Última atualização: 30/05/2018

Capítulo 1

I don't understand why you're leaving me I don't understand how without you I can't breathe Please don't, don't leave me here

Nenhum carro parava.
Os gritos desesperados.
O carro cantando pneu e fugindo do local do acidente.
Por quê é que ninguém a escutava? No momento em que viu deitado em seu colo e todo o sangue saia. Não sabia se teria forças para ajudar o marido. O único problema é que não tinha mais salvação. Ele tinha morrido ali e ninguém tinha ajudado. Parecia ser o pior momento de sua vida e pelo visto era. Não tinha mais o que fazer, então deixou as lágrimas fugirem e escorou-se olhando para o céu. Perguntando a Deus o por que de tal acontecimento. Ela era fiel então porquê o tinha perdido daquela forma?

😓😇🎶

luto
lu·to
sm
1. Sentimento de pesar ou tristeza pela morte de alguém; burel, cipreste.
2. Tristeza profunda causada por grande calamidade; dor, mágoa, aflição.

O dicionário define luto como um sofrimento mental ou stress por aflição ou perda, sofrimento agudo, arrependimento doloroso. Como cirurgiões, como cientistas, somos ensinados a aprender e confiar nos livros, em definições, em definitivos. Mas na vida, definições estritas raramente são válidas. Na vida, o luto pode ser várias coisas que atenuem o sofrimento
(Grey’s Anatomy 6x02)

