Finalizada em: 01/10/2021

Prólogo

Brasil, 1952


chegou assustada, o semblante entregava que o assunto era realmente sério. Eu já tinha dado voltas e mais voltas esperando ela chegar no velho moinho, sem saber direito o que poderia ter feito ela escrever aquele bilhete tão às pressas.
Apareceu tão linda quanto sempre, apesar do rosto assustado. Usava vestido, o que me surpreendeu, uma vez que era sempre tão difícil vê-la sem as calças jeans. Os cabelos estavam presos no alto da cabeça, e ela tinha até mesmo colocado um batom suave nos lábios. A mudança no visual me intrigou, mas caiu nos meus braços antes que eu tivesse a chance de pontuar qualquer coisa.
— Ainda bem que veio, . – Sussurrou, sôfrega, enquanto se inclinava para um abraço.
— Porque quis se encontrar comigo aqui? E a noite? – Questionei, afastando-me para olhar em seus olhos. O velho moinho tinha uma iluminação bem precária, mas mesmo assim consegui ver que chorava. Acariciei seu rosto. – Você sabe que não é seguro, alguém poderia te achar aqui.
limpou a lágrima, me puxando para o monte de feno no qual nos deitamos umas semanas atrás.
— Fui a um jantar. – Disse, simplesmente. – Eu, minha mãe e Dione e achei que seríamos só nós três.
— E não foi.
— Não. Pouco tempo depois de a gente chegar, entrou a Mirtes, sabe? A costureira.
— Sei.
— Bom, entrou Mirtes e o filho dela. – Falou, cabisbaixa. – O Jairzinho.
Fechei a cara.
— E o que ele foi fazer lá?
Ela olhou fundo nos meus olhos, virando-se em direção a luz. Deu para ver uma cicatriz fininha no queixo dela que deveria ser um incômodo em outras pessoas, mas eu adorava.
— Ele foi pedir minha mão, .
— Por isso está toda arrumada. – Resmunguei.
revirou os olhos.
— Eu não aceitei e também não é essa a questão. As regras da Dione escaparam durante o jantar e ela teve que ir embora.
Me senti corar com a informação desnecessária sobre as condições de saúde da nossa amiga.
— E o que isso tem a ver? Vai direto ao assunto!
Mais uma lágrima rolou.
— O episódio me fez fazer uma conta, . As minhas regras estão atrasadas. Há mais de uma semana.
Levantei em um pulo. Estudei o bastante de biologia para saber o que aquele atraso significava, mas queria muito estar errado. Não podia ser, de maneira nenhuma aquilo poderia ter acontecido da única vez que me permiti ser irresponsável.
— E o que isso quer dizer, ? – Perguntei, só para confirmar.
Eu poderia ter entendido errado. Mas eu não tinha, e só o olhar no rosto dela foi o suficiente para confirmar tudo que eu precisava saber. Ela nem precisava ter falado a próxima frase.
— Significa que estou grávida, .


