10. favorite crime

Finalizada em: 24/12/2021

Know that I loved you so bad, I let you treat me like that

1780, Pensilvânia


Markus sempre gostou de mitologia.
Lembrava-se de seu avô lhe contando histórias sobre monstros gigantescos, profecias inquebráveis, amores proibidos, homens poderosos e tão fortes como nunca antes vistos. Recordava-se dos livros que havia lido, de como as batalhas eram descritas, como eram as roupas, os cabelos, até mesmo as vestimentas de seus personagens. Ele se lembrava dos quadros que sua mãe costumava pintar, em tinta de tons pastéis, que davam vida às histórias que ouvia de seu avô, aos seres mágicos e inumanos, aos poderes, à cultura e às crenças.
Markus sempre apreciou todas as nuances acerca da mitologia e estudara animadamente sobre o assunto, pois parecia haver algo naquelas histórias que o encantava. Emergia das palavras uma força que crescia nele, um engajamento, um tom de coragem e de heroísmo, talvez porque, no fundo, Markus quisesse que tudo aquilo fosse verdade. Talvez, ao menos, era verdade para si mesmo.
A Pensilvânia nunca havia sido o lugar mais interessante a se viver e todo o mundo sabia disso, mas em meados de 1780, não era um lugar em que se queria estar. Como o primeiro estado a recém abolir a escravidão no país, os sensos de modernidade e justiça social permeavam os ares, enquanto um novo comércio local começava a se instalar. As ruas foram sendo mais povoadas ao passo que novas embarcações do Reino Unido cuspiam ingleses para povoar o país.
Isso resultou na imersão de uma nova classe que, gradativamente, fora assentando-se no local, construindo casas, buscando empregos, tentando de alguma forma sobreviver. A aura caótica que vinha junto com todo inverno, trazia longos períodos de seca, de fome e racionamento de mantimentos. Longe de ser o Olimpo, longe das frutas frescas que os deuses gregos comiam ou o hidromel que os nórdicos bebiam.
Em 1780, Markus estava no auge dos seus vinte e tantos anos. Tinha perdido sua mãe para uma doença que sequer sabiam o nome ainda, conjuntamente ao seu pai, que na guerra, lutou para ajudar a libertar os escravos do Estado. Seu avô já tinha partido há alguns bons anos e tudo que lhe restou de herança, foram os quadros de sua mãe, a velha casa em que viviam e os livros sobre mitologia.
Estava sozinho, trabalhando como entregador de jornais para sobreviver, com três ou quatro trocas de roupas do armário, um lampião e pães que ele mesmo assava aos finais de semana. O pouco de luz que a vida tinha para Markus, foi se dissipando com as perdas e após longos anos, tudo parecia ainda mais sombrio, solitário e caótico.
O homem apenas sobrevivia com as histórias mentais que criava sobre si mesmo; fantasiava acerca de sua força, em como manipularia o fogo para afastar o frio que sentia, sobre como seria bonito e desejado pelas deusas do Olimpo em que vivia, para espantar a terrível solidão. A realidade e a ficção de suas histórias brigavam frente a frente, dia após dia, lhe dando forças para seguir em frente.
Entretanto, tudo mudou de repente no final daquele ano, quando Markus voltava para casa, após fazer sua última entrega de jornal. Ao início da tarde fria, conforme o céu tomava uma coloração gradativamente escura, ao passo que ele caminhava esquentando as próprias mãos, esfregando-as uma na outra. Estava trajado com seus casacos pesados, cheios da usual estampa dos remendos xadrez, com a boina marrom e as luvas que continham pequenos furos nas palmas, em meio ao andar tipicamente calmo e despreocupado.
Ao contrário dos outros dias, decidiu tomar um caminho diferente para voltar para casa; talvez prolongar sua caminhada e passar próximo ao armazém de Danny, verificar se havia algum café ou leite sobrando que pudesse pegar. Uma quadra antes de chegar perto do armazém, contudo, Markus assistiu uma faixa de energia espessa, extremamente brilhante em tons de amarelo e prata, cortando o céu em direção ao solo, revelando assim, a silhueta de um corpo.
Graças a temperatura intensamente fria que fazia naquela data, as ruas estavam extremamente vazias. E se não fosse pela criança andando de bicicleta próxima a ele, totalmente embasbacada com o que vira, ninguém acreditaria se Markus descrevesse o que vira. Sem ter muito tempo para raciocinar logicamente, dominado pela curiosidade ao acontecido, ele correra até o local, notando o corpo de uma mulher caído ao chão, desacordada.
A moça em questão era loira, possuía a pele tão clara como a neve, vestida com uma roupa estranha, distinta das que comumente via, em tons de verde escuro e dourado claro. Apesar da queda brusca, sua face parecia serena, como se estivesse apenas dormindo em um sono profundo. O estado de choque de Markus, contudo, não aconteceu pelo simples fato de não entender o que acontecia ali ou por ter visto um portal abrir e se fechar em um único segundo e, dele, deixar uma mulher para trás. O choque ocorreu porque, observando com atenção e cuidado cada detalhe da mulher a sua frente, Markus tinha a certeza de que sabia exatamente quem ela era.