As paredes do hospital pareciam brancas demais, o que de fato era normal. Mas não era algo que estava a deixando alegre naquele dia. Uma semana depois da morte do marido, percebeu que não tinha o que á prendesse ali. Ficar parado é perda de tempo. O luto é algo para ser vivido, mas não pode permanecer para sempre. Ela sabia que doía. Mais do que pudesse imaginar que doeria, contudo não poderia fazer nada além de levantar-se e seguir a vida. Médicos vivem em um mundo que está sempre progredindo e andando para frente. Se ficar um segundo parado, será deixado para trás. Mas por mais que tentemos seguir em frente, por mais tentador que seja não olhar para trás, o passado sempre volta para nos infernizar. E como a história nos mostrou inúmeras vezes, quem esquece o passado está destinado a repeti-lo. E quando entrou na sala de sobreaviso encarou algo em sua frente; Algo que não sabia definir exatamente o que era, ou que nome dar. Talvez por não existir.
Isso! Eles não existiam, porém se não existiam, o que é que ele estava fazendo ali. E rindo? E porque diabos estava rindo?
pressionou os olhos imaginando estar louca, não era possível que começaria a ter alucinações. Quando abriu os olhos não o viu ali.
— Você não está louca.
— Você não está falando comigo.
— Sim, eu estou.
— Agora quer me dizer que você, no qual morreu semana passada, está falando comigo? Está aqui em carne e osso?
— Bom, em carne e osso não. Em espiríto, sim.
Tudo bem, estava sim ficando louca. Era só sair daquela sala e tudo ficaria bem. Cruzou os corredores do hospital olhando para os lados e encontrou Tatyelle ali.
— Que cara é essa? Viu assombração?
— Não! — Quase gritou e notou seu desespero depois. — Vi algo estranho, mas não era assombração.
, eu sei que está recente, você tem certeza que não quer ficar mais alguns dias em casa?
— Eu estou apta a trabalhar, Tatye.
— Eu nunca disse que não, mas acho que seu psicológico possa estar afetado já que você saiu bem estranha da sala.
— Eu estava pensando lá dentro.
Minta direito. — Essa não era a voz de Tatyelle.
— O que disse, Tatye?
— Eu? Nada.
Diga que estava no telefone e ouviu algo sobre o motorista que fugiu. — Porque mesmo a voz de parecia tão real
— Terra chamando .
— Eu estava falando com advogado lá dentro e ele me notificou sobre o motorista que causou o acidente.
Essa é a mulher que eu amo.
— Cale a boca!
— O que é? Eu não disse nada!
— Esquece, Tatye. — Precisava sair dali, não arriscou olhar para trás ou dar atenção para qualquer coisa ao seu redor. Não podia ficar naquele hospital, pelo menos não hoje. Saiu das portas do lugar e caminhou as pressas pelo estacionamento. Podia jurar estar sentindo alguma presença ali. Mas era coisa de sua cabeça, obviamente.
— Vá embora ou procure a luz! A última coisa que preciso agora é de espíritos. — Riu em seguida das palavras declaradas e girou os olhos. Precisava mesmo de um psicólogo.
— Como se eu fosse deixar você me mandar para longe, anjo. Era o que faltava um fantasma na sua vida. Era até engraçado. Além de perder o marido, agora era louca. Ia sair dali direto pra um psiquiatra. Continuando a caminhar até o carro e ignorar a maldita voz. Era a merda da voz conhecida de . Mas ele estava agora enterrado, não estava?
— You can't pretend I don't exist, but you'll see my face everytime. — Ouviu a voz do homem cantarolar.
Bouvier!
— Em pessoa! Ou melhor, nem tanto assim. — Ele mesmo riu da própria confusão e observou a mulher entrar no carro e esfregar os olhos. É só o seu psicológico. Era a frase que ela repetia pra si mesma, tentando afastar a imagem de da frente do seu carro. Se fosse ele mesmo ele não ficaria ali parado na frente da máquina quando ela arrancasse o carro, certo? Arrancou o carro acelerando mais do que era acostumada e notou que a coisa parada em sua frente tinha desaparecido. Então alguns quilômetros a frente viu o semáforo fechado e escorou a cabeça no banco de motorista.
