Capítulo Único
Eu nem sempre sabia o que meu corpo abrigava.
Em alguns dias era medo.
Em outros, solidão.
E, na maioria delas, insegurança.
Mas eu nunca achei que coragem fosse umas qualidades que compunham meu ser.
E não era.
Até eu conhecer ele.
Minha mãe costumava dizer que todos nós possuíamos ao menos uma virtude cardeal. Tomei suas palavras como verdade, e cresci com a certeza de que carregava em mim a prudência. Sempre tive a cautela de discernir o certo e errado e evitar as inconveniências. A maneira mais efetiva? Se manter longe das pessoas e nunca ficar tempo o suficiente para criar qualquer tipo de apreciação recíproca.
Mas até mesmo algo tão inabalável como a virtude escorre pelos seus dedos quando você é uma garota de vinte e sete anos passando pelo quinto grupo de apoio.
É inevitável - você acaba conhecendo pessoas tão quebradas quanto si mesmo. E, eventualmente, entre uma estrada sinuosa e outra, o muro que você ergueu começa a ceder.
Porque é impossível passar pela vida sem cultivar apreço genuíno por alguém.
E eu?
Eu não sei dizer se, sequer, tinha algum problema. Ou se tinha problemas demais e não conseguia comprimir todos eles em um só.
Eu não bebia mais do que duas taças de vinho nos finais de semana. Não era viciada em drogas. Nem em sexo. Muito menos em compras ou trabalho. Eu era apenas triste e insatisfeita com a minha existência. E havia encontrado uma maneira quase injusta de lembrar que haviam pessoas com problemas muito maiores que os meus e com vidas muitos mais vazias do que a minha.
De uma forma distorcida, aquilo me fazia bem.
Nos últimos dois anos, havia ido de grupo de apoio a grupo de apoio. Eu gostava de ouvir as pessoas exporem suas fraquezas. Era uma atitude corajosa, pra dizer o mínimo.
Eu apenas sentava lá e viajava por todas as histórias tristes ou desesperadoras.
Uma mãe que bebia demais porque perdeu o filho.
Um adolescente que experimentou heroína porque não aguentou ser deixado pela primeira garota que amou.
Um homem de meia idade que fez da sua vida o trabalho porque não tinha ninguém pra mostrar a ele as outras importâncias do mundo.
Eu colecionava aquelas histórias no peito e as sentia como se fossem minhas.
Talvez por não ter a minha própria história.
Eu estava sozinha no mundo desde que me lembrava.
Sem pai, sem irmã ou irmãos. Minha mãe havia me deixado cedo. Cedo demais. Nunca me achei interessante o suficiente para conquistar amigos - então, quando as pessoas se aproximavam, meu senso de proteção apenas as repelia.
E nessa dança de perder todo mundo, acabei perdendo a mim mesma. E nunca mais tentei me encontrar.
Até conhecer .
Era uma quinta-feira à noite.
Ele entrou pelas portas de vidro escuro da pequena salinha com manchas escuras de insônia sob os olhos e os cabelos enfiados em uma touca cinza e puída.
Ele tinha aquele mesmo olhar vago e a ausência de brilho nas feições inexpressivas de quem havia, há tempos, se entregado para o álcool.
Ainda assim, não deixava de ser um dos garotos mais bonitos que eu havia visto.
Naquela noite, ele sentou na cadeira ao meu lado e me encarou por cima do nariz, com desprezo.
Talvez eu tenha ficado incomodada por dois ou três segundos. Foi o tempo que precisei para notar que ele olhava todo mundo com desprezo.
💔
O vento gelado cortava meu rosto.
Minhas mãos estavam enfiadas nos bolsos do casaco pesado e, ainda assim, estavam trêmulas.
Cheguei a me perguntar porque havia escolhido percorrer os vinte minutos da minha casa até o encontro em grupo daquela sexta-feira a pé.
Eu sempre pegava um táxi. Caminhadas noturnas no pico do inverno londrino era o mesmo que pedir por narizes e dedos congelados.
Mas o destino age mesmo dessa forma. Sutil. Inesperado. Quase imperceptível.
Se eu não estivesse caminhando naquela noite, eu não o veria.
E talvez o destino percorresse linhas diferentes.
- O que está fazendo? - minha voz saiu em lufadas brancas de ar, alta o suficiente para que ele me ouvisse do outro lado da rua.
Sua cabeça se moveu minimamente para o lado, como se já estivesse esperando que alguém interviesse a cena.
- O que parece que estou fazendo?
Dei um pequeno sorriso. O cara havia sentado ao meu lado por sete semanas seguidas e aquela era a primeira vez que eu ouvia sua voz.
Mesmo que estivesse em pé na linha de concreto estreita de uma ponte, bem em cima da via expressa, soava espantosamente calmo.
- É melhor descer daí antes que escorregue.