Freya, a deusa do amor para os nórdicos, permaneceu na Terra por quase um ano. Havia sido convidada a liderar as Valquírias e, em uma missão importante, colocou tudo a perder por uma decisão errada, levada puramente pelo seu lado emocional, tomando uma decisão que custou a vida de dezessete guerreiras. Dada como incapaz, foi temporariamente banida de Asgard e cumpriria seu exílio, sua punição, na Terra, local em que seria privada dos privilégios que tinha, da fortuna, do sossego, das farturas e de seus poderes, que foram tirados delas por tempo indeterminado. Dessa forma, deveria aprender a tomar decisões racionais. Odin a traria de volta quando julgasse ser tempo suficiente para a redenção, quando seu povo já não mais a quisesse condenar. Freya, felizmente, foi acolhida por Markus naquele dia.
Fora levada para dentro da casa dele, cuidada, incluída. Markus parecia já saber partes importantes da história dela, apesar da incredulidade transparecer sempre que ouvia novos detalhes. Ele a ajudou a se integrar àquele planeta, a ajudou a se sentir parte de algo outra vez, a lidar com uma nova civilização, com um estilo de vida tão cruel, com as próprias frustrações. Apesar dos tempos turbulentos, das diferenças e de todas as privações, Freya conseguiu ser feliz ali, talvez de uma forma tão verdadeira e entregue como nunca antes foi em sua imortalidade. Fez da Terra sua casa e, sem sequer se dar conta daquilo, já não tinha mais pretensão de retornar a Asgard algum dia. Sequer pensava acerca daquele tópico.
Freya e Markus, inevitavelmente, se apaixonaram. Se entregaram um ao outro de corpo e alma, viveram em beijos, sorrisos, manhãs acordadas juntos, noites frias sendo esquentadas pelos corpos nus e apaixonados. Tudo beirava a um sonho. Um capítulo novo de um conto épico daqueles que Markus sabia de cor, uma bonita história de amor entre um homem e uma deusa. O clássico, o encantador, o irreal e o improvável. Tudo era um sonho bonito demais e parte dele, a cada dia, se dava conta de que já conhecia aquela história. Detalhe a detalhe, parte a parte, palavra a palavra do que foi vivido, do que foi repetido em sua mente durante o tempo.
Markus fez das longas epopeias clássicas e aventureiras uma história sobre si mesmo a contar, afinal. Uma que não ouviu de alguém, uma que não inventou, uma que viveu, a sua própria. Uma história que foi passando ao longo do tempo, mas que se foi perdida. De final feliz ou de catástrofes, de morais enérgicas ou de sábias lições, aquela era a simples história de Markus e Freya.
Começo, meio e fim. O fim.
Ele já sabia exatamente como terminaria e terminou.
No final do quase um ano em que ficou na Terra, Freya simplesmente desapareceu da noite para o dia. Sem deixar avisos, sem acordá-lo, sem dizer absolutamente nada. Do mesmo modo em que apareceu, seu tempo de punição havia sido cumprido e, de volta a Asgard, Freya acordou onde não mais esperava voltar algum dia. E os tempos de sonho que viveu com Markus, o único que ela verdadeira amou em sua longa vida, transformaram-se em um eterno pesadelo. Njord, seu pai, descobriu que sua filha estava grávida duas semanas depois de seu retorno à Terra. Freya não pode mais ver Markus, nunca mais. Deu vida a , quem herdou os poderes que dela foram retirados e, como punição por ter desonrado sua família e a tradição asgardiana vigente, precisou escolher entre a vida de sua filha e a sua própria.
Como a deusa do amor, Freya escolheu o amor.
era fruto de dias bons, de uma paixão e de entrega. Era a concretização mais bonita de um amor que nunca poderia ter acontecido, o acerto no meio de tantos erros que Freya cometeu em sua vida. viveu e ficou com sua mãe não mais do que uma única hora depois de nascer até que ela fosse morta. Anos depois, já adulta, a história que sustentavam, para proteger um passado sombrio e violento de Asgard, era a de que sua mãe teve um relacionamento com um homem da Terra que, em busca de ascender a qualquer custo para Asgard, a matou assim que nasceu. Odin a teria salvado a tempo e a trazido de volta para seu local de pertença, por direito. Fez de a líder das Valquírias, ainda na adolescência, e quem as gerações atuais conheciam como nova deusa do amor.
Markus morreu aos oitenta e três anos de idade, na Pensilvânia. Sem nunca mais ter qualquer notícia de Freya e sem ter consciência de que no universo vivia o fruto de seu único amor. Nunca soube que tivera uma filha, nunca poderia imaginar. Carregava o ano em que viveu com Freya em seu coração, em memórias tão vívidas como as palavras dos livros que continuava a ler, sobre mitologia, sobre os deuses, os homens e seus amores impossíveis. Ao fim de sua vida, Markus tinha consciência de que amou tanto Freya, que a deixou, enfim, tratá-lo daquela forma: como um mero amor humano, improvável e, para sempre, impossível.