— O seguro arrumou o carro rápido demais. — Merda! Merda! Merda!
olhou para o lado e lá estava ele parado na sua frente sem sinal nenhum de cansaço. Então ele não havia corrido e sim havia usado seus poderes de assombração para se materializar dentro do carro.
— Eu não vou desaparecer, .
— Vai pra luz, assombração! Eu repreendo. — rogou olhando para o céu; — Deus, manda uma luz para isso e o tire daqui. — Mas a única resposta foi uma gargalhada.
— Eu não vou embora, .
— Você não existe mais!
, você acredita em Deus, certo?
— Óbvio.
— Em anjos?
— Sim.
— Eu sou o seu.
Acredito que seja impossível ter certeza de algo durante a vida. Como minha mãe dizia, posso viver uma vida e mais seis meses, e mesmo assim, não saberia de tudo. Essa vida soa um pouco confusa pra mim. Quando penso que sei de pelo menos noventa por cento da vida, vem Deus e me mostra, que na verdade, não sei de nada. Encarando as palavras vindas de , eu não sabia se podia acreditar. Se anjos realmente eram coisas visíveis ou pelo pelos palpáveis. Eu nunca soube de nada disso. Nunca precisei saber, ao menos. Mas agora vendo ele aí, tudo que eu já tinha descoberto sobre diversas religiões tinham ido por água abaixo. Eu sempre imaginei como seria os anjos no céu. Do tipo, eles tinham casas nas nuvens e apareciam só quando a gente aprontava, achava também que só existiam anjos bons. No entanto, descobri depois de um tempo. – graças à umbanda – que existem anjos ruins também e que eles vivem vestidos de preto, os religiosos da umbanda ligam a cor preta a algo ruim. – O lado mal da força – Mas particularmente, noventa por cento dos humanos gostam de se vestir de preto. E branco. – Ah, o bendito branco. – Uma cor tão leve, tão paz e amor. Eu sempre amei branco, tudo bem e usava graças a minha profissão. Mas diversas as vezes me questionei qual a necessidade de tanto branco? Mas em eu não questionava isso, era uma cor estupenda, pelo menos nele. Tudo irradiava beleza naquele anjo. Observei a cidade enquanto estava sentada no banco do carro e vi algumas crianças nas ruas pedindo comida, outros eram mais velhos e percebi, no entanto, que por mais que vivêssemos numa época que pregam o amor a todo custo, se esqueceram de amar. Esqueceram de amar quando rejeitam alguém por opção sexual. Esqueceram de amar quando julgam uma mulher que abortou por simplesmente não poder criar e saber que o futuro que o mundo concederia para aquela criança não seria bom. Esqueceram de amar no momento em que pessoas que são chamadas de homens, abusam de crianças, jovens e mulheres por aí, dando a desculpa de que “a mulher pediu”. Eu realmente me arrependia de viver num mundo tão cruel. Pregam o amor e não amam, pregam a igualdade e vivem numa hipocrisia sem tamanho, eu percebi que eu vivo numa era social. Eu percebi então, que de alguma forma, ter aqui era um privilégio. E por mais que isso não é algo que fizesse sentido em minha mente. Eu devia agradecer, afinal, eu tinha o que muitas pessoas não conseguiam. Então foquei em e estiquei a mão tentando encostar nele.
— Você não consegue me sentir, .
— Por que?
— Tecnicamente, você sente algo, mas não uma sensação normal. — Ele esticou a mão e afagou meus cabelos. Um frio na barriga e os pelos do meu braço se arrepiaram no segundo seguinte.
— Eu senti você.
— Não da forma que esperava, .
— Eu preciso saber o por que disso tudo.
— Porquê de que?
— De você ter ido embora e me deixado.
— Não é controlado por mim e você sabe disso.
— Então por que voltou?
— Foi escolha dEle, .
Ato 2 (Duas semanas depois)

