxiliar em qualquer coisa.
— Não vou ser demitida?
Eles riram.
— Ah, . – Olivia juntou as duas mãos, sérias. – Quando te entrevistei no ano passado, a vaga para a qual você estava concorrendo já tinha sido preenchida. Mas gostei tanto do seu espírito que quis te dar uma chance, assim como eu queria que a iTenn tivesse mais uma chance, e por isso passei uma coluna quase falida para você.
— Certo...
— A ideia era que você só mantivesse a coluna no ar enquanto pudesse e nesse intervalo nós teríamos mais tempo para te alocar em outra função. Mas você fez um milagre, . – Ela sorriu para mim. – Transformou a coluna mais falida em nossa principal estrela. A iTeen faturou mais em cinco meses do que nos últimos três anos de sua existência. A PlayList foi para o ranking de mais vendida várias vezes, e tudo graças a você.
— É, eu acho. Mas se não fosse Niall...
Ela balançou a cabeça.
— Seu envolvimento com aquele homem pode ter ajudado a dar visibilidade sim. Mas foi você quem escreveu todos os textos, , e depois daquela entrevista nenhum outro texto falava sobre Niall. As pessoas te conheceram por ele, mas começaram a ler suas colunas porque se identificaram com o que você escrevia. E isso é tudo que você precisa ter no coração: o mérito é todo seu.
Depois que ela disse isso, realmente fez sentido. Niall pode ter me ajudado de alguma maneira, mas fui eu quem escrevi, eram as minhas palavras. Só naquele momento que toda minha insegurança com a minha carreira finalmente começou a desaparecer.
— Isso não é tudo. – Continuou Olivia. – Chase, por favor.
Chase sorriu para mim.
— Admiramos muito o modo como lidou com tudo, não só com o crescimento da coluna como com todo o resto. Você se fez ser notada, . Não só por outras revistas, mas pela Billboard.
Encarei os dois.
— A Billboard?
Eles riram, e Chase retomou a palavra.
— Querem que você tenha sua própria coluna. Você teria sua própria sala, um salário maior e um apartamento alugado pago pela empresa.
O que estava acontecendo?
— Meu Deus? – Foi a única coisa brilhante que consegui murmurar.
— Só que... tem um porém.
— Claro que tem um porém! E eu nem ligo para o porém, eu aceito! – Falei, feliz. – Que se dane esse porém! É a Billboard!
Mas Chase e Olivia me olharam quase com pena, o que me fez diminuir a empolgação. Falando sério, que tipo de porém me faria desistir dessa oportunidade? Eu não conseguia pensar em nenhum.
— Qual é o porém?
— A oferta de emprego é para... Nova York.
Ah, sim, esse era um baita de um porém.
Capítulo 25
Então após arrumar tudo, tomar banho, calçar meus sapatos, colocar o quadro pronto debaixo do meu braço e abrir minha porta não é de se estranhar minha reação quando dei de cara com Niall Horan com, provavelmente, a mesma cara surpresa que a minha. Ele pareceu meio sem jeito e assustado por ter sido pego no flagra, como se estivesse em dúvida se apertava a campainha ou não.
— Como conseguiu subir? – Aparentemente, depois de um mês sem nos falarmos, a segurança do prédio parecia ser a minha maior preocupação.
Ou talvez eu só estava tentando adiar o inevitável.
Ele deu de ombros.
— Sua vizinha me deixou subir.
Assenti.
— Ah.
Ficamos olhando para o chão por uns segundos constrangedores.
— Acho que estava de saída. – Comentou, apontando para minha bolsa pendurada.
Olhei para o relógio da parede, que indicava que se eu saísse de casa agora, ainda chegaria uma hora adiantada no hospital. Resolvi que poderia lidar com Niall agora e iria ver meu pai mais tarde. Me afastei da entrada da porta para que ele passasse, depositando o quadro pronto com delicadeza contra a parede.
— Você pode entrar, se quiser.
