Finalizada em: 22/10/2019
Music Video: Within Temptation - Stand My Ground



OBS: Como nenhum dos jogos de Elder Scrolls possui tradução oficial em português e é de nosso interesse ficar o mais canon (parecido com o material de origem) possível, na fic usaremos diversos termos em inglês para nos referirmos a raças, nomes de lugares, armas, missões, etc.
Portanto, para melhor entendimento da história, clique aqui antes de começar a leitura.


I. A cidade dos reis


Como esperava, fazia muito frio quando o pequeno barco de madeira ia se aproximando do cais de Windhelm. Na verdade, havia estado frio durante toda a viagem desde o porto de Dawnstar, mas, devido ao seu sangue nórdico e élfico das neves, o clima não a incomodava. O barqueiro, no entanto, não havia parado de reclamar desde que havia começado a remar. Em vez de escutá-lo, dividiu o tempo de viagem entre comer os pedaços de pão e de carne que restavam em sua bolsa, limpar sua espada daédrica e pensar no que iria escrever para Fanis assim que aportassem. 

Com certeza a taverna local teria alguns pedaços de papel e tinta para emprestar ou vender, era o que pensava. A distância entre Dawnstar e Windhelm não era tão grande para durar mais de doze horas de viagem, mas com as paradas para comer e dormir, a viagem estava levando quase um dia inteiro -- mesmo com as ondas carregando o barco a uma boa velocidade. Por mais que quisesse chegar logo, ela sabia que o pobre barqueiro não aguentaria remar mais do que algumas horas por dia, então ela tomava o controle dos remos quando os braços daquele homem nórdico começavam a queimar, o que aconteceu mais vezes e em intervalos maiores do que ela gostaria.

Após várias horas no barco, as águas do mar encontraram as do Rio Branco, o principal e mais longo rio de Skyrim, que conectava desde a região sul de coníferas de Falkreath até Windhelm e o mar do norte. observou com interesse como as águas eram de fato muito limpas e pareciam brancas ao refletir o gelo e a neve. Ela se surpreendeu ao ver grupos de salmões pulando sobre algumas corredeiras, subindo o rio, e escutou com interesse quando o barqueiro lhe contou porque os peixes faziam aquilo. Conforme aquela tarde se aproximava do fim, as águas iam ficando mais lentas e tranquilas. À distância, conseguia ver a silhueta de muros altíssimos e do que parecia ser um palácio feito de pedras. “O que você está vendo ali é um pedaço do Palácio dos Reis e a grande muralha”, ela se virou, ouvindo a voz do homem pela primeira vez em horas. “É a morada de Ulfric Stormcloak, líder da rebelião e nosso verdadeiro rei.” 

sabia da guerra civil, sempre acostumada a ouvir as histórias dos viajantes que passavam pela Taverna Nightgate. Skyrim pertencia ao Império, cuja sede na província era na capital Solitude, na direção oposta de onde estavam, mas, com a morte recente do Rei Torygg em um duelo com Ulfric Stormcloak, uma grande revolta havia começado. Muitos nórdicos orgulhosos se opunham à subjugação do Império aos altos elfos, líderes do Domínio Aldmeri, também conhecidos como Thalmor, que estava conquistando cada vez mais territórios em todo o continente de Tamriel. havia escutado muito sobre os Thalmor e como se consideravam superiores e como costumavam aprisionar qualquer pessoa que os criticasse. No entanto, ela ainda não tinha visto nenhum oficial Thalmor nem nenhuma de suas vítimas em suas andanças pelo norte. Ela sabia que o principal motivo para tantos Nords se aliarem à rebelião era o fato de o Império ter sido obrigado a banir o culto a Talos, deus da guerra do panteão nórdico, como parte do tratado de paz assinado com os Thalmor após uma sangrenta guerra que havia matado milhões. O culto a Talos era uma parte inerente da cultura nórdica, então tal banimento era muito ofensivo para a maioria dos cidadãos. 

entendia os sentimentos das duas facções, mas não sabia muito sobre os deuses nem sobre política para tomar uma posição. O máximo que ela sabia era que o Império era bem apoiado no sul e no oeste, enquanto a rebelião dominava a região central e quase todo o norte, com exceção de Solitude. Como The Pale estava aliado aos Stormcloaks, e eles estavam indo para Windhelm, a sede da rebelião, ela havia imaginado que em algum momento começaria a ouvir muito sobre os Stormcloaks. Afinal, Ulfric também era o Jarl de Windhelm, e assim governava a cidade e a região circundante, chamada de Eastmarch. 

A muralha cinza foi ficando mais próxima conforme o barco se aproximava da grande cidade, até que eles conseguiram ver as docas com quatro barcos grandes ancorados e do outro lado havia tundra, muitas árvores e duas pequenas fazendas. também conseguia ver marinheiros e trabalhadores andando, conversando e carregando caixas. Ela nunca havia estado em Windhelm, apesar de ter passado várias vezes por Eastmarch em seus contratos -- mas sabia da sua fama como uma das cidades mais frias da província, assim como seu povo -- embora não com outros cidadãos nórdicos, talvez. O homem remou em silêncio até alcançarem uma das docas. A água congelada ali cortou um pouco a velocidade do pequeno barco. Então não é só em The Pale e Winterhold que temos água congelada, pensou, surpresa com a falta de conhecimento sobre o próprio lar. O homem remou com mais vigor, até que por fim aportou ao lado de uma grande embarcação: conseguiu ler que se chamava Donzela do Norte, como estava escrito na lateral de madeira.

“Chegamos. Tenha uma boa estadia em Windhelm, compatriota. Para entrar na cidade, você precisa virar à direita e subir aqueles degraus até encontrar um portão. A taverna fica à direita.” A voz grossa a tirou de seus devaneios. O barqueiro apontou para o caminho que ela deveria seguir. ajustou seu capuz para que não caísse com o vento gelado que começava a soprar e se levantou, ajeitando sua sacola de viagem em seus ombros. Ela tirou cinco moedas a mais de seu bolso e as pôs na mão aberta dele.

“Obrigada, Harlaug.” Respondeu, surpresa com a própria cortesia e por se lembrar do nome dele. “Tenha uma boa viagem de volta.” 

Harlaug assentiu e desembarcou, olhando seus arredores. Os ancoradouros eram mais largos do que pareciam à distância, e ela reparou que o pequeno barco em que havia viajado não era nada comparado às grandes embarcações que deixavam suprimentos naquela tarde nublada. Seu olhar recaiu sobre os trabalhadores das docas – de longe, não havia visto que eram todos reptilianos, com a exceção de alguns homens nórdicos que pareciam marinheiros, pois estavam trabalhando dentro dos barcos. Ela passou por um dos Argonians que estava afiando uma espada ao seguir o caminho indicado para Windhelm. Suas escamas tinham tons entre preto e verde-escuro, e ele usava roupas e botas comuns à maioria dos que moravam em cidades. Ele retribuiu o olhar espantado de com desdém. 

“Me desculpe por ficar encarando você” ela foi dizendo, tropeçando nas palavras, antes que ele fizesse algum comentário. E logo se explicou: “É minha primeira vez em Eastmarch e nunca tinha visto um Argonian antes. Acho que não há muitos de vocês mais ao norte.”

“Não me surpreende. A única coisa mais fria que esta província são os próprios Nords.” Ele continuou com uma expressão irritada enquanto apertava o pedal com um dos pés, causando um ruído desagradável de aço sendo amolado. “Veja, não gostamos muito de pessoas do seu tipo aqui nas docas. Seria melhor se você fosse embora.” 

Apesar do tom irritadiço, ele não parecia ofendido. resmungou um pedido de desculpas e subiu os degraus, virando em uma esquina até passar por um dos portões, enquanto pensava que ao ser um dos poucos reptilianos em uma cidade povoada por humanos – e lar dos Stormcloaks, conhecidos por não apreciar forasteiros – ele deveria passar por situações muito mais sérias que uma nórdica olhando-o com curiosidade. empurrou o portão pesado de aço e adentrou a praça principal de Windhelm, próximo ao portão principal. De acordo com o que Harlaug lhe havia contado, aquele era o Distrito das Pedras, o bairro principal da cidade, onde ela conseguia ver muitos prédios altos e o Palácio dos Reis ao fundo, parte de outro distrito. As calçadas e ruas de pedra estavam cheias de neve e havia poucas pessoas andando de um lugar ao outro – a maioria cidadãos nórdicos e guardas, pelo que ela conseguia ver. Todos os guardas vestiam armaduras azuis e capacetes que cobriam todo o rosto. Aqueles que usavam espadas também levavam escudos com um urso pintado, símbolo da cidade. 

subiu os degraus, suas botas amassando a neve recém-caída, e foi na direção do maior prédio à sua frente, uma taverna de dois andares com o nome de Candlehearth. Ao adentrar a taverna, se dirigiu ao balcão e alugou um quarto por uma noite – ela tinha a intenção de apenas passar pela cidade para chegar a Riften, seu destino final, mas ao mesmo tempo queria descansar e tirar um pouco de tempo para escrever para Fanis. se sentou no balcão com suas coisas e se virou quando uma garçonete loira, usando roupas da taverna, se aproximou, perguntando se ela gostaria de comer alguma coisa. se surpreendeu com a aproximação. Agora que estou viajando por cidades maiores, esse tipo de serviço é mais comum. Mesmo Dawnstar sendo uma cidade menor, isso também aconteceu lá. Basta eu me acostumar com isso, pensou rápido e deu um pequeno sorriso para a mulher.

“Eu gostaria de um pouco de pão, ensopado de carne de veado e alguns pedaços de queijo.” E depositou o valor correspondente na mão dela.

“Uau, faz dias que não vejo alguém com tanto apetite! Me diga, você vem de longe?” estava surpresa com a simpatia da mulher, e assentiu. Ela se sentou no banco ao lado dela e as duas trocaram cumprimentos – a garçonete se chamava Susanna. 

“Venho de Dawnstar, mas sou de Winterhold. A viagem deveria ter levado doze horas, mas o tempo não nos ajudou. É a minha primeira vez em uma cidade tão grande.”

“Uma aventureira?” antes que pudesse responder, Susanna continuou falando: “o que você precisa saber sobre Windhelm é o seguinte: se você quer beber bem, vá ao Clube New Gnisis no Distrito Cinzento, sabe onde fica? Mas você não ouviu isso de mim” ela deu uma piscadela, e estava se sentindo um pouco zonza de tanto que a mulher falava, ela não sabia o que responder primeiro. “Espere aí, vou buscar sua comida.” Enquanto isso, a dona da taverna, uma nórdica de meia-idade chamada Elda Early-Dawn, passou pelo balcão e resmungou que Susanna só era simpática com os clientes para receber gorjetas. não deu atenção àquilo. 

A nórdica-elfa não havia percebido com quanta fome estava até que os pratos fumegantes foram colocados na sua frente. Enquanto ela comia com avidez, Susanna voltou para o lado dela e lhe contou diversas coisas, como que a vela em cima da lareira no andar de cima não havia se apagado em mais de cem anos e que deveria subir para dar uma olhada. apenas assentiu enquanto mastigava, sem conseguir prestar atenção em tudo. “Veja só, chegaram mais clientes. Te vejo mais tarde, minha linda.” Susanna se levantou e sentiu seu rosto um pouco corado, se perguntando se aquilo era um flerte. 