Capítulo Um

Brasil, 2020


— Fernanda é forte, ela vai ficar bem. – Falei para minha filha mais velha, Joana, que não aguentava ver o sofrimento da filha perante o caixão.
— Eu sei que vai, mas... céus! Rodrigo morreu muito jovem... Se essa vacina já existisse! – Lamentou Joana, apertando minha mão.
— É um vírus maldito, que pegou nosso rapaz desprevenido. Agora temos que nos cuidar mais, a pandemia ainda não acabou. – Murmurei, com o que me restava de sanidade.
Não costumava mais falar tanto com as pessoas. Meus oitenta e cinco anos de vida deviam ser o motivo disso, e depois de oito décadas falando sem parar, ficar em silêncio me acalmava. Eles achavam que a senilidade tinha atingido minha cabeça, mas eu não me considerava um velho senil. Ora, era tão independente!
Olhei para frente, onde uma Fernanda desolada se despedia do caixão de seu marido que era enterrado. Eu detestava cemitérios, mas tinha amor demais pelos meus e por aqueles que jaziam nesse lugar e era por isso que ainda vinha.
Depois do que me pareceram muitos minutos, a família mais distante que tentava, em vão, consolar Fernanda foi se afastando e os mais próximos convergiram para ela. Estavam todos indo para minha casa, por isso tentaram me levar junto, mas eu disse que iria andando, não era tão longe. Além disso, eu queria ficar.
Eles entenderam.
— Ela é forte mesmo. – Disse ao meu lado, em seu vestido florido demais para a ocasião. – Muito parecida com você.
Sorri para ela, tomando o caminho em direção a saída do cemitério.
— A única certeza que temos sobre a vida, é que ela acaba, minha amada. – Respondi a ela. – E o medo de perder alguém jamais será motivo para deixar de viver.
Ela caminhou ao meu lado, e fiquei preocupado que passasse mal. Deveria ter feito ela ir de carro com os outros. Leu a preocupação em minhas feições e deu de ombros.
— Sou mais jovem que você, . Consigo ir andando sozinha até minha casa, obrigada.
Notei um quê de deboche na frase, mas deixei para lá. Depois de sessenta anos juntos eu já sabia perder uma pequena discussão para deixa-la feliz.
— Isso é totalmente algo que você diria. – Concordei, sorrindo.
— Rodrigo. Foi COVID? – Ela perguntou.
A cabeça dela que não estava muito boa. Eu tinha certeza de já ter contado isso para ela.
— Foi. Ele era hipertenso, a pressão subia muito na UTI. – Expliquei. – Não sobreviveu à intubação.
Ela assentiu e se silenciou. Quando vimos o telhado da nossa casinha, apertamos o passo, Fernanda precisava de nós e tínhamos que estar lá por ela.
Rodrigo era um bom homem. Era um pai muito divertido e gostava de mim, diferente dos outros jovens com quem Fernanda tinha se relacionado. Me dei bem com ele logo de cara, apesar de ele ser um mau perdedor no xadrez. Eu também jogava muito mal, então as vezes eu pensava que ele entregava o jogo só para eu ganhar. Eu nunca tinha perguntado aquilo para ele, e agora jamais saberia. Chega a ser injusto perder alguém que você acaba de ganhar e por quem tem muito carinho. Tive dez anos de companhia com Rodrigo até ele partir, o que só mostra que estamos em uma fila onde ninguém sabe quando sua hora chega e fiquei com isso na cabeça por um bom tempo. Jovens realmente acham que vão viver para sempre, sem a menor consciência do quanto nossas vidas são frágeis. Consigo pensar em um rol de eventualidades que poderiam pôr um fim na minha vida. Uma dosagem errada no meu remédio para o rim, uma queda de cabeça na quina da escada, uma escorregada no banheiro, o coração velho, cansado de bater, simplesmente parar...
Fernanda estava abraçada a um porta-retratos que eu tinha colocado no aparador da sala com todos os netos. Ela era minha única neta casada, então é claro que tinha uma foto de Rodrigo ali.
Olhá-la tão triste com a morte de seu parceiro me fez pensar em , que sorria para mim tristonha, provavelmente pensando o mesmo.