Ele concordou, entrando e indo até seu lado favorito do meu sofá. Não tirou seus sapatos e nem fez nada do que normalmente faria que demonstrasse estar confortável em minha presença, e isso me deixou mal.
Parecia que tínhamos muito a dizer um para o outro, mas por algum motivo não conseguimos dizer nada por muitos minutos.
— Você terminou o quadro.
Ele notou, ao mesmo tempo em que eu disse:
— O que veio fazer aqui?
Ele analisou o quadro.
— Ficou bom. Achei parecido com o original.
Sorri, involuntariamente.
— Você leu as mensagens. – Não era uma pergunta, e ele não negou.
— Desculpe, . – Eu sabia exatamente pelo que ele estava se desculpando, mas não seria assim tão fácil. Suspirei, olhando para ele, que ainda mapeava seus olhos em qualquer lugar que não fossem nos meus.
— O que veio fazer aqui, Niall?
Niall bufou.
— Alguém precisava ceder.
— Ceder? Do que você tá falando?
— Fiquei esperando por você. – Ele falou, olhando em meus olhos pela primeira vez. – Em Los Angeles.
Eu tinha mesmo a intenção de ir para Los Angeles, mas isso foi antes do meu pai piorar. Confesso que demorei para ter pensado em ir até lá, mas ao invés de dizer essas coisas, preferi me defender.
— Como eu simplesmente iria até Los Angeles? Você nem respondeu as minhas várias mensagens, eu não tinha garantia nenhuma de que você iria sequer abrir a porta para mim!
— Isso não interessa! – Retrucou. – Quando precisei que você me ouvisse, eu vim até aqui por você. Quando beijei Hailee, não sabia se você iria me ouvir, ou abrir a porta para mim, mas vim do mesmo jeito.
Dei risada, sem humor nenhum.
— Isso... isso não é nem um pouco justo! – Cruzei os braços. – Você não pode comparar o que eu passei com o seu rolo do ano passado!
— Eu não estou comparando...
— Não, isso está errado! – Interrompi. – As situações não são nada parecidas. Eu fui vítima de um crime, Niall, de outra pessoa se passando por mim. Você beijou Hailee porque quis. E deixou isso bem claro na época.
— Eu não estou tentando compararar nada! Só estou dizendo que fiquei te esperando, . Era o mínimo.
— O mínimo? Você me deixou aqui, Niall, com nada além de um problema enorme para resolver. As pessoas começaram a me atacar na internet e você não estava do meu lado para me ajudar. Quase perdi meu emprego, minha carreira toda, por causa da droga de um erro que nem foi meu! Como poderia ser o mínimo?
Meu argumento pareceu tê-lo derrubado, ou pelo menos me rendeu um pouco de silêncio. Olhei para ele mais uma vez.
— Por que você foi embora?
Ele suspirou.
— Porque eu fiquei com raiva.
— Você achou mesmo que eu faria algo assim?
Ele desviou o olhar, brincando distraído com uma linha da sua blusa que estava solta.
— Eu não sabia em que acreditar. Eu... eu só fiquei com muita raiva.
— Ele pagou alguém, caso queira saber. Para publicar o texto.
— Eu sei. Avisaram para o meu advogado.
Balancei a cabeça.
— Foi por isso que você veio? Porque só depois que foi provado que eu não tinha nada a ver com isso eu valia a pena ser ouvida? Minha palavra não vale de nada?
— , o que você queria que eu fizesse? Eu sei, com todo meu coração, pelo sei agora, que você nunca teria publicado nada disso para o mundo, aposto minha vida que você não contou isso nem mesmo para Rachel.
Dado a veracidade do que escrevi, foi impossível negar para Rachel e Olivia que o que tinha escrito era mentira. Elas foram compreensivas e solícitas, e prometeram refrear a notícia tanto quanto podiam.
— Agora ela sabe, mas é claro que não contei.