Logo após terminar a refeição, ela deixou sua bolsa no quarto que lhe foi dado e saiu apenas com sua espada amarrada nas costas e com um saco contendo uma pequena quantidade de dinheiro. Já anoitecia quando ela atravessou o distrito para chegar ao mercado, que ficava em um dos cantos mais frios de Windhelm e consistia em algumas barracas, uma forja com a loja e uma loja de alquimia. Havia poucos clientes quando chegou – na verdade, a maioria dos vendedores estava guardando suas mercadorias para ir embora – e ela correu para a barraca da alta elfa Niranye, que vendia quase qualquer tipo de suprimento, desde armas e armaduras até comida e algumas joias. conseguiu ser atendida e guardou os pedaços de papel, tinta e pena no saco onde não restavam mais moedas. 

Ao deixar a barraca, estava pensando se deveria dar uma olhada na loja de alquimia quando gritos alcançaram seus ouvidos sensíveis. Mas a sensibilidade dela não a ajudou, pois no momento seguinte todos ali ouviram os gritos, e por um segundo ficaram paralisados. No momento seguinte, todos se moveram muito rápido, e agradeceu por o mercado estar quase vazio àquela hora, com os vários mercadores se empurrando para buscar abrigo em uma das lojas. Ela arrancou a espada daédrica da bainha e viu apenas Niranye correr para a rua principal, tirando uma adaga élfica do cinto, e a seguiu, as duas indo na direção dos gritos. Encontraram diversos guardas com espadas e alabardas, alguns correndo em círculos, outros dando ordens, e o que parecia o chefe gritando como era possível que ninguém havia visto as criaturas da noite chegando. sentiu seu pulso acelerar, e a visão que Vaermina lhe havia forçado a ver assaltou sua mente: os olhos vermelhos de seu pai em contraste com a pele pálida, os dentes afiados, seus traços élficos... e se ele estivesse ali?

continuou correndo, apertando a enorme espada em suas mãos, os gritos mais altos conforme se aproximavam da entrada de Windhelm. Ao virar a esquina na praça principal, ela os viu: três vampiros se moviam com muita rapidez e atacavam – enquanto Niranye e alguns guardas correram na direção deles, seguiu os gritos, cada vez mais desesperados, que a levaram a um dos muitos becos próximos da taverna. levantou sua espada de duas mãos e atingiu o vampiro no ombro, e, quando ele se virou para ela, viu que a vítima era ninguém menos que Susanna. gritou para que ela corresse enquanto tentava bloquear os golpes da espada élfica dele, vendo que começava a lançar espinhos de gelo com a outra mão. Devido à sua resistência natural ao frio, sentia apenas um incômodo com o feitiço, mas a força e velocidade de seu inimigo eram desafiadoras. Sua agilidade com a espada de duas mãos fazia com que conseguisse infligir vários cortes nele, mas lhe custava cada vez mais bloquear os golpes. Ela sentiu que estava perdendo a firmeza, e no momento seguinte a enorme espada caiu de suas mãos, o som abafado pela neve abundante. Imediatamente sentiu seu braço esquerdo dormente e pesado, e viu, atônita, que ele estava coberto de gelo. O leve incômodo a havia feito se concentrar apenas em bloquear os golpes de espada, e por isso não havia percebido a estratégia do vampiro – sua única arma estava jogada nas pedras, seu peso tamanho que era impossível usá-la com apenas um dos braços. Sem perceber, ela deu dois passos para trás, quase desaparecendo no beco enquanto ele avançava, agora com dois feitiços diferentes nas mãos. Tudo que pode fazer foi esticar o braço bom na frente de seu rosto, a única área não protegida pela armadura, tentando evitar o ataque derradeiro. 

Houve um grito, mas ele não saiu da boca de . Ela ouviu primeiro o urro de dor e depois viu o clarão que saía da palma de sua mão até a ponta dos dedos. Cheiro de carne queimada. Fogo – chamas saíam da mão de enquanto ela tentava se defender, o vampiro gritando mais e mais, seu rosto e colo queimando enquanto ele tentava atacá-la com mais feitiços, mas ele parecia não conseguir recuperar sua concentração. exclamou surpresa e deu alguns passos para frente, sem mover seu braço, enquanto o vampiro era obrigado a recuar e as chamas causavam ainda mais danos em sua pele inflamável. Ela queria destruí-lo, queria que todos andassem seguros pelas ruas – a força de sua determinação era tamanha que aquelas chamas tímidas rapidamente se tornaram mais espessas até que seu inimigo continuou queimando, o cheiro e o estalo das chamas cada vez mais fortes, e com um último e agonizante grito ele sucumbiu a uma pilha de cinzas, poluindo as calçadas brancas. 

Quando se virou, ainda com chamas na mão, viu que o outro vampiro já estava morto e junto com ele havia dois guardas caídos, com as gargantas rasgadas, seu sangue manchando a neve – Niranye ainda estava lutando com o último dos agressores, que parecia ser o líder do grupo. Os guardas que haviam corrido com elas até ali assistiam a luta, atônitos demais para se moverem. A nórdica-elfa viu quando o vampiro-mestre lançou uma espécie de feitiço vermelho na alta elfa, e ela gritou de dor, levando a mão livre à região do abdômen, enquanto ele parecia ficar mais forte. Sem dizer nada, ela esticou seu braço na direção deles, tomando cuidado para acertar somente o agressor – o ataque o distraiu por tempo suficiente para a elfa conseguir cortar a garganta dele com sua adaga, e logo ele caiu, meio chamuscado e com o próprio sangue escuro cobrindo seu peito. 

Assim que o vampiro caiu morto, o feitiço sumiu da mão de e ela amparou Niranye, que ainda tocava seu ferimento. “Eu nunca imaginei que dreno vampírico seria tão doloroso”, ela comentou enquanto pousou a outra mão no ombro de para se equilibrar. “Isso é um feitiço?” perguntou, vendo os guardas comentarem e alguns se aproximarem, recolhendo os corpos e restos mortais. “Sim. É uma forma de eles se alimentarem”, a elfa respondeu, parecendo enojada. também não gostou de imaginar que um feitiço poderia ser uma forma de nutrição. “Obrigada, aliás. Se não fosse por você, eu não teria acabado com ele naquela hora.” assentiu, mas não soube o que dizer. Ela observou Niranye ir ao templo, dizendo algo sobre buscar uma cura, pois vampiros podiam infectar mortais com aquele feitiço. Ainda parada no local da luta, conseguiu conjurar as chamas por vontade própria e assim derreteu o gelo que prendia seu braço esquerdo, movendo-o em diferentes ângulos para se certificar que nada havia sido danificado. Ela estava recolhendo sua espada ensanguentada do chão quando viu outro guarda carregando uma tocha dobrar a esquina e se aproximar. “Obrigado, mas, uh... temo que vamos precisar da sua ajuda mais uma vez...” não entendeu porque ele parecia nervoso. “Por favor, siga-me.” o seguiu por uma das ruas que saía da praça principal, e quando chegaram ao cemitério foi que ela viu.

Sobre uma lápide, estava o corpo de Susanna.


II. Sangue no gelo


Na verdade, o que restou de Susanna estava sobre a lápide – seu corpo, desprovido de vestimentas, tinha cortes profundos em um dos ombros, no colo, na barriga e nas pernas. Os olhos de se encheram de lágrimas, mas nenhuma delas caiu. Seu olhar se demorou nos cortes que pareciam frescos no ar frio da noite. Então ela voltou a olhar para o guarda, vendo mais três testemunhas ao redor da lápide – um homem imperial, uma mulher que parecia ser uma mendiga devido aos trapos que vestia e outra nórdica que estava vestida como sacerdotisa. percebeu que o guarda tentava falar com ela, e parecia incomodado ao ver que não o havia escutado. “Como eu estava dizendo”, ela notou um tom de irritação em sua voz arrastada, mas não se importou. “Susanna é a terceira vítima. É sempre a mesma coisa: mulher jovem, assassinada à noite, corpo dilacerado.” As três testemunhas começaram a falar ao mesmo tempo: o homem disse que havia visto alguém sair correndo, a mendiga disse que havia escutado gritos mas chegou tarde demais, e a sacerdotisa apenas comentou que a bolsa de moedas da vítima ainda estava intacta, concluindo por si mesma que aquele não era um assalto que deu errado. 

“Vocês estão investigando esses assassinatos?” estava surpresa pelo pouco que o guarda parecia saber sobre os assassinatos. Ela imaginava que um local como Windhelm, tão grande e com tantos guardas, teria ao menos um destacamento para investigar crimes como aquele. Imediatamente o guarda ficou na defensiva, dizendo: “Já estamos ocupados o suficiente com a guerra, e por isso ninguém tem tempo para investigar. Essa é a verdade, por desagradável que seja.” pensou em questioná-lo sobre o bem-estar dos cidadãos que ele deveria servir e proteger, porém desistiu, lembrando-se que tampouco sabia qualquer coisa sobre administração pública. Questionar não era do feitio dela. se ofereceu para ajudar, sem mencionar a questão do pagamento – embora fosse muito relevante, já que aquele era seu modo de vida. O homem cruzou os braços. “E, como sempre, ninguém viu nada de útil. O desgraçado escapou de novo. Fique à vontade para investigar – muitos de nós vimos como você enfrentou aqueles vampiros.” Por um momento, pensou que ele estava duvidando de sua capacidade ou seriedade, no entanto não lhe respondeu. “Você precisa ir ao Palácio dos Reis falar com Jorleif. Não podemos deixar qualquer um andar por aí dizendo que está cuidando de assuntos oficiais.”

A nórdica-elfa deixou o cemitério para trás, e ao voltar para a praça principal foi bem fácil ver o gigantesco palácio de pedra à distância, se assomando atrás da taverna. Ela tentou ignorar todo o sangue que ainda encharcava aquelas calçadas e continuou, andando por alguns becos até emergir em uma avenida larga, cheia de mansões, chamada Valunstrad. No final da avenida, passou por um muro interno, que dividia o grande pátio externo do palácio do resto da cidade. Havia apenas dois guardas patrulhando o pátio em volta de dois braseiros, uma das poucas fontes de luz ali. O pátio também era cinza, feito de pedras e era apropriadamente uma extensão do palácio. No final dele estava o prédio, com mais um braseiro entre os dois portões de aço. não era uma estudiosa, mas sabia que aquele palácio datava de mais de dois mil anos, e, para sua surpresa, parecia muito bem preservado – havia também duas placas esculpidas na pedra, uma de cada lado do muro, flanqueando a entrada, mas não lhes deu atenção. olhou para toda a extensão do palácio, pensando que parecia menos imponente do que quando o havia visto do barco. Conforme ela se aproximava, os guardas a olharam, mas não disseram nada quando ela empurrou os portões. 

O palácio era certamente mais impressionante na parte de dentro. O piso de pedra estava em parte coberto por dois longos tapetes azuis, no meio dos quais havia uma longa mesa de madeira com bancos – e estava posta, com uma infinidade de carnes, queijos e bebidas disponíveis. No fundo do salão principal e após a mesa estava um trono de pedra esculpido em um pedestal, com um escudo e duas espadas atrás dele, e acima deles estava o urso, símbolo de Eastmarch e da causa dos Stormcloaks. O que mais chamou a atenção de ali foram as inúmeras bandeiras azuis pendentes não apenas sobre o trono, mas também no alto, entre as paredes e o teto. Outra bandeira Stormcloak pendia na entrada para outra sala, e todo o salão era bem iluminado por cinco candelabros bem distribuídos em toda a extensão do teto. O trono estava vazio, e no salão estavam apenas alguns guardas. Ao chegar perto do trono, a jovem viu que à sua direita estavam as cozinhas, em outra sala, e a sala à direita, com a bandeira pendente, devia ser usada para reuniões sobre a guerra. Sem saber onde ir, entrou nas cozinhas, vendo apenas um homem loiro de meia-idade vestindo roupas comuns e um chapéu. Quando ele se virou para ela, ela viu que ele também tinha um grande bigode. Ela estava certa – aquele era Jorleif, administrador de Ufric Stormcloak. “Ouvi falar sobre alguns assassinatos e um guarda me pediu para falar com você.” foi direto ao ponto, sem paciência para conversar sobre obviedades.

