Capítulo único
Ela sempre gostou de neve.
Desde pequena, admirava o dia branco, deslumbrada como a neve brilhava ao cobrir o chão da maneira mais pura. Sim, as árvores ficavam secas e tudo parecia estar adormecido, mas os flocos de neve espiralavam pelo vento, dançando que nem no ballet do Quebra Nozes.
As pequenas mãos da garota brincavam entre o céu levemente azulado, tentando agarrar os pequenos flocos enquanto os olhos os acompanhavam com empolgação.
Era em um desses momentos que ela encontrava a tatuagem com a qual nascera e agora crescia junto com a menina. sempre parava e passava os dedos pelas letras belamente adornadas em preto, na parte de dentro do pulso direito.
Eu senti sua falta, Floco de Neve.
Quando era mais nova, mas já grande o suficiente para entender um pouco as letras em seu braço, a menina foi até a biblioteca na qual a mãe trabalhava, incansavelmente restaurando seus belos livros antigos.
Logo que empurrou a grande e pesada porta marrom, os belos e gentis olhos da mãe pousaram sobre ela, sorrindo logo em seguida.
- Queria fazer uma pergunta, mamãe... – A menina perguntou se aproximando vagarosamente, escondendo as palavras no pulso.
- O que foi, meu amor? – A mulher imediatamente pousou o pincel sobre um pequeno copo e estendeu os braços para a filha, convidando-a a um abraço.
sorriu e imediatamente foi para os braços da mãe. Colocando a filha sobre uma das pernas, a menina imediatamente começou a admirar o desenho que a mãe restaurava com destreza – uma gravura em um antigo livro sobre um conto japonês de uma mulher feita de neve.
- Certamente você não veio aqui só para admirar meus livros. – A mãe dela comentou com um sorriso contido na voz, apoiando a cabeça sobre o ombro da filha em seguida.
- Você desenha tão bem, mãe... – E tomava cuidado para não borrar. Recentemente manchara um dos quadros da mãe, sem querer, e não conseguia parar de se culpar quando via o borrão vermelho no meio da água azul esverdeada. – Você precisa continuar me ensinando a desenhar.
- Tudo tem seu tempo, minha pequena. Agora me diga o que foi.
- Ah... Estava olhando meu braço... – Parecia que a menina tinha se lembrado de algo distante. – Essas letras. Já percebi que você tem uma frase no tornozelo e o papai também. O que é isso, mãe?
A mulher a observou durante um tempo, com um sorriso indecifrável nos lábios. Enfim, afastou uma mecha de cabelo do rosto da filha, repousando a mão sobre as letras no pulso de .
- Você sabe o que são almas gêmeas?
A cabeça de pendeu para um lado, as sobrancelhas franzindo. A visão foi tão cômica que a mãe dela não pôde deixar de rir.
- Contam os gregos nas histórias antigas que os seres humanos eram originalmente criaturas com duas cabeças, dois corações, dois corpos unidos em um só. – A mulher começou a contar enquanto desenhava as letras no pulso de com o dedo indicador, o toque gentil e aconchegante. – Um belo dia, esses corpos foram separados em duas pessoas diferentes. Perdidos, eles sempre se sentem incompletos até o dia em que se encontram novamente. Nesse momento, essas pessoas nunca mais querem se deixar, fazendo de tudo para ficar juntas para sempre. Essas são as almas gêmeas.
- Você se sente como um...? – A menina perguntou, acompanhando o desenho que a mãe fazia em seu pulso.
- Exatamente. – A mulher abriu um grande sorriso. – Você vai saber quando encontrar sua alma gêmea. Simplesmente irá vê-la e saberá. Mas todos nós nascemos com essas tatuagens, essas frases em nossos corpos. Cada frase é diferente para cada pessoa... É a primeira frase que você irá ouvir da sua alma gêmea.
- Pra ter certeza de quem ela é? – ergueu uma sobrancelha, achando tudo aquilo muito difícil de entender.
- Sim. Quando seu pai veio falar comigo a primeira vez, quase fiquei sem ar. – E agora os olhos da mãe da menina estavam distantes, como se lembrassem daquele dia nitidamente. – “Com licença, você sabe onde fica a Estação Central”? Uma simples pergunta... Meu coração parou. Eu fiquei observando-o sem reação durante alguns segundos, sem saber o que responder. Eu ia dizer a frase certa? O que era para falar? Mas minhas dúvidas passaram em uma fração de segundo, assim que meus olhos encontraram os dele. De repente, tudo fez sentido. A inquietação no meu coração, a minha solidão, cessou. Eu senti como se o conhecesse durante toda a minha vida. “Virando à direita na loja de flores, você vai ver a Estação Central”. Seu pai também ficou sem reação e eu só conseguia sorrir. Quase não acreditei quando vi nossas tatuagens nos tornozelos. Lá estava minha frase, gravada na pele dele, e, em troca, a dele estava gravada na minha.
ficou observando o pulso após aquela história. Nunca tinha parado para pensar naquilo. Sempre sentira que queria mais alguém ao lado dela, mas nunca tinha sentido saudades de alguém. Não sabia o que era solidão, não sabia o que era aquele tipo de amor. Para a idade dela, aquele conceito era um tanto difícil de entender.
- O que diz no meu pulso? – A menina finalmente perguntou, olhando nos olhos da mãe. – Não consigo entender todas as letras ainda.
- Eu senti sua falta, Floco de Neve. – A mãe dela leu com um sorriso carinhoso nos lábios.
Para , enquanto brincava na brancura translúcida da sua época favorita do ano, aquela frase não fazia o menor sentido. Como seria possível alguém dizer aquilo para ela logo ao conhecê-la pela primeira vez? Além disso, por qual motivo alguém a chamaria de “floco de neve”? Ela tinha um nome. Ser chamada de um apelido carinhoso por alguém que ela nunca vira antes não tinha o menor sentido.
Quando era pequena, aquele tipo de pensamento acabava se dissipando sempre que algo chamava a atenção da garota. Ela tinha outras coisas para pensar... Apesar de que, sempre que começava a se sentir sozinha, era só olhar a frase em seu pulso para se sentir um pouco melhor.
gostava quando a neve caía durante a madrugada e ele acordava com a visão de um carpete brilhante do lado de fora da janela de seu quarto. Ficava observando com empolgação enquanto mal podia aguardar o momento que seus pais dessem permissão para que ele brincasse em meio aos flocos de neve.
Era nesses momentos, observando pela janela em toda a sua expectativa, que ele acabava inconscientemente passando os dedos pelas palavras belamente escritas em seu pulso esquerdo.
A primeira vez que vira aquelas letras, achava que somente era um belo desenho que simplesmente nascera com ele. Somente depois de muito tempo, quando finalmente começou a aprender o que significava cada um daqueles desenhos juntos, é que teve alguma noção do que era aquilo.
Lembrava-se claramente de quando seu pai o encontrou virando o próprio braço para cima e para baixo em uma noite gélida e silenciosa. Lá estava o menino, aproximando e distanciando as letras negras dos olhos, mudando o ângulo quinhentas vezes e lendo para si mesmo, letra por letra, até formar uma palavra que não fazia o menor sentido.
O pai dele cruzou os braços e ficou observando com um riso contido até o menino finalmente notar a presença dele.
- Pai! – sorriu e estendeu o pulso até ele. – O que é isso? Eu não consigo ler!
- , ... – O homem suspirou, finalmente rindo o tanto que queria. Aproximou-se do filho e bagunçou o cabelo dele, sentando-se no chão ao lado da criança.
- Queria saber ler melhor... – O menino respondeu com uma expressão brava, porém manhosa ao mesmo tempo. O pai dele riu, segurando a mão do filho entre os dedos e observando as palavras em negro.
- Um dia você vai saber, as coisas acontecem na hora que têm que acontecer. – Ele comentou com um sorriso gentil. – Lembra quando te contei sobre as almas gêmeas?
- Ah, as pessoas que eram uma e foram separadas? Que ficam eternamente se procurando até se encontrar? – perguntou com simplicidade. Ainda não tinha idade suficiente para entender algo como aquilo. Sabia o que era amor e amava seus pais. Pensava em quando seria grande, casado com uma mulher que amasse, e teria seus próprios filhos que também o amariam. Mas não podia dizer com propriedade que entendia sobre o amor que teria com sua futura esposa.
- Exatamente, . Toda pessoa tem uma alma gêmea que está destinada a encontrar. – O pai do menino respondeu de maneira simples. Em seguida, apontou para o pulso de . – Essas palavras são as primeiras coisas que você vai ouvir da sua alma gêmea. Você não terá dúvida alguma de que é ela quando a encontrar.
- Primeiras palavras...? – E, novamente, franziu as sobrancelhas, tentando ler o que estava escrito em seu pulso, mas era em vão. O menino olhou confuso para o pai em seguida. – Mas eu sei quando vou encontrá-la?
- Não. – O homem respondeu com um sorriso, deixando embasbacado. – Pode ser a qualquer momento. Quando você menos esperar.
- Mas... – Aquilo não fazia o menor sentido e o menino não sabia se era para se sentir aliviado de que um dia ia encontrar sua alma gêmea ou se revoltava, pois aquilo era completamente incerto. – Como ela vai saber o que dizer...?
- Não se preocupe, ! – O pai deu uma boa risada com a confusão do filho. – Ela vai dizer e é assim que você vai saber. Vem cá... Lembra disso?
Dizendo isso, o homem puxou a gola da blusa para a lateral, revelando uma tatuagem que conhecia muito bem. Ficava na clavícula do homem e a mãe do menino tinha uma igual, porém de tamanho diferente. Ao ver as palavras negras contra a pele do pai, somente confirmou com a cabeça.
- Desde que me dou por gente tenho essas palavras em mim. “Ei, você derrubou a sua flor!”, foram as primeiras palavras que ouvi saindo dos lábios da sua mãe. Éramos pequenos e eu estava pegando flores para dar para a sua avó. Ela correu atrás de mim, a flor lilás entre os dedos. Quando a vi sorrindo, senti algo diferente do que sentia quando falava com outras pessoas... – E ele suspirou, rindo de si mesmo. – Era como se falar com ela fosse o suficiente. Foi algo tão estranho, tão diferente, que só consegui responder “Qual é o seu nome, menina bonita”? Sua mãe ficou vermelha como um pimentão, rindo logo em seguida. E eu não queria que ela parasse de sorrir daquele jeito, nunca mais. Tudo que ela falava parecia música e tudo que eu queria era estar ao lado dela.
- Você... Então... Soube que ela era...? – lutava consigo mesmo, tentando achar as palavras corretas para fazer uma pergunta que nem mesmo ele compreendia totalmente.
- Não. Eu não tinha ideia de que a sua mãe era minha alma gêmea. – O homem deu um sorriso distante, como se estivesse trazendo à tona diversas memórias. – Somente depois que crescemos é que realmente entendemos o que tinha acontecido e o que significávamos um para o outro.
- Eu posso conhecer minha alma gêmea amanhã então? – O menino estava começando a tentar entender aquilo tudo, mas tinha que admitir que não fazia muito sentido.
- Sim. Mas pode ser que você a conheça somente quando tiver cinquenta anos, que nem aconteceu com a sua tia. – Ele respondeu simplesmente e teve que rir da cara de indignação que fez em seguida.
- Eu não quero esperar tanto assim. – O menino não se conformava com aquilo, encarando as palavras no braço.
- Paciência, meu filho. É o que eu disse: as coisas acontecem na hora que tem que acontecer. – O homem sorriu, levantando-se e caminhando até a janela, a fim de observar a neve brincando entre o vento. – Você não quer ir lá fora brincar?
Com isso, todas as preocupações de se aquietaram e o menino esqueceu aquela história de almas gêmeas e tatuagens de frases. Normalmente, quando observava sua tatuagem, ele não sentia as saudades que todos diziam que sentiam de seus complementares. Sempre tratara aquilo como se não fosse nada de mais e tinha que admitir a si mesmo que não entendia muito bem.
Porém, naquele dia especificamente, enquanto aguardava observando pela janela, ele sentiu algo diferente. Uma pontada no peito que tirou seu ar durante um breve segundo. podia falar com toda a propriedade do mundo – durante aquele segundo específico – que um dia conheceria sua alma gêmea. Aquilo o fez sorrir e voltar a observar os flocos de neve; um sentimento quente e aconchegante tomando conta de seu coração.
Uma das atividades preferidas de era tocar piano. Ela simplesmente podia passar horas brincando com as teclas pretas e brancas, ao lado da enorme janela que dava para o jardim da casa.
Várias circunstâncias fizeram com que a garota se fechasse em si mesma. Já no Colegial, ela mesma se apelidara de “ostra” ou tinha mania de dizer que era que nem uma cebola: era preciso descascá-la aos poucos para se chegar ao centro. Foi a maneira que ela encontrou de se resguardar e impedir que a machucassem mais do que já tinham feito. Sendo assim, não era fácil para que expressasse seus sentimentos: eles estavam muito bem guardados em uma caixinha que mantinha no fundo de um lago congelado.
Por isso que qualquer momento com um piano era mágico. O coração dela estava lá, era possível ouvi-lo através da música. finalmente podia dar vazão aos seus sentimentos e, naquele dia, enquanto observava a neve começando a se formar como um cristal sobre a grama verde azulada, a melodia soava como saudades.
Foi nessa época que ela começou a entender... Aquele sentimento estranho de saudades. ficava indignada consigo mesma: como podia sentir falta de alguém que nem tinha conhecido?!
Mas, ao fechar os olhos enquanto seus dedos escorregavam pelas teclas com destreza, ela imaginava como seria o toque dele em seu rosto – a mão quente aquecendo sua face gélida. Os braços dele certamente seriam aconchegantes, com o melhor tipo de abraço. A voz melodiosa, cantarolando a música que tocava, no pé do ouvido da garota.
O coração dela repentinamente sentiu um aperto, os pulmões faltaram ar e uma lágrima, sozinha como um cristal, caiu sobre as teclas do piano. imediatamente parou de tocar, levando uma das mãos ao coração.
Será que ele também sentia falta dela...?
Música acalmava . Ele não era das melhores pessoas com palavras, desde pequeno. Agora que estava no último ano do Colégio, aquela premissa continuava igual – se não pior.
Todos os dias, amarrava uma bandana no pulso esquerdo, de modo a esconder as palavras marcadas em negro. Não queria que ninguém as visse, não queria que ninguém as lesse.
Somente ela poderia saber. Mais ninguém.
Conforme ele crescera, foi se tornando cada vez mais bonito, chamando atenção das garotas. Agora, estava prestes a se tornar um músico – algo que o faria famoso, tornando-o cada vez mais importante.
A primeira vez que ele ouvira as palavras marcadas em seu pulso, estacou e ficou olhando para a garota em questão, embasbacado. Tudo que conseguiu fazer foi perguntar “É você?!” e segurar as mãos dela, procurando pelas palavras no pulso. Mas logo encontrou outras palavras tatuadas no antebraço, sentindo o coração afundar no peito.
O desapontamento foi tão grande que saiu correndo para se trancar, completamente sozinho, no banheiro mais distante a fim de chorar em paz. Sentado no chão, ele tentava raspar as palavras em seu pulso – mas tudo que conseguiu foi deixar a pele vermelha e arrancar sangue. Acabou na enfermaria e foi a primeira vez que teve aquelas palavras que gostava tanto escondidas embaixo de uma faixa.
Depois desse dia, chegou a ouvir sua frase mais três vezes, por três garotas diferentes. E nunca sentira nada de especial, por nenhuma delas. Ele sabia que tinha que se sentir diferente e reconhecer o amor. Mas nunca sentira nada e sempre achara outras palavras, diferentes das que ele dizia, tatuadas pelos corpos delas.
E foi aí que ele teve a brilhante ideia de esconder sua frase do mundo.
Usando a bandana amarrada no pulso, nunca mais ouviu aquelas palavras sendo ditas em vão. Decidira que sempre iria usar aquilo, até o dia em que a encontrasse. Sua alma gêmea saberia o que dizer, independente de ver as palavras ou não.
Sendo assim, sempre que voltava para casa, escutava música e cantava livremente para se acalmar. Enquanto deixava as palavras caírem de seus lábios em notas perfeitas, o garoto olhou para seu pulso encoberto pelo pedaço de pano.
Repentinamente, foi acometido de uma pontada de saudades quase insuportável. Teve que desamarrar a bandana o mais rápido possível e jogá-la longe, só para ler suas palavras e ter certeza de que elas ainda estavam lá.
Sentiu os olhos se enchendo de lágrimas. Quando os fechou para se controlar, uma lágrima escorreu, quente, por sua face. só conseguia imaginar como seria sentir a mão macia dela, com seu toque sedoso, limpando a lágrima – como se tivesse o poder de consertar tudo que estava errado. Praticamente conseguia ouvir a voz melodiosa dela dizendo que tudo ficaria bem, pois estava ali com ele. E os braços envolvendo-o em um abraço carinhoso.
Observando os flocos caindo fortemente na nevasca do lado de fora, tudo que conseguia se questionar era se ela também estava com saudades dele.
10 anos depois
- Mas que cara é essa?
- Desespero, Ne. Essa é a cara do desespero.
se encontrava sentada à mesa da sala, encarando o horizonte com o rosto apoiado nas mãos. Irene tinha acabado de chegar à casa da amiga, já entrando por conta da cópia das chaves que tinha. Tornaram-se amigas no colégio e, apesar do tempo e de eventuais distâncias, sempre permaneceram em contato.
Irene encontrou pela primeira vez em uma aula de artes. A professora falara para Irene ajudar a colega, pois era um caso perdido. Sendo uma ótima artista, Irene não negou ajuda e prometeu fazer o seu melhor para que pelo menos tivesse uma noção básica de desenho.
Para isso, marcou aulas após o horário do colégio para que pudesse orientá-la melhor. Da primeira vez, colocou alguns objetos em frente à e pediu para que a garota desenhasse de observação, para entender o quanto teria que ajudá-la. Deixou-a desenhando sozinha durante uns bons vinte minutos, fazendo seu próprio desenho em um sketchbook e conhecendo-a melhor enquanto conversavam.
E Irene não pôde ficar mais chocada quando encontrou um desenho extremamente realista e decididamente bom para uma pessoa que nunca tinha feito aulas na vida.
A partir desse dia, sair para desenhar se tornou uma das atividades preferidas delas – a outra era passar o dia na casa da outra tocando piano e conversando sobre artes em geral. Com o passar do tempo, começou a escrever, enquanto Irene se especializava cada vez mais em ilustração.
Agora lá estavam elas: Irene como uma ilustradora de sucesso, emprestando seus dons para os projetos da amiga, e como uma escritora anônima de diversos livros famosos, em constante crise existencial.
- Bloqueio criativo de novo...? – Irene suspirou enquanto tirava o cachecol, completamente à vontade na casa de e já a tratando como sua.
- Eu questiono seriamente o dia em que achei que poderia ser escritora profissional. – comentou séria enquanto apoiava os braços na mesa e olhava com indignação para amiga. – É sério, Ne. O que eu tinha na cabeça?
- Provavelmente o mesmo que eu tinha quando decidi que ia ser a sua ilustradora oficial. – Irene respondeu com um rápido sorriso, encaminhando-se para a cozinha. – A minha sorte é que seus livros dão dinheiro!
- A minha também! – deu uma breve risada sem humor. – Mas agora meus editores querem mais um livro e eu não sei nem por onde começar! Tive ideia de uns cinco enredos nessa semana, mas nenhum bom o suficiente para dar andamento.
- Eu acho que você precisa sair. – Irene deu de ombros, voltando para a sala com um pêssego em mãos. – De verdade. Podemos visitar um museu e desenhar. Observamos as pessoas e você cria personagens de acordo com a aparência de cada uma delas. O que você acha?
deu um pequeno sorriso enquanto suspirava, observando a amiga durante alguns segundos.