Ele suspirou em meio a uma risada irônica.
- Você não pode ser tão inocente assim…
Torci o lábio. Não, eu não era. Sabia o que ele estava fazendo. Ou tentando fazer.
Mas qual seria a boa política para aquela situação? O que se diz para alguém pensando em pular de um viaduto? Eu estava tentando ser profilática.
- Por ir embora, por favor? - ele soltou um pequeno rosnado, ainda sem me olhar.
Eu podia.
Talvez até deveria.
Mas ali estava a prudência, tomando meus sentidos muito antes que eu arriscasse pensar nas possibilidades.
Então fiz exatamente o contrário do que ele havia me pedido. Olhei depressa para os dois lados e atravessei a rua, minhas pernas se movendo enérgicas pela pequena distância de uma calçada a outra. Sem ponderar muito, joguei a minha bolsa no chão e tomei um breve impulso para subir na mureta ao lado dele. Meu corpo tremeu quando o vento bateu ligeiramente mais forte em meu rosto e, mesmo com o medo correndo pelas veias, olhei para baixo. Uma infinidade de faróis brilhantes passavam depressa e se misturavam com o ressoar dos motores e das buzinas em um ressoar caótico.
Era uma terrível maneira de partir.
- O que está fazendo? - ele soprou, a incredulidade evidente na voz trêmula.
- O que parece que estou fazendo?
Quando voltei meu olhar pra ele, um pequeno sorriso havia se formado em seu rosto. Acho que era um bom sinal.
- Eu não valho o esforço, - ele exprimiu as palavras pra fora, como se elas o machucassem.
- Você sabe meu nome? - não consegui esconder a surpresa ao responder rápido porque, bem… Nenhum de nós dois havia dito uma só palavra durante as reuniões.
Seus olhos pairavam sobre mim, em silêncio. Eles estavam tristes e, por algum motivo, a melancolia que eles emanavam apertava o meu coração.
balançou a cabeça, como se estivesse saindo de algum tipo de transe.
- O que você faz aqui? - ele soprou, dessa vez mais calmo. Me perguntei se ele sabia o quão fácil era entender o que ele sentia apenas pelo tom de sua voz.
- Achei que já tivéssemos resolvido isso. Estou tentando impedir você de…
- Não. Quis dizer aqui - ele apontou por cima do ombro para o pequeno prédio de três andares atrás de nós - Eu sei que você não tem nenhum problema com alcoolismo.
Ah. Certo. Isso.
Levantei os ombros.
- Eu gosto de histórias tristes - disse, apenas, esperando evitar mais perguntas. Prolongar a minha lastimosa história de vida não era o melhor a se fazer a alguém prestes a saltar para o fim.
- Não é mais fácil assistir Romeu e Julieta ou algo do tipo?
Fiz uma careta, balançando a cabeça negativamente
- Odeio filmes de romance.
E então ele sorriu. Não um sorriso irônico e nem antipático. Apenas sincero.
Eu ainda não sabia, mas ele seria a primeira pessoa a encontrar o caminho para o meu coração.
💔
- … - minha voz ecoou pelo apartamento.
As luzes estavam apagadas e o ar tinha um cheiro azedo. Andei em direção ao banheiro, pois sabia que encontraria ele ali.
Em geral, era onde o encontrava depois de uma crise.
Molhando o rosto na pia ou sentado no chão frio.
Dessa vez, o espelho estava em mil pedaços no chão e o sangue escorria dos nós de seus dedos.
Meu coração se contorceu em meu peito e senti as lágrimas arderem em meus olhos.
Mas as engoli.
Entre tantas coisas, havia me ensinado a ser forte. Se não pudesse ser pra mim, seria para ele.
- Não quero que me veja assim, - sua voz saiu trêmula, quase chorosa.
E meu peito apertou mais uma vez.
- Não quero que faça isso consigo mesmo, .
Me joguei ao seu lado no chão. Ele se aconchegou em meu corpo e apoiou a cabeça em meu colo, como uma criança que precisa de alento. E eu estava ali para ser o seu alento. O apertei tão forte quanto podia, sorrindo triste ao passar os dedos por seus cabelos. E o sorriso se transformou em uma careta quando passei os olhos pela porta e vi as garrafas vazias, espalhadas ao pé de sua cama.
Havíamos nos tornado amigos. Melhores amigos.
me contava seus segredos e eu oferecia apoio. Me contou de todos que se foram; sua mãe, sua irmã e seu melhor amigo.
Ele nunca conhecera o pai.
Assim como eu, o garoto não havia encontrado sentido algum na vida.
Havíamos encontrado um ao outro - mas quando os dois lados de uma ponte são frágeis demais, é de se esperar que ela, eventualmente, se quebre.