O homem suspirou. “O que aconteceu com aquelas mulheres é terrível. Estes são de fato tempos difíceis, com os homens perseguindo seus irmãos como animais. Meus homens já estão muito sobrecarregados.” assentiu, deixando claro que queria assumir o caso. “Obrigado. Os guardas serão instruídos a ajudá-la, e eu também farei tudo que puder.” Sem ter certeza do que fazer, saiu do palácio e correu de volta ao cemitério, encontrando o mesmo guarda de antes, e vendo que o corpo havia sido removido de cima da lápide – apenas as manchas de sangue restavam, congeladas no gelo. “Jorleif me deu permissão para ajudar na investigação”, falou, cruzando os braços. Ele se desencostou da lápide, e apontou para o sangue congelado. “Notei esse rastro de sangue e agora Helgird está preparando o corpo para o funeral. Eu começaria falando com ela e examinando o corpo.” resistiu à tentação de revirar os olhos – não era como se ela precisasse de instruções, mas de qualquer maneira atravessou o pequeno cemitério e entrou na pequena porta que levava ao salão dos mortos de Windhelm.

O interior do salão dos mortos era o que esperava: decoração simples, caixões e cheiro de putrefação. Ela seguiu por alguns corredores mal iluminados até encontrar a sacerdotisa – na hora percebeu que era uma das testemunhas – debruçada sobre o corpo de Susanna, estendido em uma mesa de madeira. Ela levantou os olhos de seu trabalho quando viu a jovem se aproximando. “Há um grande corte diagonal do ombro esquerdo...” murmurava, quando a interrompeu perguntando se ela havia notado algo estranho no corpo, e ela disparou: “Bem, ela está morta. Mas isso não é incomum para alguém que esteja aqui. Quero dizer, alguém que não sou eu, é claro.” bateu a mão na mesa, frustrada, fazendo a velha sacerdotisa se assustar. “Qual é o problema de vocês? Não que eu esperasse muita simpatia, mas nem quando estou tentando ajudar vocês cooperam!” Enquanto falava, apontou para o corpo. “A única pessoa gentil que vi neste buraco de rato era a Susanna, e veja como ela acabou: morta! Agora, será que você pode se concentrar no seu trabalho?” estava surpresa com a própria explosão, mas supôs que aquilo era comum quando alguém vivia rodeado de muitas pessoas. Ter uma vida mais convencional em uma cidade grande deveria trazer muito estresse no dia a dia. 

“Desculpe, só estava brincando com você. Na verdade, a única coisa incomum é a forma dos cortes. Eles parecem que foram feitos com... bem, os antigos Nords usavam esses tipos de lâminas curvas quando embalsamavam seus mortos. Eu não sei quem em Windhelm teria algo assim. Além de mim, é claro.” Enquanto falava, ela foi para outra parte da sala e trouxe algumas ferramentas, mostrando a como os cortes teriam sido feitos. Ela agradeceu pelas informações e voltou ao cemitério, ouvindo Helgird murmurar algo sobre o trabalho que teria para preparar Susanna para o funeral.

Tudo o que lhe restava fazer era seguir o rastro de sangue que o guarda havia mencionado. não fazia ideia do horário, mas já devia ser madrugada, visto que nevava mais do que antes e o vento estava mais forte, o que a fez segurar seu capuz enquanto andava. Era difícil enxergar, então ela pegou uma das tochas que iluminavam entre as lápides. Vendo onde o sangue da Nord se misturava com o gelo, subiu os degraus que separavam o cemitério estreito da avenida Valunstrad. Ela não precisou caminhar muito para ver que a trilha terminava na porta de um casarão, que seria muito bonito em outras circunstâncias. Estava trancado, como ela esperava, e logo notou, com os membros latejando, que se jogar contra a porta e chutá-la não fariam nada para abri-la. resmungou. Não costumava levar gazuas consigo, nem mesmo na sua bolsa, esquecida em seu quarto na taverna. Ela estava longe de ser furtiva, também – arrombamento estava fora de questão e a levaria à prisão ou, na melhor das hipóteses, lhe custaria uma multa. Dinheiro nunca vinha fácil, então ela achou melhor não arriscar. 

Quando uma guarda chamou sua atenção por causa do barulho, lhe perguntou como entrar naquela casa, já que havia algo de suspeito ali. “A velha casa de Friga Shatter-Shield? Está abandonada desde que ela foi morta. Acho que Tova, a mãe dela, tem a chave. Mas a esta hora você não vai conseguir falar com ela.” suspirou e se resignou a retornar à taverna. Quando ela empurrou as portas pesadas de Candlehearth Hall, se sentiu triste ao ver que apenas Elda Early-Dawn estava atrás do balcão. Lembrando-se de algo que Susanna havia mencionado, pegou um pedaço de queijo da bolsa, assim como os papéis, pena e tinta que ainda estavam na bolsa amarrada em sua cintura e subiu as escadas, procurando uma mesa próxima da lareira. Já se passavam de duas da manhã, e ela se surpreendeu ao ver que o andar de cima estava relativamente cheio. Ela se sentou perto de um homem e molhou a pena na tinta enquanto comia o queijo. Se ela já não tinha o hábito de ler, o de escrever era ainda menos frequente. Ela leu a carta, torcendo para que Fanis conseguisse decifrar seus rabiscos bagunçados.


Fanis,

Cheguei em Windhelm. Um grupo de vampiros atacou a cidade e eu e uma elfa derrotamos eles. Você não vai acreditar que na luta usei um feitiço de chamas.

O povo daqui não gosta muito de forasteiros. A única pessoa que me tratou bem foi assassinada enquanto os vampiros atacavam. Esse é o meu mais novo trabalho: pegar o desgraçado. Não vai ser fácil, mas vou fazer ele pagar por ter tirado três vidas. 

Quero saber dos seus estudos em Winterhold!

-


Ela levantou seu olhar para a grande lareira, vendo que de fato havia uma pequena vela com um fogo brilhante. Por um momento lembrou-se de Susanna, desejando poder encontrá-la em Sovngarde algum dia, embora os rumores dissessem que a vida após a morte nórdica era apenas para os que morriam em batalha. esperou a tinta secar, dobrou a carta e se retirou para o quarto no andar de baixo. 

foi acordada na manhã seguinte por duas batidas nas portas duplas de seu quarto simples. Ainda sonolenta, e vestindo as roupas casuais que usava para dormir, ela puxou os trincos, encontrando um jovem usando uma espécie de boina, que parecia apressado. Ele murmurou que era um mensageiro, confirmou a identidade de e empurrou duas cartas bem dobradas nas mãos dela. Pedindo que ele esperasse, ela se retirou para o quarto, abrindo a primeira das cartas.


, onde você está, menina?

Você disse que ia a Dawnstar. O garoto que levou a carta voltou aqui duas vezes, não conseguiu te encontrar e tive que pagar extra. Disse que você ajudou um mago a salvar a cidade?

- Hadring


Era difícil acreditar em seus olhos. Quando saía em seus trabalhos nunca ficava sabendo do que acontecia na taverna, nem de quais viajantes passavam por lá, pois Hadring nunca havia enviado uma única carta em todos aqueles anos. No entanto, ali estava ela, lendo os garranchos dele, do homem que a havia tirado do deserto gelado há tanto tempo. Era fácil entender o que estava escrito, afinal, ele a ensinou a escrever, mesmo sem ser um homem de letras – e a caligrafia da jovem não era muito diferente daquela. Sempre direto ao ponto, mesmo por cartas. Esse velho nunca muda, pensou, sorrindo para si mesma, enquanto uma lembrança vinha em sua mente.

“Fazia algum tempo que Hadring havia encontrado na profundidade das florestas de The Pale. A menina agora tinha doze anos, e quando sentada seus pés quase tocavam o chão da taverna de tanto que havia crescido naquele período. Naquele dia de pouco movimento, ela e Hadring estavam sentados a uma das mesas do canto e as luzes das velas bruxuleavam no papel que ele rabiscava. Ela balançava suas pernas, animada, e olhava com interesse para o símbolo desenhado. ‘Esta é a letra A, a primeira do alfabeto’, ele explicou, paciente. ‘Repita comigo e agora desenhe.’ seguiu as instruções, mais tarde aprendendo que um conjunto de letras formava uma palavra, e várias palavras formavam um frase – é assim que as pessoas se comunicam por cartas!, sua mente infantil concluiu, imaginando como seria ter aquela habilidade. Ela não precisaria estar sempre presente, as pessoas poderiam ler o que ela iria escrever! Aquele dia e os dias seguintes foram muito longos, pois Hadring não deixava fácil. Ele lhe ensinou os números e as letras para que a menina nunca pudesse ser enganada e a fazia praticar todos os dias, até que ela tivesse aprendido a cobrar os clientes, a ler páginas dos pouquíssimos livros que tinham na taverna e a escrever um simples bilhete. 

“Após dias de treinamento intenso, encontrou uma espada de madeira em cima de sua cama. Quando questionou Hadring, ficou surpresa ao ver que ele passou uma mão pelos cabelos pretos. ‘Hoje faz um ano que te encontrei naquela floresta, .’ Largando a espada em cima de uma mesa, se aproximou do homem e o abraçou, fechando os olhos. Um momento depois, ela sentiu Hadring dar dois tapinhas em sua cabeça, dizendo baixo que também estava feliz por ela estar ali.
”


Ela se sentiu feliz com a lembrança e na resposta mencionou que estaria entre Eastmarch e The Rift nas próximas semanas e que estava fazendo algo importante, porém não mencionou o que era. “Vou visitar assim que puder”, foi o que escreveu no papel fino. Já a outra carta, com sua escrita cursiva floreada, era de Fanis.


Querida ,

Espero que tenha chegado bem em Windhelm. Conte-me tudo sobre a sua viagem. Sinto falta das nossas aventuras, mais ainda agora que cheguei em Winterhold e meu exame de admissão é amanhã! Estou preocupada, não sei se vou conseguir dormir esta noite.

Estou escrevendo de dentro da taverna, os donos são muito simpáticos. Acho que são os mesmos que te criaram. O que você fazia para se divertir por aqui quando era criança? Não sobrou muita coisa de Winterhold desde o Grande Colapso... mesmo trinta anos depois, a cidade nunca se recuperou.

Bem, preciso praticar meus feitiços agora, antes que a neve lá fora chegue nos meus joelhos. Deseje-me sorte!

- Fanis


suprimiu uma risada – era como se ela estivesse conversando com a maga naquele mesmo momento, já que ela escrevia da mesma maneira que falava. Ela tomou seu tempo para escrever, pois quis responder a todas as perguntas de Fanis, e inclusive adicionou que estava mandando mais uma carta junto com aquela resposta. Ao terminar, ela abriu a porta do quarto, encontrando o mensageiro tão impaciente que pulava de um pé para o outro no lugar, tendo deixado meio pedaço de pão na mesa ao seu lado. 

Ela guardou a espada na bainha em suas costas, pagou Elda Early-Dawn para ficar com o quarto pela próxima noite e acompanhou o mensageiro para fora de Candlehearth, vendo-o correr em direção aos portões assim que pisaram do lado de fora. Não havia tanta neve nas ruas como no dia anterior, e se sentiu aliviada ao ver que os corpos dos guardas mortos já haviam sido removidos, enquanto caminhava até a mansão da família Shatter-Shield, onde obteve a chave após explicar que estava investigando os assassinatos. 