One heart broke, four hands bloody

2010, Asgard


se olhava no espelho mais uma vez naquele final de tarde. Estava deslumbrante, reluzente, poderosa, carregando um olhar pesado e cheio de segurança e luxúria. Sabia exatamente com quem ela se parecia e se orgulhava muito por isso. O rosto perfeito de sua mãe, o cabelo tão dourado quanto o dela, o olhar claro e intenso que todos enchiam a boca de palavras para dizer o quanto era lindo e o quanto os lembrava de Freya. não tinha visto mais do que meia dúzia de pinturas de sua mãe, de esculturas espalhadas por Asgard e gravuras em livros que estudou na escola. Mas aquilo bastava. Era o suficiente para sentir em si mesma o que sua própria mãe representou para o mundo um dia e se orgulhava de carregar aquele legado de poder e admiração.
Poder de admiração.
Ela sorriu sozinha para sua imagem no espelho. Gostava da sensação porque era exatamente daquela forma que se sentia: desejada, amada, aclamada e poderosa. Uma vida inteira de intensos esforços em chegar até aquele exato ponto, até sentir aquelas exatas sensações. A adoração popular que antes era destinada à Freya, sua mãe, passou a ser atribuída a sua prole. A beleza e encanto de Freyadottir foram extremamente benéficas para a garota ao longo de sua vida, que desde cedo, aprendeu a manipular as pessoas ao seu redor. Não era uma pessoa essencialmente má, mas egoísta por natureza e não se incomodava com este fato.
Criada sob as ordens do severo Odin, a garota manifestou comportamentos como, em teoria, os de sua figura paterna. Mas não sabia exatamente o grau de verdade daquela parte da história. Não sabia por que, no auge de suas centenas de anos, sequer o tinha visto algum dia. Nem imagens, nem pinturas, esculturas ou gravuras. Era um completo fantasma em sua vida, e, na verdade, ela nunca quis realmente saber dele; isso não a interessava. Mas desconfiava da verdade sobre ser parecida em comportamentos com seu pai porque não acreditava naquilo. Um homem que a renegou, tirou dela tudo o que ela tinha, a deixou sozinha, à sorte da vida. não se via daquela forma. Era maior e melhor do que ele. E se estivesse disposta a arruinar algo, certamente não se limitaria a apenas a vida de uma criança.
Órfã, Frigga cuidou de como sua filha. Sabia das circunstâncias cruéis que foram impostas à vida da jovem, compadecendo de seu sofrimento. Amou-a tanto quanto seus demais filhos, afinal, essa era a melhor característica da deusa do amor, fertilidade e união. Guiou-a até sua fase adulta, instruindo-a e dando-lhe apoio conforme necessário, servindo seu colo, carinho e atenção para a mulher. Como sabia que Freya amorosamente faria por sua garotinha.
No entanto, tornou-se uma mulher imensamente poderosa e intimidadora. Até a forma que andava, sua postura e trejeitos, assemelhavam-se aos de sua progenitora. Era tangível o quanto a garota era cruelmente perigosa, embora houvesse determinados indivíduos que sentiam-se atraídos por aquele risco constante.
Imersa em seus próprios detalhes, ela finalmente viu-se pronta no espelho. Sentia-se tão bela quanto nos outros dias, mas tinha uma paixão sublime, sedutora, por eventos como aquele. Um baile era a oportunidade perfeita de fazer o que tanto gostava, além de encantar os presentes no evento: dançar, beber e esquecer-se dos problemas que enfrentava em sua vida nada pacata como guerreira.
Ela sabia que havia uma sensação que queimava estranhamente em seu peito, mas preferiu ignorar por ora. possuía completa ciência de seus sentimentos, embora soubesse da periculosidade que estes carregavam. Herdara os poderes de sua mãe e identificar nuances próximas da paixão, jamais seria uma tarefa difícil. Entretanto, admitir tal fato para si mesma beirava ao inaceitável.
Escolheu ignorar todos os pensamentos antigos e a perturbação mental e se dirigiu até o salão em que ocorria o baile. Sem pressa alguma de chegar, caminhando pelos corredores com segurança e firmeza, tal como mensurou, todos os olhares foram destinados à beleza estonteante de Freyadottir. O vestido marcava perfeitamente cada curva de seu corpo, mas de longe aquela era a característica mais marcante da mulher. Aquele olhar presunçoso, carregado em confiança e certezas, era o que realmente desestabilizava qualquer um.
Principalmente Loki.
Do centro do local onde o baile já acontecia, o deus da mentira sentiu o peito arder em chamas assim que seus olhos caíram na mulher recém-chegada. Era estranha a forma como ficou momentaneamente encantado pela beleza da garota; ela crescera com ele e Thor, mas o sentimento que possuía por ela era muito distinto ao que cultivava pelo irmão. Era incerto, confuso e intenso, deixando-o estranhamente atordoado, como estava naquele momento.
Felizmente, Loki estava sozinho e disfarçou tomando um gole do hidromel em sua taça dourada. Ninguém presenciou a cena patética em que ele se tornara protagonista, nem mesmo reparou. Ele desviou rapidamente o olhar e tentou — inutilmente — focar em qualquer coisa que não fosse ela naquela noite. Mas como em muitos planos que colocava em prática, talvez a maior parte deles, Loki falhou.