- Tem certeza que você não é minha alma gêmea, Irene? – E foi só perguntar que Irene imediatamente explodiu em risadas, fazendo-a rir em seguida.
- Claro que tenho, sua ridícula! Vamos, levanta essa bunda dessa cadeira e vamos fazer alguma coisa mais útil!
- Até hoje você nunca viu a tatuagem do Takashi, não? – perguntou enquanto jogava o casaco nos ombros. Irene enrolava novamente o cachecol no pescoço.
- Ah, credo, pelo amor de Deus. Não. – A moça respondeu categoricamente enquanto caminhavam para o mundo do lado de fora da casa de . – Nem ele viu a minha. Estamos lidando bem escondendo um do outro.
- Imagino vocês dois usando meias o dia todo em todas as situações para não enxergarem acidentalmente. – A amiga deu uma breve risada, sentindo a brisa morna da tarde batendo no próprio rosto ao atravessarem a porta de entrada. – Como vocês tomam banho?
- Por sorte, nós dois somos míopes. É só não usarmos óculos. – Irene piscou para , fazendo-a rir.
- Você nunca teve curiosidade? Quer dizer, as de vocês são nos pés, há uma possibilidade alta de que realmente sejam almas gêmeas.
- Então, mas que diferença isso faz? – Irene deu de ombros enquanto caminhavam calmamente no dourado do sol. – Se ele for, ótimo! Mas e se ele não for? Vou me separar do Takashi só porque ele não é minha alma gêmea? E se eu conhecer a minha alma gêmea e não quiser me separar do Takashi? Quero poder escolher meu próprio caminho também... Esse negócio das tatuagens é horrível.
- Eu não acho... De qualquer jeito, temos livre arbítrio. Tanto é que existem as pessoas que escolhem ficar com outras mesmo sabendo que elas não são suas almas gêmeas. – enfiou as mãos nos bolsos do casaco, pisando em folhas secas no meio do caminho somente para ouvir o som que faziam. – Ninguém é forçado a nada.
- É, eu sei... – E foi a vez de Irene suspirar, fazendo a amiga rir brevemente com aquela reação.
- Além disso, você não se lembra do que ele te disse a primeira vez que se conheceram?
- Sinceramente, não. Faz muito tempo e não foi nada muito especial... – Irene murmurou. – E antes que você pergunte, eu cubro as minhas palavras há tanto tempo que não me lembro exatamente o que dizem, então também não percebi na hora.
- Você é um ser excepcional, Ne! – ria animadamente com aquela conversa. – Já pensei em cobrir as minhas palavras por conta das pessoas bestas que já me disseram só pra me iludir... Mas elas são uma parte de mim. Com certeza iria me sentir desconfortável sem elas.
- Eu sei, ... Você tem uma sensibilidade muito grande com as suas palavras... – E Irene parecia um tanto cabisbaixa. Erguendo uma sobrancelha, achou aquele comportamento muito estranho.
- O que foi, Ne?
- , não me leve a mal... – Irene suspirou de maneira pesada, os ombros um pouco tensos. – Eu te vejo tendo reações por conta da sua alma gêmea desde que estávamos no colégio. Você é conectada a ele de uma maneira que eu nunca vi antes e realmente sente falta da presença dele... Sinceramente, eu sempre tive medo de sentir a mesma coisa. Definitivamente não estou preparada para sentir isso ou amar alguém dessa maneira. É como se você estivesse separada de uma parte sua e só fosse se sentir completa novamente com ele. Para mim, isso é absurdamente assustador... Não que você não seja suficiente em si mesma! Muito pelo contrário, sempre foi mais independente do que qualquer pessoa que conheci. Mas o seu amor, e tenho certeza que o amor dele também, vai ser algo que vai atravessar o Tempo e qualquer outra circunstância do mundo. Isso pra mim é assustador.
Ambas ficaram em silêncio durante algum tempo, somente ouvindo as folhas se quebrando embaixo dos pés de . Suspirando, a moça resolveu responder.
- É assustador para mim também... – E tinha um pequeno sorriso no rosto. – Eu nem sei quem ele é, de onde é e se realmente existe. Posso ter imaginado uma pessoa de um jeito e vir alguém completamente de outro. E, sinceramente, nem sei como vou reagir quando conhecê-lo. Provavelmente vou rir, chorar, explodir e surtar, tudo ao mesmo tempo. Às vezes, ele também não estará pronto. Para mim, não sinto problema em saber que encontrei a pessoa que me completa e faz esse vácuo sumir de dentro de mim. Mas saber que estamos conectados através da Eternidade... É um pouquinho assustador mesmo. O que você faz quando encontra o seu “Para Sempre”...?
Novamente, o silêncio caiu entre as amigas, assim como as folhas que se desprendiam das árvores com o vento. Com um sorriso compreensivo, Irene contemplou a beleza do que tinha acabado de falar.
- Acho que você encontrou o assunto do seu próximo livro.
a observou com as sobrancelhas franzidas durante alguns segundos e, em seguida, sua expressão se iluminou como se a moça tivesse acabado de descobrir a Austrália.
Quem sabe ele a encontraria se ela escrevesse sobre almas gêmeas?
- Você nunca vai tirar esses braceletes? – perguntou com um suspiro enquanto trocava um bracelete prateado por um dourado antes de subirem no palco. Uma moça seguia o amigo, ficando na ponta dos pés para tentar arrumar os cabelos dele, enquanto encontrava-se comportadamente sentado para que terminassem a sua maquiagem.
- Não. – respondeu categoricamente, ajeitando o grosso metal dourado para que nenhuma das palavras aparecesse. Enquanto isso, observava-se no espelho, a fim de ter certeza que o lápis não havia borrado. – Você devia se dar por feliz que trocaram meus tecidos por braceletes. Agora não tenho mais como limpar o suor da minha testa e jogar o pano molhado em você no fim dos shows!
somente rolou os olhos enquanto ria alegremente.
- É. O mais lindo era você andando por aí cobrindo o pulso como uma besta. – O amigo devolveu em palavras ácidas. – Sabe, você não vai poder fugir disso pra sempre.
- Não estou fugindo. Só não quero qualquer uma brincando com as minhas palavras. Isso aqui é coisa séria. – ficou imediatamente soturno, finalmente sendo abandonado pela moça do cabelo. – Você não sabe o que isso faz comigo.
- Desculpa, . Eu sei... – falava de coração. Estava somente brincando antes, porém se esquecera de como o assunto era importante para . – Eu sei que você é mais sensível com a sua alma gêmea... Aliás, é a primeira pessoa que vejo com uma conexão tão forte.
- Pois é, eu também... – suspirou, apoiando-se na bancada de maquiagem enquanto cruzava os braços. Tinha o olhar perdido no bracelete de ouro enquanto conversava. – É muito estranho... Mas sinto que é algo para sempre. Que ela vai encaixar perfeitamente na parte de mim que está faltando. Que o Tempo vai ser supérfluo. Só espero que ela exista de verdade, né.
- ! Se você tem as palavras no braço é porque ela existe e vocês vão se conhecer! É só uma questão de tempo! – teve que se conter para não cair na gargalhada e não borrar a maquiagem. – Você sabe que existem pessoas que nascem sem as palavras, porque não têm almas gêmeas. Se a sua tatuagem está aí, irá acontecer, quer você queira ou não. Quer você espere ou não.
- Eu vou aguardar. O tempo que precisar, não importa o quanto seja. – respondeu imediatamente, quase como uma reação automática às palavras do amigo. – Não quero ficar com mais ninguém além dela, não faria sentido. Não seria amor eu não me sentiria confortável. Saberia que há alguma coisa errada e não conseguiria aguentar nem um dia com outra pessoa que não fosse ela.
somente o observava com um pequeno sorriso no rosto, enquanto algumas pessoas no recinto somente suspiravam com as palavras de . Achavam aquela atitude a coisa mais romântica do mundo e, se pudessem ver o que ele tinha tatuado no braço, certamente tentariam dizer a ele para tentar passar a eternidade com .
- Você é fascinante. – concluiu, cruzando as pernas. – Você não tem medo da Eternidade?
- Claro que tenho, é algo bem assustador... – suspirou, porém deu um pequeno sorriso em seguida. – Mas se fosse perfeito, não seria amor.
- Muita gente fala o contrário. Que se for perfeito, é amor. – E claro, já estava provocando o amigo. Queria ver até onde chegaria naquela história e, sinceramente, estava curioso em entender a conexão do amigo com a própria alma gêmea.
- E eu estou convencido de que essas pessoas estão erradas. O amor não é perfeito, faz a gente rir e chorar. Mas é algo necessário para entendermos o que é se descobrir no outro. – cruzou os braços, suspirando e olhando para o teto. – Que um vai viver para sempre dentro do outro e o Tempo virará só uma circunstância, não uma limitação. É isso que faz a Eternidade suportável, porque ao invés de mergulhado em si mesmo no próprio narcisismo, você está imerso, completamente envolto por aquele que se encontra na mesma situação que você e em você... Quase como um antagonismo que se completa. Então sim, tenho medo, mas também tenho curiosidade... E saudades.
- Ah, eu sei como você tem saudades... – suspirou, apoiando o rosto na mão enquanto contemplava . Não sabia o que fazer com ele. – Quantas vezes já te encontrei chorando de saudades de uma pessoa que você nem conhece?
- Ah, sim... – riu de maneira um tanto envergonhada, abaixando a cabeça. Aquele tipo de reação não era incomum e ele a tinha desde que se conhecia por gente. – Perdi a conta de quantas lágrimas já derramei... Fico pensando se choro nesses momentos, pois ela está se sentindo triste. Sabe? Às vezes estou muito feliz e, repentinamente, sinto uma tristeza repentina apertar meu coração. É muito mais forte do que eu e começo a chorar, só desejando que alguém me abraçasse... Fico pensando se é porque ela está se sentindo assim e, mesmo distante, consigo sentir a mesma coisa.
- Eu não duvido. A conexão entre vocês dois é bizarramente forte. – suspirou, permanecendo em silêncio durante alguns segundos enquanto os olhos de se perdiam no horizonte, fechando-se em seguida. – Por que você não escreve uma música?
- Hã?
- Você fala coisas muito bonitas quando o assunto é a sua alma gêmea. – sorriu, finalmente se levantando da cadeira, pronto para o show. – Com certeza ela deve te escutar. Só precisa ouvir o seu chamado. E se você escrever uma música? Às vezes quando ela ouvir, vai ter certeza que é você e vai te encontrar.
Ouvindo o pessoal da produção chamando-os para iniciar o show, controlou as lágrimas que insistiram em surgir nos olhos. Antes de entrar no palco, fechou-os e respirou fundo, sentindo algo estranho no coração. Naquela noite, cantaria para ela e somente ela, esperando que sua voz a alcançasse e desse um pouco de conforto de que um dia eles iriam se encontrar. escreveria a música e faria de tudo para que ressoasse nos quatro cantos do mundo – assim, ela tinha que ouvir seu chamado.
Algo de estranho aconteceu naquela noite. acordou com o nome da banda de na cabeça, sendo que nunca tinha escutado uma música sequer, nem ouvira falar deles em nenhum lugar. Era como se tivesse sonhado com eles, como se aquele nome tivesse sido sussurrado em seu ouvido em alguma melodia distante que a alcançou durante a noite.
A moça passou o dia todo em seus afazeres normais, mas cada vez tinha a vontade mais urgente de saber quem eles eram. Durante o almoço, sentou-se na cadeira de um de seus bistrôs favoritos, pediu um almoço leve e digitou o nome da banda no Youtube, abrindo o primeiro vídeo que lhe chamou atenção.
foi arrebatada repentinamente pela música. Em menos de um minuto, sabia que já podia se considerar mais do que fã daquele grupo. Tudo lhe chamava atenção: as cores, a filmografia, a musicalidade, a letra e, é claro, os músicos.
Não conseguia escolher um que lhe chamasse mais atenção – afinal, sempre procurou evitar julgar um livro pela capa. Recebendo o prato, a moça continuou na sua busca enquanto comia. Normalmente evitava comer enquanto mexia no celular, mas algo naquele grupo era extremamente magnético. Ela precisava saber quem eles eram.
“: com certeza, um ser que veio de outro planeta”.
imediatamente riu daquelas palavras. Perdera a conta de quantas vezes ouvira aquilo – de que era muito diferente, por vezes esquisita, completamente fora do convencional e imprevisível.
- É, eu acho que gosto bastante de você, ... – Ela comentou consigo mesma, em uma breve risada.
“Ele nunca cantou de maneira tão bela quanto no show da noite passada: [link]”.
Interessada, clicou no link e colocou os fones de ouvido para entender o motivo da beleza daquela performance.
Quando ouviu as primeiras notas cantadas por , foi arrebatada por um sentimento forte como uma avalanche. Fechando os olhos, a única coisa que conseguia fazer era ouvi-lo – como se estivesse falando diretamente com ela.
- Eu já te escutei antes... – sussurrou de maneira automática, abrindo os olhos em surpresa com as próprias palavras.
Imediatamente, pôs-se a procurar a letra da música que ele cantava.
Nós estamos conectados pelo Destino, então não se preocupe, meu amor. Vou encontrá-la e curar a dor que existe no seu coração.
Levando uma das mãos à boca, ficou observando a tela do celular, em choque. As lágrimas caíam enquanto ela somente conseguia permanecer congelada.
- Quem é você?!
Foram as únicas palavras que ela conseguiu falar em meio ao próprio caos de emoções.
Quatro Meses Depois
- Não é possível. – Irene não conseguia acreditar nas palavras da amiga.
- É possível. Ele existe. – insistiu, o sorriso se espalhando pelo rosto.
- . Ninguém encontra a própria alma gêmea desse jeito. – Irene passou a mão pela testa, achando que a amiga já tinha ficado maluca.
- Né, eu nunca vi alguém tão coordenado comigo. De verdade. – deu de ombros, continuando a preparar o chá no fogão enquanto Irene a observava do sofá.
Enquanto isso, Takashi estava jogado em outro sofá, praticamente babando no estofado. Tinha plena consciência de que o faria limpar quando acordasse, mas estava tão cansado que não se importava.
- Coelhos na lua, “se você pular, eu pulo”, a vontade de se aposentar em uma fazenda, de ter vinte mil filhos e ficar velhinho ao lado de alguém, as reações... – E suspirou, sem saber mais como explicar. – Se você sentasse para conversar com ele, provavelmente descobriria mais umas vinte coisas que temos em comum ou que são complementares entre si. Ele é calmo como a água, enquanto eu sou feita de neve... Ele é a calmaria que eu preciso dentro de mim.
- E ele é um cantor de um grupo famoso. – Irene claramente julgava a amiga, observando-a por cima do próprio sketch book. – , pensa comigo: quantas mulheres nesse mundo devem achar exatamente o que você acha?
- A frase da alma gêmea dele está no pulso esquerdo, que ele cobre todos os dias para que ninguém veja o que está escrito e não tente enganá-lo. – Dizendo isso, enquanto caminhava com o bule de chá para a cozinha, levantou o pulso direito. – Onde está a minha frase?
- Ok. Essa é uma boa coincidência. – Irene teve que admitir, mas não estava pronta para dar o braço a torcer. – Mas muitas outras mulheres que gostam dele devem ter frases no pulso direito, você não é a única que conheci com a frase aí. O que te faz tão diferente, ? Às vezes, você está se iludindo à toa.
- É difícil de explicar, Ne... Eu sei que é ele. – suspirou, esfregando a testa. Em seguida, começou a servir o chá. – Bom, não foi por isso que você veio aqui. Quer chá?
- Você também não me chamou só pra tomar chá! – Irene riu, indo até a mesa para pegar sua caneca de chá. Não tinha coisa que sabia preparar melhor do que aquela bebida.
- Não, não... – comentou rindo brevemente. Irene voltou para o sofá no qual se encontrava anteriormente, voltando a se ajeitar com seu sketchbook. – Pensei na conversa que tivemos outro dia e tive uma ideia nova. Preciso que você já vá pensando em ilustrações, Ne.
- Ideia nova? Adoro suas ideias novas e processos criativos! – Irene pegou o pote de morangos que estendia a ela, trazidos em algum momento da cozinha para acompanhar o chá da tarde, sentando-se ao lado da amiga. – Qual foi dessa vez? É a história das almas gêmeas, não? Que você vai escrever para ele...?
- Sim, essa mesma... Basicamente: pessoas são flocos de neve. – E se virou com um sorriso imenso para a amiga, segurando um morango perfeitamente vermelho entre os dedos.
- Ok... Você me perdeu nessa... – A amiga respondeu com uma breve risada, fazendo-a rir também. – Como assim “pessoas são flocos de neve”? Como você vai desenvolver um livro a partir desse conceito? E como eu vou criar ilustrações a partir disso, mulher?
- Vamos lá... A ideia era falar sobre almas gêmeas, não? Com tudo que eu sinto pela minha, certo? – perguntou e Irene concordou com a cabeça, atenta em cada palavra e ansiosa em desvendar a maneira como a mente de funcionava. – A premissa é que todos nós temos almas gêmeas, pessoas que são únicas para nós...
estava prestes a começar uma explicação complexa se não fosse a voz de ecoando da televisão – ligada em qualquer canal para que Irene tivesse o que desenhar enquanto conversavam anteriormente. Ambas imediatamente viraram para o aparelho enquanto Takashi somente resmungou no sofá e se virou para o outro lado.
- Ah, eles vão dar uma entrevista hoje, né? – perguntou despreocupadamente e Irene somente confirmou com a cabeça, aumentando o volume da TV. – Ok. Te explico o conceito depois.
- Se o é sua alma gêmea, como você não sabia que ele daria uma entrevista hoje? – Irene ergueu uma sobrancelha enquanto perguntava.
- O fato de ele ser o amor da minha vida não faz com que eu seja obrigada a persegui-lo. – tinha uma expressão óbvia e incomodada no rosto, fazendo Irene segurar o riso. – Tenho outras coisas mais importantes para lidar do que viver em função dele.
Rindo em conjunto, as amigas ficaram em silêncio para assistir a entrevista na televisão. Tudo correu normalmente: não falava muito, mas, quando resolvia comentar algo, sempre tinha um sorriso no rosto – e, quando se empolgava, sempre fazia com que todos começassem a rir, até as moças que o assistiam. Os assuntos giraram em torno dos shows, MVs e músicas novas.
Mas, em um momento, por algum motivo que elas não prestaram muita atenção, o grupo começou a falar de neve durante a entrevista.
- Ele tem a teoria de que pessoas são como flocos de neve. – disse incrédulo, apontando para , fazendo todos no programa rirem imediatamente.
- O quê?! Como assim?! – O apresentador não conseguia parar de dar risada daquela loucura, enquanto somente ria de maneira envergonhada e sentia as bochechas corando levemente. - Você sabe que ninguém é feito de água, né?
- Bom, boa parte do corpo é feita de água... – jogou a possibilidade no ar e todos ficaram mudos, completamente em choque. Ele imediatamente começou a rir. – Não! Estou brincando! Eu sei que ninguém é de neve! Isso é só um conto japonês!
- Então de onde vem a teoria dos flocos de neve?! – O apresentador perguntou ainda rindo, aliviado de que o cantor estava somente brincando.
- Bom... Flocos de neve são únicos, não? Cada um tem um desenho diferente, próprio... – começou a explicar, dando um sorriso completamente perdido em sua própria explicação logo em seguida. Como se somente ele conseguisse ver a beleza nas próprias palavras. – Pessoas também são únicas. Cada um de nós tem a sua própria pessoa, sua alma gêmea, então... Pessoas são como flocos de neve. Não existem dois iguais, mas existem aqueles que se completam. Que foram feitos exatamente um para o outro.