A trilha de sangue continuava por baixo das grandes portas de Hjerim, que levava a um baú em um canto no andar térreo. Após se certificar que não havia sangue em outras partes da casa, se aproximou do baú, e enquanto se aproximava viu marcas nas tábuas do chão que mostravam que ele deveria ter sido arrastado e empurrado contra a parede. As marcas pareciam muito recentes. Desconfiada, ela empurrou a tampa pesada, encontrando onze panfletos e também um livreto com capa de couro. Os panfletos, intitulados Cuidado com o Açougueiro!, eram todos iguais e apenas avisavam sobre a presença de um assassino na cidade e eram assinados por Viola Giordano. não fazia ideia de quem ela era, mas imaginava que se tratava de alguém importante – pois quem mais se atreveria a distribuir panfletos sobre um assassino à solta? Ela olhou em volta, só naquele momento percebendo alguns móveis próximos do baú, dispostos sem nenhuma ordem. Ela seguiu uma passagem próxima dos móveis, chegando a uma alcova com uma pequena prateleira encostada na parede entre dois guarda-roupas. Ela se abaixou para investigá-la, e ela continha mais folhetos, dispostos em duas pilhas – notando um volume embaixo de uma delas, tateou e puxou um amuleto escuro debaixo dos papéis. Ainda segurando o amuleto na mão, ela se levantou e abriu os armários, surpresa ao perceber que um deles estava pregado na parede de pedra.

Naquele momento, soube que suas suspeitas estavam corretas, e agradeceu por ter seguido aquela pista. Hjerim não era mais uma casa comum. se certificou disso ao remover um fundo falso no armário, revelando uma sala escondida. Ali, de fato, estava o esconderijo do assassino – sentiu seu estômago se revirar ao ver o chão cheio de ossos ensanguentados, garrafas de vinho e hidromel vazias e as ferramentas de embalsamento que Helgird havia mencionado. O que mais chamou a atenção da nórdica-elfa foi a espécie de altar improvisado que havia em cima de uma mesa de madeira. Não havia nenhum santuário ali, apenas muitas velas, uma caveira e alguns ossos cheios de sangue – além de outro livreto de couro. Saindo da sala, ela se sentou no chão empoeirado de Hjerim e abriu os dois livretos, vendo que eram diários. Ela começou a ler, os dedos apertando as páginas delicadas.

Os planos estão dando certo. Encontrei boas fontes de osso, carne e sangue, mas até agora nada de uma boa amostra de tendão e medula. Não importa, a cidade está cheia de tolos desdenhosos de quem ninguém sentirá falta. Na noite passada quase consegui encurralar Susanna quando ela saiu de Candlehearth. O guarda idiota apareceu no momento errado e eu tive que me virar, como se estivesse dando um passeio. Penso em meu tempo em Winterhold, todas as mentes desperdiçadas em suas torres. Eles apenas exploram a magia que já conhecem. Estou descobrindo uma nova magia aqui. Algo mais profundo do que as travessuras de fogo e luz. Esta magia da carne é mais antiga que nós, talvez mais velha que o próprio mundo... Estou puxando o tecido do universo, e onde ele se amontoa e se dobra é onde criarei meu maior triunfo. Mais uma tentativa na garota Candlehearth. Ela está provando ser um pouco cautelosa, mas essas articulações fortes dela devem conter os tendões mais requintados. Vale o esforço. Esta noite.
não percebeu que estava destruindo uma prova do crime até que parte da página rasgou da costura do livro. Bastou ler o nome de Susanna para que seus dentes trincassem e ela desejasse, mais uma vez, não ter ficado lutando contra os vampiros enquanto a garçonete fugia pelos becos escuros. Um minuto a mais, e talvez uma mulher inocente não tivesse morrido naquela noite. Ela quase pediu a algum dos deuses que o assassino entrasse pela porta naquele momento – como ela teria gostado de vingar aquelas mortes, arrancando membro por membro daquele homem. 

Não posso encontrá-lo agora, mas a hora está cada vez mais próxima, ela se concentrou, ainda com os dentes trincados, e abriu o segundo livreto, sem entender seus conteúdos – e não por causa da letra.

17 tendões e ligamentos variados 

173 fragmentos de osso para montagem aprox.

4 baldes cheios de sangue (preferencialmente Nord)

6 colheres de medula (não mais que 2 de uma coxa)

12 jardas de carne (antes de cortar)


olhando estrelas até a borda da mente gelada, olhe para as luzes onde as almas dançam, revelando o momento em que uma faísca revive quando o apodrecido se une sob as mãos mais hábeis. Tradução de texto Aldmer...


Ela tirou os olhos dos escritos, sem interesse algum na procedência daquele texto. Só sabia que aquilo parecia algum tipo perturbador de receita – magia da carne. não sabia nada sobre aquelas coisas, mas as palavras aludiam a um tipo de magia que ela nunca havia visto, mas conhecia por sua péssima reputação. Necromancia, a magia que lidava com os mortos e com as almas. 

Fechando os livros e se colocando de pé, segurou todas as provas em suas mãos e correu para fora da casa, buscando a tal Viola Giordano, e após perguntar para algumas pessoas, conseguiu encontrá-la saindo de Candlehearth. As suposições de foram frustradas quando ela viu que Viola – uma imperial miúda de meia-idade e de cabelos brancos – não era parte da nobreza da cidade, já que usava roupas simples. Talvez fosse mesmo muito destemida, muito imprudente, ou uma mistura das duas coisas.

“O que você pode me contar sobre ‘O Açougueiro’? perguntou, tocando o ombro da mulher para chamar sua atenção. Ela zombou com cinismo antes de responder. "Eu o venho seguindo há meses – bem, não seguindo, mas estou tentando encontrá-lo... nem os guardas nem o povo ajudam. Eu sou a única que acha que ele pode ser pego.”

“Eu também” a cortou, sem querer prolongar aquela conversa. “Os guardas não vão ajudar porque estão ocupados demais com a guerra civil.”

Os olhos cinzentos de Viola se iluminaram. “Eu sei, não é mesmo? Eu digo, de que adianta ganhar uma guerra se ainda estamos sendo aterrorizadas por um dos nossos?” a interrompeu de novo, mostrando os diários que havia encontrado na casa. Para , Viola se interessou por eles tanto como uma criança recebendo presentes no dia de seu nome. Ela abriu os diários e os leu com rapidez, e voltou a falar. “É claro, Wuunferth! O mago da corte! Há rumores circulando sobre ele há anos. Ele é um homem perigoso, isso que o chamam de "não-vivo". Eu não o abordaria diretamente.” Ela deu alguns tapinhas no ombro de e devolveu-lhe os livros, enquanto ela deu um passo para trás, desconfortável com a aproximação. “Esta informação precisa ir direto ao administrador. Tenho certeza que ele irá te escutar.” Dizendo aquilo, Viola deixou parada na calçada, e ela ficou sem entender porque ela não quis ir junto, já que parecia tão interessada em resolver os assassinatos. Dando de ombros, resolveu se dirigir a um pequeno museu bem próximo do portão principal de Windhelm, pois havia ouvido um guarda dizer que seu dono poderia saber algo sobre o estranho amuleto. 

Ao empurrar as portas, ela se deparou com o mesmo homem imperial que havia estado na cena do crime, agora sentado em uma cadeira. “Bem-vinda à Casa das Curiosidades! Eu sou Calixto Corrium. Ofereço um breve tour da minha coleção por algumas moedas, ou você pode olhar à vontade.” Apesar do sorriso simpático do homem, abriu sua mão e lhe mostrou o amuleto. “É uma pena, Calixto, mas só vim aqui perguntar se você sabe algo sobre este amuleto.” Se Calixto estava ofendido pela praticidade dela, não demonstrou. “Deixe-me ver...” Ele se demorou alguns minutos virando o amuleto em suas mãos. “Ah sim, este é o Wheelstone, um símbolo de poder de Windhelm. Tradicionalmente é brandido pelo mago da corte. Eu... como colecionador, é claro, estaria interessado em adquiri-lo, se você estiver disposta a abrir mão dele. O que você acha de quinhentos septims?”

Naquele momento, a máscara de tédio de se desfez, e ela pensou que não havia escutado direito. Ela havia ganhado aquela mesma quantia por recuperar o amuleto de Kharjo nas semanas anteriores, no entanto, a vida de mercenária nunca era planejada – o dinheiro não vinha fácil, e ela precisava se manter na estrada para conseguir mais contratos. mordeu o lábio, imaginando que provavelmente receberia muito menos do que aquilo por toda a investigação, e depois ela precisaria de dinheiro para ficar em Riften e onde mais a enviassem... mas ao mesmo tempo, tinha uma ponta de desconfiança. Se o objeto mágico pertencia ao tal mago, por que ela o havia encontrado em Hjerim? 

“Se esse amuleto é do mago da corte, ele não deveria recuperá-lo?” por fim perguntou, se dando por vencida. Ela se surpreendeu quando o homem imperial bufou com sarcasmo. “Wuunferth? Bah. Este amuleto é puramente cerimonial. Além disso, aquele homem me dá arrepios. Dizem as más línguas que ele está metido com necromancia.” negou novamente e puxou o amuleto das mãos de Calixto, colocando-o com cuidado em seu cinto. Ela agradeceu e saiu da casa com o homem lhe desejando boa sorte. Foi apenas no caminho entre o pequeno museu e o palácio que viu que o sol já estava a pino – o que significava que já havia passado muito tempo da hora que havia começado a seguir as pistas. Ela seguiu caminho após parar na taverna para uma refeição que levou mais tempo do que gostaria. 

encontrou Wuunferth em seus aposentos no segundo andar do palácio. Quando ela entrou no quarto, ele estava de costas para ela, trabalhando em um encantador arcano, uma espécie de bancada usada para encantar armas. “Ouvi dizer que você é um necromante”, ela disse, sabendo que aquilo seria suficiente para chamar a atenção dele. Dito e feito: o homem se virou com um movimento tão rápido que o capuz de sua capa caiu, revelando cabelos grisalhos curtos e uma carranca distorcendo seu rosto enrugado. “Desculpe-me? Necromancia? Sou membro honorário do Colégio de Winterhold! Eles não permitem a necromancia há centenas de anos!” Agora entendia o que haviam lhe dito sobre o temperamento daquele velho. “E quem é você para fazer acusações tão sérias?” colocou sua espada no chão, mostrando que queria apenas conversar, e estendeu suas mãos com as provas recolhidas. “, e estou investigando os assassinatos. Encontrei seus diários e este amuleto no esconderijo do Açougueiro.” Ele pareceu relaxar um pouco com a declaração dela, mas ainda tinha uma posição firme. “Posso lhe garantir que nunca tive um diário. Como é esse amuleto?” Ele tateou o objeto que lhe deu, o pôs em uma bancada e fez alguns testes. “Ah sim, eu o conheço bem. Veja, esta parte esculpida no centro deve ter sido uma caveira em tempos antigos.” Ela passou o dedo no relevo, percebendo um volume afundado. “Este é o lendário Amuleto do Necromante. Parece que você está em parte certa, pois há necromancia na origem dos assassinatos.”