Capítulo Dois

Brasil, 1952


Aos 20 anos eu já era herdeiro de uma grande fortuna em cruzeiros. Antenor , meu pai, junto com mais um sócio, tinha fundado o primeiro jornal impresso da cidade de Nova Irapuã¹, empresa que hoje nos garantia estudo e boa formação, além de uma vida bem confortável.
Apesar da estabilidade, chegou em um ponto da minha vida que meu pai e seu sócio decidiram que iriam celebrar um casamento que eu nunca pedi a fim de deixar a herança para os únicos filhos. Olga, a filha do sócio, era de uma beleza intensa, considerada por muitos dos meus amigos uma futura boa esposa.
Ela era gentil, jovem, quieta e prendada. Seu pai havia comentado com o meu, em alto e bom som, que ela havia acabado de chegar da Academia de Moças em São Paulo, e que tinha se preparado para o melhor. Eu sabia de vários cavalheiros que gostariam de se dispor a tomar Olga como esposa, mas a ordem já estava dada: eu precisava cortejar Olga e, até onde eu sabia, nem precisaria me esforçar muito.
Eu a tinha conhecido na noite anterior, em um restaurante vistoso no centro da cidade, junto de nossos pais. Ela não falou muito, mas pelo pouco que pude ver dela, caso fosse mesmo obrigado a me casar, devo dizer que estava em boa companhia. Olga era muito simpática e parecia que já tinha me escolhido antes mesmo de sermos uma opção.
Antes de sair para a editora hoje, meu pai havia pedido que eu fosse até lá para uma conversa. Sem dúvidas era sobre Olga, e ele com certeza queria marcar a data, mesmo que eu só tenha visto a moça uma única vez na vida.
Assim que cheguei à recepção, fui direcionado para uma sala menor, que até então estava vazia. Cinco minutos depois, uma jovem vestindo uma calça simples e blusa de botão entrou no meu campo de visão para sentar-se a única mesa do recinto.
Ela me encarou com curiosidade, abaixando o olhar para uma agenda a sua frente.
— Senhor ? – Perguntou para mim, a voz firme.
— Sim. Estou aguardando meu pai.
Ela assentiu, educada, anotando alguma coisa no caderno.
— Seu pai acaba de sair, talvez demora um pouco a voltar. – Informou, sem olhar para mim.
Ficou ocupada pelo que se pareceu trinta minutos, em nenhum momento olhando para saber se eu ainda estava por ali. Quando levantou os olhos, eu ainda estava sentado.
— Vai ficar aqui esperando?
— Se não se importa, vou sim.
Não era tão longe de casa, mas eu odiava dar duas viagens, então para mim seria melhor esperar ali mesmo, além de já ter esperado meia hora. Mas a moça suspirou, impaciente, ao mesmo tempo que levantava mais uma pilha de jornais velhos que estavam ao seu lado.
— Muito me importa, na verdade.
Arqueei a sobrancelha, intrigado pelo tom rude em sua resposta.
— Estou te atrapalhando?
Ela bufou sem nenhuma cerimônia, me fazendo ficar um pouco nervoso.
— Sim. Estou acostumada a trabalhar sozinha.
— Desde quando trabalha aqui? – Eu tinha certeza que meu pai me falaria se tivesse uma secretária e ele nunca me disse nada.
— Há uns dois meses. E preciso me concentrar, certo, ?
— É . – Corrigi, sorrindo. – Só .
Ela parou de mexer nos jornais, olhando fixamente para mim, inclinando a cabeça para me analisar pela primeira vez, então fiz o mesmo com ela.
O cabelo era escuro e médio, não usava nenhum tipo de maquiagem e nem acessórios. Era o tipo de mulher que com certeza não se veria saindo da Academia de Moças e jamais seria amiga de mulheres tipo a Olga. Por algum motivo que eu ainda não tinha identificado, eu queria saber mais sobre o que ela tinha a dizer.
. – Falou, por fim. – As pessoas me chamam de .
Ao se levantar para me cumprimentar, porém, derrubou todos os jornais antigos no chão, o que a fez enrubescer. Fiz menção de ajuda-la, mas olhos de alerta me fizeram parar.
— Está tudo bem, eu ajudo. – Disse a ela, que já estava no chão, juntando as coisas.
— Não precisa, . – E não precisava mesmo, em apenas uma viagem ela fez tudo que precisava e depois ficou ali, parada, me olhando. – Porque está zangado?
Pisquei, confuso. Estava assim tão óbvio?
— Não estou zangado. – Neguei, balançando a cabeça e voltando a me sentar.
me imitou, sentando-se do seu lado da sala, cruzando as pernas.
— Tremor nas mãos, suor na testa, boca enrugada e essa cara azeda. – Pontuou ela. – São sintomas de alguém que está muito tenso.
Eu dei risada. Que mulher insolente! Se alguém um dia já tinha falado comigo dessa maneira, eu não me lembrava.
— Já que fui muito bem observado, estou zangado, sim. – Falei, coçando a cabeça. – Eu acho que meu pai quer marcar a data do meu casamento.
Ela prendeu seu olhar no meu por um momento antes de voltar ao que fazia.
— E porque isso é ruim? Não é o sonho de todos vocês? – Questionou. Achei diferente o uso do pronome, como se ela não sonhasse com isso.
— Eu não conheço a moça, só a vi uma vez. É um casamento por fins comerciais. – Confessei, fazendo ela dar um sorriso torno. – Qual é a graça?
balançou a cabeça.
— Passam a vida toda se preparando para formar uma família e ela nasce da pior maneira possível. – Comentou. – O mundo é mesmo injusto.
Usei meus joelhos para apoiar meus braços, intrigado com a conversa.
— Você não pensa em se casar?
— Não. Eu jamais conseguirei um bom marido. Prefiro não ser casada do que me casar mal. – Eu não entendia a lógica, mas deveria existir alguma, uma vez que parecia bem certa do que queria.
— Porque não conseguiria?
Ela sorriu de novo.
— É um assunto para um outro encontro, talvez. Mas não acredito em casamentos. Não para mim.
Curioso, me levantei. Quando ficava ansioso demais, sempre me ajudava dar umas voltas. Minha proximidade a assustou, então tentei ficar um pouco mais longe.
— E no que você acredita, ?
Ela demorou um pouco para responder, tanto que quase repeti a pergunta, achando que ela não tinha ouvido. Mas ao terminar de dobrar o último jornal, conseguiu olhar para cima, para mim.
— Eu acredito no amor. Acredito em um marido que ama sua esposa, não trai, não bate e não maltrata. Acredito que um marido e uma esposa possam ser amigos e conversar sobre tudo. Acredito que existe alguém compreensivo para mim, alguém com quem eu possa compartilhar meus pensamentos, minhas lágrimas e minhas risadas. – Ela falou com tanta paixão, que fiquei sem palavras. – Sabe, , eu acredito que em algum lugar, alguém está procurando exatamente por uma pessoa como eu, só não sabe disso ainda. Mas é esse o problema de acreditar. Por mais fé que você tenha, por motivos que você desconhece, nada disso acontece. E tudo que te resta fazer é acreditar.
E quando ela terminou de falar, eu soube. Era eu quem estava procurando exatamente por ela. Em apenas uma hora me apaixonei por , que tinha descrito, em um discurso caloroso, tudo que eu procurava em uma esposa. Se fosse para me casar, queria que fosse com alguém como ela.
Bem quando ia acrescentar algo a seu discurso, Antenor entrou na sala, onde imediatamente abaixou a cabeça e permaneceu muda, como a mulher que as pessoas achavam que ela deveria ser.