O apresentador trocou olhares admirados com os outros integrantes da banda.
- Não é que faz sentido? – O homem perguntou com uma sobrancelha erguida. – Agora me diz... O quanto você bebeu no dia em que pensou em tudo isso?
imediatamente explodiu em risadas, junto com todo mundo. Mas, sem que ninguém percebesse, também passou os dedos sobre a bandana em seu pulso esquerdo. Não achava sua explicação boba ou absurda... E não via a hora de encontrar alguém que veria a beleza nos seus pensamentos e palavras - e não rir, como todo mundo sempre fazia.
Irene somente olhou para a amiga, completamente embasbacada.
- Você sabia disso...?
- Não... – respondeu da mesma maneira que ela, olhando para a amiga em choque. – Ele nunca tinha falado sobre isso em entrevista alguma. Pelo menos não nas que eu assisti.
Ambas continuaram em seu silêncio pasmo enquanto eles somente riam na televisão.
- Ok, . Agora eu estou convencida de que ele é a sua alma gêmea. – Irene se levantou do sofá, cruzando os braços e começando a andar de um lado para o outro. – Isso é loucura! Tentei explicar de todas as maneiras que o jeito de vocês é só uma coincidência louca, mas depois dessa... Mano, eu senti todos os pelos do meu braço levantando, me deu uma coisa... Sei lá! Parecia que vocês estavam se comunicando mesmo à distância e sem se conhecer, isso é muito louco, !
- Bem vinda ao meu mundo nos últimos meses. – respondeu com um sorriso satisfeito no rosto, controlando-se para não rir da indignação da amiga. Já tinha passado daquela fase.
- Então você sabe o que isso indica? – Irene olhou de maneira séria e decidida para enquanto a moça somente negava com a cabeça. - Indica que vocês precisam se conhecer.
- E isso vai ser muito fácil! – deu uma risada de escárnio, rolando os olhos. – Você mesma disse: quantas mulheres nesse mundo devem acreditar na mesma coisa? Além disso, ele é um cantor famoso enquanto eu sou só...
- Uma escritora famosa e anônima! – Irene respondeu mudando a postura e colocando as mãos na cintura para cobrar a amiga. – Todo mundo me conhece como sua ilustradora, mas não conhece você! ... Tá na hora de você se mostrar pro mundo.
- O quê?! De onde veio isso?! – entrou em pânico repentinamente. Seu anonimato a protegia e ela estava confortável daquela maneira. Não conseguia se imaginar mundialmente famosa.
- Veio do fato de que a sua alma gêmea está lá fora te esperando, tagarelando sobre pessoas que são flocos de neve, morrendo de saudades de você tanto quanto você morre de saudades dele! – Irene já estava exasperada, pois sabia o quanto podia ser cabeça dura. – , quantas vezes você vai ficar chorando sozinha de madrugada, sentindo saudades da sua alma gêmea? Você consegue viver muito bem sem ninguém, porém tem dias que simplesmente fica despedaçada por não tê-lo junto! Eu nunca vou entender essa conexão, pois não a tenho em mim dessa maneira. Mas você tem e tudo indica que você o encontrou. O está lá, esperando por você. Temos que fazer alguma coisa sobre isso.
Com isso, olhou novamente para a televisão, encontrando os olhos de . Ele parecia levemente deslocado na entrevista e, quando olhou para a câmera, sentiu como se ele estivesse olhando diretamente para ela – implorando para que ela o encontrasse.
- Você tem razão... – suspirou, olhando decididamente para Irene em seguida. – Ok. Eu tenho que sair do anonimato.
Seis Meses Depois
Cristais de Neve.
observava o próprio livro enquanto sentia o estômago revirando dentro de si.
Lá estava ela, em um vestido abaixo dos joelhos, perfeitamente azul e decorado com pequenos flocos de neve salpicados por todo o tecido. O cabelo estava alinhado, a pele perfeita. No pescoço, levava um colar no formato de um coração azul – presente que tinha ganhado quando era pequena por amar o Coração do Oceano. Passou a mão pela pedra e observou o próprio reflexo perfeito no espelho da livraria.
Aquele era o grande dia. O livro Cristais de Neve havia sido lançado, atingindo o maior número de vendas que ela já registrara. Irene se esforçou em todas as ilustrações, recebendo até a ajuda de Takashi, para que o livro ficasse perfeito. Afinal, era a primeira vez que o mundo veria o nome real dela impresso em uma capa.
Um mês após o lançamento, ela tomou coragem de sair das sombras e apresentar-se aos fãs em uma sessão de autógrafos. Não estava pronta, mas era o que precisava fazer – não somente para encontrar sua alma gêmea, mas para seu crescimento pessoal. Ela tinha que parar de ter medo do reconhecimento e dos elogios. Aquilo era algo que tinha que abraçar, não evitar.
- Eu espero que você me veja hoje... – A moça murmurou de olhos fechados, respirando fundo mais uma vez antes de caminhar decididamente ao local onde os fãs, repórteres e emissoras de TV a aguardavam, todos ansiosos por capturar o rosto dela pela primeira vez.
sentiu algo estranho quando seus dedos passaram pela capa de Cristais de Neve. Por um mero acaso, o Destino fez com que ele encontrasse aquele singelo livro nas prateleiras, algo que ele certamente não estava procurando – mas que ficou muito contente em encontrar.
Levando-o para casa, embrulhou-se nos próprios cobertores antes de dormir e decidiu passar o tempo entre as páginas como se fosse um amigo distante que não encontrava há muito.
Por diversas vezes, teve vontade de chorar. Nunca encontrara algo que conversara tão bem com ele quanto aquelas palavras em negro no papel creme. Após ler uma quantidade considerável de páginas, passou os dedos novamente pela capa, encontrando o nome da autora: . Em letras menores, encontrou também o pseudônimo que ela usara até aquele livro.
Procurando em todos os sites, tentou aprender o máximo que pôde sobre ela. Cada palavra que lia, cada fato que descobria, o que ela deixava ou gostava de deixar, os pensamentos que escrevia... As coincidências eram muitas.
Pasmo e com um sentimento de finalmente ter chegado em casa após anos à deriva, estava convencido de que era sua alma gêmea antes do fim da noite.
Portanto, lá estava ele, sentado ansiosamente em frente à TV, com um pote de morangos em mãos e os olhos aguardando quase sem piscar. Aquele era o dia em que ela apareceria pela primeira vez em público e ele não perderia aquilo por nada.
- Eu ainda não acredito. – comentou, sentando-se ao lado do amigo. – Li o livro e sim, em muitos momentos parece que ela conversou com você e colocou todos os sentimentos que você tem em relação à sua alma gema... Mesmo assim, não consigo acreditar que é ela. Muitas outras pessoas devem pensar o mesmo.
- Eu já parei pra pensar nisso e é por isso que estou aqui. Quando você a ver, vai saber que estou certo. – respondeu com convicção.
Teriam continuado a discussão se não fossem os gritos que surgiram do aparelho de televisão. Os flashes começaram a piscar como mil estrelas e em meio aquela comoção, surgiu em seu vestido azul cravejado de flocos de neve, sorrindo com o par de olhos mais gentis que já tinha visto.
Ao encontrá-la, ele imediatamente parou de se mexer. Quando ela se sentou à mesa para assinar os autógrafos e pegou o microfone, prendeu a respiração e fechou os olhos.
- Olá, meu nome é ! Prazer em conhecê-los! – A voz da moça ecoou como as notas da música mais doce que podia acalmar qualquer caos na alma de .
Abrindo os olhos, os de encontraram os dele – o que o fez ficar a ponto de chorar.
- É ela, . Eu tenho certeza. – sorriu, como se aquele fosse o dia mais feliz de toda a sua existência, enquanto os olhos se enchiam de lágrimas. – Ela é a minha alma gêmea. Eu preciso conhecê-la.
Lá estava o olhar certeiro de . Observando-o, percebeu que os únicos momentos em que olhos do amigo ficavam decididos daquela maneira eram quando falava da própria alma gêmea. Durante muito tempo, o ouviu divagando sobre aquela pessoa e lá estava ela, sorrindo amigavelmente enquanto assinava diversos livros e conversava com cada fã que parava à sua frente como se fossem amigos há décadas – exatamente como fazia.
- Você já terminou a sua música? – perguntou repentinamente, fazendo o amigo franzir as sobrancelhas.
- Já, só preciso terminar de polir algumas partes... Por quê?
- Ela vai te escutar.
Um mês se passou e estava desesperada tentando aprender a viver com a fama.
O que resultou nos momentos mais antissociais da vida da moça, trancafiada em sua casa para focar na mais nova história que surgira na própria mente como uma avalanche.
Não que ela não gostara dos fãs – muito pelo contrário: não sabia como lidar com todas aquelas pessoas lhe dando nada mais que amor. Claro, havia muitos que destilavam ódio em relação às histórias dela, mas o tanto de gente que gostava compensava pelos outros. Ela não sabia onde se enfiar e sempre corava com os elogios, além de querer entregar algo melhor ainda para os editores como uma maneira de agradecer por todo o carinho.
Então, lá estava ela trancada em casa, mordendo a ponta de uma caneta enquanto deixava uma série de clipes rolando na televisão para lhe dar inspiração, rabiscando algumas palavras aqui e ali quando tinha alguma epifania de criatividade.
- Uma hora você vai ter que sair. – Irene comentou placidamente, enquanto rabiscava suas próprias ideias em seu sketchbook. – Você sabe como o mundo lá fora é bom para arranjar inspiração.
- Sim, eu sei... – respondeu de maneira pensativa. – Mas tem algo me incomodando. Algo que está para acontecer e eu só tenho que esperar mais um pouquinho...
Irene sorriu, voltando a atenção para o desenho. sempre tinha daquelas: sentimentos estranhos e muitas vezes premonitórios. Fora assim que ela sempre sentira a presença de e o encontrou em meio aos seus sonhos em uma manhã despreocupada. Era fascinante, para falar a verdade.
Quando elas menos esperavam, porém, um clipe do grupo de apareceu na tela da televisão. franziu as sobrancelhas, pois não conhecia aquela música – o que não podia se gabar, afinal não conhecia diversas músicas dele. Pendendo a cabeça para um lado, continuou a escrever seu livro, porém a música ganhava cada vez mais espaço nos ouvidos dela.
começou a sentir algo estranho enquanto ouvia, apesar de tentar não prestar muita atenção – afinal, precisava terminar seu livro. Mantinha o caderno em cima das pernas e a caneta entre os dedos, porém logo as imagens na TV se tornaram interessantes demais para se ignorar.
- ...? – Irene chamou enquanto terminava alguns detalhes em um pedaço de papel. Mal percebeu que a amiga se levantara do sofá e parara em frente ao aparelho de televisão, completamente absorta no vídeo que se passava. Era como se tivesse sido chamada para cada vez mais perto das imagens que se passavam por lá. – Terminei mais uma ilustração vê o que... ? Tá tudo bem?
E claro, Irene achou muito estranho encontrar a amiga parada no meio da sala, observando atentamente a TV com as sobrancelhas franzidas.
- Tá... Tudo bem sim... – respondeu despreocupadamente, mas suspirou em seguida. – Essa música lançou quando...? Tenho a impressão de que já ouvi antes em algum lugar...
Era isso que mais a incomodava. Aquelas notas não lhe eram estranhas, aquelas vozes eram extremamente familiares. Não por ser da banda que gostava tanto, mas sim porque ouvira antes, várias e várias vezes. Uma melodia extremamente familiar, com uma harmonia que a fazia se sentir em casa.
- Lançou hoje, . Não tem como você ter ouvido antes... – Irene respondeu calmamente, deixando a ilustração sobre a mesa e se aproximando da amiga. – Você acha que já ouviu?
- Acho que sim... – E continuava alheia à realidade, concentrada somente no vídeo e na música, como se o próprio Tempo tivesse parado. – Parece algo que ouvi em um sonho... Há muito tempo atrás... E essas imagens não me são estranhas...
Nesse momento, a câmera focou em sorrindo, claramente se divertindo com a cena que filmavam. E foi aí que sentiu um aperto no coração, algo tão forte que lhe tirou o fôlego e a fez arregalar os olhos: ela já tinha visto aquilo.
Levando a mão ao coração, a moça se distanciou da TV, cambaleando, e terminou sentada no sofá, os olhos marejados de lágrimas. Quando? Como que sabia daquilo? Como podia ter tanta certeza? O sentimento que a acometeu era tão forte que achava que nunca mais voltaria a respirar.
- ?! O que foi?! Tá tudo bem?! – Irene ficou alarmada ao ver aquela reação da amiga, tentando descobrir o que fazer para ajudá-la.
Começando a chorar em uma reação automática, ignorou completamente e se levantou do sofá, aproximando-se da televisão. Quando apareceu novamente na tela, ela tocou o rosto dele com os dedos trêmulos, ainda boquiaberta.
- Quem é você...? – perguntou com as sobrancelhas franzidas, as lágrimas escorrendo pelo rosto como se ela mal percebesse que estivessem lá. – Quem é você, ...?
- , você sentiu alguma coisa? – Irene já conseguia ter alguma noção do que tinha acabado de acontecer, procurando não encostar na amiga para que ela não se assustasse. Sabia que quando o assunto era a alma gêmea de , o melhor a se fazer era levar as coisas de maneira devagar.
- Senti... Algo muito estranho, Ne... – tirou a mão da tela e fechou os olhos, abraçando a si mesma em seguida. – Eu já vi aquilo antes, tenho certeza. Eu conheço esse rosto, esses olhos... Conheço tudo, já vi em algum momento... Mas não sei...
Nesse momento, ela abriu os olhos novamente e lá estava cantando as últimas frases da música, algo sobre Destino e espera – a música mais nova que ele próprio tinha escrito e produzido, do começo ao fim, sem a ajuda de ninguém. Ele olhava diretamente para a câmera, para a TV e para os olhos de .
Os olhos de .
Era isso que fazia com que ela o reconhecesse de algum tempo e lugar remotos que nenhum dos dois jamais se lembraria nessas vidas.
sentiu as pernas bambeando e o coração acelerando como uma montanha russa. Tudo foi tão forte e repentino, que a moça sentiu o próprio mundo girando e teve que se sentar no chão – pois não confiava mais na força das próprias pernas. Mal percebeu quando Irene gritou seu nome e se sentou ao lado dela, completamente desesperada e sem saber o que fazer. Na pior das hipóteses, se tivesse que levar ao hospital, levaria.
- É ele, Irene. É ele. – disse com toda a convicção do mundo, ainda observando a TV, as lágrimas escorrendo de maneira cada vez mais forte. Entretanto, ela apertava o próprio coração com a sensação de segurança mais confortável que sentiu na vida.
- É ele o quê...?
E somente se limitou a apontar as palavras no pulso. Não tinha mais dúvidas, não bambeava mais naquele conhecimento. Ela ouvira o chamado dele através da música que gastara tanto tempo para escrever justamente para ela.
Era ele. Ela sabia.
Dois Meses Depois
- Nossa.
Foi a única coisa que Irene conseguiu comentar ao terminar de ler o livro que tinha acabado de escrever.
A cabeça da amiga se levantou do sofá, observando Irene com expectativa.
- E aí...?
- ... – Irene deixou o manuscrito sobre a mesa, suspirando. pendeu a cabeça para um lado e somente ficou aguardando. Quando Irene abriu os olhos novamente, estavam marejados de lágrimas.
- Tá tão ruim assim?! – E se levantou correndo, pegando o manuscrito e abraçando-o para trancá-lo em um lugar bem longe onde ninguém mais pudesse ler.
- ... O jeito como você descreve saudades... É isso que você sente? – As lágrimas começaram a escorrer silenciosamente pelos olhos de Irene.
estava parada no meio da sala, como um animalzinho assustado – e era exatamente isso que era. Quando se tratava de seus manuscritos, morria de medo de deixar alguém ler e, sempre que tomava coragem, ficava na expectativa. Claro, já estava acostumada com rejeição – afinal, para publicar seu primeiro livro, levou muitas portadas na cara – mas, quando eram pessoas que ela conhecia, sempre tinha medo.
- Como assim, Ne?
Irene suspirou, sabendo que aquela conversa seria infrutífera. Limpou as lágrimas dos olhos e sorriu, levantando-se da poltrona em que estava sentada.
- Eu achei sensacional, você escreve muito bem. Tem algumas partes pra corrigir, porque o ritmo da história está meio confuso, mas eu te ajudo com isso. Vou fazer um chá e daí conversamos, pode ser?
- Ok. – sorriu de volta, concordando com a cabeça.
Sabendo que o chá ia demorar um pouco, a moça foi até o próprio quarto, instalando-se em seu cantinho: sentada no chão, o computador sobre a cama para poder escrever. Colocou os fones de ouvido e pôs-se a escutar algumas músicas no “aleatório”, a fim de terminar mais um projeto que tinha em andamento.
Conseguiu escrever algumas palavras normalmente, até que teve uma vontade repentina de ouvir uma música específica. Colocou para tocar e continuou a escrever, porém não esperava o que houve em seguida. O primeiro acorde do piano a fez parar de digitar e prestar atenção. O segundo parecia atingir diretamente o coração dela. E assim que a melodia começou efetivamente, ela sentiu.
Saudades.
Aquele aperto no coração típico das saudades que sentia toda vez que pensava muito nas palavras em seu pulso... E da primeira vez que vira naquele clipe.
ficou sem ar e sem mais nada para se apoiar. Sentiu as lágrimas preenchendo os olhos involuntariamente, o sentimento assolando seu coração. Ela parou de digitar, apoiou a cabeça no colchão e começou a chorar. O rosto ficou quente, as lágrimas escorrendo de maneira fria e pingando nas calças do pijama.
Nesse momento, de olhos fechados, ela pôde vê-lo claramente sentado à sua frente, escutando a mesma música. A mão dela se aproximou do pescoço dele, sentindo a pele quente de . Ele fechou os olhos enquanto ela somente se aproximava. Em poucos segundos, os lábios macios dele estavam tocando o pescoço de e logo tudo que puderam fazer foi se abraçar. Não pertenciam a lugar nenhum, pois pertenciam um ao outro. Em qualquer lugar que estivessem, se estivessem juntos, já era suficiente.
Abrindo os olhos e voltando para seu quarto, completamente vazio, as lágrimas dela somente aumentaram. Quando? Quando iam se conhecer?! Aquilo era torturante, apesar da doçura de saber que um dia iriam se encontrar.
- ! – Irene foi cuidadosamente até a amiga, retirando a mão de que se encontrava na própria cabeça e que a moça sentia que era de . – O que foi? Tá tudo bem? Você tá chorando.
- Eu preciso de um abraço... – A moça respondeu de maneira silenciosa e entre os próprios soluços.
- É por causa...? – Irene passou os dedos pelas palavras no pulso da amiga e somente confirmou com a cabeça.
Nisso, Irene se sentou ao lado da amiga e a abraçou, apoiando a cabeça dela em seu peito e afagando os cabelos de . A moça envolveu Irene com os braços da maneira que podia, chorando mais que antes.
- Eu sinto tanta falta dele...! – As lágrimas de pareciam aumentar conforme a música passava. – Tanta falta, Ne...
- Shhh, vai passar... Calma...
Se aquilo tivesse acontecido antes de ler o manuscrito de , Irene provavelmente ficaria desesperada. Porém, a maneira como a moça descrevera o próprio sentimento de saudades, de sentir a falta de uma pessoa específica ao seu lado, atingiu Irene como uma tonelada de tijolos. Ela nunca sentira aquilo, mas agora entendia o sentimento exasperante que havia no peito da amiga – e tudo que podia fazer era consolá-la com um abraço.