Naquele momento, Wuunferth revelou que estava investigando os crimes há meses e convidou para sentar-se, o que ela fez com gosto. Ele lhe mostrou anotações e detalhes que havia encontrado, assim como os padrões de quando os assassinatos aconteciam. “Fique de olho no Distrito das Pedras à noite, na área do mercado.” Dizendo isso, ele se levantou e olhou pela enorme janela. “Já está escuro. VÁ!” recolheu sua espada do chão e disparou pelas escadas, e depois para a grande cidade. Suas botas esmagavam a neve novamente, escurecida com os passos dos transeuntes. As lojas do mercado estavam fechadas, com algumas poucas pessoas perambulando e comerciantes recolhendo mercadorias. estava passando pela forja quando viu uma figura de cabelos castanhos se esgueirando atrás de uma elfa, apontando uma faca para as costas dela.

deixou que seus instintos a guiassem – certificou-se de fazer muito barulho enquanto puxava a espada de suas costas – e correu até eles, com um grito de guerra que não esperava dar. A elfa se afastou e saiu correndo por um dos becos, chamando os guardas. derrubou o homem no chão gelado, e viu que de fato se trava de Calixto. Ele gritou, dizendo que ela não entendia, e tentou atingi-la com a faca em diversos pontos vitais enquanto tentava deixá-lo parado com seu peso. Quando ela se lembrou de Susanna, sua fúria foi tamanha que Calixto não viu mais nada. “Susanna... todas aquelas mulheres... como você ousa? Como você pode se atrever?” Ela desceu a espada sobre Calixto enquanto ele se debatia, às vezes dando gritos de fúria e sentindo seus olhos se encherem de lágrimas ao imaginar o que as vítimas teriam sentido. O som da lâmina cortando a carne parecia bom para ela, e não se deu por satisfeita até que alguém chacoalhou seus ombros com truculência, como para acordá-la. 

“Pare! Ele está morto.” A voz conhecida da elfa Niranye, com quem havia lutado, fez com que parasse de se debruçar sobre aquele imperial. Ela estava acompanhada de dois guardas, que ajudaram a se levantar. Ela olhou pela última vez para o imperial, cujo braço estava separado do corpo. Em sua fúria, o havia mutilado – as mãos dela estavam cheias de sangue, e ela não se reconheceu ali. Seu breve devaneio foi interrompido por um dos guardas, que a parabenizou por pegar o criminoso e lhe informou que o Jarl queria falar com ela. Ela se deixou conduzir e, quando deu por si, já estavam na sala do trono do Palácio dos Reis, e Ulfric Stormcloak estava sentado no trono de pedra, com Jorleif de um lado e um guerreiro vestido com pele de urso do outro lado. Ulfric tinha a aparência que se esperava de um Nord: cabelos loiros compridos no estilo tradicional, com algumas tranças, e barba e bigode bem aparados. Ele era um homem grande e robusto, com bastante força física, porém não o achou tão impressionante como diziam, talvez pela postura relaxada e quase entediada dele no trono. Ela não tinha certeza, mas era possível que ele fosse até mesmo maior que ela, que mesmo para as mulheres nativas daquela terra, era considerada grande e forte. 

Ela retribuía o olhar atento de Ulfric, e se surpreendeu quando Jorleif pigarreou, e virou a cabeça para ele. “Pelas barbas de Ysmir, minha amiga. Aquele homem sempre foi um pouco estranho, mas não esperávamos...” Ele olhou para Ulfric, como se esperasse uma interrupção, e após um momento de pausa continuou falando. “Você prestou um grande serviço a esta cidade. Eu acredito que os guardas serão um pouco mais cordiais com você no futuro.” Era aquilo, então? Um agradecimento da corte e um pouco da boa vontade dos guardas orgulhosos? Agradecimentos não colocam moedas em meus bolsos, pensou com um pingo de irritação. Ela estava a ponto de responder quando as portas do palácio se abriram, e Tova Shatter-Shield entrou afobada, seguida por duas pessoas – um homem careca de barba grisalha e uma adolescente de cabelos castanhos – que deveriam ser seu marido e filha. Ela só parou de correr para se curvar a Ulfric e imediatamente puxou para um abraço apertado – ela, apesar de sua surpresa, conseguiu retribuir dando alguns tapinhas em suas costas. 

“Obrigada, obrigada. Embora seus atos não tragam nossa filha de volta, meu coração está em paz sabendo que o assassino dela foi punido.” assentiu, no início sentindo um pouco de dificuldade para compreender os termos que ela usava. Após cumprimentarem Ulfric, o marido e filha de Tova também se viraram para ela. “Obrigado, compatriota”, ele falou primeiro, cumprimentando-a da maneira tradicional. “Agora podemos passar nosso período de luto em paz. Sou Torbjorn Shatter-Shield, patriarca da família. Espero poder lutar ao seu lado um dia.” Por fim, a adolescente se apresentou como Nilsine e também ofereceu algumas palavras de agradecimento pela resolução da morte de sua irmã. Todos se viraram para Ulfric, e ele parecia olhar com mais interesse naquele momento. A família se curvou novamente, e achou melhor imitá-los, embora não entendesse a necessidade daquilo. Ela permaneceu com um dos joelhos no tapete azul enquanto Tova levantou a cabeça, se dirigindo a Ulfric. “Meu Jarl, acho que esta corajosa jovem merece uma recompensa pertinente ao serviço que prestou à nossa família e a esta grande cidade.”

Ele levantou a cabeça que estava apoiada em uma das suas mãos e disse, solenemente: “Muito bem. Eu a autorizo a comprar propriedade em minha cidade. Esta é uma honra reservada apenas aos meus Thanes, os membros de minha corte.” Todos viram Jorleif se esgueirar e cochichar algo para Ulfric. “ de Winterhold é o seu nome, correto?” Ela olhou para ele e balançou a cabeça. “Jorleif aqui se encarregará da venda e da decoração de Hjerim. Ele me diz que o preço de doze mil septims poderá ser reduzido para o valor mínimo de oito mil septims.” não conseguia imaginar de quantas bolsas de moedas precisaria se tivesse todo aquele dinheiro. Ela quase riu, pois aquele preço era absurdo a seus olhos, mas imaginava que ninguém ali apreciaria aquilo. “Eu agradeço, mas não tenho tanto dinheiro.” Ela voltou seu olhar para a família Shatter-Shield. “E mesmo que tivesse... não sei se poderia morar naquela casa em paz com todas as coisas horríveis que Calixto Corrium fez lá.” Ulfric não parecia muito feliz por ter recusado a proposta, mas deixou o assunto de lado. “Como desejar. Jorleif, dê algumas moedas de ouro para ela. Galmar, como estão nossos números na guerra?” Jorleif se aproximou e depositou uma pequena sacola de moedas na mão de , que ela amarrou em seu cinto. O outro homem parado ao lado de Ulfric se aproximou, e pode ver que ele parecia bem mais feroz que o próprio Jarl. “Sempre precisamos de homens e mulheres dedicados à causa dos Stormcloaks e dispostos a morrer por ela.” Os dois olharam para . “E então, o que me diz?” perguntou Ulfric. “Está disposta a se provar como uma verdadeira filha de Skyrim?”

levantou uma mão para ajustar seu capuz. “Eu não estou em nenhum dos lados da guerra civil. Eu vivo na estrada e, além disso, duvido que gostariam de uma mercenária nas suas... fileiras”, terminou de dizer, após passar algum tempo pensando na palavra adequada. Ela viu o homem chamado Galmar pedir que ela levantasse, e atendeu o pedido dele. A família Shatter-Shield também se levantou, e com a bênção de Ulfric, deixaram o palácio. “Até mesmo mercenários podem lutar com honra desde que tenham a instrução adequada”, ele começou a falar assim que os Shatter-Shields saíram da presença deles. Naquele momento, viu que Galmar tinha um machado gigantesco nas costas, também uma arma de duas mãos. Ele se afastou alguns passos e percebeu que ele e Ulfric a estavam analisando. “Você parece robusta e forte. Tenho certeza que uma guerreira com essas qualidades seria um ótimo complemento para nosso exército.” 

Pela primeira vez, teve que medir bem suas palavras, uma vez que desrespeitar o Jarl e líder dos Stormcloaks não poderia acabar bem. Ela queria evitar dizer a verdade: que achava aquela guerra estúpida. “Obrigada, mas não quero. Preciso ir agora.” Ela deu as costas ao trono e começou a se dirigir às grandes portas do palácio, sem pensar nas consequências daquela ação. “Vá, e que Talos a guie”, se virou por um momento ao ouvir a voz de Ulfric, mas logo continuou em seu caminho. “Porém, não se esqueça: a neutralidade também é uma posição.”


III. As folhas de outono


conseguiu vender o Amuleto do Necromante por algumas centenas de moedas e teve um banho preparado por Elda Early-Dawn, finalmente removendo todo o sangue do assassino. lavou algumas de suas roupas também, e conseguiu conjurar o fogo e controlá-lo por alguns minutos para secá-las.

Ela suspirou aliviada ao passar pelos portões principais de Windhelm e pagar Alfarinn, o carroceiro, para levá-la até Riften. Finalmente estou deixando esta cidade inóspita, pensou, observando como as muralhas cinzentas de pedra ficavam cada vez mais distantes conforme chegavam à beira do Rio Branco. Segundo Alfarinn, o caminho margeando o rio seria o mais rápido até atingirem o Lago Honrich, ao redor de onde Riften havia sido construída. A neve, no entanto, dificultaria a saída deles de Eastmarch, de maneira que a viagem poderia levar mais de um dia, segundo o carroceiro. Durante o caminho, ficou pensando se não seria mais rápido conseguir a ajuda de um animal grande para ir mais rápido, mas achou melhor ficar na carroça. Ainda era bem cedo naquela manhã e tinham um longo caminho pela frente.

O início da viagem passou relativamente rápido até o meio da tarde, salvo por uma pausa para o almoço e alguns salteadores no caminho, dos quais se livrou sem grandes esforços. Mais ao final da tarde, estavam procurando um lugar para acampar próximo ao rio quando Alfarinn quebrou o silêncio ao apontar para o céu. 

“Você está vendo?” balançou a cabeça, só conseguia visualizar uma silhueta ao longe. “Saiba que aquilo é um dragão! Tenho que mudar nossa rota!”, gritou, afobado, e fez o cavalo caminhar na direção oposta, e seguiram por ali, em um galope mais rápido. não podia evitar sentir uma curiosidade mórbida de ver como era um dragão de verdade – eles realmente eram tão ferozes e eram maiores que uma casa, como diziam os rumores? Ela teve que guardar suas questões para si, já que Alfarinn parecia muito assustado para conversar sobre o tema. 

Conforme eles passavam pelo centro-sul de Eastmarch, a tundra foi sumindo e dando origem a planícies vulcânicas – viu pela primeira vez piscinas coloridas de águas termais, gás saindo de rachaduras no solo por onde passavam e gêiseres. Não havia tantas árvores naquelas áreas e ela até chegou a ver mamutes e gigantes a uma distância segura. Por algum motivo curioso, vários grupos de gigantes haviam decidido fazer seus lares naquela região vulcânica. Tudo aquilo atiçava a curiosidade da mercenária, já que antes de sair do Norte ela não imaginava que veria tantas paisagens diferentes – fez várias perguntas a Alfarinn, e ele pareceu muito disposto a lhe explicar tudo que sabia sobre aquela que era sua terra natal. Ele apontava em diferentes direções conforme falava. “A leste temos as montanhas Velothi, uma cadeia de montanhas que vai até o extremo sul de The Rift e faz fronteira com Morrowind, a terra natal dos elfos negros. O norte você já conhece, é uma tundra congelada, e mais a oeste temos planícies com um pouco de tundra e também o Rio Branco passa por lá.” Foi naquele clima tranquilo de conversa que eles montaram acampamento e descansaram, próximos ao rio e o mais longe possível das áreas com maior atividade vulcânica. 

estava muito curiosa para ver se The Rift era igual às histórias que os viajantes contavam quando ficavam hospedados na taverna. Na sua infância, sentar-se ao lado deles e ouvir tudo que tinham para contar era uma das coisas que mais gostava de fazer. Suas suspeitas foram confirmadas quando atravessaram a fronteira na metade da manhã seguinte – como se alguém tivesse lançado um feitiço, as planícies com vegetação rasteira se tornaram florestas outonais, com tons de vermelho e laranja, e inúmeras árvores que nunca havia visto. Conforme avançavam no caminho de terra para dentro da floresta, a vegetação ficava mais espessa e o clima mais cálido. Sendo a província mais ao sul de Skyrim, ela deveria ter imaginado que o clima seria muito mais ameno, e que mesmo no inverno podia ser que não houvesse neve por ali.