¹Nova Itapuã é uma cidade fictícia criada por mim, exclusivamente para essa história. Qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência.


Capítulo Três

Brasil, 2020


Quando levantei a cabeça, sorria para mim, compartilhando minha memória com um sorriso afável. Apertou meu ombro levemente, tão leve que quase nem senti, e inclinou a cabeça em direção a Fernanda, que havia dispensado a família e agora estava sentada sozinha no jardim da casa.
Assenti, e fomos juntos até Fernanda, que rapidamente enxugou as lágrimas quando viu que eu me aproximava. Sentamos cada um de um lado da nossa neta no banquinho, e mesmo que tenha decidido se fazer de forte, parando de chorar, os ombros se curvavam, murchos.
— Oi, vô. – Ela disse, parecendo pequena.
Me lembrei de todas as suas travessuras do passado, de como ela era tão esperta e vigorosa. Era a mais nova dos meus sete netos, mas por algum motivo era sempre ela que liderava as brincadeiras. Me permiti olhar para o balanço de pneu que meu filho Lupércio tinha amarrado para os filhos e sobrinhos no que ele chamava de “seu momento de inspiração”. Aquele balanço tinha feito sucesso, até Fernanda, que na época era bem nova, quebrar o pulso entre uma balançada e outra. A brincadeira perdeu a graça depois que a líder decidiu que a balança era amaldiçoada e as outras crianças acreditaram nela. Achamos essa história muito engraçada, mas Lupércio ficou bem chateado e disse que nunca mais construiria nada para aquelas crianças ingratas.
Mas o balanço estava no jardim até hoje, agora dominado pela energia voraz de João Pedro e Otávio, os gêmeos de sete anos filhos de Fernanda.
Era para eles que ela olhava agora, e era por eles que eu sabia que ela iria superar isso. Ela sempre superava tudo. Eu sabia que não podia ter um neto preferido, isso ia contra o código dos avós. Mas se eu tivesse que eleger um, com certeza seria Fernanda, a caçula.
— Eu ainda me custo a acreditar. – Falou, destruída, desviando a atenção dos filhos. – Pedro e Tavinho já me perguntaram duas vezes onde está o papai e eu não tive coragem de contar.
Suspirei, pegando na mão dela.
— Sabe, Nandinha, vai ser difícil mesmo. Seu marido era um bom homem e com certeza fará falta em nossa vida. E você pode ficar chateada, meu bem. Tem esse direito de estar de luto.
Mesmo que estivesse de máscara, deu para ver que ela sorriu, um sorriso triste.
— Eu sei. Eu preciso ser forte e aguentar firme, por eles. Por todos vocês.
— Ninguém espera que carregue a dor de todo mundo nas costas, minha menina. – Contei a ela, dando batidinhas gentis em seu dorso. – Cuida apenas da sua dor. Seus filhos sentirão dor. Nós sentimos dor. E cada um lidará com a sua, cada um do seu jeito.
Ela me olhou um pouco desesperada, com a mesma expressão de derrota que estava no cemitério.
— E se eu não conseguir, vô? E se eu não conseguir?
Do outro lado do banco, abaixou a cabeça, suspirando com pesar para o sofrimento da neta.
— Estaremos aqui por você, minha neta. – Ela disse.
— Todos nós estaremos aqui para você. – Repeti, sorrindo por trás das duas máscaras que usava. – Para você e para seus meninos. Que precisam saber da verdade, para que enfim possam se proteger mais ainda.
Fernanda olhou para os gêmeos de novo, que haviam desistido do balanço e agora encontraram um graveto para cutucar as roseiras do jardim.
— Eu sei que devo sempre me lembrar do meu marido. Mas dói tanto pensar nele agora, vô.
Fernanda finalmente voltou a chorar, e eu me arrumei para apoiá-la no meu ombro, abraçando-a delicadamente.
— Vai doer. – Alertei. – Mas vai passar. Você precisa se lembrar dele.
— Pensa nas memórias incríveis que vocês viveram juntos, Nandinha. Elas vão ser seu guia. – Disse , terna.
— As memórias que você guardou com o Rodrigo é tudo que te resta. Vão guiar você pela sua vida, tanto as memórias boas, quanto as ruins. – Completei, encarando que sorria do outro lado da neta.
Fernanda se arrumou no banquinho, avistando ao longe sua mãe chegando no jardim. Parte de mim achava que Joana só estava piorando a situação ficando tão em cima dela, mas as vezes uma garota simplesmente precisa da sua mãe.
Fernanda levantou do banco para ir até Joana, que a abraçou prontamente.
veio para o meu lado, se aproximando de mim, com o seu toque leve de sempre me levando para o passado mais uma vez.