Assim, o quarto foi tomado pela música e as lágrimas silenciosas de .
Mal sabia ela que decidira ouvir a mesma música que ela.
Tentando relaxar e encontrar um pouco de inspiração pra escrever a letra da música que ele fora desafiado a escrever, teve a vontade repentina de escutar a mesma música que decidira colocar ao escrever.
Sentado em sua cama, ele se sentiu incomodado ao ouvir os acordes do piano, tentando entender o motivo de soarem tão diferentes. pensou que não tivera aquele sentimento ao ouvir aquela música pela primeira vez, então não entendia o porquê daquele aperto em seu peito.
Repentinamente, ele perdeu todo o ar de seus pulmões. As letras em seu pulso pareciam arder como fogo e o rosto dela surgiu no canto mais remoto da memória dele. brilhava como uma estrela solitária em uma noite silenciosamente escura.
fechou os olhos e apoiou a testa nos joelhos. Conseguia sentir a mão quente de contra seu pescoço, aproximando-se lentamente dele. não conseguiu controlar o impulso de grudar os lábios na pele macia do pescoço dela, fazendo-a suspirar. Teve que abraçá-la em seguida, os braços de retornando o abraço – como se nunca mais fossem se separar e seus corações se completassem em um só naquele simples gesto.
- Ai, meu Deus, ! Tá tudo bem?! – veio correndo até o amigo, já que decidira passar por lá para deixar alguns doces que tinha comprado mais cedo.
- Eu... Ela... Dói tanto... – tentava explicar, mas não conseguia achar palavras. Aquele sentimento era muito estranho para explicar. Somente alguém que passara pelo mesmo conseguiria entender.
- Dói aonde...? – E finalmente compreendeu quando levou a mão esquerda ao peito, a tatuagem descoberta pela manga do suéter felpudo. – Calma, calma... Vocês vão se encontrar...
- Eu sei, mas... – O amigo não sabia mais o que falar. Não sabia mais como explicar. Só sabia que quanto mais da música ouvia, mais sentia a necessidade de chorar enquanto a saudade aumentava. – Mas eu...
- Tudo bem, . Tá tudo bem. – Dizendo isso, se sentou ao lado do amigo, abraçando-o e deixando-o chorar em seu ombro. Ele afagava os cabelos de , tentando acalmá-lo, mas sabendo que aquela angústia do amigo só iria passar no dia em que conhecesse .
sorriu. De certa maneira, invejava . Queria sentir o que ele estava sentindo. Também queria encontrar sua alma gêmea.
Três Meses Depois
continuou lançando seus livros. continuou criando suas músicas. Ele lia as palavras que ela escrevia como se tivessem sido feitas somente para os olhos dele, enquanto ela fechava os olhos e escutava a voz de como se fosse só para ela.
e Irene ficavam cada vez mais angustiados de observar os amigos. Não que e estivessem diferentes, mas sabiam que nos momentos em que aqueles dois ficavam em silêncio e passavam a observar algum ponto distante, estavam pensando no outro. E quando fechavam os olhos, abrindo-os em seguida e sorrindo para os amigos como se nada tivesse acontecido, era porque sentiram aquelas saudades que arrancava o ar de seus pulmões.
Folheando um dos livros de antes de entrarem em uma entrevista, tentava pensar em algo que poderia fazer pelo amigo. Olhou para e, como sempre, encontrou-o encarando algum ponto perdido, passando os dedos pela tatuagem que tanto amava.
encontrou, logo atrás do livro, a foto de sorrindo, com uma pequena descrição da sua trajetória como autora. Logo abaixo, porém, encontrou outra mulher: Irene. Franziu as sobrancelhas e leu que ela era a responsável pelas ilustrações nos livros de .
E teve uma ideia formidável.
Pegando o celular, ligou para o empresário do grupo, sem que ninguém percebesse.
- Oi! É rapidinho, vamos entrar em uma entrevista em dois minutos... – comentou, falando o mais baixo possível. – Sabe aquela autora que o gosta, a ? Ela tem uma ilustradora oficial, a Irene. Deve ser mais fácil de achar o contato dela do que o da . Pode procurar para mim, por favor?
A ideia era simples: ligar para Irene e explicar toda aquela loucura. A moça podia não acreditar nele, mas, pelo menos, poderia marcar um encontro de com . E, se tudo aquilo fosse verdade, nunca mais precisaria encobrir as próprias palavras.
Irene estava trabalhando em um projeto de outro cliente quando o celular começou a tocar.
Sentada em sua cadeira do bistrô que sempre ia com , franziu as sobrancelhas ao ver que era um número que não conhecia. Sorriu em seguida, pensando que podia ser um cliente novo.
- Alô?
- Alô? Senhora Irene? – A voz do outro lado da linha era cuidadosa e animada.
- Eu mesma, mas não precisa me chamar de senhora. Você é...?
- Ah, que ótimo! Meu nome é , olá! – Ele respondeu com uma risada muito contente. – Precisava muito conversar com você!
- Ok, estou toda ouvidos. Seu nome me é familiar... – Ela murmurou em resposta, parando de desenhar e prestando mais atenção à ligação. – Eu já trabalhei para você antes?
- Não, nada disso...! Eu sou músico, talvez tenha ouvido falar de mim em alguma entrevista ou algo do gênero... – Foi só responder que a mão de Irene já voou para a própria boca e ela ficou completamente congelada no lugar. Não era possível ser ele. – Você é amiga da , autora de Cristais de Neve, não?
- Sim! Sou ilustradora oficial dela, por quê...? – Irene sentia os dedos formigando, não conseguia acreditar naquela ligação.
- Preciso da sua ajuda! Você conhece o ?
- Não. Não é possível. – A cabeça de Irene girava. Ela já podia ver para onde aquela conversa estava se encaminhando e simplesmente não conseguia acreditar.
- O quê? Por que você está falando desse jeito? – E agora era quem estava alerta. Levantando da poltrona que em que estava sentado, começou a caminhar pelo próprio quarto. – Não vai me dizer que...?
- A ... Vamos dizer que... Bom, ela tem...
- Alguns sentimentos estranhos com ele?!
- SIM!
e Irene finalmente ficaram em silêncio, ambos chocados com o que tinha acabado de acontecer. Não que duvidassem de e , mas lá estava a comprovação. Eles se acharam, mesmo com toda a distância entre ambos, e souberam que eram almas gêmeas. Sofriam todo dia com aquela distância, sentiam alegrias repentinas e esperança, dor e lágrimas, mas sabiam.
Era assustador.
- Eu te procurei exatamente por causa disso. – comentou silenciosamente, sem conseguir conter as lágrimas que escorriam pelo rosto. Estava assustado, mas definitivamente feliz.
- Eles precisam se encontrar. – Irene tinha uma das mãos sobre o coração, contendo a falta de ar. – Eles... Eles... São almas...
- Gêmeas.
Três Semanas Depois
- Me esclarece o porquê a gente vai nessa premiação de novo. – surgiu na sala nem um pouco feliz enquanto Irene arrumava as últimas coisas na bolsa.
- Porque todo mundo quer uma autora maravilhosa que nem você por lá! Você é uma estrela...! – Nisso, Irene se virou para checar se a amiga estava pronta. – Uau.
estava com um vestido azul levemente escuro, salpicado de brilhantes – um perfeito cristal de neve. Era a roupa perfeita para conhecer ,- na opinião de Irene. A moça começou a rir bobamente, deixando a escritora confusa.
- O que houve? Por que você está rindo assim?
- Nada não. – E Irene colocou a bolsa resolutamente sobre o ombro. – Vamos?
Suspirando, a seguiu. Sabia que era famosa, mas uma premiação do mundo da música não era exatamente o tipo de evento para o qual ela era convidada especial. Mesmo assim, lá estava ela, Irene e Takashi a caminho de uma das maiores premiações do ano.
Quando o carro estacionou na porta do evento, os flashes já começaram a disparar. queria fugir naquele exato momento, pedir para o motorista levá-la de volta para casa. Com a mão hesitando para abrir a porta, Irene se aproximou do ouvido da amiga, falando o mais silenciosamente possível.
- Não sei se te avisei antes... Mas o grupo do vai se apresentar hoje.
Os olhos de se arregalaram. Mudando completamente o que tinha em mente, segurou a porta de maneira resoluta e a abriu, saindo do carro enquanto recebia uma chuva de flashes.
Sem se importar com os fotógrafos – mas, ainda assim, sorrindo para as pessoas que gritavam seu nome e acenavam para ela – a moça praticamente correu para dentro do evento.
Sentia algo em seu peito. Uma leve falta de ar que só podia indicar uma coisa.
O momento estava chegando.
literalmente brilhava entre a multidão. A roupa era inteira preta, se não fosse pelo blazer incrustado de pedras que cintilavam em branco e azul. tinha que admitir que o amigo estava de tirar o fôlego, parecendo o mais perfeito cristal de neve.
Apesar de todas as pessoas presentes, algo tirava a calma dele. As mãos estavam suando frio e ele tinha que secá-las nas calças constantemente. estava com o coração acelerado e nem sabia o motivo daquilo – definitivamente não era a primeira vez que se apresentaria em uma premiação importante e não seria a última. Ele não deveria estar mais nervoso do que o normal, então, por que aquele sentimento?
- Tudo bem por aí, ? – deu um pequeno tapa no ombro do amigo, fazendo-o suspirar de maneira audível. – O que foi?
- Ah, nada... – balançou a cabeça, olhando para o chão. – Estou com um sentimento estranho, inquieto... E não é por causa do show...
deu um pequeno sorriso. Sabia exatamente o motivo. Afinal, tinha combinado tudo perfeitamente com Irene em várias ligações.
- Ela está aqui?! Preciso tirar uma foto depois! – Uma cantora, colega deles, passou animadamente enquanto conversava com uma amiga. franziu as sobrancelhas. Normalmente eles não chegavam a se animar daquela maneira com outros artistas, exatamente por já conhecerem praticamente todos. Então, deveria ser alguém que nunca se apresentara lá antes e ele não estava sabendo nada daquilo.
- Quem está aqui? Eu não ouvi falar de nenhuma novidade nos cantores hoje...
- A .
Os olhos de se arregalaram. Repentinamente, ele parecia exasperado. Olhando em todas as direções, procurava a porta do evento. Pela maneira que estavam falando, ela tinha acabado de chegar – e ele tinha que falar com ela. tinha que dizer aquelas palavras para , aquelas que ele aguardou a vida toda para ouvir.
Quando finalmente achou a porta, congelou no lugar.
Assim como congelou na porta ao encontrá-lo pela primeira vez.
O tempo pareceu parar, assim com seus corações. Ambos se esforçaram para não chorar e somente sorrir. Quando a viu sorrindo, não conseguiu ficar sem sorrir de volta, corando como um morango.
- ... – Ele se preparou para correr na direção dela, já murmurando o nome que ansiava ouvir dos lábios dela quando finalmente se conhecessem.
- Ei! ! Não foge! – Mas o empresário deles teve que surgir no mesmo momento. – Está na hora de vocês irem se preparar no backstage!
- Mas... – tentou argumentar, porém foi envolta por várias pessoas que queriam tirar fotos e conversar sobre os livros antes do evento começar.
Assim, teve que se distanciar dela. Mas, enquanto caminhava para o backstage, prometia a si mesmo que seria a última vez que a deixaria para trás daquela maneira.
- , por aqui! – Irene segurava a mão da amiga, enquanto Takashi praticamente servia como um guarda costas. Já estava acostumado com as duas andando à frente e, sinceramente, não se importava. Enquanto Irene estivesse sorrindo, ele não se importava com nada. – Temos poltronas logo na frente!
- Você planejou isso, não? – não conseguia estar mais indignada, apesar de rir como uma louca. Não sabia exatamente o que estava sentindo, mas parecia que ia explodir. – Como?!
- O me ligou! Não faço ideia de como conseguiu meu telefone, mas me ligou! – Irene se sentou em um lugar na terceira fileira próxima ao palco, puxando para também se sentar e explicar tudo enquanto segurava as mãos da amiga. – Ele me falou sobre tudo que passou, os mesmos sentimentos que você e como te encontrou por causa do seu livro, Cristais de Neve. Por coincidência, vocês estão vestidos de maneira muito parecida, como se fossem cristais de neve. Tudo está conspirando a favor de vocês, ... Vocês realmente são almas gêmeas. Ele escreveu a música para que você o encontrasse, como você escreveu o livro para ele te encontrar. É incrível!
- Eu tô vendo como é incrível! Você já está chorando até! – reclamou, mas limpava as lágrimas dos próprios olhos. Não queria borrar a maquiagem.
- É assustador, não me culpe por me emocionar desse jeito! – Irene riu de volta, enquanto Takashi somente as observava com um sorriso no rosto. Gostava da maneira como ambas eram amigas. Uma incentivava somente o melhor da outra.
Nesse momento, as luzes do palco se apagaram e sentiu todos os membros do corpo formigando. Os apresentadores começaram a falar, mas ela não conseguia ouvir coisa alguma. Somente conseguiria voltar a escutar quando a voz de ressoasse pelo local.
Mal sabia ela que já estava para entrar no palco, exasperado ao lado de .
- Você combinou isso com a Irene?! – Ele ainda não conseguia acreditar, enquanto somente ria. – Ela sabe de alguma coisa?
- Não! Agora a Irene deve ter contado para ela como contei para você. Mas não sabia de nada também. – piscou para o amigo. – , ela é a sua alma gêmea, a Irene me contou tudo. Do mesmo jeito que você escreveu a música, ela escreveu Cristais de Neve para que você a encontrasse.
abaixou a cabeça, descansando as mãos na cintura. estranhou, mas aguardou até que ele levantasse a cabeça novamente: e lá estavam as lágrimas escorrendo como os mais brilhantes diamantes pela face de .
- Se eu borrar minha maquiagem antes de entrar no palco, a culpa é sua. – repreendeu, fazendo rir animadamente.
De repente, porém, ouviram o grupo sendo chamado para o palco. Enquanto as pessoas gritavam na plateia, eles caminharam até seus lugares, as luzes ainda apagadas. Muitas pessoas se aglomeraram nos locais mais próximos do palco, para assisti-los de maneira melhor.
se perguntava se estaria lá – mas tinha a impressão de que ela seria o tipo de pessoa a ficar no próprio lugar para assisti-lo melhor, longe da aglomeração.
E estava certo. Enquanto várias poltronas vagaram, ela continuou à própria, em pé, aguardando com expectativa. As luzes do palco se acenderam e a voz de ecoou junto com os primeiros acordes, iniciando a música.
O coração dela quase pulou do próprio peito. Ele brilhava no palco e jamais imaginara que o assistiria daquela maneira. Mantinha as mãos sobre o peito, observando-o com expectativa pelos olhos laminados de lágrimas. Será que ele a encontraria na multidão? Sabia como era difícil enxergar qualquer coisa do palco. Mas gostava de alimentar aquela esperança tola.
, por outro lado, esforçava-se para observar todos os rostos que os assistiam com admiração. Ele tinha que achá-la novamente, nem que fosse para saber onde encontrá-la após o show. O próprio coração estava quase saindo pela boca e logo achava que seria possível ouvi-lo quando partisse os lábios para cantar.
Próximo do fim da música, o grupo de se juntou perto da beirada do palco para cantar junto com a plateia. A iluminação mudou levemente e parecia que nevava por todo o recinto. A música enchia os corações de todos os presentes com esperança e alegria – até mesmo e não puderam deixar de sorrir com a admiração do momento.
Shinji te hoshii mukae ni iku yo
(Eu quero que você acredite, eu irei te encontrar)
Someday, someday
(algum dia, algum dia)
- Eu preciso... – murmurou, ficando em silêncio logo em seguida. Não sabia exatamente se aquela era a melhor atitude a se tomar.
- . Vai até ele. – Takashi finalmente se manifestou, causando surpresa tanto em quanto em Irene. – Não sei se você percebeu, mas ele está te procurando do palco. Vai lá. Você tem que ir.
Respirando fundo e enchendo o peito de coragem, olhou resolutamente para o palco e começou a caminhar, sem dúvidas no próprio coração. Tentou fazer seu caminho por entre as pessoas, mas todos estavam entretidos demais com a música para deixá-la passar. A moça tinha alguma dificuldade para atravessar a multidão – que até começava a se irritar com o fato de que estava tentando chegar mais perto do palco.
- ! – Ela tentou gritar sobre a música, mas, com o retorno no ouvido, era óbvio que ele não conseguiria escutá-la. Esticando a mão direita, não iria desistir. Demorara muito para chegar até aquele momento. – !
não conseguiu ouvi-la, mas algo chamou a sua atenção na multidão – muitos falaram que foi a movimentação, porém ele sempre insistiu e insistiria que foi o próprio Destino que o fez notar o que estava acontecendo.
E lá, encontrou o rosto de olhando-o com grandes olhos brilhantes de expectativa, a mão direita esticada em direção a ele, a tatuagem aparente no pulso – apesar de que ele não conseguia ler as palavras.
Mas nada daquilo importava. Ele já sabia que era ela.
Sem pensar duas vezes, largou o microfone e desceu do palco, ignorando todas as vozes que o chamavam – principalmente os seguranças – enquanto caminhava pelo pequeno espaço em que não havia ninguém.
Esticando a mão esquerda, segurou a mão direita de , ajudando-a a atravessar o resto da multidão e finalmente fazendo-a cambalear para seus braços.
It’s always you, it’s always, crystal snow
(É sempre você, é sempre você, neve cristalizada)
Let me feel your Love, so doko made mo
(Me deixe sentir o seu amor, para sempre)
Segurando-a com firmeza, a envolvia pela cintura enquanto as mãos de descansaram sobre o peito dele – e ambos sorriram, tendo a certeza de que aquele era o momento mais correto e perfeito das suas vidas.
- Eu sou seu Floco de Neve. – finalmente declarou.
Os olhos de se encheram de lágrimas e algo dentro do peito dele explodiu como duzentos fogos de artifício.
- Eu senti sua falta, Floco de Neve. – respondeu com o sorriso mais calmo e belo colorindo os próprios lábios.
teve a mesma sensação de explosão, falhando em conter as lágrimas que começaram a escorrer pelo rosto como pequenos cristais. Rindo com a reação dela, também começou a chorar, já não vendo mais sentido em segurar as próprias emoções. Eles esperaram por aquele momento durante muito tempo.
finalmente conseguiu tirar o bracelete que envolvia o pulso esquerdo, voltando a abraçá-la logo em seguida, enquanto repousava a mão esquerda no rosto de . Sorrindo, ela retribuiu o toque com a mão direita, suas frases complementares finalmente ficando uma de frente para a outra.
Ignorando a multidão e levados pela música que chegava ao fim – a música sobre flocos de neve que compusera para que o encontrasse – os lábios de ambos se tocaram, no primeiro de muitos beijos apaixonados que trocariam durante anos. Sentiram todos os sentimentos do mundo ao mesmo tempo, mas havia um que era o mais forte de todos...
Eles estavam em casa.
Doko made mo baby
(Para sempre baby)
Crystal Snow
Desde pequena, admirava o dia branco, deslumbrada como a neve brilhava ao cobrir o chão da maneira mais pura. Sim, as árvores ficavam secas e tudo parecia estar adormecido, mas os flocos de neve espiralavam pelo vento, dançando que nem no ballet do Quebra Nozes.
As pequenas mãos da garota brincavam entre o céu levemente azulado, tentando agarrar os pequenos flocos enquanto os olhos os acompanhavam com empolgação.
Era em um desses momentos que ela encontrava a tatuagem com a qual nascera e agora crescia junto com a menina. sempre parava e passava os dedos pelas letras belamente adornadas em preto, na parte de dentro do pulso direito.