Let you live your life pretend I'm okay
Don't ya know that this ain't over?

Parecia algo surreal, ou no mínimo loucura. Se alguém visse a forma com que eu conversava com , ou o que era pra ser ele. Me mandaria logo para uma clínica de psiquiatria. Tudo bem, eu faria o mesmo. Encontrar todas as manhãs, no mesmo lugar. Parecia ser algo da minha cabeça e consequentemente eu ainda acreditava ser. Ou eu tinha algum tumor que me causava alucinações. Eu sabia que anjos existiam, então tive que acreditar que estava ali.
— Encarando novamente?
— Eu não sei o por quê.
— Ele entrou em coma depois de um acidente de carro, deve se lembrar de .
— Talvez seja isso.
— Você ainda não superou não é?
— Só duas semanas, Tatye.
Encarou o homem que havia dado entrada dois dias depois da morte de e não sabia o exato motivo, mas algo lhe trazia esperanças de que o homem acordaria.
...
— Eu não tenho solução para isso, .
— Claro que tem.
— O caso dele é grave, não tem fámilia por perto.
— Ele entrou em coma?
— Sim.
— E o que você pensa em fazer?
— Eu penso em esperar, como médica não posso fazer mais nada.
, você sabe que eu não vou ficar pra sempre aparecendo, não é?
— E porque iria embora?
— Não sei ao certo.
— Sou tão ruim assim de ser guardada?
— Você sabe que por mim eu ficaria assim pra sempre, mas talvez seja melhor.
— Melhor?
— Imagina se eu ia suportar você em seus momentos..
— Por Deus, ! Eu não estou em busca de ninguém.
— Mas um dia vai, quem morreu fui eu, voce tem que viver.
— Estou vivendo muito bem.
— Eu sei, .
O silêncio prevaleceu e ela girou na cama mais uma vez pensando nos momentos em que pôde ficar com naquele ambiente e o encarou. Ele transmitia uma sensação de calma e olhava sereno para ela. Não se lembrava de vê-lo com um sentimento de calma assim, há muito tempo. Mas agradecia, por, de alguma forma tê-lo alí. Sabia que podia tê-lo perdido para sempre, mas o luto teria sido muito mais díficil de enfrentar, caso não tivesse ele como anjo.
— Essa cabecinha tá pensando muito.
— A vida mudou muito rápido.
— Deveríamos ter tido mais tempo né?
— Não podia ter me deixado.
— Eu estou aqui.
— Não podia ter me deixado sozinha fisicamente.
respirou fundo.
— Nós prometemos que seria eterno.
— E foi.
— Você morreu, .
— Não por escolha, a unica escolha que eu tive foi decidir te guardar.
— Eu não posso tocar em você.
— Só de me ter com você não é o suficiente?
O pager tocou e ela viu a sala no visor. Merda!
— Eu preciso de ir atender o paciente do coma, .
— Eu estarei aqui.
— Espero que sim.
Lembrou-se da ultima vez que o teve de verdade. Ele recordou-se da promessa feita no carro antes do acidente e quis voltar para cuidar dela. Quis voltar para resolver diversas coisas deixadas ao ar. Quis tê-la em seus braços novamente. E faria o que fosse possível, ou até, impossível pra isso.
!
Ela olhou para trás e o encarou. Ele parecia diferente.
— Eu vou voltar.
— Você está bem aí, .
— Eu preciso ir, mas eu vou voltar.
— Porque diabos está indo?
— Pelo amor de Deus, não diz esse nome. — Ela riu da contradição da frase. — Porque você está me deixando? — E só obteve silêncio. — De novo, ?
E de repente parecia realmente ser louca. Já que ele não estava mais ali.
The city of angels is lonely tonight
Keep myself alive by candle light
Adentrou o quarto e viu o homem com os picos de batimento quase inexistentes. Passou a mão pelo rosto desesperada. alguns enfermeiros ao redor da cama e um barulho constante que indicava parada cardíaca.
— Desfibrilador. – gritou um pouco desesperada e em segundos o aparelho já estava ao seu lado. — Afastar! — Pressionou as placas no tórax do homem e nada. Começaram uma massagem cardíaca enquanto preparavam para a próxima aplicação. — Afastar.— Mais um choque e nada. já havia deixado uma lágrima cair, enquanto segurava o choro, aflita por ter ido, por não vê-lo do outro lado do quarto. Aflita por não trazer o homem de volta.
— Afastar! Três picos, quatro, cinco, 62 batimentos por minuto.— Sorriu aliviados e esfregou o rosto, sentindo a sensação de dever cumprido aliviando seu peito. Conseguiu recuperar , suspirou aliviada e observou o momento em que a ele voltava a respirar e milagrosamente abria os olhos lentamente.
? Está me ouvindo? . – Ele assentiu a cabeça de modo fraco. — Tudo bem, sem esforços. Vou fazer algumas perguntas e você mexa apenas a cabeça.
— Você tem alguma familia que eu possa entrar em contato? — Ele negou e tentou abrir os olhos mais uma vez.
— Está sentindo alguma dor? — Ele negou.
— Você consegue apertar minha mão? — Um movimento lento e ele apertou.
Reações rápidas.
Correspondendo aos comandos.
Batimentos normalizados.
— Vou realizar alguns exames de rotina e caso tudo fique bem, eu transfiro você para o quarto normal, tudo bem? — Ele assentiu novamente.
And I'm letting go for the last time
And through the tears I say goodbye
Cinco dias depois
Nenhum sinal de . Ao contrário de . Ele desenvolvia a cada dia e ela acompanhava de perto. Abriu a porta do quarto e viu escorado no travesseiro e sorriu quando ela chegou. Gesto estranho, ainda focavam na comunicação a base de assentir, para que não forçasse a recuperação.
— Tudo bem por aqui, ?
— Sim! — Ele a encarou e riu da reação da médica.
— Vejo que temos um avanço.
Ele assentiu novamente e ela piscou os olhos ao notar um sorriso. Ele não parava de sorrir.
— Tudo bem com você ?
— Estranho ver você falar assim.
Confusão era tudo presente naquela sala.
— Assim como?
— Diferente.
— Eu falei de forma estranha?
— Não falava assim comigo.
— Quem é você e o que fizeram com o calado? — Ela gargalhou.
—Sou eu, .
E por um segundo, congelou. Quem a chamava assim era somente .
— De onde tirou esse apelido?
Eu disse que voltaria, a cidade dos anjos está vazia essa noite.




Continua...





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