Suas suspeitas sobre a vida selvagem também se tornaram verdadeiras – ela viu muitos tipos de cervos, aranhas gigantes e também espécies de lobos, ursos e gatos-de-sabre que não eram encontrados mais ao norte. Por muitas vezes ela teve que descer da carruagem e matar ou espantar animais que bloqueavam o caminho ou que pareciam dedicados a emboscá-los, e mais de uma vez viu grupos de caçadores fazendo o mesmo. Apesar daqueles encontros inesperados, para a segunda parte da viagem foi tranquila e interessante, pelo menos até chegarem às imediações de Riften. Eles desviaram por um caminho entre as montanhas e já estavam chegando a uma clareira quando ouviram – um rugido tão alto que fez com que os dois cobrissem as orelhas e olhassem para os cantos, apenas para descobrir que o barulho vinha de cima deles. De fato, alguns momentos depois, uma sombra gigantesca se alçou sobre eles, voando em círculos. “Pelos ossos de Shor!” Alfarinn gritou e deu um tranco nas rédeas, tanto que o cavalo guinchou, como se estivesse protestando. “Será possível que aquele dragão nos seguiu até aqui?”

A emoção de uma possível batalha já fazia o sangue de correr mais rápido, e ela arrancou a espada das costas e pulou para fora da carroça. “Não acho que somos tão importantes assim. Esconda-se! Vou tentar falar com ele, te encontro depois por aqui.” Ela não entendeu porque sua fala o fez rir, e procurou esquecer daquilo. correu sem rumo pela floresta – estava acostumada a rastrear animais terrestres, não um voador, e portanto não estava encontrando os sinais característicos.

Ela ouviu um rugido novamente, e um estrondo que fez o chão tremer – mais algumas centenas de metros à frente, havia uma clareira. E lá estava um dragão marrom, com dois chifres na cabeça e inúmeros espinhos que desciam por suas costas cheia de escamas. Ele batia suas asas enquanto queimava a vegetação, emitindo um som que parecia um grito. E enquanto se aproximava, duas flechas de prata atingiram o couro do dragão, o que o fez guinchar de dor e se virar para trás – para uma jovem de cabelos ruivos que já apontava outra flecha para ele. 

“FO KRAH DIIN!” A voz da jovem aumentou como se gritasse em um megafone, mas o que mais deixou chocada foi ver uma rajada de gelo sair da boca dela e atingir o dragão em cheio, que rugiu novamente e se defendeu com outro grito, de onde saiu fogo – a jovem escapou se jogando para o lado, e naquele momento outra jovem mulher apareceu atrás do dragão, do meio da vegetação queimada – ela tinha cabelos escuros e jogava espinhos de gelo dos feitiços em suas mãos. 

percebeu que havia parado de correr na direção deles, chocada pelo que havia acabado de ver. Era exatamente como nos rumores: uma jovem que atacava com sua voz e parecia preferir arco e flecha, embora também dissessem que ela usava uma espada. Ela viu a Dragonborn levar a mão à garganta – um efeito do grito, talvez? – e voltar a circundar o dragão enquanto a outra mulher continuava atacando-o com feitiços. Ao voltar a si, olhou nos olhos do dragão quando ele se virou para ela, e o que sentiu não foi a consciência dele, e sim uma enxaqueca tão forte que ela se dobrou no piso cheio de folhas, cuspindo sangue, antes de ver o brilho do fogo. levantou a cabeça por um momento, vendo o fogo vir em sua direção, mas logo a Dragonborn estava em sua frente, levantando um escudo mágico que absorveu o fogo, destruindo-o no processo. 

O dragão foi distraído pelos feitiços da outra mulher e se virou para aquela direção. Foi então que a Dragonborn estendeu uma mão para , e ela agradeceu ao se levantar. “Você realmente estava tentando falar com ele?” notou um sotaque diferente, que nunca tinha escutado – era provável que a Dragonborn, mesmo sendo Nord, não havia sido criada em Skyrim. “Eu aprendi a me comunicar com animais selvagens e pedir ajuda deles, então pensei que com dragões não seria diferente...” viu os olhos cinzentos da Dragonborn se arregalarem, mostrando um interesse genuíno naquilo. “Como você faz isso? Pensei que apenas os elfos da floresta conseguissem.” apenas explicou que havia desenvolvido aquilo durante sua infância e que não se tratava de magia. “Dragões não são animais. Eles são tão ou até mais inteligentes que qualquer uma das raças sencientes, até têm a própria língua e são imortais. Então é por isso que você não conseguiu falar com ele. Também são muito poderosos e orgulhosos, mas ainda estou aprendendo sobre eles... às vezes parece que me perseguem” dizendo aquilo, ela olhou para o céu, e mirou mais uma flecha no dragão, porém não conseguiu acertá-lo. A Dragonborn agora corria pela floresta, tentando alcançar sua companheira e , por fim sentindo a emoção da batalha, brandiu sua espada e a seguiu, encontrando o dragão pousado, com as asas dobradas, a alguns metros de distância.

Ele parecia um pouco cansado naquele momento, devido aos ataques da outra mulher, que pareciam ser poderosos. No entanto, continuava agressivo, já que o viu investir contra as duas mulheres, tentando mordê-las. Ele não percebeu até tarde demais, quando girou sua espada e a cravou na pele dura e escamosa do flanco do dragão – ela repetiu o movimento várias vezes, enquanto via mais e mais flechas se alojarem nele, e ele sucumbiu depois de mais dois gritos da Dragonborn. O corpo do dragão caiu com estrondo no chão, as asas meio dobradas e a boca escancarada, onde conseguia ver o que parecia ser o uniforme de um guarda daquele Hold, com o símbolo de duas adagas cruzadas. Com a batalha terminada, ela se sentiu segura para se aproximar mais, e ficou de frente para o corpo, como as duas mulheres faziam – como se elas estivessem esperando algo acontecer. 

A mulher mais alta, com quem ainda não havia falado, usava uma capa de viagem marrom e comprida – embaixo parecia haver outra capa – e uma espécie de armadura de material flexível em tons escuros, e puxou um capuz sobre a cabeça, aparentemente para se proteger do sol, que estava a pino. Era muito diferente do capuz que a mercenária sempre usava, e quando ela se virou para , sua suspeita foi confirmada. Aqueles olhos penetrantes e brilhantes, parecidos com os dos vampiros que ela havia derrotado, só poderiam significar que ela era uma criatura da noite também. retribuiu e manteve o olhar fixo. Um vento suave bateu, e os olhos da mulher pareceram mais escuros por um momento. tirou o sangue que ainda restava em sua boca e limpou sua luva na calça. Foi então que percebeu que a brisa não era vento – algo estava ocorrendo no corpo do dragão: parecia estar se desfazendo aos poucos, com as escamas, músculos e tecidos sumindo no ar, e logo o cadáver foi envolvido por chamas, e o vento ficou mais forte, até que aquelas chamas, transformadas em luz púrpura, começaram a ser absorvidas pela Dragonborn. Ela ficou parada durante todo o processo, respirando devagar, e, quando abriu os olhos, nada restava do dragão além de seu esqueleto. “Eu sinto muito, mas você nos atacou sem provocação”, ela falou baixo, mas conseguiu ouvi-la. Era estranho para ela, quase como uma prece pela fera morta. “E assim, minhas amigas, é que se absorve uma alma de dragão”, a Dragonborn se virou para elas e riu alto. 

estava um pouco confusa e não respondeu, e a vampira parecia não ter achado a menor graça. “Será que pode-me levar agora até minha casa?” ela falou pela primeira vez, e achou complicado entender os termos que usava. Era quase como se ela estivesse falando uma língua estrangeira. “Como se não bastasse estarmos no lugar mais longe possível de Haafingar, está muito claro aqui. Não sei como você aguenta.” Em vez de se irritar, a Dragonborn pareceu gostar da provocação. 

“Esse mau humor é fome?” arqueou uma das sobrancelhas. “Imaginei que já teria se alimentado desde que saímos daquela tumba.” A vampira chegou a lamber os lábios. “Eu...” mas então fez um sinal na direção de com os olhos. A Dragonborn pareceu não se importar. “Você me pediu para ser sua guia, mas também tenho meus próprios lugares para ir, que muitas é para onde as pessoas precisarem. Eu te falei, só preciso passar em Shor’s Stone pra limpar a mina deles e posso seguir caminho para sua casa.” 

“Realmente achas que eles não conseguem derrotar um grupo de aranhas congelantes?” Ela deu de ombros. “Eu vou onde precisam de mim.” “Você é muito generosa para seu próprio bem, Sigrid. Algum dia alguém acabará se aproveitando de sua boa-fé.” Ela suspirou, mas não pareceu tratar aquilo como um defeito. “Deixe que venham, então”, a guerreira ruiva disse e guardou seu arco e as duas flechas que ainda estava segurando. pigarreou, e a vampira deu um passo à frente. “Desculpe-nos, acho que nos empolgamos um pouco. Agradecemos sua ajuda com o dragão. Eu sou Serana, é bom conhecê-la.” A Dragonborn cumprimentou com mais entusiasmo. “E eu sou Sigrid Saren.”

Agora que estavam frente a frente, viu que era mais alta que as duas, e que pareciam ter idades próximas à sua. Sigrid, a Dragonborn, tinha os cabelos presos em tranças nórdicas tradicionais e usava uma armadura simples de couro que deixava a área do colo e pescoço e os braços à mostra. Ela também usava uma capa de viagem em cima da armadura, cujo fecho estava logo abaixo do pescoço. “Sou , prazer em conhecer vocês também.”

Com os cumprimentos feitos, Serana e Sigrid seguiram para o norte em direção a Shor’s Stone e continuou caminhando na floresta até encontrar um altar rodeado por duas estruturas de pedra que pareciam portais. O altar estava provavelmente sendo protegido por um mago, que já estava morto, com sinais de queimaduras no corpo. Ela viu um livro chamado Notas sobre Filogenia e Biologia Racial, Sétima Edição e o guardou em sua bolsa quando viu que ele era um estudo sobre as diferentes raças de Tamriel, imaginando que podia dar-lhe algumas informações sobre sua própria ancestralidade. Alfarinn apareceu no altar depois de alguns minutos, junto com sua carroça. “Ele já foi?” ele perguntou, tocando o focinho do cavalo para acalmá-lo. assentiu e eles seguiram viagem, até que chegarem em Riften no meio da tarde.

desceu da carroça e olhou os estábulos simples e a grande muralha de pedra à sua frente, vendo os portões fechados mais embaixo. Quando ela se aproximou, um guarda mandou que parasse e pediu uma “taxa de visitante” de vinte septims. Sem vontade de discutir, lhe pagou e então os portões foram abertos.