- Minha mãe… - cortei o silêncio em um sussurro, um tanto incerta - Minha mãe costumava falar que todos nós temos uma das virtudes cardeais. Você sabe qual é sua?
Ele murmurou alguma coisa contra o meu peito. Se não o conhecesse tão bem, talvez não teria entendido.
- É algo para se agarrar - comecei a explicar e ele moveu minimamente o rosto para me olhar - Se você sabe qual a sua virtude, acaba entendendo seu papel na vida das pessoas. Das especiais, pelo menos. Não tem como desistir da vida sem descobrir qual virtude faz parte de você, .
Ele me encarou em silêncio por alguns minutos. Como se tentasse entender ou até mesmo acreditar no que eu dizia.
- E quais são elas?
Dei um pequeno sorriso.
- Prudência, justiça, força e temperança.
E então o sorriso refletiu em seus lábios, ainda que discreto.
- Não é difícil saber qual é a sua…
Era, sim. Mas ele costumava ver o melhor em mim. E eu mal sabia como lidar com isso - porque ninguém antes havia sequer tentado ver algo bom em mim.
💔
- Achei que odiasse filmes de romance.
- Eu odeio. Foi você que escolheu o filme.
- Se esse assunto voltar a surgir, eu vou negar. Para todos os efeitos, foi você quem escolheu.
- Quem tem uma queda pelo Ryan Gosling é você, .
Ele piscou os olhos pra mim, com aquela carinha linda e inocente que só ele conseguia fazer, e não disse nada.
Ele sabia que eu estava certa.
Ele sempre escolhia um filme com Ryan no elenco. Não sei se era proposital, mas em três meses ele havia me feito ver a filmografia inteira do cara.
- Eu só não estou reclamando mais porque você fez pipoca - sorri ao pegar um punhado do delicioso lanchinho do balde no colo de .
The Notebook passava na tela e eu não precisava assistir mais do que trinta minutos para saber que o final da história não seria feliz. É regra: qualquer narrativa com muitas idas e vindas não acaba bem. A vida costuma imitar a arte, mas a arte também se arrisca, vez ou outra, a imitar a vida.
- Fala a verdade. Você nunca quis viver uma história como essa? - se ajeitou no sofá, encostando na almofada e virando o rosto em minha direção.
Meneei a cabeça para os lados.
- Alguma coisa vai dar errado. Ele vai machucar ela, ela vai trocar ele por alguém ou algum dos dois vai morrer.
- A questão não é pensar em como termina. E sim encontrar a felicidade enquanto dura.
Desviei o olhar da TV, encontrando os olhos dele brilhando em minha direção.
Era incrível como às vezes mostrava essa prontidão para a esperança; mesmo que, na maioria dos dias, se lançasse em um poço cada vez mais fundo de escuridão. Breves momentos cintilantes como aquele me faziam acreditar que, um dia, ele deixaria toda soturnidade que o atingia de lado.
- Eu encontrei felicidade uma vez na vida - virei meu corpo, ficando de frente para ele enquanto falava - Quando conheci você.
Um sorriso carinhoso flutuou em seus lábios. Fiquei imóvel quando seus dedos tocaram suavemente meu rosto, roçando em minha pele em um triscar suave.
- Como duas pessoas tão quebradas podem se fazer tão bem, ?
Fechei os olhos, ciente da expressão eufórica que tomava conta dos meus traços - pelo prazer em receber seu carinho e por meu apelido soar tão bem quando externado de seus lábios.
Estava prestes a soltar uma frase espertinha quando algo me parou.
Durou quatro segundos.
Senti os lábios de contra os meus.
Foi rápido.
Rápido demais.
E ainda assim fora a melhor sensação da minha vida.
O formigar nos pés.
O arrepio no pescoço.
O bater de asas no estômago.
A sensação macia contra minha boca.
O cheiro adocicado dele ainda mais perto de mim.
Como se tivesse levado um choque, ele se afastou.
E ficou me encarando; os olhos faiscando entre todos os pontos do meu rosto.
Eu nem ao menos desconfiava; mas queria prová-lo mais uma vez. Queria que durasse mais. Que suas mãos tocassem minha cintura. Que nossas línguas se cumprimentassem, talvez.
E quando eu achei que ele me tomaria em seus braços, apenas se levantou. Passou as mãos pelos cabelos, apressou os passos em direção à cozinha enquanto murmurava frases desconexas para si mesmo.
Fiquei o olhando de longe, abraçando meu próprio corpo.
Eu sabia o que ele estava pensando. Que havia sido um erro. Que ele acabaria encontrando uma forma de me decepcionar.
Mas eu não me importava.
Porque, de repente, o que ele havia me dito minutos atrás havia feito sentido.
Quando seus lábios tocaram os meus, eu não senti medo de um futuro melancólico iminente. Não queria saber como aquilo terminaria.