A noite passava como um raio cortava o céu: rápida, intensa e agitada. Iluminado pelas poucas luzes do palácio, regado a vinho e hidromel, o baile estava carregado pelas conversas desinteressantes das pessoas enquanto outras ousavam dançar ao centro. As estátuas de mármore dos ancestrais reais julgando os já alcoolizados e os que já pareciam não aguentar mais a noite. bufou para um homem que se aproximava dela para falar qualquer baboseira para ela e, sem sequer dar tempo de ouvi-lo, virou-se de costas para ele e caminhou para longe. Embora gostasse da bajulação dos eventos sociais, em alguma hora, aquilo começava a cansá-la.
Quando a viu dirigir-se para a área externa do local, não viu motivo para não segui-la. Estava curioso e nem mesmo as músicas, danças ou a decoração repleta em ouro eram capazes de chamar sua atenção como os trejeitos sutis de . Em um vestido tecido a fios de ouro, tão dourados quanto seus cabelos brilhantes, às costas dela ficavam completamente à vista, nuas, em uma postura invejável.
Loki aproximou-se com passos sutis, caminhando em direção à garota, que observava a noite, sem parecer perceber a chegada dele. Havia algo naquele olhar que intrigava Loki; embora ela tivesse uma origem parecida — mesmo que fosse desconhecida por —, as semelhanças terminavam ali. Eram parecidos, talvez complementares, com motivações extremamente distintas, como o preto e o branco, a água e o óleo. Se encaixavam em harmonia, apesar de sozinhos não parecerem sequer uma combinação possível.
E mesmo sabendo de cada empecilho e discrepância, eles se encararam, como sempre costumavam fazer. Desde adolescentes sentiam uma força estranha emanar. Como um imã, estavam sempre sendo repelidos um do outro até o ponto exato de contato que os fazia se conectar de uma vez, com força. sentiu um pequeno calafrio por sua espinha, assim que o sorriso ligeiramente debochado de Loki brotou em seus lábios. O olhar dele sustentou o dela, a única pessoa que, talvez, fosse forte e segura o suficiente para nunca desviar quando ela o encarava.
— O que está fazendo aqui? — a loira indagou, mais na defensiva do que gostaria de admitir.
detestava ser observada e o deus da mentira sabia bem disso. Loki, entretanto, não poupou um sorriso convencido ao notar a pequena fraqueza em seu tom de voz:
— Eu vim te fazer a mesma pergunta. — Loki rebateu imediatamente, cruzando os braços. — Fiquei impressionado com o tamanho do seu egocentrismo em sequer falar com ninguém hoje. Você já foi mais educada.
automaticamente bufou, irritada ao notar o quanto Loki havia reparado em seus atos. Ela não parecia estar de bom humor e isso divertiu ainda mais o deus da mentira, que adorava tirá-la do sério.
— Talvez você devesse cuidar da sua vida, Loki. — deu um passo involuntário para trás, desviando seu olhar do julgamento das orbes gélidas. — Eu não sou obrigada.
— Quanta irritação. — Loki debochou da afirmação, erguendo a sobrancelha. — Você anda muito amarga, Freyadottir. Talvez seja falta de…
— Escuta aqui. — a loira chamou sua atenção, irada com a insinuação baixa do deus, fechando as mãos em punhos.
Ambos se encararam, com uma tensão nada usual no olhar. parecia ter fogo em seus olhos, ao passo que Loki sustentava a frieza de sempre. Estava acostumado com aquele tipo de provocação passivo-agressiva, de qualquer forma.
No entanto, não se dera conta da proximidade entre eles até aquele momento. A respiração dos deuses se mesclaram, conforme os olhares intensos ainda eram trocados. Loki não pôde evitar um sorriso cafajeste com aquela situação a qual estavam submetidos.
— Eu estou escutando, . O que você tem a me dizer?
Havia nervosismo em seu trejeito. As mãos da loira estavam trêmulas, nervosas com aquela provocação descabida. Loki sempre a tirava do sério sem nenhum motivo aparente, implicando minimamente com cada ato feito por Freyadottir. No entanto, não havia resposta. Pelo menos, não uma que pudesse verbalizar. Ele só era um verdadeiro idiota.
Sentindo mais uma lufada provocante em sua direção, finalmente encontrou-se descontrolada. Não conseguiu esconder a forma que encarou os lábios de Loki. Ele também percebeu, sorrindo de forma nada sutil. Por isso, quando ambos se beijaram, nada parecia mais certo do que aquilo.
O toque não era ligeiro; era exploratório, como se há tempos aguardassem — inconscientemente — por aquilo. Loki sentia-se desacreditado, conforme o odor delicioso de rosas invadia suas narinas. Ela era a encantadora portadora dos poderes da deusa do amor e ele não podia estar mais hipnotizado.