Logo que entrou em Riften, pôde perceber que era uma cidade pobre. As muralhas eram de pedra, mas a cidade toda ficava em cima de plataformas de madeira sob um lago, sendo que os prédios mais simples eram feitos de madeira e apenas as mansões ou prédios importantes, como a residência da Jarl, eram feitos de pedra, mais resistentes. Ela achou interessante que a praça do mercado era circular e ficava bem no centro, no meio de algumas lojas e da taverna. Diversos mercadores estavam trabalhando nas barracas e nas lojas, e já ali ela viu muito mais diversidade que em Windhelm – quase metade dos mercadores não eram humanos – ela viu pelo menos um Argonian e uma elfa e um elfo negros. Porém, o que mais lhe chamou a atenção ali foi como as pessoas andavam rápido e pareciam desconfiadas, olhado para os lados o tempo todo. Talvez sua amiga Fanis tivesse razão: o crime era tão desenfreado naquela cidade que seus habitantes tinham que estar sempre alertas. Depois do que havia visto nos portões, não seria surpreendente se os guardas recebessem subornos para ignorar crimes.

soube que havia chegado ao Templo de Mara quando parou na frente de um muro decorado com faixas vermelhas, adornadas com o que deveria ser o emblema da deusa. O templo era de madeira e parecia ser um dos maiores prédios da cidade, além de ter seu próprio pátio e um lance de escadas iluminado por braseiros. Assim que entrou, ela viu uma enorme estátua de bronze de Mara à sua frente, retratada como uma mulher vestindo roupas de sacerdotisa com os braços estendidos. atravessou a sala, passando pelo tapete vermelho a seus pés e deu uma olhada nas dezenas de bancos dispostos em fileiras. Ela chegou até o altar, sob uma mesa simples, onde havia um pequeno santuário de Mara – e viu o que pareciam ser dois sacerdotes conversando em um dos bancos. 

O homem, um Redguard, segurava as mãos da mulher, uma elfa negra de cabelos curtos. “Fico feliz em saber que você está grávida, . Eles disseram que isso não poderia acontecer, mas Mara mostrou a eles que estão enganados.” As suspeitas de se confirmaram. Se aquele humano e aquela elfa podiam ter um filho, sua própria ascendência não era um engano, afinal. Ela deixou o casal e foi até um Nord que viu sentado em um canto. “Quem é o responsável do templo? Tenho algumas perguntas que precisam de respostas”, ela viu que ele também usava roupas de monge e comia uma fruta. “Seja bem-vinda ao Templo de Mara. Eu sou apenas um humilde acólito, no entanto. Se você precisa de orientação, deve falar com ou . Aquele casal ali,” gesticulou para a elfa e o humano.

Talvez percebendo a presença de uma visitante, o casal se abraçou e se afastou – o homem se ajoelhou abaixo do santuário e a elfa foi até . “O que você procura, minha filha?” se levantou e tirou o livro da sacola de viagem. “Respostas. Fui enviada por para iniciar minha busca.” pegou o livro e o virou em suas mãos. “Você é de Winterhold, correto? Recebemos uma carta dele há algumas semanas dizendo que você viria. Acompanhe-me, por favor.” seguiu a sacerdotisa até um quarto adjacente à sala principal do templo. Ela supôs que fosse o quarto dos sacerdotes ao ver uma cama de casal, sendo que também havia uma cama estreita em um canto do quarto. fechou a porta e a convidou para sentar-se à mesa, servindo-lhe pão, queijo e algumas bebidas. alegrou-se com a comida farta. “ mencionou que você procura alguma coisa sobre elfos da neve” assentiu. Enquanto ela comia, a elfa ficou procurando alguns livros na estante e disse que poderia ficar hospedada ali quanto tempo precisasse, já que havia sido enviada pelo colega deles.

Ela colocou mais três livros na mesa enquanto terminava sua refeição. “Eu também estou procurando informações sobre uma mulher chamada Sylgja Bronze-Helm”, ela acrescentou, e viu a sacerdotisa retirar uma espécie de catálogo da estante e folhear as páginas gastas. “... Sylgja Asgarsen, talvez? Parece que esse nome que você falou é um título, e não um sobrenome.” terminou de comer e respondeu: “Não sei, eu a conheço pelo nome de Bronze-Helm.” colocou o catálogo sobre a mesa e apontou a página que estava lendo. “Aqui diz que esta Sylgja foi uma iniciada neste Templo há mais de trinta anos, portanto, antes da Grande Guerra entre o Império e o Domínio Aldmeri.” deu uma olhada no texto, que descrevia a jovem como uma aluna no templo, suas atribuições e até algumas características físicas para melhor identificação. “Ela deixou o templo um pouco antes do início da guerra e se juntou à Thieves Guild, e é aqui que os registros acabam”, a elfa concluiu, esperando uma resposta de . “Veja esta nota: ‘avistada várias vezes nos arredores de Riften usando um elmo marrom.’” não tinha mais dúvidas de que aquela ex-aluna realmente se tratava de sua mãe. 

“Eu tive visões dela em um sonho proporcionado por Vaermina”, explicou, e a elfa comentou que havia mencionado aquilo. “Vi lembranças dela, e foi assim que eu descobri que meu pai é um elfo das neves que tem vampirismo.” A sacerdotisa pôs uma mão sobre as de , dizendo que Lady Mara iluminaria o caminho. Ela mostrou os três livros: dois volumes pequenos intitulados Os traídos e Tocando o céu, além de Notas em Filogenia e Biologia Racial, que havia trazido. Ela percebeu que os dois primeiros livros tinham um símbolo que nunca havia visto nas capas, como estrelas. 

“Entender o que estes livros ensinam vai lhe dar maior conhecimento sobre sua origem, e vou fazer isso junto com você”, a sacerdotisa explicou. Ela abriu os dois primeiros livros. “Foi Sylgja que trouxe estes livros do lugar onde conheceu seu pai, que é um vale ancestral, o lugar de peregrinação da antiga religião dos elfos da neve.” Antes que pudesse fazer perguntas, ela continuou. “Quando viu que não conseguiria vendê-los por estarem na antiga língua élfica, ela os deixou aqui conosco, e um estudioso de Markarth os traduziu para nós.” Ela deixou que lesse os livros, ajudando-a quando necessário por causa da linguagem. O primeiro era um relato em versos da dolorosa transformação dos elfos da neve em Falmer por meio da escravidão, e o segundo detalhava todos os riscos da árdua jornada de peregrinação por um vale escondido. “Se o seu pai estava sentado em um trono na sua visão, ele deve ser algum tipo de sacerdote ou líder – e é possível que ainda esteja nesse vale. Se você quer encontrá-lo, talvez seguir o caminho dos antigos peregrinos seja uma opção.” quase cuspiu o vinho que estava em sua boca. “Desde que vi as lembranças, tenho sentido quase um chamado para encontrar o meu pai. Antes eu estava satisfeita por não saber nada sobre minha origem, mas agora é como se eu não fosse uma pessoa completa sem fazer isso.” Ela não havia percebido que lágrimas inundaram seus olhos escuros até que algumas caíram sobre a mesa. segurou sua mão. “Os deuses mostrarão o caminho, minha filha. Você deve confiar neles.” assentiu e limpou as lágrimas, abrindo o último livro e lendo em voz alta. 

“Depois de muita análise de espécimes vivos, o Conselho de Curandeiros da Universidade Imperial determinou há muito tempo que todas as "raças" de elfos e humanos podem acasalar-se entre si e gerar filhos férteis. Geralmente, os filhos carregam os traços raciais da mãe, embora alguns traços da raça do pai também possam estar presentes...” Aquele estudo sobre as principais raças de Tamriel era tão extenso que nunca havia ouvido falar de muitas das raças citadas ali. Sob orientação da sacerdotisa, ela passou a ler apenas as partes que tratavam das relações entre elfos e humanos. Ao final da leitura, baixou seu capuz, expondo suas orelhas e cabelos brancos, querendo comprovar o que estava descrito no estudo. Ela olhou seu reflexo em um balde com água enquanto a sacerdotisa citava os traços das duas raças. “De fato, você não tem os traços tão angulosos como os elfos costumam ter e seus olhos são amendoados, outra característica humana. Você parece ter só as orelhas e os cabelos mais parecidos com os elfos – lembra alguma coisa aparência dos seus pais?” 

“De acordo com as visões que tive, acho que tenho mais traços da minha mãe, com a diferença que ela parecia ser mais baixa que eu e tinha cabelos loiros”, concluiu enquanto falava. “Pela minha aparência, pensam que sou apenas humana, portanto... acho que é verdade o que falam nesse livro”. Dizendo isso, puxou novamente o capuz sobre a cabeça, deixando apenas seu rosto à mostra. “Você deve a sua força física a seu sangue nórdico também,” sorriu um pouco, mas logo uma expressão sombria atravessou seu rosto. “Não está pensando em falar com a Thieves Guild, certo?”

“É exatamente o que vou fazer,” respondeu, se levantando e jogando a bolsa sobre a cama estreita. A sacerdotisa foi até a porta. “Eles se desviaram do caminho da Deusa há muitos anos.” No entanto, em vez de bloquear a passagem, ela abriu a porta. “Mas neste caso, tampouco vejo outra opção. Você deve falar com Brynjolf, ele costuma ficar no mercado a esta hora.” agradeceu e correu para fora do templo. 

Brynjolf, um Nord robusto, era dono de uma das barracas do mercado. havia tido um vislumbre dos cabelos ruivos dele ao passar pelo mercado no caminho para o templo e havia ouvido algo sobre suas “curas milagrosas”. Ele parece mesmo um homem de negócios, deve ser o homem mais bem vestido daqui, pensou, dando uma olhada nas pessoas que passavam por ali ou trabalhavam àquela hora da tarde. Ela não precisou se aproximar mais do que alguns passos para ser abordada.

“Nunca teve um dia de trabalho honesto em sua vida por todo o ouro que está carregando, hein moça?” Ele tinha um sotaque distinto, que não sabia definir.

“Como você poderia saber disso?” verificou, aliviada, que a bolsa de moedas ainda estava atada a sua cintura.

“É tudo uma questão de avaliar seu alvo, garota. A maneira como andam, o que estão vestindo... entrega tudo de bandeja."

“Na verdade, estou buscando uma pessoa e acho que você deve saber bastante sobre ela.” decidiu ir direto ao assunto. Brynjolf se aproximou, passou um braço pelos ombros dela e cochichou.

“Querendo informações gratuitas, não é? Ajude-me a lidar com os negócios primeiro, depois veremos como posso ajudá-la.” Parecia que ela não conseguiria descobrir o paradeiro de seu pai sem fazer um favor para aquele homem.

“Espere um pouco, eu só preciso de algumas informações”, insistiu.

“E eu estou ocupado. Você me ajuda, eu te ajudo, é assim que funciona.”

“Muito bem.” não conseguiu evitar de revirar os olhos. “O que tenho que fazer?”

“É bem simples”, ele apontou com a cabeça para o Argonian que vendia joias e para um elfo negro de cabelos castanhos que estava trabalhando em uma barraca próxima. “Precisamos colocar o elfo, Brand-Shei, fora da competição em caráter permanente. Para isso, eu vou causar uma distração e você vai roubar o anel de prata de Madesi de um cofre sob sua estante. Quero que você coloque o anel no bolso de Brand-Shei sem que ele perceba.” 

“Não vou jogar um homem inocente na prisão!” A voz de se elevou um pouco em sua inquietação, embora não o suficiente para todos ouvirem. “Eu te pago pelas informações, pode ser? Quanto você quer?” E pegou o saco de moedas, colocando-o sobre o balcão, ao lado dos elixires que Brynjolf estava vendendo.

“Desculpe... eu geralmente tenho um faro para este tipo de coisa.” Ele parecia bastante desapontado. não fazia ideia de que parte dela o havia feito pensar que estaria disposta a infringir a lei. “No entanto, posso aceitar um pouco de dinheiro. Que tal trezentos septims?” Aquela era a exata quantia que ela havia recebido pela venda do Amuleto do Necromante. Sem ter certeza se poderia confiar nele, contou as moedas e as depositou na mão dele. “Ótimo, moça, ótimo. Você acabou de conseguir o maior dos linguarudos. Quem você está buscando?”