Por quatro segundos, pensei apenas no quanto me salvava de mim mesma. E tive a certeza que poderia passar o resto dos dias tentando fazer o mesmo por ele.
💔
Ele estava me evitando.
E eu sabia porque.
Ele não queria me magoar.
Era uma grande besteira; ninguém me magoava mais do que eu mesma.
Dois dias era quanto eu havia aguentado de mensagens e ligações sendo ignoradas. No terceiro, decidi ir até o apartamento dele.
Imagina que eu abriria a porta e encontraria ele de braços abertos, prestes a me pegar e girar no ar enquanto me beijava, assim como todos aqueles filmes clichês que ele gostava.
Mas se esperava felicidade, fui recebida exatamente com o contrário.
Ausência.
Tristeza.
Frieza.
Abandono.
O que quer que fosse o infeliz oposto daquela pequena palavra.
Quando cheguei no terceiro andar e caminhei direto para o canto do corredor onde ficava o apartamento de , encontrei a porta aberta.
Meu coração bateu um pouco mais depressa. Ele nunca deixava a porta destrancada.
Quando me aproximei, a visão da sala se tornou embaçada.
Porque haviam lágrimas brotando em meus olhos.
No lugar onde ficavam o sofá, a televisão, a simpática mesinha verde de centro e as duas poltronas pretas, não encontrei nada.
Estava tudo vazio.
Exceto por um pequeno envelope branco no chão.
Com o meu nome. Escrito na caligrafia de .
As lágrimas invadiram meu rosto de vez. Senti o peso rasgar meu peito, tão forte como nunca havia experimentado antes. Porque eu nunca suaviza experimentado alguém como ele antes.
Com os dedos trêmulos em descontrole, me abaixei para pegar a carta.
“
Andei pensando muito no que você falou sobre as virtudes.
Eu geralmente faço isso - penso demais em tudo o que você diz. Simplesmente porque todas as palavras que fluem de um coração tão bondoso, externadas de lábios tão bonitos, não devem ser apenas jogadas ao vento.
Você me perguntou qual a minha virtude. Eu não tenho nenhuma, . E enquanto me resumo à insignificância, você leva todas elas em si.
Você é a prudência. Sempre soube o que dizer e o que fazer para me salvar de mim mesmo, até quando eu já havia desistido. Você é a justiça. Ainda não conheci alguém que quisesse o bem indiscriminado de todos tanto quanto você. Você é a força. Sempre foi e sempre será a única fortaleza que eu encontrei em meio às dificuldades e você sempre esteve na constante procura do bem. Você é a temperança. Sempre manteve meus pés no chão e foi o equilíbrio entre meus instintos e o que o era realmente bom pra mim.
Mais do que isso, , você é a garota por quem eu me apaixonei e quem eu sei que não mereço.
E, por ser tão virtuosa, eu sei que você tentaria me provar o contrário.
Você não me deixou partir aquele dia. Estar perto da morte foi o que mais me aproximou da vida, porque o princípio da queda me trouxe você. E você sempre será o que de melhor aconteceu para mim.
E eu preciso ser, também, o melhor para você. E eu só conseguiria fazer isso não estando ao seu lado.
Eu sei que vai doer agora. Doeu em mim, acredite. Mas você vai perceber que eu apenas ofuscava a luz que você prontamente emanava todos os dias.
Você foi o melhor pra mim. Mas eu não sou o melhor pra você.
Espero que ainda lembre de mim quando um filme de romance aparecer na televisão. Onde quer que eu esteja, eu lembrarei de você.
Eternamente seu,
”.
Em alguns dias era medo.
Em outros, solidão.
E, na maioria delas, insegurança.
Mas eu nunca achei que coragem fosse umas qualidades que compunham meu ser.
E não era.
Até eu conhecer ele.
Minha mãe costumava dizer que todos nós possuíamos ao menos uma virtude cardeal. Tomei suas palavras como verdade, e cresci com a certeza de que carregava em mim a prudência. Sempre tive a cautela de discernir o certo e errado e evitar as inconveniências. A maneira mais efetiva? Se manter longe das pessoas e nunca ficar tempo o suficiente para criar qualquer tipo de apreciação recíproca.
Mas até mesmo algo tão inabalável como a virtude escorre pelos seus dedos quando você é uma garota de vinte e sete anos passando pelo quinto grupo de apoio.
É inevitável - você acaba conhecendo pessoas tão quebradas quanto si mesmo. E, eventualmente, entre uma estrada sinuosa e outra, o muro que você ergueu começa a ceder.
Porque é impossível passar pela vida sem cultivar apreço genuíno por alguém.
E eu?
Eu não sei dizer se, sequer, tinha algum problema. Ou se tinha problemas demais e não conseguia comprimir todos eles em um só.