— Mas isso não muda o fato de você ter escrito, . Você escreveu, mesmo que não tenha publicado. E o fato de ter escrito me deixou confuso em relação a confiança que eu tinha em você.
— E você preferiu ficar me ignorando por um mês a responder uma maldita mensagem? Porque estava confuso?
Ele ficou de pé, indo até a janela, e eu não o acompanhei. Ele parecia precisar de um tempo para si mesmo e eu poderia ceder isso.
Talvez, se eu tivesse ido até Los Angeles, a gente tivesse resolvido mais rápido, mas talvez eu deixasse tudo pior. Não tinha como saber o que iria acontecer. O fato era que muito me admirou Niall ter sido o primeiro a dar um basta na situação, mostrava que, de fato, ele queria estar comigo, principalmente se estivesse disposto a perdoar o que aconteceu.
Fiquei repassando todo nosso relacionamento na minha cabeça que havia começado quase um ano atrás, o modo como nos conhecemos, nos aproximamos e nos apaixonamos, eu abaixando todas as minhas guardas em prol desse relacionamento, sem saber qual de nós dois iria ficar com o coração partido no final. Previ que não seria fácil, mas que valeria a pena, previ que um de nós seria magoado, mais de uma vez, previ que teríamos bons momentos juntos, previ que um relacionamento a distância nos tornaria mais fortes, previ que ficaríamos juntos enquanto fôssemos felizes assim.
A única coisa que eu não tinha previsto era justamente dois corações quebrados.
— Eu teria aberto a porta. – Ele disse, uns minutos depois, ainda olhando para a rua. – Em Los Angeles, quero dizer. – Esclareceu, vindo até mim de novo. – Então eu teria te ouvido. Te entendido. E te perdoado. E não teríamos perdido tanto tempo longe um do outro.
— E o que acontece agora, Niall? – Quis saber.
Fiquei magoada quando ele hesitou. Também fiquei magoada porque eu hesitei. Nenhum de nós dois sabíamos o que iria acontecer conosco agora porque não tinha mais nada para acontecer. Percebi que não tinha falado sobre meu emprego em Nova York e, naquele exato momento, também percebi que já tinha decidido que iria aceitar. E Niall podia ser muitas coisas, mas não era egoísta, então eu sabia exatamente o que ele falaria se eu contasse a ele: me diria para ir. Eu queria Niall, mas eu também queria Nova York, e, ao mesmo tempo, essa foi a decisão difícil mais fácil que eu já tomei.
— Eu... eu não sei. – Confessou, sincero. – O que quer fazer?
Também não sabia a resposta dessa.
— Bom, você pode ir ao hospital comigo, se quiser. Vou mostrar o quadro ao meu pai.
Niall sorriu, ainda que o sorriso não chegasse aos olhos.
— Parece bom.
Devolvi ao sorriso, me arrumando novamente para sairmos. Tranquei o apartamento e, uma vez no térreo, fomos andando ao meu carro. Meu carro...
Ainda em silêncio, dei partida, me permitindo martelar aquela dúvida na minha cabeça. Eu queria perguntar, mas, ao mesmo tempo, não queria saber a resposta. Ela seria tudo, menos vaga, e iria responder aos questionamentos não respondidos do nosso relacionamento. Parecia que estava tudo bem entre nós, mas eu não sabia dizer se ainda éramos um casal e eu não tinha coragem de perguntar.
Mas eu precisava.
— Niall, o carro...
— , não. – Interrompeu, as feições duras.
Aproveitei o sinal vermelho para encará-lo.
— Eu não posso...
— Pode sim! Foi um presente. Não me interessa o que aconteça, foi um presente e você deve mantê-lo, por que é seu. Entendeu? – Perguntou, calmo.
Ainda estava intimidada e não sabia como interpretar sua resposta, mas confirmei mesmo assim. O carro voltou a andar e, em poucos minutos, estávamos no estacionamento do hospital. Estacionei o carro, mas antes de descer, observei Niall segurando o quadro e pela primeira vez desde que eu o terminara, gostei do que vi.