“Uma mulher chamada Sylgja Asgarsen. Talvez você a conheça por Bronze-Helm.” Brynjolf levou uma mão ao queixo, como se estivesse tentando lembrar de alguma coisa, e logo seu rosto se iluminou. “Ah sim. Eu a conheço, ou melhor a conheci. Encontre-me no Ragged Flagon, o bar abaixo da cidade, e eu te direi tudo que sei.” franziu as sobrancelhas. As histórias que havia ouvido sobre ‘a cidade embaixo da cidade’ eram verdadeiras, então. “Por quê lá e não aqui?” Ele pôs uma mão em seu ombro. “Os muros têm ouvidos, moça. Lembre-se disso. Te vejo na taverna.”

A contragosto, desceu as escadas para o nível inferior de Riften, o Canal, pequenas residências e até mesmo a loja de alquimia eram construídas direto da pedra cheia de umidade. O cheiro era tão forte que ela não conseguia entender como alguém conseguiria viver ou trabalhar ali. Embora o sol ainda brilhasse nas plataformas acima, o Canal estava bem mais escuro e não quis ficar muito tempo perambulando por ali. Ela atravessou as passarelas precárias que separavam os dois lados do canal e abriu um velho portão de ferro, que girou com um rangido tão alto que seus ouvidos doeram. Ela puxou a maçaneta e entrou no esgoto. 

logo entendeu porque chamavam aquele lugar de Caminho dos Ratos – não só o cheiro de esgoto era insuportável, como também para cada sala e corredor havia inúmeras salas mais, como se estivessem ali para confundir viajantes. Ela não achou nada além de hordas de Skeevers e corpos humanos que pareciam relativamente frescos. Ela só podia imaginar porque aquelas pessoas haviam escolhido o esgoto como casa. Ela viu vários artigos e armas interessantes jogados no chão imundo ou em cima de mesas, porém os deixou lá, com receio de pegar alguma doença.

Depois que sua espada já estava encharcada de sangue de Skeever, ela adentrou uma sala com escadas e uma porta igual à da entrada do esgoto, e ao abri-la encontrou-se em uma espécie de cisterna, onde o cheiro já era bem mais suportável, mas a umidade era ainda pior. Ao entrar, ela passou por cinco nichos sujos e desorganizados, e entrou na área principal do bar após passar por uma passarela onde havia uma placa com o nome do lugar. Conforme andava, ela foi se aproximando de uma piscina rasa com um deque de madeira, onde algumas pessoas estavam sentadas, e logo pôde ver o balcão do bar e diversas mesas e cadeiras, como uma taverna normal. Tudo parecia muito desorganizado e improvisado, com barris, sacas e engradados jogados no chão ou empilhados sem cuidado algum, confirmando o estereótipo pelos quais a guilda era tão conhecida. 

Ela viu como todos os olhares se voltaram para ela quando se aproximou de Brynjolf, que conversava com um homem que tinha quase o dobro da altura dele. Os dois estavam apoiados no balcão e o homem enorme bufou e saiu de perto, se dirigindo para a entrada do bar, quando chamou Brynjolf.

“Você chegou rápido, moça. Talvez eu esteja certo sobre os seus talentos ocultos, afinal.” Ele dizia enquanto gesticulava para uma mesa vazia. se sentou à frente dele e observou enquanto abria uma garrafa de cerveja. “Eu só preciso das minhas informações”, insistiu, e ele não se opôs. “Muito bem, o que quer saber sobre Sylgja Bronze-Helm?” baixou a voz. “Eu sou filha dela, e quero saber tudo sobre a entrada dela na Thieves Guild e sobre os tesouros que ela trouxe de um vale nevado.”

“Esses tesouros já foram usados por nós há muito tempo,” ele riu, e não pareceu surpreso pela revelação de . “Bem, por onde podemos começar? Eu era bem mais novo que você quando passei a fazer parte da Thieves Guild, naquela época um moleque que roubava algumas moedas dos mercadores ricos.” Ele deu risada. “Quase trinta anos atrás, uma jovem Nord havia entrado na guilda há pouco mais de um ano, desacreditada com a deusa Mara. Ela havia passado boa parte de sua juventude no templo, e não entendia porque a deusa não havia intercedido pelos milhões de vidas que se perderam durante a Grande Guerra. Ela sabia, pois era uma veterana: na época uma adolescente, trabalhou como espiã entre os Thalmor e o Império, e mais tarde como curandeira, e assim, viu muitos homens e mulheres valentes morrerem em suas mãos. Ela não era muito robusta como seus compatriotas, mas era tão ágil que nunca foi pega em seus roubos – ela era tão boa e se destacou em tão pouco tempo que eu ouvia meus superiores dizendo que iam convidá-la para fazer parte da liderança da guilda.” Ele parou para tomar mais alguns goles e ofereceu a garrafa a , que a virou com gosto, molhando sua garganta seca. Até então, tudo que ele contava parecia fazer sentido com as lembranças de Sylgja. “Eu ouvia outros membros, no entanto, dizerem que ela estava ficando cada vez mais arrogante, como se o sucesso tivesse lhe subido à cabeça. E, naquela época, mais de dez anos após minha indução na guilda, Sylgja partiu em um último teste antes de ser agraciada com uma das posições de liderança. Nenhum de nós ficou sabendo para onde ela foi, só sabíamos que era uma caverna escondida nas montanhas de The Reach.”

sentiu sua pulsação acelerar ao ouvir a última frase. O fato daquela região ser muito perigosa e ter inúmeras cavernas não ajudava, mas pelo menos ela sabia para qual Hold deveria ir. “Ela demorou quase um ano para voltar e muitos de nós achamos que ela havia parecido. Porém, um dia ela entrou pela porta desta cisterna, carregando tanto ouro e artigos valiosos que mal conseguia andar. Após três dias de festa pelo seu retorno, Sylgja disse que se ausentaria por alguns meses com amigos em Winterhold, pois quem poderia impedi-la? E ela se foi, e quando voltou parecia mais magra e mais fraca, porém retornou aos trabalhos como se não tivesse acabado de dar à luz. Eu não sabia, mas uma ou outra de nossas membras percebeu os sinais.” Naquele momento, Brynjolf parou e pediu mais dinheiro, pois segundo ele, ‘não iria querer ficar sem o fim da história, certo moça?’ e ela concordou com relutância, quase esvaziando seus bolsos de moedas.

“Após retornar, não só Sylgja recebeu uma boa soma de dinheiro por seus esforços, como também continuou seu treinamento especial para a liderança. Pois aqui não é qualquer um que se torna líder, moça, eu lhe garanto.” quase revirou os olhos ao ouvir aquilo. “Alguns anos depois, porém, alguns dias antes de fazer seu juramento final... o assalto a uma carruagem deu errado e Sylgja pereceu quando um guarda cravou sua espada no abdômen dela. Não que você tenha perguntado minha opinião, mas acho que a autoconfiança exacerbada foi o que a levou à queda.” pensou um pouco e tentou se lembrar. De fato, as visões dadas por Vaermina condiziam com o relato do ladrão. Ela tinha que admitir que aquele era um ladrão de palavra, ainda que exigisse grandes quantidades de moedas para tal.

“Certo. Eu preciso de uma última coisa,” pediu, abrindo seu mapa de Skyrim na mesa engordurada. “Aponte para mim onde é essa tal caverna.” Ficou surpresa com a aparente boa vontade dele, que virou o mapa para si e traçou possíveis rotas com o dedo. “Eu nunca estive lá, mas a sua mãe disse várias vezes que era por aqui, nas montanhas, perto da fronteira com Haafingar.” Ele apontou uma região circundada por terreno acidentado, que tinha várias marcações de tumbas antigas por perto, refúgios dos Renegados e até mesmo de uma possível fortaleza dos orcs. Sem ter outra pista para seguir, lhe agradeceu e se levantou, deixando metade da garrafa de cerveja sobre a mesa. Ela por fim tinha outro lugar para seguir a busca, e não queria perder um minuto sequer.


IV. Quando as montanhas falam


Ela mal tinha voltado para a cidade quando recebeu uma carta de Fanis, dizendo que havia passado no teste do Colégio de Winterhold e logo começaria suas aulas. lhe respondeu com muito entusiasmo, parabenizando-a e também pedindo informações sobre The Reach.

decidiu passar mais alguns dias em Riften, cuidando dos preparativos para a longa viagem - afinal, ela atravessaria Skyrim e sabe-se lá quando voltaria. Ela passou aqueles dias ajudando no templo e fazendo tarefas simples como cortar lenha e colher vegetais para recuperar seu dinheiro. Graças ao clima ameno da região, ela pôde lavar suas roupas e usou seu tempo livre até mesmo para afiar sua espada daédrica e reparar sua armadura com o ferreiro local, Balimund.

Naqueles dias tranquilos até mesmo para os padrões de Riften, ela recebeu a resposta da maga, aconselhando-a a não caminhar à noite por The Reach e sempre ficar o mais longe possível dos acampamentos dos Renegados, muito comuns naquelas terras. O norte da região, onde a caverna – que havia descoberto que tinha o nome oficial de "Abismo Negro" – estava, era mais seguro por fazer fronteira com Haafingar, o Hold famoso por ter a capital de Skyrim, Solitude.

se despediu dos sacerdotes do Templo, prometendo visitá-los assim que possível, e saiu de Riften montada em um cavalo emprestado pelo Redguard que geria os estábulos. Ela logo descobriu que montar a cavalo não era tão diferente de montar cervos ou alces, com o benefício de que os cavalos eram mais obedientes e tinham mais energia. E eles correram e correram pelas florestas outonais, que logo se transformaram em campos e planícies verdejantes com a travessia para o Hold de Whiterun, que conhecia bem por causa dos inúmeros trabalhos de extermínio animal que havia realizado por ali. 

Ela continuava tão rápido quanto podia sem que o cavalo se cansasse demais, e muitas vezes dormiu em seu lombo enquanto ele reduzia seu passo a um trote tranquilo. Ela perdeu a conta dos dias que passaram na região de Whiterun, inclusive da única vez que pararam na capital e depois em Rorikstead para um descanso merecido. Tudo que sabia era que se passaram mais de três dias desde a saída de Riften e menos de uma semana até atravessarem o Rio Karth, no coração do território disputado pelos rebeldes. O que via e sentia não deixava dúvidas de aquela era uma região errada, talvez deformada ou amaldiçoada pela quantidade de sangue que havia sido derramada naquelas terras inférteis ou mesmo pelas disputas intermináveis. teve que matar alguns guerreiros Renegados que a perseguiram logo após cruzar o rio.

Eles continuaram rumo ao norte, as temperaturas caindo cada vez mais conforme subiam as montanhas. quase se sentiu em casa quando o terreno acidentado de vegetação rasteira deu lugar a florestas de coníferas banhadas pela neve. O próprio de ar de The Reach não a deixava esquecer, porém, que não era bem-vinda ali.

Foi sabendo disso que ela olhou bem a entrada da caverna em meio a uma rocha, entre vários pinheiros. desmontou do cavalo, determinada a iniciar o caminho dos elfos da neve peregrinos, seus ancestrais.


Fim.



Nota da autora: e Fanis retornarão em MV: In Vain.
Fique de olho na longfic de Skyrim que postarei nos próximos meses!

Outras Fanfics:

MV: Élan
As Crônicas da Rainha Leoa (O Rei Leão - Finalizada)
Timişoara

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