Eu não bebia mais do que duas taças de vinho nos finais de semana. Não era viciada em drogas. Nem em sexo. Muito menos em compras ou trabalho. Eu era apenas triste e insatisfeita com a minha existência. E havia encontrado uma maneira quase injusta de lembrar que haviam pessoas com problemas muito maiores que os meus e com vidas muitos mais vazias do que a minha.
De uma forma distorcida, aquilo me fazia bem.
Nos últimos dois anos, havia ido de grupo de apoio a grupo de apoio. Eu gostava de ouvir as pessoas exporem suas fraquezas. Era uma atitude corajosa, pra dizer o mínimo.
Eu apenas sentava lá e viajava por todas as histórias tristes ou desesperadoras.
Uma mãe que bebia demais porque perdeu o filho.
Um adolescente que experimentou heroína porque não aguentou ser deixado pela primeira garota que amou.
Um homem de meia idade que fez da sua vida o trabalho porque não tinha ninguém pra mostrar a ele as outras importâncias do mundo.
Eu colecionava aquelas histórias no peito e as sentia como se fossem minhas.
Talvez por não ter a minha própria história.
Eu estava sozinha no mundo desde que me lembrava.
Sem pai, sem irmã ou irmãos. Minha mãe havia me deixado cedo. Cedo demais. Nunca me achei interessante o suficiente para conquistar amigos - então, quando as pessoas se aproximavam, meu senso de proteção apenas as repelia.
E nessa dança de perder todo mundo, acabei perdendo a mim mesma. E nunca mais tentei me encontrar.
Até conhecer .
Era uma quinta-feira à noite.
Ele entrou pelas portas de vidro escuro da pequena salinha com manchas escuras de insônia sob os olhos e os cabelos enfiados em uma touca cinza e puída.
Ele tinha aquele mesmo olhar vago e a ausência de brilho nas feições inexpressivas de quem havia, há tempos, se entregado para o álcool.
Ainda assim, não deixava de ser um dos garotos mais bonitos que eu havia visto.
Naquela noite, ele sentou na cadeira ao meu lado e me encarou por cima do nariz, com desprezo.
Talvez eu tenha ficado incomodada por dois ou três segundos. Foi o tempo que precisei para notar que ele olhava todo mundo com desprezo.
O vento gelado cortava meu rosto.
Minhas mãos estavam enfiadas nos bolsos do casaco pesado e, ainda assim, estavam trêmulas.
Cheguei a me perguntar porque havia escolhido percorrer os vinte minutos da minha casa até o encontro em grupo daquela sexta-feira a pé.
Eu sempre pegava um táxi. Caminhadas noturnas no pico do inverno londrino era o mesmo que pedir por narizes e dedos congelados.
Mas o destino age mesmo dessa forma. Sutil. Inesperado. Quase imperceptível.
Se eu não estivesse caminhando naquela noite, eu não o veria.
E talvez o destino percorresse linhas diferentes.
- O que está fazendo? - minha voz saiu em lufadas brancas de ar, alta o suficiente para que ele me ouvisse do outro lado da rua.
Sua cabeça se moveu minimamente para o lado, como se já estivesse esperando que alguém interviesse a cena.
- O que parece que estou fazendo?
Dei um pequeno sorriso. O cara havia sentado ao meu lado por sete semanas seguidas e aquela era a primeira vez que eu ouvia sua voz.
Mesmo que estivesse em pé na linha de concreto estreita de uma ponte, bem em cima da via expressa, soava espantosamente calmo.
- É melhor descer daí antes que escorregue.
Ele suspirou em meio a uma risada irônica.
- Você não pode ser tão inocente assim…
Torci o lábio. Não, eu não era. Sabia o que ele estava fazendo. Ou tentando fazer.
Mas qual seria a boa política para aquela situação? O que se diz para alguém pensando em pular de um viaduto? Eu estava tentando ser profilática.
- Por ir embora, por favor? - ele soltou um pequeno rosnado, ainda sem me olhar.
Eu podia.
Talvez até deveria.
Mas ali estava a prudência, tomando meus sentidos muito antes que eu arriscasse pensar nas possibilidades.
Então fiz exatamente o contrário do que ele havia me pedido. Olhei depressa para os dois lados e atravessei a rua, minhas pernas se movendo enérgicas pela pequena distância de uma calçada a outra. Sem ponderar muito, joguei a minha bolsa no chão e tomei um breve impulso para subir na mureta ao lado dele. Meu corpo tremeu quando o vento bateu ligeiramente mais forte em meu rosto e, mesmo com o medo correndo pelas veias, olhei para baixo. Uma infinidade de faróis brilhantes passavam depressa e se misturavam com o ressoar dos motores e das buzinas em um ressoar caótico.
Era uma terrível maneira de partir.
- O que está fazendo? - ele soprou, a incredulidade evidente na voz trêmula.
- O que parece que estou fazendo?