Eu senti sua falta, Floco de Neve.
Quando era mais nova, mas já grande o suficiente para entender um pouco as letras em seu braço, a menina foi até a biblioteca na qual a mãe trabalhava, incansavelmente restaurando seus belos livros antigos.
Logo que empurrou a grande e pesada porta marrom, os belos e gentis olhos da mãe pousaram sobre ela, sorrindo logo em seguida.
- Queria fazer uma pergunta, mamãe... – A menina perguntou se aproximando vagarosamente, escondendo as palavras no pulso.
- O que foi, meu amor? – A mulher imediatamente pousou o pincel sobre um pequeno copo e estendeu os braços para a filha, convidando-a a um abraço.
sorriu e imediatamente foi para os braços da mãe. Colocando a filha sobre uma das pernas, a menina imediatamente começou a admirar o desenho que a mãe restaurava com destreza – uma gravura em um antigo livro sobre um conto japonês de uma mulher feita de neve.
- Certamente você não veio aqui só para admirar meus livros. – A mãe dela comentou com um sorriso contido na voz, apoiando a cabeça sobre o ombro da filha em seguida.
- Você desenha tão bem, mãe... – E tomava cuidado para não borrar. Recentemente manchara um dos quadros da mãe, sem querer, e não conseguia parar de se culpar quando via o borrão vermelho no meio da água azul esverdeada. – Você precisa continuar me ensinando a desenhar.
- Tudo tem seu tempo, minha pequena. Agora me diga o que foi.
- Ah... Estava olhando meu braço... – Parecia que a menina tinha se lembrado de algo distante. – Essas letras. Já percebi que você tem uma frase no tornozelo e o papai também. O que é isso, mãe?
A mulher a observou durante um tempo, com um sorriso indecifrável nos lábios. Enfim, afastou uma mecha de cabelo do rosto da filha, repousando a mão sobre as letras no pulso de .
- Você sabe o que são almas gêmeas?
A cabeça de pendeu para um lado, as sobrancelhas franzindo. A visão foi tão cômica que a mãe dela não pôde deixar de rir.
- Contam os gregos nas histórias antigas que os seres humanos eram originalmente criaturas com duas cabeças, dois corações, dois corpos unidos em um só. – A mulher começou a contar enquanto desenhava as letras no pulso de com o dedo indicador, o toque gentil e aconchegante. – Um belo dia, esses corpos foram separados em duas pessoas diferentes. Perdidos, eles sempre se sentem incompletos até o dia em que se encontram novamente. Nesse momento, essas pessoas nunca mais querem se deixar, fazendo de tudo para ficar juntas para sempre. Essas são as almas gêmeas.
- Você se sente como um...? – A menina perguntou, acompanhando o desenho que a mãe fazia em seu pulso.
- Exatamente. – A mulher abriu um grande sorriso. – Você vai saber quando encontrar sua alma gêmea. Simplesmente irá vê-la e saberá. Mas todos nós nascemos com essas tatuagens, essas frases em nossos corpos. Cada frase é diferente para cada pessoa... É a primeira frase que você irá ouvir da sua alma gêmea.
- Pra ter certeza de quem ela é? – ergueu uma sobrancelha, achando tudo aquilo muito difícil de entender.
- Sim. Quando seu pai veio falar comigo a primeira vez, quase fiquei sem ar. – E agora os olhos da mãe da menina estavam distantes, como se lembrassem daquele dia nitidamente. – “Com licença, você sabe onde fica a Estação Central”? Uma simples pergunta... Meu coração parou. Eu fiquei observando-o sem reação durante alguns segundos, sem saber o que responder. Eu ia dizer a frase certa? O que era para falar? Mas minhas dúvidas passaram em uma fração de segundo, assim que meus olhos encontraram os dele. De repente, tudo fez sentido. A inquietação no meu coração, a minha solidão, cessou. Eu senti como se o conhecesse durante toda a minha vida. “Virando à direita na loja de flores, você vai ver a Estação Central”. Seu pai também ficou sem reação e eu só conseguia sorrir. Quase não acreditei quando vi nossas tatuagens nos tornozelos. Lá estava minha frase, gravada na pele dele, e, em troca, a dele estava gravada na minha.
ficou observando o pulso após aquela história. Nunca tinha parado para pensar naquilo. Sempre sentira que queria mais alguém ao lado dela, mas nunca tinha sentido saudades de alguém. Não sabia o que era solidão, não sabia o que era aquele tipo de amor. Para a idade dela, aquele conceito era um tanto difícil de entender.
- O que diz no meu pulso? – A menina finalmente perguntou, olhando nos olhos da mãe. – Não consigo entender todas as letras ainda.
- Eu senti sua falta, Floco de Neve. – A mãe dela leu com um sorriso carinhoso nos lábios.
Para , enquanto brincava na brancura translúcida da sua época favorita do ano, aquela frase não fazia o menor sentido. Como seria possível alguém dizer aquilo para ela logo ao conhecê-la pela primeira vez? Além disso, por qual motivo alguém a chamaria de “floco de neve”? Ela tinha um nome. Ser chamada de um apelido carinhoso por alguém que ela nunca vira antes não tinha o menor sentido.
Quando era pequena, aquele tipo de pensamento acabava se dissipando sempre que algo chamava a atenção da garota. Ela tinha outras coisas para pensar... Apesar de que, sempre que começava a se sentir sozinha, era só olhar a frase em seu pulso para se sentir um pouco melhor.
gostava quando a neve caía durante a madrugada e ele acordava com a visão de um carpete brilhante do lado de fora da janela de seu quarto. Ficava observando com empolgação enquanto mal podia aguardar o momento que seus pais dessem permissão para que ele brincasse em meio aos flocos de neve.
Era nesses momentos, observando pela janela em toda a sua expectativa, que ele acabava inconscientemente passando os dedos pelas palavras belamente escritas em seu pulso esquerdo.
A primeira vez que vira aquelas letras, achava que somente era um belo desenho que simplesmente nascera com ele. Somente depois de muito tempo, quando finalmente começou a aprender o que significava cada um daqueles desenhos juntos, é que teve alguma noção do que era aquilo.
Lembrava-se claramente de quando seu pai o encontrou virando o próprio braço para cima e para baixo em uma noite gélida e silenciosa. Lá estava o menino, aproximando e distanciando as letras negras dos olhos, mudando o ângulo quinhentas vezes e lendo para si mesmo, letra por letra, até formar uma palavra que não fazia o menor sentido.
O pai dele cruzou os braços e ficou observando com um riso contido até o menino finalmente notar a presença dele.
- Pai! – sorriu e estendeu o pulso até ele. – O que é isso? Eu não consigo ler!
- , ... – O homem suspirou, finalmente rindo o tanto que queria. Aproximou-se do filho e bagunçou o cabelo dele, sentando-se no chão ao lado da criança.
- Queria saber ler melhor... – O menino respondeu com uma expressão brava, porém manhosa ao mesmo tempo. O pai dele riu, segurando a mão do filho entre os dedos e observando as palavras em negro.
- Um dia você vai saber, as coisas acontecem na hora que têm que acontecer. – Ele comentou com um sorriso gentil. – Lembra quando te contei sobre as almas gêmeas?
- Ah, as pessoas que eram uma e foram separadas? Que ficam eternamente se procurando até se encontrar? – perguntou com simplicidade. Ainda não tinha idade suficiente para entender algo como aquilo. Sabia o que era amor e amava seus pais. Pensava em quando seria grande, casado com uma mulher que amasse, e teria seus próprios filhos que também o amariam. Mas não podia dizer com propriedade que entendia sobre o amor que teria com sua futura esposa.
- Exatamente, . Toda pessoa tem uma alma gêmea que está destinada a encontrar. – O pai do menino respondeu de maneira simples. Em seguida, apontou para o pulso de . – Essas palavras são as primeiras coisas que você vai ouvir da sua alma gêmea. Você não terá dúvida alguma de que é ela quando a encontrar.
- Primeiras palavras...? – E, novamente, franziu as sobrancelhas, tentando ler o que estava escrito em seu pulso, mas era em vão. O menino olhou confuso para o pai em seguida. – Mas eu sei quando vou encontrá-la?
- Não. – O homem respondeu com um sorriso, deixando embasbacado. – Pode ser a qualquer momento. Quando você menos esperar.
- Mas... – Aquilo não fazia o menor sentido e o menino não sabia se era para se sentir aliviado de que um dia ia encontrar sua alma gêmea ou se revoltava, pois aquilo era completamente incerto. – Como ela vai saber o que dizer...?
- Não se preocupe, ! – O pai deu uma boa risada com a confusão do filho. – Ela vai dizer e é assim que você vai saber. Vem cá... Lembra disso?
Dizendo isso, o homem puxou a gola da blusa para a lateral, revelando uma tatuagem que conhecia muito bem. Ficava na clavícula do homem e a mãe do menino tinha uma igual, porém de tamanho diferente. Ao ver as palavras negras contra a pele do pai, somente confirmou com a cabeça.
- Desde que me dou por gente tenho essas palavras em mim. “Ei, você derrubou a sua flor!”, foram as primeiras palavras que ouvi saindo dos lábios da sua mãe. Éramos pequenos e eu estava pegando flores para dar para a sua avó. Ela correu atrás de mim, a flor lilás entre os dedos. Quando a vi sorrindo, senti algo diferente do que sentia quando falava com outras pessoas... – E ele suspirou, rindo de si mesmo. – Era como se falar com ela fosse o suficiente. Foi algo tão estranho, tão diferente, que só consegui responder “Qual é o seu nome, menina bonita”? Sua mãe ficou vermelha como um pimentão, rindo logo em seguida. E eu não queria que ela parasse de sorrir daquele jeito, nunca mais. Tudo que ela falava parecia música e tudo que eu queria era estar ao lado dela.
- Você... Então... Soube que ela era...? – lutava consigo mesmo, tentando achar as palavras corretas para fazer uma pergunta que nem mesmo ele compreendia totalmente.
- Não. Eu não tinha ideia de que a sua mãe era minha alma gêmea. – O homem deu um sorriso distante, como se estivesse trazendo à tona diversas memórias. – Somente depois que crescemos é que realmente entendemos o que tinha acontecido e o que significávamos um para o outro.
- Eu posso conhecer minha alma gêmea amanhã então? – O menino estava começando a tentar entender aquilo tudo, mas tinha que admitir que não fazia muito sentido.
- Sim. Mas pode ser que você a conheça somente quando tiver cinquenta anos, que nem aconteceu com a sua tia. – Ele respondeu simplesmente e teve que rir da cara de indignação que fez em seguida.
- Eu não quero esperar tanto assim. – O menino não se conformava com aquilo, encarando as palavras no braço.
- Paciência, meu filho. É o que eu disse: as coisas acontecem na hora que tem que acontecer. – O homem sorriu, levantando-se e caminhando até a janela, a fim de observar a neve brincando entre o vento. – Você não quer ir lá fora brincar?
Com isso, todas as preocupações de se aquietaram e o menino esqueceu aquela história de almas gêmeas e tatuagens de frases. Normalmente, quando observava sua tatuagem, ele não sentia as saudades que todos diziam que sentiam de seus complementares. Sempre tratara aquilo como se não fosse nada de mais e tinha que admitir a si mesmo que não entendia muito bem.
Porém, naquele dia especificamente, enquanto aguardava observando pela janela, ele sentiu algo diferente. Uma pontada no peito que tirou seu ar durante um breve segundo. podia falar com toda a propriedade do mundo – durante aquele segundo específico – que um dia conheceria sua alma gêmea. Aquilo o fez sorrir e voltar a observar os flocos de neve; um sentimento quente e aconchegante tomando conta de seu coração.
Uma das atividades preferidas de era tocar piano. Ela simplesmente podia passar horas brincando com as teclas pretas e brancas, ao lado da enorme janela que dava para o jardim da casa.
Várias circunstâncias fizeram com que a garota se fechasse em si mesma. Já no Colegial, ela mesma se apelidara de “ostra” ou tinha mania de dizer que era que nem uma cebola: era preciso descascá-la aos poucos para se chegar ao centro. Foi a maneira que ela encontrou de se resguardar e impedir que a machucassem mais do que já tinham feito. Sendo assim, não era fácil para que expressasse seus sentimentos: eles estavam muito bem guardados em uma caixinha que mantinha no fundo de um lago congelado.
Por isso que qualquer momento com um piano era mágico. O coração dela estava lá, era possível ouvi-lo através da música. finalmente podia dar vazão aos seus sentimentos e, naquele dia, enquanto observava a neve começando a se formar como um cristal sobre a grama verde azulada, a melodia soava como saudades.
Foi nessa época que ela começou a entender... Aquele sentimento estranho de saudades. ficava indignada consigo mesma: como podia sentir falta de alguém que nem tinha conhecido?!
Mas, ao fechar os olhos enquanto seus dedos escorregavam pelas teclas com destreza, ela imaginava como seria o toque dele em seu rosto – a mão quente aquecendo sua face gélida. Os braços dele certamente seriam aconchegantes, com o melhor tipo de abraço. A voz melodiosa, cantarolando a música que tocava, no pé do ouvido da garota.
O coração dela repentinamente sentiu um aperto, os pulmões faltaram ar e uma lágrima, sozinha como um cristal, caiu sobre as teclas do piano. imediatamente parou de tocar, levando uma das mãos ao coração.
Será que ele também sentia falta dela...?
Música acalmava . Ele não era das melhores pessoas com palavras, desde pequeno. Agora que estava no último ano do Colégio, aquela premissa continuava igual – se não pior.
Todos os dias, amarrava uma bandana no pulso esquerdo, de modo a esconder as palavras marcadas em negro. Não queria que ninguém as visse, não queria que ninguém as lesse.
Somente ela poderia saber. Mais ninguém.
Conforme ele crescera, foi se tornando cada vez mais bonito, chamando atenção das garotas. Agora, estava prestes a se tornar um músico – algo que o faria famoso, tornando-o cada vez mais importante.
A primeira vez que ele ouvira as palavras marcadas em seu pulso, estacou e ficou olhando para a garota em questão, embasbacado. Tudo que conseguiu fazer foi perguntar “É você?!” e segurar as mãos dela, procurando pelas palavras no pulso. Mas logo encontrou outras palavras tatuadas no antebraço, sentindo o coração afundar no peito.
O desapontamento foi tão grande que saiu correndo para se trancar, completamente sozinho, no banheiro mais distante a fim de chorar em paz. Sentado no chão, ele tentava raspar as palavras em seu pulso – mas tudo que conseguiu foi deixar a pele vermelha e arrancar sangue. Acabou na enfermaria e foi a primeira vez que teve aquelas palavras que gostava tanto escondidas embaixo de uma faixa.
Depois desse dia, chegou a ouvir sua frase mais três vezes, por três garotas diferentes. E nunca sentira nada de especial, por nenhuma delas. Ele sabia que tinha que se sentir diferente e reconhecer o amor. Mas nunca sentira nada e sempre achara outras palavras, diferentes das que ele dizia, tatuadas pelos corpos delas.
E foi aí que ele teve a brilhante ideia de esconder sua frase do mundo.
Usando a bandana amarrada no pulso, nunca mais ouviu aquelas palavras sendo ditas em vão. Decidira que sempre iria usar aquilo, até o dia em que a encontrasse. Sua alma gêmea saberia o que dizer, independente de ver as palavras ou não.
Sendo assim, sempre que voltava para casa, escutava música e cantava livremente para se acalmar. Enquanto deixava as palavras caírem de seus lábios em notas perfeitas, o garoto olhou para seu pulso encoberto pelo pedaço de pano.
Repentinamente, foi acometido de uma pontada de saudades quase insuportável. Teve que desamarrar a bandana o mais rápido possível e jogá-la longe, só para ler suas palavras e ter certeza de que elas ainda estavam lá.
Sentiu os olhos se enchendo de lágrimas. Quando os fechou para se controlar, uma lágrima escorreu, quente, por sua face. só conseguia imaginar como seria sentir a mão macia dela, com seu toque sedoso, limpando a lágrima – como se tivesse o poder de consertar tudo que estava errado. Praticamente conseguia ouvir a voz melodiosa dela dizendo que tudo ficaria bem, pois estava ali com ele. E os braços envolvendo-o em um abraço carinhoso.
Observando os flocos caindo fortemente na nevasca do lado de fora, tudo que conseguia se questionar era se ela também estava com saudades dele.
10 anos depois
- Mas que cara é essa?
- Desespero, Ne. Essa é a cara do desespero.
se encontrava sentada à mesa da sala, encarando o horizonte com o rosto apoiado nas mãos. Irene tinha acabado de chegar à casa da amiga, já entrando por conta da cópia das chaves que tinha. Tornaram-se amigas no colégio e, apesar do tempo e de eventuais distâncias, sempre permaneceram em contato.
Irene encontrou pela primeira vez em uma aula de artes. A professora falara para Irene ajudar a colega, pois era um caso perdido. Sendo uma ótima artista, Irene não negou ajuda e prometeu fazer o seu melhor para que pelo menos tivesse uma noção básica de desenho.
Para isso, marcou aulas após o horário do colégio para que pudesse orientá-la melhor. Da primeira vez, colocou alguns objetos em frente à e pediu para que a garota desenhasse de observação, para entender o quanto teria que ajudá-la. Deixou-a desenhando sozinha durante uns bons vinte minutos, fazendo seu próprio desenho em um sketchbook e conhecendo-a melhor enquanto conversavam.
E Irene não pôde ficar mais chocada quando encontrou um desenho extremamente realista e decididamente bom para uma pessoa que nunca tinha feito aulas na vida.
A partir desse dia, sair para desenhar se tornou uma das atividades preferidas delas – a outra era passar o dia na casa da outra tocando piano e conversando sobre artes em geral. Com o passar do tempo, começou a escrever, enquanto Irene se especializava cada vez mais em ilustração.
Agora lá estavam elas: Irene como uma ilustradora de sucesso, emprestando seus dons para os projetos da amiga, e como uma escritora anônima de diversos livros famosos, em constante crise existencial.
- Bloqueio criativo de novo...? – Irene suspirou enquanto tirava o cachecol, completamente à vontade na casa de e já a tratando como sua.
- Eu questiono seriamente o dia em que achei que poderia ser escritora profissional. – comentou séria enquanto apoiava os braços na mesa e olhava com indignação para amiga. – É sério, Ne. O que eu tinha na cabeça?
- Provavelmente o mesmo que eu tinha quando decidi que ia ser a sua ilustradora oficial. – Irene respondeu com um rápido sorriso, encaminhando-se para a cozinha. – A minha sorte é que seus livros dão dinheiro!
- A minha também! – deu uma breve risada sem humor. – Mas agora meus editores querem mais um livro e eu não sei nem por onde começar! Tive ideia de uns cinco enredos nessa semana, mas nenhum bom o suficiente para dar andamento.
- Eu acho que você precisa sair. – Irene deu de ombros, voltando para a sala com um pêssego em mãos. – De verdade. Podemos visitar um museu e desenhar. Observamos as pessoas e você cria personagens de acordo com a aparência de cada uma delas. O que você acha?
deu um pequeno sorriso enquanto suspirava, observando a amiga durante alguns segundos.
- Tem certeza que você não é minha alma gêmea, Irene? – E foi só perguntar que Irene imediatamente explodiu em risadas, fazendo-a rir em seguida.
- Claro que tenho, sua ridícula! Vamos, levanta essa bunda dessa cadeira e vamos fazer alguma coisa mais útil!
- Até hoje você nunca viu a tatuagem do Takashi, não? – perguntou enquanto jogava o casaco nos ombros. Irene enrolava novamente o cachecol no pescoço.