— Sabe porque quis pintar esse quadro?
— Porque?
Sorri, encostando a cabeça no encosto do banco.
— Ele me conta que foi a primeira vez que eu encostei em um pincel na minha vida. Que ele e minha mãe conversavam que tipo de pessoa eu seria, se seria uma leitora como ela, ou uma pintora como ele. E como encostei em um pincel antes mesmo de segurar um livro na mão, ele venceu. – Ri, com a lembrança que chegava. – Ele não ia vender esse quadro, era um teste. Mas eu, com toda a maestria de uma garotinha de dois anos, peguei o primeiro pincel que vi na frente e fiz uma linha azul no meio da tela. – Expliquei, apontando para o quadro incompleto.
— Criatividade desde o berço.
— Foi exatamente o que ele disse. Por isso, decidiu colocar o quadro na galeria. Vendeu em menos de dois dias, dizendo apenas que tinha pintado junto com sua filha de apenas dois anos.
— Ele te deu créditos de co-autoria? Deixou você assinar seu nome e tudo?
Eu ri.
— É claro que não. – Balancei a cabeça, mesmo sabendo que ele estava sendo sarcástico. – Mas foi o que disse para todo mundo.
— Por isso quis fazer esse quadro. Mas por que não terminou?
Mordi os lábios, com um olhar travesso, imaginando a linha azul imaginária que ainda não existia ali.
— Porque, dessa vez, quem vai fazer o traço azul será ele.
Niall riu, olhando para o quadro mais uma vez antes de se virar para mim.
— É o presente perfeito. – Disse apenas, abrindo a porta do carro em seguida.
Segui Niall para dentro do hospital, pela primeira vez me sentindo esquisita ao entrar ali. Fomos até a ala B, onde meu pai estava, e subimos até o terceiro andar, mas assim que saímos do elevador eu tive certeza de que alguma coisa estava errada.
Para começar minha mãe não estava me esperando do lado de fora do quarto do meu pai, que de onde eu podia ver estava totalmente desocupado. Enfermeiros bipando um para o outro e andando depressa de um lado para o outro também indicavam que algo não ia bem. E, se essas informações não fossem o suficiente, o simples fato de meu pai não estar ali já devia ser o bastante para todos os meus alarmes internos soarem.
— Meu pai. – Eu disse apenas, apontando para o quarto vazio.
— Como?
— Meu pai, ele deveria estar ali. – Insisti.
Delicadamente, Niall colocou o quadro em meus braços e me puxou para um canto.
— Eu já volto, fique aqui. Vou descobrir o que aconteceu.
Niall se dirigiu à recepcionista mais próxima a nós enquanto eu tentava assimilar o que não estava vendo. Eu sei que tinham várias outras razões para ele não estar ali, mesmo tendo prometido que estaria. Talvez ele estivesse fazendo algum exame. Talvez ele tenha tido alta e voltado para El Monte e ficado tão felizes que esqueceram de me avisar. Eu poderia perdoá-lo por isso, contando que estivesse bem. Ou talvez tenha conseguido um doador e estava realizando um transplante nesse exato momento.
Mas quando vi Niall voltando em minha direção, percebi.
Não tinha acontecido nada daquilo.
— , seu pai teve um ataque pela manhã e precisou fazer uma cirurgia de emergência. – Niall explicou, colocando as mãos nos meus dois braços. Até aquele momento eu não tinha percebido que precisava ser sustentada.
— Ele está bem? Quando eu posso vê-lo?
Ao olhar em seus olhos, eu soube. Simplesmente soube.
— Não. – Sussurrei, permitindo que ele me abraçasse. – Niall, não.
Não.
— Ah, . – Murmurou, me abraçando mais forte. – Eu sinto muito, mais do que você imagina.
— Niall, quando vou poder vê-lo? – Perguntei assim mesmo.