Quando voltei meu olhar pra ele, um pequeno sorriso havia se formado em seu rosto. Acho que era um bom sinal.
- Eu não valho o esforço, - ele exprimiu as palavras pra fora, como se elas o machucassem.
- Você sabe meu nome? - não consegui esconder a surpresa ao responder rápido porque, bem… Nenhum de nós dois havia dito uma só palavra durante as reuniões.
Seus olhos pairavam sobre mim, em silêncio. Eles estavam tristes e, por algum motivo, a melancolia que eles emanavam apertava o meu coração.
balançou a cabeça, como se estivesse saindo de algum tipo de transe.
- O que você faz aqui? - ele soprou, dessa vez mais calmo. Me perguntei se ele sabia o quão fácil era entender o que ele sentia apenas pelo tom de sua voz.
- Achei que já tivéssemos resolvido isso. Estou tentando impedir você de…
- Não. Quis dizer aqui - ele apontou por cima do ombro para o pequeno prédio de três andares atrás de nós - Eu sei que você não tem nenhum problema com alcoolismo.
Ah. Certo. Isso.
Levantei os ombros.
- Eu gosto de histórias tristes - disse, apenas, esperando evitar mais perguntas. Prolongar a minha lastimosa história de vida não era o melhor a se fazer a alguém prestes a saltar para o fim.
- Não é mais fácil assistir Romeu e Julieta ou algo do tipo?
Fiz uma careta, balançando a cabeça negativamente
- Odeio filmes de romance.
E então ele sorriu. Não um sorriso irônico e nem antipático. Apenas sincero.
Eu ainda não sabia, mas ele seria a primeira pessoa a encontrar o caminho para o meu coração.
- … - minha voz ecoou pelo apartamento.
As luzes estavam apagadas e o ar tinha um cheiro azedo. Andei em direção ao banheiro, pois sabia que encontraria ele ali.
Em geral, era onde o encontrava depois de uma crise.
Molhando o rosto na pia ou sentado no chão frio.
Dessa vez, o espelho estava em mil pedaços no chão e o sangue escorria dos nós de seus dedos.
Meu coração se contorceu em meu peito e senti as lágrimas arderem em meus olhos.
Mas as engoli.
Entre tantas coisas, havia me ensinado a ser forte. Se não pudesse ser pra mim, seria para ele.
- Não quero que me veja assim, - sua voz saiu trêmula, quase chorosa.
E meu peito apertou mais uma vez.
- Não quero que faça isso consigo mesmo, .
Me joguei ao seu lado no chão. Ele se aconchegou em meu corpo e apoiou a cabeça em meu colo, como uma criança que precisa de alento. E eu estava ali para ser o seu alento. O apertei tão forte quanto podia, sorrindo triste ao passar os dedos por seus cabelos. E o sorriso se transformou em uma careta quando passei os olhos pela porta e vi as garrafas vazias, espalhadas ao pé de sua cama.
Havíamos nos tornado amigos. Melhores amigos.
me contava seus segredos e eu oferecia apoio. Me contou de todos que se foram; sua mãe, sua irmã e seu melhor amigo.
Ele nunca conhecera o pai.
Assim como eu, o garoto não havia encontrado sentido algum na vida.
Havíamos encontrado um ao outro - mas quando os dois lados de uma ponte são frágeis demais, é de se esperar que ela, eventualmente, se quebre.
- Minha mãe… - cortei o silêncio em um sussurro, um tanto incerta - Minha mãe costumava falar que todos nós temos uma das virtudes cardeais. Você sabe qual é sua?
Ele murmurou alguma coisa contra o meu peito. Se não o conhecesse tão bem, talvez não teria entendido.
- É algo para se agarrar - comecei a explicar e ele moveu minimamente o rosto para me olhar - Se você sabe qual a sua virtude, acaba entendendo seu papel na vida das pessoas. Das especiais, pelo menos. Não tem como desistir da vida sem descobrir qual virtude faz parte de você, .
Ele me encarou em silêncio por alguns minutos. Como se tentasse entender ou até mesmo acreditar no que eu dizia.
- E quais são elas?
Dei um pequeno sorriso.
- Prudência, justiça, força e temperança.
E então o sorriso refletiu em seus lábios, ainda que discreto.
- Não é difícil saber qual é a sua…
Era, sim. Mas ele costumava ver o melhor em mim. E eu mal sabia como lidar com isso - porque ninguém antes havia sequer tentado ver algo bom em mim.
- Achei que odiasse filmes de romance.
- Eu odeio. Foi você que escolheu o filme.
- Se esse assunto voltar a surgir, eu vou negar. Para todos os efeitos, foi você quem escolheu.
- Quem tem uma queda pelo Ryan Gosling é você, .
Ele piscou os olhos pra mim, com aquela carinha linda e inocente que só ele conseguia fazer, e não disse nada.