Capítulo Quatro

Brasil, 1952


simplesmente não é elegível. – Disse meu pai pela vigésima vez somente naquela noite. – Eu não posso te casar com uma garota tão imprópria.
Estávamos em seu gabinete, mais uma vez, a fim de acertar os detalhes do casamento com Olga. Por mais que não fosse o fim do mundo me casa com uma garota tão bonita, parte do meu coração ainda estava pensando em e tudo em que ela acreditava.
Até que eu percebi que acreditava naquilo também. Amor. Parecia bonito viver daquela maneira. Meus pais também tiveram um casamento comercial, mas o respeito era visível. O amor também veio depois, pelo que percebi, e por mais que meu pai jamais inclua minha mãe em seus assuntos, eu sei que ele a ama e a valoriza, e também sei que ele pensa o mesmo para mim. Assim como sei que esse será meu destino se me casar com Olga.
Nada terrível, mas com certeza não o ideal.
— Me diga mais uma vez o que a torna imprópria.
— Para começar, a mãe é desquitada. – Iniciou. – Não consigo mensurar te casando com uma filha sem pai. Que educação recebeu essa moça? Além de tudo se recusou a ir para a Academia de Moças, e sei que os avós têm boas condições.
— Às vezes ela só não se identifica com a tarefa.
Meu pai suspirou, juntando as mãos antes de falar de novo.
, você sabe porque eu dei um emprego àquela mulher?
Neguei.
— Não, senhor.
— Ela me falou, com todas as letras, que jamais se casaria. Só tinha um pretendente para ela, e era a liberdade. Ela só queria trabalhar e não depender de seus avós.
Minha admiração por cresceu ainda mais.
— Ela pode mudar de ideia.
— Que insistência, ! Ela nem é a mais bonita. – Meu pai destacou. – Usando aquelas calças e os cabelos soltos.
Sorri para ele.
— É a mais bonita para mim.
Antenor fez um gesto de desprezo com as mãos, bufando.
— Em todo caso, a resposta é não. Você se casará com Olga Figueiredo e está decidido.
Não iria adiantar discutir com meu pai, então desisti. Deveria ter outra maneira de fazer vê-lo a voz da razão.
Ele não sabia que eu visitava no trabalho todas as tardes quando ele saia, e nem que nos encontrávamos na praça aos sábados há pelo menos uns dois meses. Ele não tinha como saber que estávamos nos apaixonando e que eu tinha certeza que jamais conheceria outra mulher como ela em toda minha vida. Ele não tinha como saber sobre os beijos roubados, os poemas declamados, os passeios secretos e os sorrisos disfarçados.
seria minha, de um jeito ou de outro.
Era sábado, dia de encontrá-la na praça. Querendo sair de casa para vê-la o quanto antes, me despedi do meu pai.
— Com licença, meu pai.
Antes que eu pudesse alcançar a maçaneta, escutei ele pigarreando atrás de mim.
— Na verdade, ...
— Sim?
— Acabei de marcar seu casamento. – Disse apenas, apontando para a carta que escrevia. – Você se casa em um mês. Creio que a família de Olga irá prosseguir com os preparativos.
Abalado, encarei-o.
— Você vai me lançar em um casamento comercial que não me trará nenhum benefício?
Meu pai apertou a ponte do nariz, quase impaciente.
— Eu sei que você me acha muito duro, , mas no futuro você vai me agradecer. – Sua expressão se suavizou e parecia que ele tinha voltado no tempo e estava assistindo a própria conversa que teve com o pai na época. – Eu também tive a minha . E não acabou bem, meu filho. – Ele se levantou vindo em minha direção, e colocou a mão no meu ombro. – O nome dela era Odette e eu me apaixonei por ela no momento em que a vi. Eu odiei meu pai por ter feito eu me casar com a sua mãe, mas acredite, hoje vejo que foi a melhor coisa que fiz. Tenho uma esposa linda e um filho homem.
Acho que esse foi o mais perto de paternal que meu pai se mostrou desde que cresci, e fiquei com medo de estragar o que quer que fosse. Por isso só abaixei a cabeça e concordei, tentando, com tristeza, aceitar meu destino.
— Claro, pai.
Saí do gabinete sob seu olhar atento e fui direto para praça me encontrar com , talvez pela última vez.