O ósculo parecia uma dança, em plena sincronia com ambos. Loki estava tão entregue quanto , ignorando todos os obstáculos que surgiram durante aquele dia. Nada mais importava. Tampouco as inoportunas ideias de seu pai ou provocações constantes de Thor. Afinal, em seus braços estava finalmente a garota pela qual ansiava em silêncio durante um bom período de sua vida.
Mas, tão rápido quanto viera, deixou-o. Embora seguisse sua intuição quando tocara os lábios de Loki, estava confusa. Ele fora criado ao seu lado, como sendo quase um irmão de consideração; o quanto aquilo era errado? Há quanto tempo ela cultivava aquele sentimento em segredo? Talvez um segredo tão oculto que ela mesma não havia percebido com clareza. Haviam muitas perguntas e poucas respostas.
E, definitivamente, aquilo não seria respondido tão cedo. Por nenhum deles dois.

Oh, look what we became

2012, Santuário


— Você realmente acha que isso vai dar certo?
Havia incerteza no tom de voz de , apesar de deus esforços contínuos em não deixá-la transparecer. Ela não estava inteiramente confiante no que lhe fora proposto, embora seguisse os passos de Loki sem aparentar hesitação. Não sabia ao certo porque se deixava levar por ele, mas sempre era daquela forma. Ele sempre conseguia tudo o que queria dela, exatamente como ela sabia que conseguiria tudo o que quisesse dele. Talvez por um sentimento orgânico que nutriam nos anos, pela convivência diária com o deus da mentira, talvez porque ela aprendera a manipular com maestria os sentimentos das pessoas ao seu redor, parte dos poderes herdados da sua mãe, o fato era que se tratando de Loki, ela sempre tinha seus desejos mais profundos realizados. Apesar da recíproca silenciosa e de nunca sequer terem assumido ou falado sobre aquilo, amava a intensidade de se doarem um ao outro daquele forma, de comprarem as ideias, de compartilharem os planos e os sonhos mais ambiciosos que poderiam ter.
— Não acho — ele sequer olhou para ela em retrospecto, afirmando com convicção. Loki sempre agia com extrema convicção. — Tenho certeza absoluta.
não evitou uma risada leve e irônica, comentando mais para si do que para o homem próximo a ela:
— Também tinha certeza absoluta da última vez e, bom, olha o que aconteceu.
olhou o lugar ao redor. De todos os lugares que poderia ter parado, aquele era, definitivamente, o pior deles. Sujo, escuro, frio, barulhento. Apesar de serem bem tratados ali, feito reis, tudo era bem diferente das fortunas e do conforto que viviam em Asgard. E apesar do poder, ela gostava do luxo, da grandiosidade. Era ambiciosa demais, arrogante e refinada demais, para apenas contentar-se.
— O pessimismo é a única coisa feia em você. — em posição, ele olhava para um canto qualquer, como se esperasse que algo aparecesse ali a qualquer instante. — Deveria repensar alguns valores, .
— Quem deveria repensar algo aqui é você, Loki — ela bufou, enfatizando o tom de voz em seu nome. — Se isso der errado, de novo, o que vamos fazer?
Era notável a segurança que ele exibia, quase que palpável. Sua incredulidade parecia tola perto do deus.
Não vai dar errado — ele a olhou sério, carregado em prepotência.
— Alguém já te disse que você é muito seguro de si mesmo? — a mulher voltou a perguntar, um tanto cínica.
Loki negou com a cabeça, altamente irônico, murmurando em retrospecto um “olha quem fala”. Era estranha a forma como ambos eram tão semelhantes, mesmo sendo tão distintos. Ele apreciava grandemente isto.
— Você, pelo menos dez vezes por minuto na última hora. — Loki revirou os olhos, irritado. — Deveria parar de fazer tantas perguntas e começar a pensar.
, contudo, deu de ombros falsamente:
— Até onde sei, você já tem um plano, não preciso pensar em nada.
Loki detestava provocações. E vindo dela pareciam ainda piores, mais cínicas do que de qualquer outra pessoa. Atingiam o ego dele com tanta força que incomodava. Ele não podia falhar, não podia errar, fraquejar ou perder. Não podia porque se cobrava de ser o pior e o melhor que poderia ser por ela. Quando se tratava daquela mulher, da deusa que o encarava com um toque de desdém e muita desconfiança, tudo era diferente para ele.
sabia o quanto ele odiava suas provocações e utilizava ao seu favor, principalmente quando precisava extrair algum fato ou quando queria se sentir no comando.
— Eu tenho um plano, — foi a vez dele bufar, enquanto se virava de frente para a loira. Os olhos de ambos se encontraram com intensidade. — Mas acha mesmo que vamos invadir a Terra, acabar com tudo e simplesmente viver felizes para sempre por lá? Precisamos pensar no que nós vamos fazer quando tudo der certo.
“No que nós vamos fazer”.