Ele sabia que eu estava certa.
Ele sempre escolhia um filme com Ryan no elenco. Não sei se era proposital, mas em três meses ele havia me feito ver a filmografia inteira do cara.
- Eu só não estou reclamando mais porque você fez pipoca - sorri ao pegar um punhado do delicioso lanchinho do balde no colo de .
The Notebook passava na tela e eu não precisava assistir mais do que trinta minutos para saber que o final da história não seria feliz. É regra: qualquer narrativa com muitas idas e vindas não acaba bem. A vida costuma imitar a arte, mas a arte também se arrisca, vez ou outra, a imitar a vida.
- Fala a verdade. Você nunca quis viver uma história como essa? - se ajeitou no sofá, encostando na almofada e virando o rosto em minha direção.
Meneei a cabeça para os lados.
- Alguma coisa vai dar errado. Ele vai machucar ela, ela vai trocar ele por alguém ou algum dos dois vai morrer.
- A questão não é pensar em como termina. E sim encontrar a felicidade enquanto dura.
Desviei o olhar da TV, encontrando os olhos dele brilhando em minha direção.
Era incrível como às vezes mostrava essa prontidão para a esperança; mesmo que, na maioria dos dias, se lançasse em um poço cada vez mais fundo de escuridão. Breves momentos cintilantes como aquele me faziam acreditar que, um dia, ele deixaria toda soturnidade que o atingia de lado.
- Eu encontrei felicidade uma vez na vida - virei meu corpo, ficando de frente para ele enquanto falava - Quando conheci você.
Um sorriso carinhoso flutuou em seus lábios. Fiquei imóvel quando seus dedos tocaram suavemente meu rosto, roçando em minha pele em um triscar suave.
- Como duas pessoas tão quebradas podem se fazer tão bem, ?
Fechei os olhos, ciente da expressão eufórica que tomava conta dos meus traços - pelo prazer em receber seu carinho e por meu apelido soar tão bem quando externado de seus lábios.
Estava prestes a soltar uma frase espertinha quando algo me parou.
Durou quatro segundos.
Senti os lábios de contra os meus.
Foi rápido.
Rápido demais.
E ainda assim fora a melhor sensação da minha vida.
O formigar nos pés.
O arrepio no pescoço.
O bater de asas no estômago.
A sensação macia contra minha boca.
O cheiro adocicado dele ainda mais perto de mim.
Como se tivesse levado um choque, ele se afastou.
E ficou me encarando; os olhos faiscando entre todos os pontos do meu rosto.
Eu nem ao menos desconfiava; mas queria prová-lo mais uma vez. Queria que durasse mais. Que suas mãos tocassem minha cintura. Que nossas línguas se cumprimentassem, talvez.
E quando eu achei que ele me tomaria em seus braços, apenas se levantou. Passou as mãos pelos cabelos, apressou os passos em direção à cozinha enquanto murmurava frases desconexas para si mesmo.
Fiquei o olhando de longe, abraçando meu próprio corpo.
Eu sabia o que ele estava pensando. Que havia sido um erro. Que ele acabaria encontrando uma forma de me decepcionar.
Mas eu não me importava.
Porque, de repente, o que ele havia me dito minutos atrás havia feito sentido.
Quando seus lábios tocaram os meus, eu não senti medo de um futuro melancólico iminente. Não queria saber como aquilo terminaria.
Por quatro segundos, pensei apenas no quanto me salvava de mim mesma. E tive a certeza que poderia passar o resto dos dias tentando fazer o mesmo por ele.
Ele estava me evitando.
E eu sabia porque.
Ele não queria me magoar.
Era uma grande besteira; ninguém me magoava mais do que eu mesma.
Dois dias era quanto eu havia aguentado de mensagens e ligações sendo ignoradas. No terceiro, decidi ir até o apartamento dele.
Imagina que eu abriria a porta e encontraria ele de braços abertos, prestes a me pegar e girar no ar enquanto me beijava, assim como todos aqueles filmes clichês que ele gostava.
Mas se esperava felicidade, fui recebida exatamente com o contrário.
Ausência.
Tristeza.
Frieza.
Abandono.
O que quer que fosse o infeliz oposto daquela pequena palavra.
Quando cheguei no terceiro andar e caminhei direto para o canto do corredor onde ficava o apartamento de , encontrei a porta aberta.
Meu coração bateu um pouco mais depressa. Ele nunca deixava a porta destrancada.
Quando me aproximei, a visão da sala se tornou embaçada.
Porque haviam lágrimas brotando em meus olhos.
No lugar onde ficavam o sofá, a televisão, a simpática mesinha verde de centro e as duas poltronas pretas, não encontrei nada.
Estava tudo vazio.
Exceto por um pequeno envelope branco no chão.
Com o meu nome. Escrito na caligrafia de .