Meu corpo era feito de ar, não sabia nem como estava em pé. Não sabia nem como estava me segurando e nem o que estava me impedindo de cair.
— Seu pai... ele não resistiu a cirurgia, meu amor. – Niall respondeu, terno, me apoiando com cuidado. – Eu sinto tanto.
Não.
— Cadê meu pai, Niall? Onde está o meu pai? – Perguntei mais alto, tendo a ciência de que a única coisa que me impedia de cair era ele mesmo me sustentando.
Não.
Não.
Não.
Não.
Ele disse que estaria aqui. Ele prometeu. Ele prometeu que estaria aqui!
— Seu pai... eu odeio muito te dar essa notícia, meu amor. Seu pai se foi, .
NÃO!
Quando ele disse em voz alta as palavras em que não queria acreditar, perdi todo o sustento que ele me oferecia caindo com meu joelho junto ao chão. Isso não estava certo, até ontem ele estava bem!
Ele estava bem e estava orgulhoso de mim, disse que me amava e que queria ver o quadro, e eu trouxe o quadro para ele ver!
Olho para o lado e me assusto por um momento porque o quadro ainda está ali, mas isso já não importa porque meu pai não está mais aqui para vê-lo e dizer, sem sombras de dúvidas, que ficou muito melhor que o dele.
Mas ele iria ficar orgulhoso se visse. Percebi que importava muito, tinha que levar o quadro a ele.
Levantei em um rompante, porque nada nesse mundo iria fazer eu desistir de entregar o quadro ao meu pai.
— , espera! – Disse Niall atrás de mim.
Tive uma vaga ciência de que pessoas me observavam enquanto eu corria às cegas procurando em qualquer lugar onde poderia encontra-lo.
Mas estava zonza e sentindo coisas que nunca senti antes. Um imenso vazio parecia ser a única coisa que me prendia na Terra e eu não me sentia mais viva.
Estava só existindo.
E por estar apenas existindo e andando sem rumo, Niall conseguiu me alcançar.
— Ele precisa ver o quadro! – Falei, com urgência.
— Ele vai ver, ok? Mas agora você precisa se acalmar.
As lágrimas nublaram minha visão, enquanto eu lutava para me soltar de seu aperto firme.
— Me solta, preciso disso. Por favor, eu preciso disso. Ele precisa fazer a última linha, ele precisa terminar o quadro.
Niall fechou os olhos, me puxando para o calor de seu peito. Me puxando para seu abraço firme, onde eu imediatamente consegui forças para me acalmar.
— , ele se foi. – Niall repetiu em meus ouvidos. – Eu sinto muito, querida, mas ele se foi.
Não.
— Ele não viu o quadro, ele nem sabe sobre minha promoção para Nova York! – Falei, atropelando as palavras. – Tenho que contar para ele, Niall, tenho que contar antes que seja tarde demais.
— ...
— Ele não vai mais me chamar de filhota. – Falei, chorando. – Ele não vai fazer piadas indecentes as custas da sua própria vida, não vai elogiar meus quadros, não vai me levar ao altar no dia do meu casamento e nunca mais vai me dizer o que preciso ouvir. Ele não vai me dar tintas raras de natal e nem fazer chamadas de vídeo comigo. – Eu era um poço de lágrima, a tristeza pingando para fora de mim como uma ferida que jamais iria se curar. – Ele não vai fazer o último traço no quadro, porque ele morreu. Niall, meu pai morreu!
Aquelas foram as três palavras mais dolorosas que escaparam da minha boca. Me cortaram por dentro como navalhas. E, sabendo que a dor era tamanha para suportar, meu próprio corpo não aguentou sentir o que eu estava sentindo.
A última coisa que vi antes de mergulhar na inconsciência foi o quadro incompleto que pintei, encostado solitário na parede atrás do balcão.
O quadro que meu pai nunca veria.
Continua...
Mais 3 capítulos para o final, espero que estejam gostando!
Beijinhos!
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