Encostada no batente da porta, de braços cruzados, ponderou por um momento. Não sabia exatamente por que tinha comprado aquela ideia, mas lá estava ela, outra vez. Servindo ao Glorioso Propósito dele, sendo levada pelo sentimento mais profundo e íntimo que morava dentro de si mesma: a vingança. Não estava tão segura de que aquele plano daria certo, ao menos não tão segura quanto ele parecia estar desde que tudo começou, mas havia um fio de racionalidade interessante ali e aquilo já parecia bastar para ela. Da primeira vez em que tentaram dominar algo, um ano antes, em 2011, eram mais jovens e imaturos, não estavam realmente prontos para a grandeza daquela ação e não agiram mais do que dominados pela pura e egoísta vontade de Loki de mostrar a seu pai, Odin, que sabia e que merecia governar algo.
Apesar de ter dito uma centena de vezes que aquela não era a melhor das ideias, Loki, sempre foi teimoso e soberbo, não quis ouvi-la e decidiu que se tivesse que começar com algo, que fosse governando exatamente o lugar ao qual ele minimamente se sentia pertencente. Mas aquela ideia parecia um absurdo sem fim por dois motivos primordiais. Primeiro, não tinham um plano. Era bem diferente das peças que costumavam pregar nas pessoas ao seu redor em Asgard, bem diferente dos pequenos furtos de artefatos históricos que faziam em outros planetas ou dos problemas que amavam causar. Aquilo era grande e muito, muito, complexo. Depois, em segundo lugar, havia Thor na jogada. Herdeiro legítimo ao trono, tinha sido expulso de Asgard por seu próprio pai e foi exilado na Terra.
conhecia o deus do trovão o suficiente para saber que, custasse o que fosse, ele daria um jeito de retornar. E o que ele acharia quando visse Loki e, bom, sentados no trono de Asgard? Não havia necessidade alguma de responder aquela pergunta. Não bastassem as incertezas, a deusa da beleza também não se sentia exatamente confortável com a ideia de dar um golpe em quem a tinha acolhido e abrigado por tantos anos. Sem mais sua mãe e sem saber sobre a existência de seu pai, nunca teve questão alguma com Asgard, seus governantes ou sua linhagem familiar. Tinha, contudo, um ódio e uma mágoa gigantescos da Terra e de tudo que vinha dela, por ter tirado a única família que poderia ter - sua mãe.
Ansiava, desejava profundamente, todos os dias de sua vida vingar-se do planeta insignificante e ordinário que a tinha transformado em uma órfã solitária e incompreendida. Não queria e não concordava com a ideia de golpear Asgard. A única casa que já teve em toda sua existência, o lar e o porto-seguro que tinha, não podia ser destruído por um simples desejo de governar de um homem de centenas de anos que ainda sonhava curar suas mágoas como um garoto frustrado.
Mas Loki sempre falava sobre seus planos de dominação. Sempre sonhava alto e arrogante sobre o dia em que poderia, finalmente, viver o maior dos propósitos de sua vida e parecia, sempre, em todas as suas falas, ser minimamente incluída nele. Talvez o ego gigantesco de Laufeyson o impedisse de externalizar com precisão o sentimento que cultivara por Freyadottir; talvez fosse tão contrário à sua natureza, que sentia-se impedido de dizer - mas não de sentir. Entretanto, ainda era difícil compreender o quanto ela estava inserida nas pretensões do deus da mentira e, para ela, nunca foi claro qual seria o seu papel da primeira parte do plano, quando conseguisse liderar Asgard.
Comprando aquela ideia, apegada ao fato de que se não soubesse exatamente o que ele faria e muito menos qual seria a parcela dela naquilo tudo não teria qualquer culpa, ela esteve ao lado dele.
Contudo, relacionado há tudo que ele falava, de tudo que prometia a ela e de todos os planos que tinham conjuntamente, invadir a Terra era o que mais lhe brilhava os olhos.
E um ano depois de ter fracassado no golpe de Estado em Asgard e serem expulsos de lá, recolhidos pelos Chitauris, lá estava Loki se preparando para invadir e dominar os seres “mais ignorantes e fracos que o universo teve a capacidade de gerir” - os humanos. Thor continuava a viver na Terra e, apesar de, dessa vez, terem um plano mais consistente e o apoio dos Chitauris, criaturas tão malignas quanto Loki e tão vingativas quando , ainda sim soava como se nada fosse o suficiente.
Qual era a chance de aquilo dar certo? Nenhuma. Mas havia algo que Loki pedisse a com carinho que ela não fazia? Talvez a única parte dela que ainda conseguia ter uma ponta de bondade girava em torno do que sentia por Loki. Invadiriam a Terra e a dominariam, como ele sempre sonhou pelo poder de governar, como ela sempre quis pela necessidade de destruir tudo o que a destruiu um dia. E fariam aquilo da forma mais violenta possível e submersível que podiam.
Precisamos pensar no que fazer quando tudo der certo”. Aquela frase seguiu ecoando na mente de , como uma lembrança que ela não queria se esquecer jamais. Talvez por ser a primeira vez na vida em que estavam realmente fazendo algo juntos, genuinamente juntos. Talvez por, nas entrelinhas, ter sido uma forma de Loki dizer que esperava que ela estivesse com ele nos momentos de glória. não sabia dizer ao certo. Mas a aura que emanou dele ao dizer cada uma daquelas palavras foi diferente.
Foi feliz e sincera.
E ele nunca mais se esqueceu.