Andei pela praça por uns cinco minutos até que eu a avistei sentada com Dione e Zélia. As duas moças deram sorrisos educados quando me viram, mas me dirigiu um olhar assustado. Ela me conhecia muito bem, e provavelmente tinha reconhecido a urgência com a qual cheguei.
— Boa tarde, senhoritas. – Cumprimentei, tirando meu chapéu. – , podemos dar um passeio?
Ela olhou para trás, onde sua mãe estava conversando com Helena, mãe de Dione, e concordou.
— Claro.
Ela ficou ao meu lado, as mãos comportadas junto ao corpo. Dei um sorrisinho contido; nem parecia a mulher com quem tinha roubado beijos e carícias. sorriu também, mas corou, então eu sabia que tinha pensado nas mesmas coisas.
, não tenho boas notícias.
Ela suspirou.
— Ele negou, não foi?
Mesmo que ela não estivesse olhando para mim, assenti, chateado.
— Pior.
Ela parou de andar, olhando para mim, alarmada.
— O que pode ser pior que isso, ?
Outro suspiro. Dessa vez meu.
— Me caso com Olga em um mês, .
Os ombros dela murcharam, e ela voltou a andar. Percebi que procurava se afastar da vista da mãe, escondendo-se atrás de uma densa árvore.
— Eu nunca tinha me pensado em casar antes de conhecer você, .
Eu sorri para ela, aproveitando que estávamos escondidos, acariciei suas bochechas.
— E eu nunca tinha pensado que um dia iria querer me casar por amor.
Ela foi para trás, espantada.
— Você me ama?
Arregalei os olhos, segurando as mãos dela nas minhas.
— Como ousa perguntar isso? Céus! É claro que eu te amo!
Seu olhar penetrou o meu, ardente como fogo.
— Ah, eu me apaixonei por você, . De maneira que eu tenho certeza que jamais me apaixonarei por alguém. Eu amo você. Se tinha uma pessoa no mundo que seria um bom marido para mim, essa pessoa é você.
Encostei minha testa na dela, que ficou tensa com a aproximação, mas não se afastou.
— Eu queria poder te dar tudo, . – Confidenciei. – Se já fosse tudo meu, eu te daria.
Tímida, ela levantou a cabeça.
. – Começou, corando lentamente. – Se eu não me casar com você, não me caso com ninguém. E você sempre será meu único.
— O que isso quer dizer?
— Quer dizer que eu quero te mostrar o quanto eu te amo. Hoje. Antes de você casar.
Arregalei os olhos.
— Eu não posso te macular dessa maneira, ! Você não entende o que e...
, eu sei o que estou oferecendo. – Falou. – E eu quero. Por favor. Me encontre no velho moinho as nove da noite. É a hora que o remédio de dormir de minha mãe faz efeito.
...
— Por favor, . Esteja lá.
E saiu apressada de volta ao banco, sem me dar a chance de contestar a inconveniência daquele plano.
Naquela noite, eu ia para o velho moinho dizer para ela desistir, e talvez roubar um último beijo de despedida. Mas não consegui dizer nada disso. Nós nos amamos em um monte de feno, com uma brisa fina que vinha pela porteira e um leve brilho de luar que aparecia na soleira. Aquela não foi só a primeira noite em que amei uma mulher, foi minha primeira noite com , e foi a primeira noite dela comigo.
Foi errado usar o corpo dela sem sermos consagrados como família, mas não me importei com a minha honra como me importava com a dela. não era mais criança, já tinha dezessete anos e sabia o que queria.
Eu a queria. Ela me queria. E assim foi.
Jamais iria me esquecer de como foi amar no velho moinho.