As lágrimas invadiram meu rosto de vez. Senti o peso rasgar meu peito, tão forte como nunca havia experimentado antes. Porque eu nunca suaviza experimentado alguém como ele antes.
Com os dedos trêmulos em descontrole, me abaixei para pegar a carta.
“
Andei pensando muito no que você falou sobre as virtudes.
Eu geralmente faço isso - penso demais em tudo o que você diz. Simplesmente porque todas as palavras que fluem de um coração tão bondoso, externadas de lábios tão bonitos, não devem ser apenas jogadas ao vento.
Você me perguntou qual a minha virtude. Eu não tenho nenhuma, . E enquanto me resumo à insignificância, você leva todas elas em si.
Você é a prudência. Sempre soube o que dizer e o que fazer para me salvar de mim mesmo, até quando eu já havia desistido. Você é a justiça. Ainda não conheci alguém que quisesse o bem indiscriminado de todos tanto quanto você. Você é a força. Sempre foi e sempre será a única fortaleza que eu encontrei em meio às dificuldades e você sempre esteve na constante procura do bem. Você é a temperança. Sempre manteve meus pés no chão e foi o equilíbrio entre meus instintos e o que o era realmente bom pra mim.
Mais do que isso, , você é a garota por quem eu me apaixonei e quem eu sei que não mereço.
E, por ser tão virtuosa, eu sei que você tentaria me provar o contrário.
Você não me deixou partir aquele dia. Estar perto da morte foi o que mais me aproximou da vida, porque o princípio da queda me trouxe você. E você sempre será o que de melhor aconteceu para mim.
E eu preciso ser, também, o melhor para você. E eu só conseguiria fazer isso não estando ao seu lado.
Eu sei que vai doer agora. Doeu em mim, acredite. Mas você vai perceber que eu apenas ofuscava a luz que você prontamente emanava todos os dias.
Você foi o melhor pra mim. Mas eu não sou o melhor pra você.
Espero que ainda lembre de mim quando um filme de romance aparecer na televisão. Onde quer que eu esteja, eu lembrarei de você.
Eternamente seu,
”.
Fim
Nota da autora:
Se alguém chegou até aqui, não mate a autora! hahahha não consegui imaginar essa pequena história com um final feliz, gente.
Se alguém reparou a pequena semelhança do enredo com Clube da Luta, deixo aqui alguns pensamentos.
Ele realmente existiu ou ela o criou como um artifício para se salvar de si mesma? E, quando se viu capaz de deixar alguém entrar, permitiu que “ele” partisse?
E o final dele - ele morreu ou morreu apenas para ela?
Quero saber a opinião de vocês sobre as entrelinhas!
Falando de coisa boa: ficstape de um álbum novo do mcfly em 2021, quem diria que esse momento de glória chegaria? Tô emotiva, não nego! E feliz de participar porque, convenhamos, o YDT é perfeito. Buscando inspiração pra essa história, consegui ficar viciada em todas as músicas hahhaha
Espero que tenham gostado!
Nos vemos em outras histórias <3
Fanfics
Shades Of Cool | Restritas - Longfic - Finalizada
Suave é a Noite | Restritas - Longfic - Em Andamento
Shortfics
Chaos Theory | Restritas - Shortfic - Finalizada
Once Upon a Time In… Hollywood | Leonardo DiCaprio - Shortfic - Finalizada
Ficstapes
08. In My Feelings | Lana Del Rey
09. California | Lana Del Rey
11. The Greatest | Lana Del Rey
04. Brooklyn Baby | Lana Del Rey
08. Something About You | McFLY
08. Paper Rings | Taylor Swift
09. Broken Parts | The Maine
13. i love you | Billie Eilish
Nota da scripter: Oi! O Disqus está um pouco instável ultimamente e, às vezes, a caixinha de comentários pode não aparecer. Então, caso você queira deixar a autora feliz com um comentário, é só clicar AQUI.
Qualquer erro nessa fanfic ou reclamações, somente no e-mail.
Se alguém chegou até aqui, não mate a autora! hahahha não consegui imaginar essa pequena história com um final feliz, gente.
Se alguém reparou a pequena semelhança do enredo com Clube da Luta, deixo aqui alguns pensamentos.
Ele realmente existiu ou ela o criou como um artifício para se salvar de si mesma? E, quando se viu capaz de deixar alguém entrar, permitiu que “ele” partisse?
E o final dele - ele morreu ou morreu apenas para ela?
Quero saber a opinião de vocês sobre as entrelinhas!
Falando de coisa boa: ficstape de um álbum novo do mcfly em 2021, quem diria que esse momento de glória chegaria? Tô emotiva, não nego! E feliz de participar porque, convenhamos, o YDT é perfeito. Buscando inspiração pra essa história, consegui ficar viciada em todas as músicas hahhaha
Espero que tenham gostado!
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