- Ah, credo, pelo amor de Deus. Não. – A moça respondeu categoricamente enquanto caminhavam para o mundo do lado de fora da casa de . – Nem ele viu a minha. Estamos lidando bem escondendo um do outro.
- Imagino vocês dois usando meias o dia todo em todas as situações para não enxergarem acidentalmente. – A amiga deu uma breve risada, sentindo a brisa morna da tarde batendo no próprio rosto ao atravessarem a porta de entrada. – Como vocês tomam banho?
- Por sorte, nós dois somos míopes. É só não usarmos óculos. – Irene piscou para , fazendo-a rir.
- Você nunca teve curiosidade? Quer dizer, as de vocês são nos pés, há uma possibilidade alta de que realmente sejam almas gêmeas.
- Então, mas que diferença isso faz? – Irene deu de ombros enquanto caminhavam calmamente no dourado do sol. – Se ele for, ótimo! Mas e se ele não for? Vou me separar do Takashi só porque ele não é minha alma gêmea? E se eu conhecer a minha alma gêmea e não quiser me separar do Takashi? Quero poder escolher meu próprio caminho também... Esse negócio das tatuagens é horrível.
- Eu não acho... De qualquer jeito, temos livre arbítrio. Tanto é que existem as pessoas que escolhem ficar com outras mesmo sabendo que elas não são suas almas gêmeas. – enfiou as mãos nos bolsos do casaco, pisando em folhas secas no meio do caminho somente para ouvir o som que faziam. – Ninguém é forçado a nada.
- É, eu sei... – E foi a vez de Irene suspirar, fazendo a amiga rir brevemente com aquela reação.
- Além disso, você não se lembra do que ele te disse a primeira vez que se conheceram?
- Sinceramente, não. Faz muito tempo e não foi nada muito especial... – Irene murmurou. – E antes que você pergunte, eu cubro as minhas palavras há tanto tempo que não me lembro exatamente o que dizem, então também não percebi na hora.
- Você é um ser excepcional, Ne! – ria animadamente com aquela conversa. – Já pensei em cobrir as minhas palavras por conta das pessoas bestas que já me disseram só pra me iludir... Mas elas são uma parte de mim. Com certeza iria me sentir desconfortável sem elas.
- Eu sei, ... Você tem uma sensibilidade muito grande com as suas palavras... – E Irene parecia um tanto cabisbaixa. Erguendo uma sobrancelha, achou aquele comportamento muito estranho.
- O que foi, Ne?
- , não me leve a mal... – Irene suspirou de maneira pesada, os ombros um pouco tensos. – Eu te vejo tendo reações por conta da sua alma gêmea desde que estávamos no colégio. Você é conectada a ele de uma maneira que eu nunca vi antes e realmente sente falta da presença dele... Sinceramente, eu sempre tive medo de sentir a mesma coisa. Definitivamente não estou preparada para sentir isso ou amar alguém dessa maneira. É como se você estivesse separada de uma parte sua e só fosse se sentir completa novamente com ele. Para mim, isso é absurdamente assustador... Não que você não seja suficiente em si mesma! Muito pelo contrário, sempre foi mais independente do que qualquer pessoa que conheci. Mas o seu amor, e tenho certeza que o amor dele também, vai ser algo que vai atravessar o Tempo e qualquer outra circunstância do mundo. Isso pra mim é assustador.
Ambas ficaram em silêncio durante algum tempo, somente ouvindo as folhas se quebrando embaixo dos pés de . Suspirando, a moça resolveu responder.
- É assustador para mim também... – E tinha um pequeno sorriso no rosto. – Eu nem sei quem ele é, de onde é e se realmente existe. Posso ter imaginado uma pessoa de um jeito e vir alguém completamente de outro. E, sinceramente, nem sei como vou reagir quando conhecê-lo. Provavelmente vou rir, chorar, explodir e surtar, tudo ao mesmo tempo. Às vezes, ele também não estará pronto. Para mim, não sinto problema em saber que encontrei a pessoa que me completa e faz esse vácuo sumir de dentro de mim. Mas saber que estamos conectados através da Eternidade... É um pouquinho assustador mesmo. O que você faz quando encontra o seu “Para Sempre”...?
Novamente, o silêncio caiu entre as amigas, assim como as folhas que se desprendiam das árvores com o vento. Com um sorriso compreensivo, Irene contemplou a beleza do que tinha acabado de falar.
- Acho que você encontrou o assunto do seu próximo livro.
a observou com as sobrancelhas franzidas durante alguns segundos e, em seguida, sua expressão se iluminou como se a moça tivesse acabado de descobrir a Austrália.
Quem sabe ele a encontraria se ela escrevesse sobre almas gêmeas?
- Você nunca vai tirar esses braceletes? – perguntou com um suspiro enquanto trocava um bracelete prateado por um dourado antes de subirem no palco. Uma moça seguia o amigo, ficando na ponta dos pés para tentar arrumar os cabelos dele, enquanto encontrava-se comportadamente sentado para que terminassem a sua maquiagem.
- Não. – respondeu categoricamente, ajeitando o grosso metal dourado para que nenhuma das palavras aparecesse. Enquanto isso, observava-se no espelho, a fim de ter certeza que o lápis não havia borrado. – Você devia se dar por feliz que trocaram meus tecidos por braceletes. Agora não tenho mais como limpar o suor da minha testa e jogar o pano molhado em você no fim dos shows!
somente rolou os olhos enquanto ria alegremente.
- É. O mais lindo era você andando por aí cobrindo o pulso como uma besta. – O amigo devolveu em palavras ácidas. – Sabe, você não vai poder fugir disso pra sempre.
- Não estou fugindo. Só não quero qualquer uma brincando com as minhas palavras. Isso aqui é coisa séria. – ficou imediatamente soturno, finalmente sendo abandonado pela moça do cabelo. – Você não sabe o que isso faz comigo.
- Desculpa, . Eu sei... – falava de coração. Estava somente brincando antes, porém se esquecera de como o assunto era importante para . – Eu sei que você é mais sensível com a sua alma gêmea... Aliás, é a primeira pessoa que vejo com uma conexão tão forte.
- Pois é, eu também... – suspirou, apoiando-se na bancada de maquiagem enquanto cruzava os braços. Tinha o olhar perdido no bracelete de ouro enquanto conversava. – É muito estranho... Mas sinto que é algo para sempre. Que ela vai encaixar perfeitamente na parte de mim que está faltando. Que o Tempo vai ser supérfluo. Só espero que ela exista de verdade, né.
- ! Se você tem as palavras no braço é porque ela existe e vocês vão se conhecer! É só uma questão de tempo! – teve que se conter para não cair na gargalhada e não borrar a maquiagem. – Você sabe que existem pessoas que nascem sem as palavras, porque não têm almas gêmeas. Se a sua tatuagem está aí, irá acontecer, quer você queira ou não. Quer você espere ou não.
- Eu vou aguardar. O tempo que precisar, não importa o quanto seja. – respondeu imediatamente, quase como uma reação automática às palavras do amigo. – Não quero ficar com mais ninguém além dela, não faria sentido. Não seria amor eu não me sentiria confortável. Saberia que há alguma coisa errada e não conseguiria aguentar nem um dia com outra pessoa que não fosse ela.
somente o observava com um pequeno sorriso no rosto, enquanto algumas pessoas no recinto somente suspiravam com as palavras de . Achavam aquela atitude a coisa mais romântica do mundo e, se pudessem ver o que ele tinha tatuado no braço, certamente tentariam dizer a ele para tentar passar a eternidade com .
- Você é fascinante. – concluiu, cruzando as pernas. – Você não tem medo da Eternidade?
- Claro que tenho, é algo bem assustador... – suspirou, porém deu um pequeno sorriso em seguida. – Mas se fosse perfeito, não seria amor.
- Muita gente fala o contrário. Que se for perfeito, é amor. – E claro, já estava provocando o amigo. Queria ver até onde chegaria naquela história e, sinceramente, estava curioso em entender a conexão do amigo com a própria alma gêmea.
- E eu estou convencido de que essas pessoas estão erradas. O amor não é perfeito, faz a gente rir e chorar. Mas é algo necessário para entendermos o que é se descobrir no outro. – cruzou os braços, suspirando e olhando para o teto. – Que um vai viver para sempre dentro do outro e o Tempo virará só uma circunstância, não uma limitação. É isso que faz a Eternidade suportável, porque ao invés de mergulhado em si mesmo no próprio narcisismo, você está imerso, completamente envolto por aquele que se encontra na mesma situação que você e em você... Quase como um antagonismo que se completa. Então sim, tenho medo, mas também tenho curiosidade... E saudades.
- Ah, eu sei como você tem saudades... – suspirou, apoiando o rosto na mão enquanto contemplava . Não sabia o que fazer com ele. – Quantas vezes já te encontrei chorando de saudades de uma pessoa que você nem conhece?
- Ah, sim... – riu de maneira um tanto envergonhada, abaixando a cabeça. Aquele tipo de reação não era incomum e ele a tinha desde que se conhecia por gente. – Perdi a conta de quantas lágrimas já derramei... Fico pensando se choro nesses momentos, pois ela está se sentindo triste. Sabe? Às vezes estou muito feliz e, repentinamente, sinto uma tristeza repentina apertar meu coração. É muito mais forte do que eu e começo a chorar, só desejando que alguém me abraçasse... Fico pensando se é porque ela está se sentindo assim e, mesmo distante, consigo sentir a mesma coisa.
- Eu não duvido. A conexão entre vocês dois é bizarramente forte. – suspirou, permanecendo em silêncio durante alguns segundos enquanto os olhos de se perdiam no horizonte, fechando-se em seguida. – Por que você não escreve uma música?
- Hã?
- Você fala coisas muito bonitas quando o assunto é a sua alma gêmea. – sorriu, finalmente se levantando da cadeira, pronto para o show. – Com certeza ela deve te escutar. Só precisa ouvir o seu chamado. E se você escrever uma música? Às vezes quando ela ouvir, vai ter certeza que é você e vai te encontrar.
Ouvindo o pessoal da produção chamando-os para iniciar o show, controlou as lágrimas que insistiram em surgir nos olhos. Antes de entrar no palco, fechou-os e respirou fundo, sentindo algo estranho no coração. Naquela noite, cantaria para ela e somente ela, esperando que sua voz a alcançasse e desse um pouco de conforto de que um dia eles iriam se encontrar. escreveria a música e faria de tudo para que ressoasse nos quatro cantos do mundo – assim, ela tinha que ouvir seu chamado.
Algo de estranho aconteceu naquela noite. acordou com o nome da banda de na cabeça, sendo que nunca tinha escutado uma música sequer, nem ouvira falar deles em nenhum lugar. Era como se tivesse sonhado com eles, como se aquele nome tivesse sido sussurrado em seu ouvido em alguma melodia distante que a alcançou durante a noite.
A moça passou o dia todo em seus afazeres normais, mas cada vez tinha a vontade mais urgente de saber quem eles eram. Durante o almoço, sentou-se na cadeira de um de seus bistrôs favoritos, pediu um almoço leve e digitou o nome da banda no Youtube, abrindo o primeiro vídeo que lhe chamou atenção.
foi arrebatada repentinamente pela música. Em menos de um minuto, sabia que já podia se considerar mais do que fã daquele grupo. Tudo lhe chamava atenção: as cores, a filmografia, a musicalidade, a letra e, é claro, os músicos.
Não conseguia escolher um que lhe chamasse mais atenção – afinal, sempre procurou evitar julgar um livro pela capa. Recebendo o prato, a moça continuou na sua busca enquanto comia. Normalmente evitava comer enquanto mexia no celular, mas algo naquele grupo era extremamente magnético. Ela precisava saber quem eles eram.
“: com certeza, um ser que veio de outro planeta”.
imediatamente riu daquelas palavras. Perdera a conta de quantas vezes ouvira aquilo – de que era muito diferente, por vezes esquisita, completamente fora do convencional e imprevisível.
- É, eu acho que gosto bastante de você, ... – Ela comentou consigo mesma, em uma breve risada.
“Ele nunca cantou de maneira tão bela quanto no show da noite passada: [link]”.
Interessada, clicou no link e colocou os fones de ouvido para entender o motivo da beleza daquela performance.
Quando ouviu as primeiras notas cantadas por , foi arrebatada por um sentimento forte como uma avalanche. Fechando os olhos, a única coisa que conseguia fazer era ouvi-lo – como se estivesse falando diretamente com ela.
- Eu já te escutei antes... – sussurrou de maneira automática, abrindo os olhos em surpresa com as próprias palavras.
Imediatamente, pôs-se a procurar a letra da música que ele cantava.
Nós estamos conectados pelo Destino, então não se preocupe, meu amor. Vou encontrá-la e curar a dor que existe no seu coração.
Levando uma das mãos à boca, ficou observando a tela do celular, em choque. As lágrimas caíam enquanto ela somente conseguia permanecer congelada.
- Quem é você?!
Foram as únicas palavras que ela conseguiu falar em meio ao próprio caos de emoções.
Quatro Meses Depois
- Não é possível. – Irene não conseguia acreditar nas palavras da amiga.
- É possível. Ele existe. – insistiu, o sorriso se espalhando pelo rosto.
- . Ninguém encontra a própria alma gêmea desse jeito. – Irene passou a mão pela testa, achando que a amiga já tinha ficado maluca.
- Né, eu nunca vi alguém tão coordenado comigo. De verdade. – deu de ombros, continuando a preparar o chá no fogão enquanto Irene a observava do sofá.
Enquanto isso, Takashi estava jogado em outro sofá, praticamente babando no estofado. Tinha plena consciência de que o faria limpar quando acordasse, mas estava tão cansado que não se importava.
- Coelhos na lua, “se você pular, eu pulo”, a vontade de se aposentar em uma fazenda, de ter vinte mil filhos e ficar velhinho ao lado de alguém, as reações... – E suspirou, sem saber mais como explicar. – Se você sentasse para conversar com ele, provavelmente descobriria mais umas vinte coisas que temos em comum ou que são complementares entre si. Ele é calmo como a água, enquanto eu sou feita de neve... Ele é a calmaria que eu preciso dentro de mim.
- E ele é um cantor de um grupo famoso. – Irene claramente julgava a amiga, observando-a por cima do próprio sketch book. – , pensa comigo: quantas mulheres nesse mundo devem achar exatamente o que você acha?
- A frase da alma gêmea dele está no pulso esquerdo, que ele cobre todos os dias para que ninguém veja o que está escrito e não tente enganá-lo. – Dizendo isso, enquanto caminhava com o bule de chá para a cozinha, levantou o pulso direito. – Onde está a minha frase?
- Ok. Essa é uma boa coincidência. – Irene teve que admitir, mas não estava pronta para dar o braço a torcer. – Mas muitas outras mulheres que gostam dele devem ter frases no pulso direito, você não é a única que conheci com a frase aí. O que te faz tão diferente, ? Às vezes, você está se iludindo à toa.
- É difícil de explicar, Ne... Eu sei que é ele. – suspirou, esfregando a testa. Em seguida, começou a servir o chá. – Bom, não foi por isso que você veio aqui. Quer chá?
- Você também não me chamou só pra tomar chá! – Irene riu, indo até a mesa para pegar sua caneca de chá. Não tinha coisa que sabia preparar melhor do que aquela bebida.
- Não, não... – comentou rindo brevemente. Irene voltou para o sofá no qual se encontrava anteriormente, voltando a se ajeitar com seu sketchbook. – Pensei na conversa que tivemos outro dia e tive uma ideia nova. Preciso que você já vá pensando em ilustrações, Ne.
- Ideia nova? Adoro suas ideias novas e processos criativos! – Irene pegou o pote de morangos que estendia a ela, trazidos em algum momento da cozinha para acompanhar o chá da tarde, sentando-se ao lado da amiga. – Qual foi dessa vez? É a história das almas gêmeas, não? Que você vai escrever para ele...?
- Sim, essa mesma... Basicamente: pessoas são flocos de neve. – E se virou com um sorriso imenso para a amiga, segurando um morango perfeitamente vermelho entre os dedos.
- Ok... Você me perdeu nessa... – A amiga respondeu com uma breve risada, fazendo-a rir também. – Como assim “pessoas são flocos de neve”? Como você vai desenvolver um livro a partir desse conceito? E como eu vou criar ilustrações a partir disso, mulher?
- Vamos lá... A ideia era falar sobre almas gêmeas, não? Com tudo que eu sinto pela minha, certo? – perguntou e Irene concordou com a cabeça, atenta em cada palavra e ansiosa em desvendar a maneira como a mente de funcionava. – A premissa é que todos nós temos almas gêmeas, pessoas que são únicas para nós...
estava prestes a começar uma explicação complexa se não fosse a voz de ecoando da televisão – ligada em qualquer canal para que Irene tivesse o que desenhar enquanto conversavam anteriormente. Ambas imediatamente viraram para o aparelho enquanto Takashi somente resmungou no sofá e se virou para o outro lado.
- Ah, eles vão dar uma entrevista hoje, né? – perguntou despreocupadamente e Irene somente confirmou com a cabeça, aumentando o volume da TV. – Ok. Te explico o conceito depois.
- Se o é sua alma gêmea, como você não sabia que ele daria uma entrevista hoje? – Irene ergueu uma sobrancelha enquanto perguntava.
- O fato de ele ser o amor da minha vida não faz com que eu seja obrigada a persegui-lo. – tinha uma expressão óbvia e incomodada no rosto, fazendo Irene segurar o riso. – Tenho outras coisas mais importantes para lidar do que viver em função dele.
Rindo em conjunto, as amigas ficaram em silêncio para assistir a entrevista na televisão. Tudo correu normalmente: não falava muito, mas, quando resolvia comentar algo, sempre tinha um sorriso no rosto – e, quando se empolgava, sempre fazia com que todos começassem a rir, até as moças que o assistiam. Os assuntos giraram em torno dos shows, MVs e músicas novas.
Mas, em um momento, por algum motivo que elas não prestaram muita atenção, o grupo começou a falar de neve durante a entrevista.
- Ele tem a teoria de que pessoas são como flocos de neve. – disse incrédulo, apontando para , fazendo todos no programa rirem imediatamente.
- O quê?! Como assim?! – O apresentador não conseguia parar de dar risada daquela loucura, enquanto somente ria de maneira envergonhada e sentia as bochechas corando levemente. - Você sabe que ninguém é feito de água, né?
- Bom, boa parte do corpo é feita de água... – jogou a possibilidade no ar e todos ficaram mudos, completamente em choque. Ele imediatamente começou a rir. – Não! Estou brincando! Eu sei que ninguém é de neve! Isso é só um conto japonês!
- Então de onde vem a teoria dos flocos de neve?! – O apresentador perguntou ainda rindo, aliviado de que o cantor estava somente brincando.
- Bom... Flocos de neve são únicos, não? Cada um tem um desenho diferente, próprio... – começou a explicar, dando um sorriso completamente perdido em sua própria explicação logo em seguida. Como se somente ele conseguisse ver a beleza nas próprias palavras. – Pessoas também são únicas. Cada um de nós tem a sua própria pessoa, sua alma gêmea, então... Pessoas são como flocos de neve. Não existem dois iguais, mas existem aqueles que se completam. Que foram feitos exatamente um para o outro.
O apresentador trocou olhares admirados com os outros integrantes da banda.
- Não é que faz sentido? – O homem perguntou com uma sobrancelha erguida. – Agora me diz... O quanto você bebeu no dia em que pensou em tudo isso?
imediatamente explodiu em risadas, junto com todo mundo. Mas, sem que ninguém percebesse, também passou os dedos sobre a bandana em seu pulso esquerdo. Não achava sua explicação boba ou absurda... E não via a hora de encontrar alguém que veria a beleza nos seus pensamentos e palavras - e não rir, como todo mundo sempre fazia.
Irene somente olhou para a amiga, completamente embasbacada.