Apesar da farsa e das mentiras que o rondavam, Loki havia aprendido a confiar nela com os anos de convivência e, estreitando a amizade de infância para adolescentes com convívio diários até se tornarem adultos que trocavam intimidades quando bem queriam, o tempo havia dado à Loki um presente como nenhum outro. Tinha ganhado, sem querer e sem pedir, sem conquistas e sem poder algum a oferecer, alguém com quem compartilhar os dias, dos bons aos péssimos, alguém que estava dando cada passo da vida com ele, e às vezes por ele.
Loki e se entreolharam uma última vez, assim que o portal que estavam esperando se abriu bem diante de seus olhos. Com sorrisos satisfeitos, ele a deixou entrar primeiro e, a seguindo, conseguiram, finalmente, adentrar a Terra. Era nítido a forma como tudo naquela experiência fora mais intenso para : um turbilhão de sentimentos queimava em seu peito, como se precisasse dar o grito mais alto de sua vida. Sua cabeça zumbia, ao passo que o peito arfou com a lufada de ar que tomara em seus pulmões. Havia ódio em seus olhos, sedenta por uma vingança cega e tão abstrata quanto seu passado, que fora roubado de si antes mesmo de poder se recordar.
De todo modo, conseguiram localizar o Tesseract e conseguiram tomar posse do cetro que canalizou parte de sua energia. Com um poder que jamais imaginaram ter, conseguiram driblar a S.H.I.E.L.D., seus agentes, seus planos e sentir o gosto doce da dominação. Por um momento, enquanto o olhava em pé, poucos passos à sua frente, diante de uma multidão de humanos que se ajoelharam por medo, sentiu a melhor das sensações de sua vida. O orgulho de terem conseguido, a vitória correndo suas veias, o poder que saía deles. A sensação incontrolável de se poder fazer tudo que se queria, tudo que tinham vontade, a adrenalina de começar a realização de um sonho. não conseguia colocar em palavras tudo o que se passou pela sua mente naquele momento e, menos ainda, conseguia mensurar o que estava sentindo. Sua vingança à Terra estava prestes a acontecer.
Não fosse por terem sido interrompidos bem ali, minutos depois. por Thor e um bando de outros imbecis que se achavam as criaturas mais fortes da Terra. lutou naquela noite, como a guerreira asgardiana que sempre foi, como a deusa da beleza. Encantou, deixou-se seduzir e pisou em qualquer um que se colocou à sua frente como pisava no chão, feito insetos que mereciam morrer. Mas não foi o suficiente. Ela e Loki foram presos, separados, interrogados por pessoas diferentes, tentados a acusar um ao outro, a soltar informações, mas se mantiveram. Bom, ao menos se manteve íntegra às suas palavras, ao plano e ao seu parceiro. Loki, por sua vez, fez de tudo para colocar a culpa nela e, por um momento, chegou a convencer com aquele discurso.
E, uma vez que conseguiram escapar, os dois, pareceram perceber, afinal, o que tinham se tornado.
Era estranho pensar naquilo. Na grandeza daquilo. No que tinham se tornado. De crianças criadas juntas, a amigos, pessoas que se conheciam e passaram a confiar. Foram adolescentes, se tornaram adultos. Foram de frágeis e indefesos a pessoas fortes e absolutamente poderosas. Foram do nada e chegavam agora às beiras de se tornar tudo. Talvez pela sensação de poder que sentiram ao assistir Nova Iorque ser inundada e destruída pelos Chitauri, por culpa deles, talvez pelo orgulho de si mesmos e do que estavam construindo ali, na destruição, tudo de repente se tornou real. O tornar-se parecia um ato sucessivo e repetitivo de ser um no outro tudo aquilo que já não mais cabia em ser apenas em si mesmos.
Deixaram-se viver aquele instante mergulhados no torpor do que sentiam e se beijaram, mais uma vez naquela vida. jamais iria se esquecer daquele momento. Da mesma forma que Loki jamais se esqueceria de tê-la olhado uma última vez, quando o plano começou a ruir e os malditos Vingadores, uma vez mais, conseguiram contê-los. Quando a ironia do destino fez dele próprio a vítima da trapaça. O olhar sereno e o sorriso leve nos olhos de , irônico, dizendo casualmente antes de escapar dali e deixá-lo sozinho, para trás, para ser preso, como ele mesmo já havia feito com ela quando, mais jovens, foram pegos a primeira vez por autoridades que descobriram o roubo de um artefato:

Ah, Loki — falsamente surpresa, ela riu amarga pela lembrança de quando ele a deixou para trás. Toda a trapaça, a mentira, a desconfiança, a traição tomando conta dela enquanto o olhava risonha e sussurrava: — olha o que a gente se tornou.

But I say that I hate you with a smile on my face

2014, Asgard


Loki estava um tanto quanto entediado. Suspirou fundo, bufando em seguida, ao passo que era tomado por uma falsa sensação de calmaria. Já conhecia os mínimos detalhes da prisão nada majestosa em que fora condenado pelo próprio “pai”, deixando a situação ainda mais estressante para o deus da mentira.
