Última atualização: 25/06/2020

Capítulo Único

Cerveja.
Hortelã.
E amêndoas.
Era a mistura desses três sabores que eu jurava sentir enquanto o beijava.
Meus dedos, correndo entre os fios sedosos de seus cabelos, transmitiam algum tipo de eletricidade para o sangue que corria fervente em minhas veias.
Estar com trazia a mim o mesmo sentimento de estar à beira do caos – perto, mas nunca próxima o suficiente para deixar-me tornar caótica.
Era a medida perfeita de insanidade, equilibrada com uma generosa dose de carinho e cumplicidade.
– Você pode fazer melhor que isso, .
Senti-me inerte por alguns instantes, presa na sensação de que meu nome escapava como música dos lábios de entre uma tragada e outra do baseado que apertava entre seus dedos.
– Você sabe que isso soou como um desafio, certo?
Estreitei os olhos para o garoto que, com as mãos em minha cintura, me lançava o sorriso atravessado mais irresistível que eu já havia visto na vida.
Eu adorava desafios. Ele adorava me desafiar.
Ajeitei a pequena bolinha laranja entre meus dedos e inspirei a fumaça que meu namorado tentava dispersar com os dedos. Fechei um dos olhos e ajeitei a posição de meu punho algumas vezes. Quando peguei impulso para jogá-la, mal pude vê-la acertar em cheio o último copo vermelho no outro lado da mesa de sinuca, pois os braços de me erguiam do chão eufóricos e seus lábios macios emolduravam os meus da mesma maneira caótica que meu coração martelava meu peito.
Aquele momento era muito mais nosso do que qualquer um podia imaginar.
Fora quem me ensinara a ver alegria nas pequenas coisas, como ganhar quinze gramas de erva em uma partida de beer pong.
Não importava a situação, era sempre intenso em tudo o que fazia e em tudo o que acontecia. Não demorei muito tempo para me ver presa à sua intensidade, mergulhando fundo demais para sequer mirar o topo.
– Já disse que está linda hoje? – O murmúrio quase sensual veio junto às suas mãos entrelaçando as minhas, puxando-me para perto de si.
– Cerca de vinte e sete vezes. – Rolei os olhos ao sentir meu corpo encontrar o seu. – Sim, eu contei.
soltou a risada que eu tanto amava, apertando os olhos e jogando os cabelos loiros para trás.
– Você é incrível. – Ele mordeu o lábio inferior enquanto seus olhos passeavam inquietos pelos meus. – Na verdade, acabei de decidir que você é tão incrível que merece uma noite tão incrível quanto você.
Balancei a cabeça, tentando entender onde a conversa havia chegado.
– Rápido demais, .
Ele me deu um selinho rápido antes de pegar um saquinho transparente recheado de maconha da mão do garoto que havia acabado de perder pra mim no beer pong. Segundos mais tarde, passava as mãos pelos meus ombros e me guiava até a parte de fora da casa lotada de gente onde a rua treze e a sétima avenida se encontravam.
– Certo. É uma daqueles jogos em que tenho que adivinhar onde está me levando? – Sorri ao acompanhar seu passo na calçada.
Era começo de outubro e, mesmo assim, a noite estava excepcionalmente quente.
Ou talvez fosse apenas o calor que emanava do corpo do meu namorado e atingia somente a mim, já que um casal havia acabado de passar ao nosso lado com incontáveis casacos empacotando seus corpos.
– Sem jogos. Só quero andar pela cidade e conversar com você.
Só conversar? Não parece algo que faria.
– É diferente quando é com você. Acredite, tudo que sai dessa sua boquinha linda me interessa.
– Por que sempre parece que você está falando de sexo?
Ele soltou outra risada que pareceu reverberante direto em meu peito.
– Porque, na maioria das vezes, eu tô. – Seus passos diminuíram quando suas mãos deslizaram para os meus ombros, fazendo-me parar e virar para ele. – Eu ouvi dizer que algumas pessoas têm um linha mais escura em volta da íris e outras não. – Seu rosto se aproximou milimetricamente do meu. – As pessoas que não têm essa linha também não têm alma.
Segurei uma risada. Era extremamente difícil não se apaixonar por . Talvez até impossível.
Foi a minha vez de me aproximar um pouco mais, mirando o fundo dos olhos mais intensos que eu conhecia.
E lá estava. Apenas a intensidade da cor, bela e sem borda alguma, apenas terminando ao infinito.
– Não deve ser surpresa, mas você não tem uma alma. – Sussurrei.
Um pequeno sorriso curvou seus lábios para cima.
– Parece que fomos feitos um para o outro. Você também não.
O sorriso refletiu em meus lábios quando, ao terminar a frase, ele beijou brevemente a ponta do meu nariz. E então entrelaçou nossos dedos e voltou a andar, como se não tivesse soltado o conhecimento mais aleatório da noite cinco segundo atrás.
? – Murmurei seu nome, mantendo meu olhar fixo na rua iluminada que nos levaria até o Riverside Park.
– Oi, amor.
Meu estômago deu três cambalhotas desengonçadas. Eu adorava quando ele me chamava de amor.
– Eu geralmente perco o interesse rápido pelas coisas. Pelas pessoas. Por que não aconteceu com você?
– Não acabamos de chegar à conclusão de que fomos feitos um para o outro?
Rolei os olhos.
– Estou falando sério.
– Eu não sou de conversar e posso passar horas ouvindo você apenas contando sobre seu dia. Odeio romance e faço questão de quase ter um ataque glicêmico quando estamos juntos. Achava que era impossível ser feliz com apenas uma pessoa, e agora acho impossível ser feliz com alguém que não seja você. – Com o canto dos olhos, eu podia ver suas bochechas se ascenderem do tom mais vivo de rosa enquanto ele falava. – Quer dizer, acho que essas coisas acontecem quando você encontra a pessoa certa.
– É. Foi o que eu ouvi dizer.
À medida que um sorriso sincero ia se formando em meu rosto, um sentimento de nostalgia tomava meu peito – e eu me perguntava o porquê, se estava bem onde o sentimento de reminiscência me levava.
As palavras de pareciam um trecho clichê retirado de um livro de romance. Ou auto ajuda.
Mas não era verdade?
Ele não se importava com a cicatriz que eu tinha na clavícula e sempre tentava esconder. Ele beijava o pedacinho de pele machucado e insistia em dizer que eu era a garota mais linda que ele já havia visto, o que me fazia pensar que ele era o cara mais incrível que eu já conhecera.
Ele fazia questão de assistir os filmes antigos que eu tanto gostava – mesmo que sua atenção voasse da tela pois ele julgava que todos aconteciam em um ritmo lento demais para entreter a qualquer um.
Era a ele que eu recorria para contar qualquer segredo, dividir qualquer mágoa e confiar para me livrar da culpa.
E era, de fato, impossível não se apaixonar por .
E quando chegamos nas árvores que indicavam estarmos no Riverside e apoiou as mãos em minha cintura apenas para me posicionar em sua frente e mergulhar-me em um beijo terno, senti meu peito ficar pequeno demais para todo o amor que eu sentia por aquele garoto.
Senti a cidade ficar pequena demais para um sentimento tão intenso.
E então tudo se transformou em escuridão quando fechei os olhos para beijá-lo.
Mas por que então, daquela vez, eu não sentia o gosto de cerveja? Tampouco o de hortelã?
Porque, quando abri os olhos, eu já não estava em Nova York.
Quando abri os olhos, as palmeiras de Venice batiam na janela do meu quarto com força, anunciando a tempestade que estava pra chegar.
Com o coração acelerado, sentei-me na cama.
Era apenas um sonho ruim.
Não. Não era só isso. Era a porcaria de uma lembrança. Uma dolorosa lembrança da época em que eu tinha tudo e não sabia, e ninguém me avisou que eu cairia do paraíso direto para escuridão.
Respirei fundo uma, duas, três vezes.
E então me vi levando a ponta dos dedos aos lábios, envolta pela névoa de ilusão de sentir algum resquício de ali.