Capítulo Cinco

Brasil, 2020


se afastou de mim quando Fernanda voltou para o banco. Joana retornou para dentro da casa em que cresceu, e ouvi um suspiro audível de minha neta quando se sentou de novo.
— Eu vou falar com os meninos.
Concordei.
— Quer que a gente fique com você, meu bem? – Perguntou , preocupada.
— Você quer que eu faça companhia? – Repeti.
Fernanda concordou, prontamente.
— Por favor, eu jamais iria conseguir... fazer isso sozinha.
— Chame os meninos, Nandinha.
Fernanda colocou as mãos em concha ao redor da boca e gritou:
— Tavinho, Pedro! O vovô está chamando!
Esperei pacientemente as crianças largarem os gravetos que as tinha entretido até agora e se apresentarem para nós. Os gêmeos não eram idênticos, e só por isso minha cabeça velha conseguia distingui-los com facilidade.
— Tavinho, cobre o rosto com a máscara direito. – Repreendeu Fernanda, que aproveitou para amarrar o cadarço de Pedro e sentá-lo em seu colo, ao lado de , que já tentava consolá-lo.
— Mas, mãe, está doendo! – Reclamou, arrumando a máscara mesmo assim.
Fernanda suspirou, fazendo com que Tavinho se sentasse em sua outra perna, mais próximo de mim.
— Eu sei, meu amor, mas a gente precisa se cuidar, está bem?
Pedro, que até então tinha se mantido quieto, olhou para mim.
— É o papai, né? O papai morreu. – Deduziu, encarando o chão.
— Não fala assim do meu pai! – Rebateu Tavinho, olhando zangado para o irmão.
Nandinha engoliu o choro algumas vezes antes de continuar.
— Tavinho, o Pedro está certo. O papai... ele está morando lá no céu agora.
— Você está mentindo, mamãe. – Tavinho disse, pulando do colo da mãe e longe do afago calmo de . – É mentira, meu pai vai voltar! Ele disse que ia voltar e eu acredito nele.
Fernanda se entregou para as lágrimas tentando, em vão, pegar no braço de Tavinho que estava se desvencilhando com facilidade.
— Ele disse que ia voltar! – Ele gritou, se jogando no chão e chorando copiosamente.
meneou com a cabeça em direção a Otávio, e assim eu soube que era minha deixa.
— Tavinho, seu pai não deixou você. – Falei, olhando para o Pedro também. – Ele não deixou nenhum de vocês, está bem?
Otávio se levantou do chão, vindo até mim, secando as lágrimas na manga da blusa.
— Como você sabe, vovô?
Sorri para ele.
— Porque ele me disse.
— Disse? – Perguntou Pedro.
— Claro! Ele disse que jamais iria abandonar seus filhos. Que era para sempre cuidarem um do outro e que tinha muito orgulho de vocês.
Pedro sorriu, orgulhoso, e os olhos de Tavinho marejaram de novo.
— Eu vou sentir muita falta dele, mamãe. – Falou, baixinho, e os gêmeos foram embalados em um abraço apertado de Fernanda, que chorava ao ver o sofrimento dos filhos.
Joana apareceu bem naquele momento com uma taça de sorvete em cada mão, mesmo que não fosse verão.
— Quem quer sorvete?
Os meninos não iriam esquecer disso tão cedo, mas um doce calórico com certeza iria preencher seus corações por ora. Saíram correndo em direção a avó e Fernanda se virou para mim, agradecida.
— Obrigada. – Eu e sorrimos para ela.
— Sempre que precisar, minha querida. – Sussurrou .
— Estarei sempre aqui. – Completei.
Ela ficou um pouco em silêncio, mas quando se virou tinha um brilho decidido em seu olhar.
— Sabe, vô, eu ainda era muito nova quando aconteceu. – Começou.
deu um sorriso triste ao seu lado, e acho que nós dois já sabíamos o que estava por vir.
— O que, Nandinha?
Ela suspirou, me encarando.
— Como você passou por isso, vô? Como superou, como sobreviveu os últimos vinte anos sem a vovó?
Fechei os olhos, e, quando abri de novo, não sorria para mim do outro lado do banco. Ela não estava mais lá. Não estava mais lá porque, na verdade, nunca esteve.
Pensei em cada doce memória que nos uniu, em cada dificuldade que passamos ao longo dos anos. Meu pai precisando aceitar o casamento mesmo contra sua vontade e a nossa alegria no altar no dia em que casamos. Pensei nos filhos que vieram cedo demais e a alegria de tê-los em nossas vidas. Pensei em suas primeiras palavras, em seus primeiros passos, as birras e os momentos de aprendizado. Quando começaram a ir para a escola, quando se tornaram adolescentes e quando encontraram bons parceiros com quem se casar. Mesmo contra minha vontade, pensei na doença de chegando para leva-la, tão cedo, tão de repente, mas também me lembro de que lutou com toda sua força e sua luta foi tão tremenda que conheceu e amou todos os seus netos antes de partir dessa vida.
Lembrei dos primeiros anos sem ela, apenas existindo, sem direção e sem vontade de continuar. Mas então, como em um clique, também me lembrei do que me fazia levantar todos os dias.
— Nandinha, eu não sei se estou sobrevivendo. – Disse a ela, sincero. Não queria deixa-la mal, mas não podia mentir. – Cada dia sem sua vó perto de mim é um dia menos feliz que o anterior. Eu sinto muita, muita saudade dela, mesmo depois de vinte anos. Mas sabe o que me faz levantar esse corpo velho todos os dias? Você. Tavinho. Pedro. Joana. Seu tio Lupércio. Minha família. Todos vocês são heranças de algo que jamais imaginei que teria e que só foi possível porque conheci sua avó. E é por amá-la muito que me levanto todos os dias, porque sei que é o que ela gostaria que eu fizesse.
Fernanda aquiesceu, se arrumando no banco de jardim. Arrumou a máscara atrás da orelha que já estava incomodando, mas não a tirou.
— Eu sempre admirei sua força, vô. Sei que você a amava muito, não deve ter sido fácil.
— De fato não foi. Mas eu sou muito grato por tudo que vivemos, Nandinha. Sou velho. Minha mente falha sempre, mas todas as lembranças antigas que tenho com sua vó estão bem gravadas na minha memória.
Ela assentiu e se levantou. Estava quase fora do meu campo de visão quando voltou.
— Vô, porque as vezes age como se... como se ela ainda estivesse aqui?
apareceu ao seu lado, sorrindo para mim mais uma vez, com aquele mesmo vestido florido.
Sorri de volta para ela e em seguida para Fernanda.
— Mas quem foi que te disse que ela não está aqui?
Nandinha sorriu, respirando fundo e indo até onde os meninos comiam seus respectivos sorvetes. Encarei , respirando fundo antes de me levantar também.
— Se o seu amor é tudo que você me deixou, eu me contento, . Eu me contento com o seu fantasma.