- Você sabia disso...?
- Não... – respondeu da mesma maneira que ela, olhando para a amiga em choque. – Ele nunca tinha falado sobre isso em entrevista alguma. Pelo menos não nas que eu assisti.
Ambas continuaram em seu silêncio pasmo enquanto eles somente riam na televisão.
- Ok, . Agora eu estou convencida de que ele é a sua alma gêmea. – Irene se levantou do sofá, cruzando os braços e começando a andar de um lado para o outro. – Isso é loucura! Tentei explicar de todas as maneiras que o jeito de vocês é só uma coincidência louca, mas depois dessa... Mano, eu senti todos os pelos do meu braço levantando, me deu uma coisa... Sei lá! Parecia que vocês estavam se comunicando mesmo à distância e sem se conhecer, isso é muito louco, !
- Bem vinda ao meu mundo nos últimos meses. – respondeu com um sorriso satisfeito no rosto, controlando-se para não rir da indignação da amiga. Já tinha passado daquela fase.
- Então você sabe o que isso indica? – Irene olhou de maneira séria e decidida para enquanto a moça somente negava com a cabeça. - Indica que vocês precisam se conhecer.
- E isso vai ser muito fácil! – deu uma risada de escárnio, rolando os olhos. – Você mesma disse: quantas mulheres nesse mundo devem acreditar na mesma coisa? Além disso, ele é um cantor famoso enquanto eu sou só...
- Uma escritora famosa e anônima! – Irene respondeu mudando a postura e colocando as mãos na cintura para cobrar a amiga. – Todo mundo me conhece como sua ilustradora, mas não conhece você! ... Tá na hora de você se mostrar pro mundo.
- O quê?! De onde veio isso?! – entrou em pânico repentinamente. Seu anonimato a protegia e ela estava confortável daquela maneira. Não conseguia se imaginar mundialmente famosa.
- Veio do fato de que a sua alma gêmea está lá fora te esperando, tagarelando sobre pessoas que são flocos de neve, morrendo de saudades de você tanto quanto você morre de saudades dele! – Irene já estava exasperada, pois sabia o quanto podia ser cabeça dura. – , quantas vezes você vai ficar chorando sozinha de madrugada, sentindo saudades da sua alma gêmea? Você consegue viver muito bem sem ninguém, porém tem dias que simplesmente fica despedaçada por não tê-lo junto! Eu nunca vou entender essa conexão, pois não a tenho em mim dessa maneira. Mas você tem e tudo indica que você o encontrou. O está lá, esperando por você. Temos que fazer alguma coisa sobre isso.
Com isso, olhou novamente para a televisão, encontrando os olhos de . Ele parecia levemente deslocado na entrevista e, quando olhou para a câmera, sentiu como se ele estivesse olhando diretamente para ela – implorando para que ela o encontrasse.
- Você tem razão... – suspirou, olhando decididamente para Irene em seguida. – Ok. Eu tenho que sair do anonimato.
Seis Meses Depois
Cristais de Neve.
observava o próprio livro enquanto sentia o estômago revirando dentro de si.
Lá estava ela, em um vestido abaixo dos joelhos, perfeitamente azul e decorado com pequenos flocos de neve salpicados por todo o tecido. O cabelo estava alinhado, a pele perfeita. No pescoço, levava um colar no formato de um coração azul – presente que tinha ganhado quando era pequena por amar o Coração do Oceano. Passou a mão pela pedra e observou o próprio reflexo perfeito no espelho da livraria.
Aquele era o grande dia. O livro Cristais de Neve havia sido lançado, atingindo o maior número de vendas que ela já registrara. Irene se esforçou em todas as ilustrações, recebendo até a ajuda de Takashi, para que o livro ficasse perfeito. Afinal, era a primeira vez que o mundo veria o nome real dela impresso em uma capa.
Um mês após o lançamento, ela tomou coragem de sair das sombras e apresentar-se aos fãs em uma sessão de autógrafos. Não estava pronta, mas era o que precisava fazer – não somente para encontrar sua alma gêmea, mas para seu crescimento pessoal. Ela tinha que parar de ter medo do reconhecimento e dos elogios. Aquilo era algo que tinha que abraçar, não evitar.
- Eu espero que você me veja hoje... – A moça murmurou de olhos fechados, respirando fundo mais uma vez antes de caminhar decididamente ao local onde os fãs, repórteres e emissoras de TV a aguardavam, todos ansiosos por capturar o rosto dela pela primeira vez.
sentiu algo estranho quando seus dedos passaram pela capa de Cristais de Neve. Por um mero acaso, o Destino fez com que ele encontrasse aquele singelo livro nas prateleiras, algo que ele certamente não estava procurando – mas que ficou muito contente em encontrar.
Levando-o para casa, embrulhou-se nos próprios cobertores antes de dormir e decidiu passar o tempo entre as páginas como se fosse um amigo distante que não encontrava há muito.
Por diversas vezes, teve vontade de chorar. Nunca encontrara algo que conversara tão bem com ele quanto aquelas palavras em negro no papel creme. Após ler uma quantidade considerável de páginas, passou os dedos novamente pela capa, encontrando o nome da autora: . Em letras menores, encontrou também o pseudônimo que ela usara até aquele livro.
Procurando em todos os sites, tentou aprender o máximo que pôde sobre ela. Cada palavra que lia, cada fato que descobria, o que ela deixava ou gostava de deixar, os pensamentos que escrevia... As coincidências eram muitas.
Pasmo e com um sentimento de finalmente ter chegado em casa após anos à deriva, estava convencido de que era sua alma gêmea antes do fim da noite.
Portanto, lá estava ele, sentado ansiosamente em frente à TV, com um pote de morangos em mãos e os olhos aguardando quase sem piscar. Aquele era o dia em que ela apareceria pela primeira vez em público e ele não perderia aquilo por nada.
- Eu ainda não acredito. – comentou, sentando-se ao lado do amigo. – Li o livro e sim, em muitos momentos parece que ela conversou com você e colocou todos os sentimentos que você tem em relação à sua alma gema... Mesmo assim, não consigo acreditar que é ela. Muitas outras pessoas devem pensar o mesmo.
- Eu já parei pra pensar nisso e é por isso que estou aqui. Quando você a ver, vai saber que estou certo. – respondeu com convicção.
Teriam continuado a discussão se não fossem os gritos que surgiram do aparelho de televisão. Os flashes começaram a piscar como mil estrelas e em meio aquela comoção, surgiu em seu vestido azul cravejado de flocos de neve, sorrindo com o par de olhos mais gentis que já tinha visto.
Ao encontrá-la, ele imediatamente parou de se mexer. Quando ela se sentou à mesa para assinar os autógrafos e pegou o microfone, prendeu a respiração e fechou os olhos.
- Olá, meu nome é ! Prazer em conhecê-los! – A voz da moça ecoou como as notas da música mais doce que podia acalmar qualquer caos na alma de .
Abrindo os olhos, os de encontraram os dele – o que o fez ficar a ponto de chorar.
- É ela, . Eu tenho certeza. – sorriu, como se aquele fosse o dia mais feliz de toda a sua existência, enquanto os olhos se enchiam de lágrimas. – Ela é a minha alma gêmea. Eu preciso conhecê-la.
Lá estava o olhar certeiro de . Observando-o, percebeu que os únicos momentos em que olhos do amigo ficavam decididos daquela maneira eram quando falava da própria alma gêmea. Durante muito tempo, o ouviu divagando sobre aquela pessoa e lá estava ela, sorrindo amigavelmente enquanto assinava diversos livros e conversava com cada fã que parava à sua frente como se fossem amigos há décadas – exatamente como fazia.
- Você já terminou a sua música? – perguntou repentinamente, fazendo o amigo franzir as sobrancelhas.
- Já, só preciso terminar de polir algumas partes... Por quê?
- Ela vai te escutar.
Um mês se passou e estava desesperada tentando aprender a viver com a fama.
O que resultou nos momentos mais antissociais da vida da moça, trancafiada em sua casa para focar na mais nova história que surgira na própria mente como uma avalanche.
Não que ela não gostara dos fãs – muito pelo contrário: não sabia como lidar com todas aquelas pessoas lhe dando nada mais que amor. Claro, havia muitos que destilavam ódio em relação às histórias dela, mas o tanto de gente que gostava compensava pelos outros. Ela não sabia onde se enfiar e sempre corava com os elogios, além de querer entregar algo melhor ainda para os editores como uma maneira de agradecer por todo o carinho.
Então, lá estava ela trancada em casa, mordendo a ponta de uma caneta enquanto deixava uma série de clipes rolando na televisão para lhe dar inspiração, rabiscando algumas palavras aqui e ali quando tinha alguma epifania de criatividade.
- Uma hora você vai ter que sair. – Irene comentou placidamente, enquanto rabiscava suas próprias ideias em seu sketchbook. – Você sabe como o mundo lá fora é bom para arranjar inspiração.
- Sim, eu sei... – respondeu de maneira pensativa. – Mas tem algo me incomodando. Algo que está para acontecer e eu só tenho que esperar mais um pouquinho...
Irene sorriu, voltando a atenção para o desenho. sempre tinha daquelas: sentimentos estranhos e muitas vezes premonitórios. Fora assim que ela sempre sentira a presença de e o encontrou em meio aos seus sonhos em uma manhã despreocupada. Era fascinante, para falar a verdade.
Quando elas menos esperavam, porém, um clipe do grupo de apareceu na tela da televisão. franziu as sobrancelhas, pois não conhecia aquela música – o que não podia se gabar, afinal não conhecia diversas músicas dele. Pendendo a cabeça para um lado, continuou a escrever seu livro, porém a música ganhava cada vez mais espaço nos ouvidos dela.
começou a sentir algo estranho enquanto ouvia, apesar de tentar não prestar muita atenção – afinal, precisava terminar seu livro. Mantinha o caderno em cima das pernas e a caneta entre os dedos, porém logo as imagens na TV se tornaram interessantes demais para se ignorar.
- ...? – Irene chamou enquanto terminava alguns detalhes em um pedaço de papel. Mal percebeu que a amiga se levantara do sofá e parara em frente ao aparelho de televisão, completamente absorta no vídeo que se passava. Era como se tivesse sido chamada para cada vez mais perto das imagens que se passavam por lá. – Terminei mais uma ilustração vê o que... ? Tá tudo bem?
E claro, Irene achou muito estranho encontrar a amiga parada no meio da sala, observando atentamente a TV com as sobrancelhas franzidas.
- Tá... Tudo bem sim... – respondeu despreocupadamente, mas suspirou em seguida. – Essa música lançou quando...? Tenho a impressão de que já ouvi antes em algum lugar...
Era isso que mais a incomodava. Aquelas notas não lhe eram estranhas, aquelas vozes eram extremamente familiares. Não por ser da banda que gostava tanto, mas sim porque ouvira antes, várias e várias vezes. Uma melodia extremamente familiar, com uma harmonia que a fazia se sentir em casa.
- Lançou hoje, . Não tem como você ter ouvido antes... – Irene respondeu calmamente, deixando a ilustração sobre a mesa e se aproximando da amiga. – Você acha que já ouviu?
- Acho que sim... – E continuava alheia à realidade, concentrada somente no vídeo e na música, como se o próprio Tempo tivesse parado. – Parece algo que ouvi em um sonho... Há muito tempo atrás... E essas imagens não me são estranhas...
Nesse momento, a câmera focou em sorrindo, claramente se divertindo com a cena que filmavam. E foi aí que sentiu um aperto no coração, algo tão forte que lhe tirou o fôlego e a fez arregalar os olhos: ela já tinha visto aquilo.
Levando a mão ao coração, a moça se distanciou da TV, cambaleando, e terminou sentada no sofá, os olhos marejados de lágrimas. Quando? Como que sabia daquilo? Como podia ter tanta certeza? O sentimento que a acometeu era tão forte que achava que nunca mais voltaria a respirar.
- ?! O que foi?! Tá tudo bem?! – Irene ficou alarmada ao ver aquela reação da amiga, tentando descobrir o que fazer para ajudá-la.
Começando a chorar em uma reação automática, ignorou completamente e se levantou do sofá, aproximando-se da televisão. Quando apareceu novamente na tela, ela tocou o rosto dele com os dedos trêmulos, ainda boquiaberta.
- Quem é você...? – perguntou com as sobrancelhas franzidas, as lágrimas escorrendo pelo rosto como se ela mal percebesse que estivessem lá. – Quem é você, ...?
- , você sentiu alguma coisa? – Irene já conseguia ter alguma noção do que tinha acabado de acontecer, procurando não encostar na amiga para que ela não se assustasse. Sabia que quando o assunto era a alma gêmea de , o melhor a se fazer era levar as coisas de maneira devagar.
- Senti... Algo muito estranho, Ne... – tirou a mão da tela e fechou os olhos, abraçando a si mesma em seguida. – Eu já vi aquilo antes, tenho certeza. Eu conheço esse rosto, esses olhos... Conheço tudo, já vi em algum momento... Mas não sei...
Nesse momento, ela abriu os olhos novamente e lá estava cantando as últimas frases da música, algo sobre Destino e espera – a música mais nova que ele próprio tinha escrito e produzido, do começo ao fim, sem a ajuda de ninguém. Ele olhava diretamente para a câmera, para a TV e para os olhos de .
Os olhos de .
Era isso que fazia com que ela o reconhecesse de algum tempo e lugar remotos que nenhum dos dois jamais se lembraria nessas vidas.
sentiu as pernas bambeando e o coração acelerando como uma montanha russa. Tudo foi tão forte e repentino, que a moça sentiu o próprio mundo girando e teve que se sentar no chão – pois não confiava mais na força das próprias pernas. Mal percebeu quando Irene gritou seu nome e se sentou ao lado dela, completamente desesperada e sem saber o que fazer. Na pior das hipóteses, se tivesse que levar ao hospital, levaria.
- É ele, Irene. É ele. – disse com toda a convicção do mundo, ainda observando a TV, as lágrimas escorrendo de maneira cada vez mais forte. Entretanto, ela apertava o próprio coração com a sensação de segurança mais confortável que sentiu na vida.
- É ele o quê...?
E somente se limitou a apontar as palavras no pulso. Não tinha mais dúvidas, não bambeava mais naquele conhecimento. Ela ouvira o chamado dele através da música que gastara tanto tempo para escrever justamente para ela.
Era ele. Ela sabia.
Dois Meses Depois
- Nossa.
Foi a única coisa que Irene conseguiu comentar ao terminar de ler o livro que tinha acabado de escrever.
A cabeça da amiga se levantou do sofá, observando Irene com expectativa.
- E aí...?
- ... – Irene deixou o manuscrito sobre a mesa, suspirando. pendeu a cabeça para um lado e somente ficou aguardando. Quando Irene abriu os olhos novamente, estavam marejados de lágrimas.
- Tá tão ruim assim?! – E se levantou correndo, pegando o manuscrito e abraçando-o para trancá-lo em um lugar bem longe onde ninguém mais pudesse ler.
- ... O jeito como você descreve saudades... É isso que você sente? – As lágrimas começaram a escorrer silenciosamente pelos olhos de Irene.
estava parada no meio da sala, como um animalzinho assustado – e era exatamente isso que era. Quando se tratava de seus manuscritos, morria de medo de deixar alguém ler e, sempre que tomava coragem, ficava na expectativa. Claro, já estava acostumada com rejeição – afinal, para publicar seu primeiro livro, levou muitas portadas na cara – mas, quando eram pessoas que ela conhecia, sempre tinha medo.
- Como assim, Ne?
Irene suspirou, sabendo que aquela conversa seria infrutífera. Limpou as lágrimas dos olhos e sorriu, levantando-se da poltrona em que estava sentada.
- Eu achei sensacional, você escreve muito bem. Tem algumas partes pra corrigir, porque o ritmo da história está meio confuso, mas eu te ajudo com isso. Vou fazer um chá e daí conversamos, pode ser?
- Ok. – sorriu de volta, concordando com a cabeça.
Sabendo que o chá ia demorar um pouco, a moça foi até o próprio quarto, instalando-se em seu cantinho: sentada no chão, o computador sobre a cama para poder escrever. Colocou os fones de ouvido e pôs-se a escutar algumas músicas no “aleatório”, a fim de terminar mais um projeto que tinha em andamento.
Conseguiu escrever algumas palavras normalmente, até que teve uma vontade repentina de ouvir uma música específica. Colocou para tocar e continuou a escrever, porém não esperava o que houve em seguida. O primeiro acorde do piano a fez parar de digitar e prestar atenção. O segundo parecia atingir diretamente o coração dela. E assim que a melodia começou efetivamente, ela sentiu.
Saudades.
Aquele aperto no coração típico das saudades que sentia toda vez que pensava muito nas palavras em seu pulso... E da primeira vez que vira naquele clipe.
ficou sem ar e sem mais nada para se apoiar. Sentiu as lágrimas preenchendo os olhos involuntariamente, o sentimento assolando seu coração. Ela parou de digitar, apoiou a cabeça no colchão e começou a chorar. O rosto ficou quente, as lágrimas escorrendo de maneira fria e pingando nas calças do pijama.
Nesse momento, de olhos fechados, ela pôde vê-lo claramente sentado à sua frente, escutando a mesma música. A mão dela se aproximou do pescoço dele, sentindo a pele quente de . Ele fechou os olhos enquanto ela somente se aproximava. Em poucos segundos, os lábios macios dele estavam tocando o pescoço de e logo tudo que puderam fazer foi se abraçar. Não pertenciam a lugar nenhum, pois pertenciam um ao outro. Em qualquer lugar que estivessem, se estivessem juntos, já era suficiente.
Abrindo os olhos e voltando para seu quarto, completamente vazio, as lágrimas dela somente aumentaram. Quando? Quando iam se conhecer?! Aquilo era torturante, apesar da doçura de saber que um dia iriam se encontrar.
- ! – Irene foi cuidadosamente até a amiga, retirando a mão de que se encontrava na própria cabeça e que a moça sentia que era de . – O que foi? Tá tudo bem? Você tá chorando.
- Eu preciso de um abraço... – A moça respondeu de maneira silenciosa e entre os próprios soluços.
- É por causa...? – Irene passou os dedos pelas palavras no pulso da amiga e somente confirmou com a cabeça.
Nisso, Irene se sentou ao lado da amiga e a abraçou, apoiando a cabeça dela em seu peito e afagando os cabelos de . A moça envolveu Irene com os braços da maneira que podia, chorando mais que antes.
- Eu sinto tanta falta dele...! – As lágrimas de pareciam aumentar conforme a música passava. – Tanta falta, Ne...
- Shhh, vai passar... Calma...
Se aquilo tivesse acontecido antes de ler o manuscrito de , Irene provavelmente ficaria desesperada. Porém, a maneira como a moça descrevera o próprio sentimento de saudades, de sentir a falta de uma pessoa específica ao seu lado, atingiu Irene como uma tonelada de tijolos. Ela nunca sentira aquilo, mas agora entendia o sentimento exasperante que havia no peito da amiga – e tudo que podia fazer era consolá-la com um abraço.
Assim, o quarto foi tomado pela música e as lágrimas silenciosas de .
Mal sabia ela que decidira ouvir a mesma música que ela.
Tentando relaxar e encontrar um pouco de inspiração pra escrever a letra da música que ele fora desafiado a escrever, teve a vontade repentina de escutar a mesma música que decidira colocar ao escrever.
Sentado em sua cama, ele se sentiu incomodado ao ouvir os acordes do piano, tentando entender o motivo de soarem tão diferentes. pensou que não tivera aquele sentimento ao ouvir aquela música pela primeira vez, então não entendia o porquê daquele aperto em seu peito.