Mas já fazia tanto tempo…

Procurei meu celular na mesa de cabeceira para ver até que horas o sono tranquilo havia conseguido se arrastar naquela madrugada. E então senti um breve formigamento começando em meus pés e terminando em meu coração.
Não pelo relógio estar marcando quatro horas e quatro minutos.
Nem pelas duas ligações perdidas de minha mãe.
Era o número que eu tão bem conhecia, e que um dia fora salvo com um nome carinhoso na minha lista de contatos, brilhando no topo da tela, acompanhado de uma mensagem.
Quatro minutos atrás.
Seria desconcertante o suficiente receber uma mensagem de no meio da madrugada quando fazia tanto tempo que não nos falávamos.
Seria mais desconcertante ainda receber uma mensagem de logo após sonhar com ele.
Mas as seis palavras aterrorizavam o lugar mais sensível de meu coração, porque elas afirmavam aquilo que eu tentei não admitir desde que disse adeus a ele.
O fato de que, mesmo depois de tudo, ainda estávamos conectados. Ainda havíamos sido feitos um para o outro, o que quer que isso significasse.

“Sonhei com você. Sinto sua falta”.

Por que havia mesmo o deixado ser a maior perda de minha vida?


Fim.



Nota da autora: "ESSA MÚSICA! Se você, que acabou de ler essa história, nunca escutou The Greatest, para tudo o que está fazendo e vai ouvir essa obra de arte POR FAVOR.
Eu já era apaixonada por essa faixa do NFR, mas ouvi repetidas vezes nos últimos dias para escrever essa história e não consigo superar o quanto ela mexe comigo.
Espero que gostem dessa história e desse casal, embora ela tenha ficado curtinha.

Um beijo enorme! Nos vemos em outras histórias ♥"



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Qualquer erro nessa fanfic ou reclamações, somente no e-mail.


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