Epílogo

Brasil, 1952


— Você não vai falar nada, ? – Perguntou , inquieta.
— O que você quer que eu diga?
— Eu não sei! – Ela estava à beira das lágrimas. – Eu não sei o que fazer. Você vai se casar com Olga amanhã e eu estou grávida. Eu tinha que te contar. Acho que... acho que eu vou aceitar a proposta do Jairzinho.
Dei um passo para trás, incrédulo.
— Vai o que?
— Ele é minha melhor esperança! Eu posso exigir que nos casemos rápido e ninguém precisará ficar sabendo.
Eu estava lívido de desesperado, a adrenalina tomando cada parte de mim.
— Mas eu vou saber, ! – Gritei, assustando-a um pouco. – Toda vez que passar por esse bairro com os braços ao redor de outro homem, saberei que em seu ventre guarda um filho meu! Toda vez que te ver pelo centro da cidade com um carrinho de bebê, saberei que ele carrega o meu sangue! E toda vez que eu te ver com ele... saberei que era eu quem deveria estar com você, .
Aproximei-me dela novamente para secar a lágrima em sua bochecha, apenas para perceber que também escorria na minha. Nosso destino estava traçado, e não dependia de nenhum de nós dois.
— Então o que você quer que eu faça, ?
Eu a abracei, tão apertado que talvez pudesse tê-la machucado.
— Se casa comigo, . – Sussurrei em seu ouvido.
Ela se afastou o suficiente só para me encarar.
— Eu não posso, a gente não pode. Você vai se casar com Olga amanhã! Seu pai me odeia!
— Eu não me importo! – Falei, segurando o rosto dela com as duas mãos. – Não me importo com Olga, com aquele casamento, nem com meu pai. Você e esse bebê são minha prioridade agora e que tipo de homem eu seria deixando tudo isso para lá?
sorriu, mas ainda parecia tensa.
— Não faço ideia de como vamos fazer isso, . Seu pai nunca irá permitir.
Balancei a cabeça.
— Já te falei que não me importo.
Dessa vez fiquei de joelhos.
, você aceita se casar comigo?
Emocionada, ela recomeçou a chorar, se abaixando para me abraçar. Me levantei ainda com ela no colo, pensando que nem em um milhão de anos eu poderia imaginar essa reviravolta.
Meu pai não iria aceitar um filho bastardo. Ele tentaria comprar o silêncio de , que não cooperaria. E se ainda assim não me deixasse casar com ela, então que me deserdasse.
— Sim, . Só tem um homem nesse mundo com quem eu me aceitaria casar, e é você.
Rodei no ar, enquanto ela gargalhada.
— Que bom que você acreditou, . – Falei, bem perto do rosto dela, quando paramos de rodar. – Porque eu prometo ser um marido que ama sua esposa, não trai, não bate e não maltrata. Prometo ser seu melhor amigo e que podemos conversar sobre tudo. Prometo ser compreensivo e compartilhar meus pensamentos, minhas lágrimas e minhas risadas. – Falei, enxugando uma lágrima do rosto dela. – Eu também prometo, , que passei anos da minha vida procurando exatamente por uma pessoa como você, e que agora é minha. Prometo que você será muito feliz.
sorri em meio a lágrimas.
— E por quanto tempo pretende manter essas promessas, ? – Quis saber, enquanto secava minhas próprias lágrimas.
Eu ri, abraçando ela de novo, enquanto recebia meu sorriso favorito no mundo.
— Por você, , por você eu vou manter essas promessas por toda minha vida. Eu as manterei até depois da morte.




Fim!



Nota da autora: Oláaa! Então gente, algumas coisas:
1-Eu realmente não tive muita informação sobre a época e meus avós são posteriores aos anos 50, então não tinha nem para quem perguntar. Pesquisei muita coisa, mas na maior parte usei minha licença poética.
2-O protagonista vê espíritos? Não, gente, ele não vê. Entrar na cabeça de um idoso foi MUITO legal, e tive que ler uns dois livros com protagonistas idosos para ter uma ideia mínima de por onde começar. Os pensamentos dele são confusos porque ele está confuso, então não se preocupem com a coesão e coerência, a ideia era que fosse de propósito e toda a confusão mental do protagonista foi premeditada.
No mais, espero que tenham gostado tanto quanto eu e não se esqueçam de comentar!
Beijoooos!




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