Repentinamente, ele perdeu todo o ar de seus pulmões. As letras em seu pulso pareciam arder como fogo e o rosto dela surgiu no canto mais remoto da memória dele. brilhava como uma estrela solitária em uma noite silenciosamente escura.
fechou os olhos e apoiou a testa nos joelhos. Conseguia sentir a mão quente de contra seu pescoço, aproximando-se lentamente dele. não conseguiu controlar o impulso de grudar os lábios na pele macia do pescoço dela, fazendo-a suspirar. Teve que abraçá-la em seguida, os braços de retornando o abraço – como se nunca mais fossem se separar e seus corações se completassem em um só naquele simples gesto.
- Ai, meu Deus, ! Tá tudo bem?! – veio correndo até o amigo, já que decidira passar por lá para deixar alguns doces que tinha comprado mais cedo.
- Eu... Ela... Dói tanto... – tentava explicar, mas não conseguia achar palavras. Aquele sentimento era muito estranho para explicar. Somente alguém que passara pelo mesmo conseguiria entender.
- Dói aonde...? – E finalmente compreendeu quando levou a mão esquerda ao peito, a tatuagem descoberta pela manga do suéter felpudo. – Calma, calma... Vocês vão se encontrar...
- Eu sei, mas... – O amigo não sabia mais o que falar. Não sabia mais como explicar. Só sabia que quanto mais da música ouvia, mais sentia a necessidade de chorar enquanto a saudade aumentava. – Mas eu...
- Tudo bem, . Tá tudo bem. – Dizendo isso, se sentou ao lado do amigo, abraçando-o e deixando-o chorar em seu ombro. Ele afagava os cabelos de , tentando acalmá-lo, mas sabendo que aquela angústia do amigo só iria passar no dia em que conhecesse .
sorriu. De certa maneira, invejava . Queria sentir o que ele estava sentindo. Também queria encontrar sua alma gêmea.
Três Meses Depois
continuou lançando seus livros. continuou criando suas músicas. Ele lia as palavras que ela escrevia como se tivessem sido feitas somente para os olhos dele, enquanto ela fechava os olhos e escutava a voz de como se fosse só para ela.
e Irene ficavam cada vez mais angustiados de observar os amigos. Não que e estivessem diferentes, mas sabiam que nos momentos em que aqueles dois ficavam em silêncio e passavam a observar algum ponto distante, estavam pensando no outro. E quando fechavam os olhos, abrindo-os em seguida e sorrindo para os amigos como se nada tivesse acontecido, era porque sentiram aquelas saudades que arrancava o ar de seus pulmões.
Folheando um dos livros de antes de entrarem em uma entrevista, tentava pensar em algo que poderia fazer pelo amigo. Olhou para e, como sempre, encontrou-o encarando algum ponto perdido, passando os dedos pela tatuagem que tanto amava.
encontrou, logo atrás do livro, a foto de sorrindo, com uma pequena descrição da sua trajetória como autora. Logo abaixo, porém, encontrou outra mulher: Irene. Franziu as sobrancelhas e leu que ela era a responsável pelas ilustrações nos livros de .
E teve uma ideia formidável.
Pegando o celular, ligou para o empresário do grupo, sem que ninguém percebesse.
- Oi! É rapidinho, vamos entrar em uma entrevista em dois minutos... – comentou, falando o mais baixo possível. – Sabe aquela autora que o gosta, a ? Ela tem uma ilustradora oficial, a Irene. Deve ser mais fácil de achar o contato dela do que o da . Pode procurar para mim, por favor?
A ideia era simples: ligar para Irene e explicar toda aquela loucura. A moça podia não acreditar nele, mas, pelo menos, poderia marcar um encontro de com . E, se tudo aquilo fosse verdade, nunca mais precisaria encobrir as próprias palavras.
Irene estava trabalhando em um projeto de outro cliente quando o celular começou a tocar.
Sentada em sua cadeira do bistrô que sempre ia com , franziu as sobrancelhas ao ver que era um número que não conhecia. Sorriu em seguida, pensando que podia ser um cliente novo.
- Alô?
- Alô? Senhora Irene? – A voz do outro lado da linha era cuidadosa e animada.
- Eu mesma, mas não precisa me chamar de senhora. Você é...?
- Ah, que ótimo! Meu nome é , olá! – Ele respondeu com uma risada muito contente. – Precisava muito conversar com você!
- Ok, estou toda ouvidos. Seu nome me é familiar... – Ela murmurou em resposta, parando de desenhar e prestando mais atenção à ligação. – Eu já trabalhei para você antes?
- Não, nada disso...! Eu sou músico, talvez tenha ouvido falar de mim em alguma entrevista ou algo do gênero... – Foi só responder que a mão de Irene já voou para a própria boca e ela ficou completamente congelada no lugar. Não era possível ser ele. – Você é amiga da , autora de Cristais de Neve, não?
- Sim! Sou ilustradora oficial dela, por quê...? – Irene sentia os dedos formigando, não conseguia acreditar naquela ligação.
- Preciso da sua ajuda! Você conhece o ?
- Não. Não é possível. – A cabeça de Irene girava. Ela já podia ver para onde aquela conversa estava se encaminhando e simplesmente não conseguia acreditar.
- O quê? Por que você está falando desse jeito? – E agora era quem estava alerta. Levantando da poltrona que em que estava sentado, começou a caminhar pelo próprio quarto. – Não vai me dizer que...?
- A ... Vamos dizer que... Bom, ela tem...
- Alguns sentimentos estranhos com ele?!
- SIM!
e Irene finalmente ficaram em silêncio, ambos chocados com o que tinha acabado de acontecer. Não que duvidassem de e , mas lá estava a comprovação. Eles se acharam, mesmo com toda a distância entre ambos, e souberam que eram almas gêmeas. Sofriam todo dia com aquela distância, sentiam alegrias repentinas e esperança, dor e lágrimas, mas sabiam.
Era assustador.
- Eu te procurei exatamente por causa disso. – comentou silenciosamente, sem conseguir conter as lágrimas que escorriam pelo rosto. Estava assustado, mas definitivamente feliz.
- Eles precisam se encontrar. – Irene tinha uma das mãos sobre o coração, contendo a falta de ar. – Eles... Eles... São almas...
- Gêmeas.
Três Semanas Depois
- Me esclarece o porquê a gente vai nessa premiação de novo. – surgiu na sala nem um pouco feliz enquanto Irene arrumava as últimas coisas na bolsa.
- Porque todo mundo quer uma autora maravilhosa que nem você por lá! Você é uma estrela...! – Nisso, Irene se virou para checar se a amiga estava pronta. – Uau.
estava com um vestido azul levemente escuro, salpicado de brilhantes – um perfeito cristal de neve. Era a roupa perfeita para conhecer ,- na opinião de Irene. A moça começou a rir bobamente, deixando a escritora confusa.
- O que houve? Por que você está rindo assim?
- Nada não. – E Irene colocou a bolsa resolutamente sobre o ombro. – Vamos?
Suspirando, a seguiu. Sabia que era famosa, mas uma premiação do mundo da música não era exatamente o tipo de evento para o qual ela era convidada especial. Mesmo assim, lá estava ela, Irene e Takashi a caminho de uma das maiores premiações do ano.
Quando o carro estacionou na porta do evento, os flashes já começaram a disparar. queria fugir naquele exato momento, pedir para o motorista levá-la de volta para casa. Com a mão hesitando para abrir a porta, Irene se aproximou do ouvido da amiga, falando o mais silenciosamente possível.
- Não sei se te avisei antes... Mas o grupo do vai se apresentar hoje.
Os olhos de se arregalaram. Mudando completamente o que tinha em mente, segurou a porta de maneira resoluta e a abriu, saindo do carro enquanto recebia uma chuva de flashes.
Sem se importar com os fotógrafos – mas, ainda assim, sorrindo para as pessoas que gritavam seu nome e acenavam para ela – a moça praticamente correu para dentro do evento.
Sentia algo em seu peito. Uma leve falta de ar que só podia indicar uma coisa.
O momento estava chegando.
literalmente brilhava entre a multidão. A roupa era inteira preta, se não fosse pelo blazer incrustado de pedras que cintilavam em branco e azul. tinha que admitir que o amigo estava de tirar o fôlego, parecendo o mais perfeito cristal de neve.
Apesar de todas as pessoas presentes, algo tirava a calma dele. As mãos estavam suando frio e ele tinha que secá-las nas calças constantemente. estava com o coração acelerado e nem sabia o motivo daquilo – definitivamente não era a primeira vez que se apresentaria em uma premiação importante e não seria a última. Ele não deveria estar mais nervoso do que o normal, então, por que aquele sentimento?
- Tudo bem por aí, ? – deu um pequeno tapa no ombro do amigo, fazendo-o suspirar de maneira audível. – O que foi?
- Ah, nada... – balançou a cabeça, olhando para o chão. – Estou com um sentimento estranho, inquieto... E não é por causa do show...
deu um pequeno sorriso. Sabia exatamente o motivo. Afinal, tinha combinado tudo perfeitamente com Irene em várias ligações.
- Ela está aqui?! Preciso tirar uma foto depois! – Uma cantora, colega deles, passou animadamente enquanto conversava com uma amiga. franziu as sobrancelhas. Normalmente eles não chegavam a se animar daquela maneira com outros artistas, exatamente por já conhecerem praticamente todos. Então, deveria ser alguém que nunca se apresentara lá antes e ele não estava sabendo nada daquilo.
- Quem está aqui? Eu não ouvi falar de nenhuma novidade nos cantores hoje...
- A .
Os olhos de se arregalaram. Repentinamente, ele parecia exasperado. Olhando em todas as direções, procurava a porta do evento. Pela maneira que estavam falando, ela tinha acabado de chegar – e ele tinha que falar com ela. tinha que dizer aquelas palavras para , aquelas que ele aguardou a vida toda para ouvir.
Quando finalmente achou a porta, congelou no lugar.
Assim como congelou na porta ao encontrá-lo pela primeira vez.
O tempo pareceu parar, assim com seus corações. Ambos se esforçaram para não chorar e somente sorrir. Quando a viu sorrindo, não conseguiu ficar sem sorrir de volta, corando como um morango.
- ... – Ele se preparou para correr na direção dela, já murmurando o nome que ansiava ouvir dos lábios dela quando finalmente se conhecessem.
- Ei! ! Não foge! – Mas o empresário deles teve que surgir no mesmo momento. – Está na hora de vocês irem se preparar no backstage!
- Mas... – tentou argumentar, porém foi envolta por várias pessoas que queriam tirar fotos e conversar sobre os livros antes do evento começar.
Assim, teve que se distanciar dela. Mas, enquanto caminhava para o backstage, prometia a si mesmo que seria a última vez que a deixaria para trás daquela maneira.
- , por aqui! – Irene segurava a mão da amiga, enquanto Takashi praticamente servia como um guarda costas. Já estava acostumado com as duas andando à frente e, sinceramente, não se importava. Enquanto Irene estivesse sorrindo, ele não se importava com nada. – Temos poltronas logo na frente!
- Você planejou isso, não? – não conseguia estar mais indignada, apesar de rir como uma louca. Não sabia exatamente o que estava sentindo, mas parecia que ia explodir. – Como?!
- O me ligou! Não faço ideia de como conseguiu meu telefone, mas me ligou! – Irene se sentou em um lugar na terceira fileira próxima ao palco, puxando para também se sentar e explicar tudo enquanto segurava as mãos da amiga. – Ele me falou sobre tudo que passou, os mesmos sentimentos que você e como te encontrou por causa do seu livro, Cristais de Neve. Por coincidência, vocês estão vestidos de maneira muito parecida, como se fossem cristais de neve. Tudo está conspirando a favor de vocês, ... Vocês realmente são almas gêmeas. Ele escreveu a música para que você o encontrasse, como você escreveu o livro para ele te encontrar. É incrível!
- Eu tô vendo como é incrível! Você já está chorando até! – reclamou, mas limpava as lágrimas dos próprios olhos. Não queria borrar a maquiagem.
- É assustador, não me culpe por me emocionar desse jeito! – Irene riu de volta, enquanto Takashi somente as observava com um sorriso no rosto. Gostava da maneira como ambas eram amigas. Uma incentivava somente o melhor da outra.
Nesse momento, as luzes do palco se apagaram e sentiu todos os membros do corpo formigando. Os apresentadores começaram a falar, mas ela não conseguia ouvir coisa alguma. Somente conseguiria voltar a escutar quando a voz de ressoasse pelo local.
Mal sabia ela que já estava para entrar no palco, exasperado ao lado de .
- Você combinou isso com a Irene?! – Ele ainda não conseguia acreditar, enquanto somente ria. – Ela sabe de alguma coisa?
- Não! Agora a Irene deve ter contado para ela como contei para você. Mas não sabia de nada também. – piscou para o amigo. – , ela é a sua alma gêmea, a Irene me contou tudo. Do mesmo jeito que você escreveu a música, ela escreveu Cristais de Neve para que você a encontrasse.
abaixou a cabeça, descansando as mãos na cintura. estranhou, mas aguardou até que ele levantasse a cabeça novamente: e lá estavam as lágrimas escorrendo como os mais brilhantes diamantes pela face de .
- Se eu borrar minha maquiagem antes de entrar no palco, a culpa é sua. – repreendeu, fazendo rir animadamente.
De repente, porém, ouviram o grupo sendo chamado para o palco. Enquanto as pessoas gritavam na plateia, eles caminharam até seus lugares, as luzes ainda apagadas. Muitas pessoas se aglomeraram nos locais mais próximos do palco, para assisti-los de maneira melhor.
se perguntava se estaria lá – mas tinha a impressão de que ela seria o tipo de pessoa a ficar no próprio lugar para assisti-lo melhor, longe da aglomeração.
E estava certo. Enquanto várias poltronas vagaram, ela continuou à própria, em pé, aguardando com expectativa. As luzes do palco se acenderam e a voz de ecoou junto com os primeiros acordes, iniciando a música.
O coração dela quase pulou do próprio peito. Ele brilhava no palco e jamais imaginara que o assistiria daquela maneira. Mantinha as mãos sobre o peito, observando-o com expectativa pelos olhos laminados de lágrimas. Será que ele a encontraria na multidão? Sabia como era difícil enxergar qualquer coisa do palco. Mas gostava de alimentar aquela esperança tola.
, por outro lado, esforçava-se para observar todos os rostos que os assistiam com admiração. Ele tinha que achá-la novamente, nem que fosse para saber onde encontrá-la após o show. O próprio coração estava quase saindo pela boca e logo achava que seria possível ouvi-lo quando partisse os lábios para cantar.
Próximo do fim da música, o grupo de se juntou perto da beirada do palco para cantar junto com a plateia. A iluminação mudou levemente e parecia que nevava por todo o recinto. A música enchia os corações de todos os presentes com esperança e alegria – até mesmo e não puderam deixar de sorrir com a admiração do momento.
- Eu preciso... – murmurou, ficando em silêncio logo em seguida. Não sabia exatamente se aquela era a melhor atitude a se tomar.
- . Vai até ele. – Takashi finalmente se manifestou, causando surpresa tanto em quanto em Irene. – Não sei se você percebeu, mas ele está te procurando do palco. Vai lá. Você tem que ir.
Respirando fundo e enchendo o peito de coragem, olhou resolutamente para o palco e começou a caminhar, sem dúvidas no próprio coração. Tentou fazer seu caminho por entre as pessoas, mas todos estavam entretidos demais com a música para deixá-la passar. A moça tinha alguma dificuldade para atravessar a multidão – que até começava a se irritar com o fato de que estava tentando chegar mais perto do palco.
- ! – Ela tentou gritar sobre a música, mas, com o retorno no ouvido, era óbvio que ele não conseguiria escutá-la. Esticando a mão direita, não iria desistir. Demorara muito para chegar até aquele momento. – !
não conseguiu ouvi-la, mas algo chamou a sua atenção na multidão – muitos falaram que foi a movimentação, porém ele sempre insistiu e insistiria que foi o próprio Destino que o fez notar o que estava acontecendo.
E lá, encontrou o rosto de olhando-o com grandes olhos brilhantes de expectativa, a mão direita esticada em direção a ele, a tatuagem aparente no pulso – apesar de que ele não conseguia ler as palavras.
Mas nada daquilo importava. Ele já sabia que era ela.
Sem pensar duas vezes, largou o microfone e desceu do palco, ignorando todas as vozes que o chamavam – principalmente os seguranças – enquanto caminhava pelo pequeno espaço em que não havia ninguém.
Esticando a mão esquerda, segurou a mão direita de , ajudando-a a atravessar o resto da multidão e finalmente fazendo-a cambalear para seus braços.
Segurando-a com firmeza, a envolvia pela cintura enquanto as mãos de descansaram sobre o peito dele – e ambos sorriram, tendo a certeza de que aquele era o momento mais correto e perfeito das suas vidas.
- Eu sou seu Floco de Neve. – finalmente declarou.
Os olhos de se encheram de lágrimas e algo dentro do peito dele explodiu como duzentos fogos de artifício.
- Eu senti sua falta, Floco de Neve. – respondeu com o sorriso mais calmo e belo colorindo os próprios lábios.
teve a mesma sensação de explosão, falhando em conter as lágrimas que começaram a escorrer pelo rosto como pequenos cristais. Rindo com a reação dela, também começou a chorar, já não vendo mais sentido em segurar as próprias emoções. Eles esperaram por aquele momento durante muito tempo.
finalmente conseguiu tirar o bracelete que envolvia o pulso esquerdo, voltando a abraçá-la logo em seguida, enquanto repousava a mão esquerda no rosto de . Sorrindo, ela retribuiu o toque com a mão direita, suas frases complementares finalmente ficando uma de frente para a outra.
Ignorando a multidão e levados pela música que chegava ao fim – a música sobre flocos de neve que compusera para que o encontrasse – os lábios de ambos se tocaram, no primeiro de muitos beijos apaixonados que trocariam durante anos. Sentiram todos os sentimentos do mundo ao mesmo tempo, mas havia um que era o mais forte de todos...
Eles estavam em casa.
Fim.
Nota da autora: Quem está chorando junto comigo e os cristais de neve?!
Hahahaha espero que tenham gostado! Essa foi uma das histórias mais sentimentais que escrevi e incrivelmente reveladora. Estou muito contente com o resultado e fiquei com receio de não deixar o final emocionante o suficiente – mas acho que valeu a pena.
Esse casal sofreu, mas finalmente se encontrou! Provavelmente vou usá-lo em alguma outra fic, para contar um pouco do que aconteceu depois desse drama todo xD
Muito obrigada por ler a fic e fique à vontade para comentar! Respondo o quanto antes!
Até a próxima! E nunca se esqueçam: todos têm os seus flocos de neve por aí ;)
PS: Ah, e segue meu grupo no facebook pra que vocês fiquem de olho nos meus próximos projetos – tenho mais alguns ficstapes para entregar e sempre atualizo por lá! Tem espaço pra todo mundo, sempre procuro conversar bastante com o pessoal que faz parte e realmente vou ficar feliz de vê-los por lá: https://www.facebook.com/groups/558784227519925/?ref=bookmarks.
Disclaimer: Essa história é protegida pela Lei de Direitos Autorais e o Marco Civil da Internet. Postar em outro lugar sem a minha permissão é crime.
Não gosto de falar essas coisas, mas como já tive problemas antes, acho bom deixar avisado. Nem tudo que tá na internet é do mundo, minha gente. Quer postar em outro site? Fala comigo! Eu não mordo! Hahaha a gente vê de me dar o crédito e linkar para o original aqui no FFObs! Só me mandar um e-mail ou pedir aí nos comentários!
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Esse casal sofreu, mas finalmente se encontrou! Provavelmente vou usá-lo em alguma outra fic, para contar um pouco do que aconteceu depois desse drama todo xD
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