Agora deitado em sua cama perfeitamente arrumada em lençóis brancos e macios, brincava com um artefato qualquer que pegara na sala, jogando-o para cima, conforme era tomado por pensamentos que lhe assombravam. As revelações que lhe foram acometidas, pareciam tê-lo deixado ainda mais furioso. Descobriu dentro de si uma fúria maior do que a esperada; aguardou a vida toda para destacar-se e conquistar seus propósitos, mas lá estava ele: enganado e sozinho, mais uma vez, sendo apenas um mero coadjuvante de Thor.
Era uma situação patética. As coisas ruíram, seus planos tão gloriosos e calculados deram errado. Fora impedido de conquistar o que tanto ansiava ardentemente. Não sabia onde estava a única pessoa em que confiava e sua própria “família” lhe destinara aquele destino bárbaro.
Entretanto, seus pensamentos barulhentos e melancólicos foram interrompidos repentinamente por um barulho. Curioso, o deus levantou-se, arqueando sua sobrancelha. Aquele local não possuía grandes movimentações e algo como o estrondo que ouvira, não deveria significar boa coisa. A energia elétrica do local falhara,, conforme as luzes piscaram repentinamente. O fato não passou despercebido por Loki, que olhou para cima, levemente intrigado com os atos incomuns.
Porém, ao passo que seus questionamentos internos se fizeram, uma explosão ocorrera, sem que ele pudesse distinguir a situação precisamente. Aquilo deixou-o ainda mais tenso, caminhando cautelosamente até o vidro que protegia a cela, observando com atenção a situação que se desenrolava. Suas ações estavam carregadas em puro receio, ansioso pelo significado de tais ocorrências.
Loki deduziu que, talvez, a explosão possa ter sido ocasionada por um dos outros prisioneiros que o acompanhavam nos majestosos cubículos ao lado. Ou talvez por um nobre guerreiro revoltado. Até mesmo a pessoa que ele aguardava que tomasse alguma atitude perante sua prisão Contudo, quando notara a aproximação do ser rudimentar, que caminhou perigosamente em sua direção, teve suas expectativas confirmadas. Aquela seria uma boa oportunidade de livrar-se do cárcere indevido ao qual fora submetido.
Entretanto, como se lesse seus pensamentos ansiosos através de sua face confusa, a criatura horrenda apenas o deixou de lado, caminhando em direção ao corredor. O fato obviamente deixara o ego do deus da mentira extremamente ferido, como se de nada ele valesse. Decerto que o ser rochoso não sabia do quanto Loki poderia ser perspicaz e, principalmente, convincente, mas logo conhecera este lado ardiloso:
— Deve estar procurando a escada a sua esquerda.
A criatura apenas desprezou-lhe com uma risada baixa, conforme Loki fazia com outros seres. O nórdico, entretanto, sentiu-se ultrajado com o fato, embora não externou em voz alta. Apenas suspirou fundo, sabendo que suas chances de sair dali seriam mínimas perante a depreciação.
Quando avistara um certo martelo adentrando o local, soube que Thor estava presente na batalha que se iniciara entre os presidiários. Batalhara arduamente contra aqueles que roubavam a paz de seu amado reino, desferindo socos, chutes, ao passo que disparava o Mjölnir com pura fúria, desejando o encerramento daquela situação o mais rápido possível, acompanhado por mais guerreiros asgardianos que se aproximavam.
Loki viu-se impossibilitado, petrificado e impotente. De nada ele valia preso em uma cela. Quem diria, aquele que possuía ambição em ser vangloriado como um rei, posto naquela situação patética e indefesa.
A fúria finalmente lhe invadiu, tomando-o por completo. Ao passo que a situação se normalizou e a solidão se fez presente, um grito mudo saiu de seus lábios. A invasão que ocorreu, de nada adiantara, ele ainda estava condenado ali. Ninguém o ajudou. Irritado fez questão de destruir cada perímetro dentro daquela cela minúscula, ficando num estado tão deplorável quanto o cômodo.
Ao chão, estava ele: Loki Laufeyson, destruído, quebrado e aos prantos. Os cabelos apresentavam um emaranhado nada habitual vindo do deus da mentira; as roupas eram como um trapo, somado à pele suja graças a destruição que promoveu no local. Não desejava que ninguém o visse em meio ao ato detestável que despertou seu ódio.
No entanto, a ira de Loki balançou-se quando notou uma presença feminina se aproximar. Arqueou a sobrancelha, tombando a cabeça para o lado conforme acompanhava os passos da loira ao lado de fora. espalmou a mão no vidro que separava sua figura e a de Laufeyson, suspirando fundo.
— O que pensa que está fazendo aqui?
Era sobre Frigga que ela desejava falar. Não é como se Loki não soubesse, mas Freyadottir estava tão machucada quanto ele. Presumiu que, talvez, o rapaz pudesse confortá-la de alguma forma, por terem uma história de vida tão semelhante. Ela sentia as coisas como ele, sentia-se confidente do deus, principalmente depois de tudo que viveram conjuntamente.
— Você sabe, Loki. Ela… ela se foi.
Ele apenas riu soprado em retrospecto, a fazendo engolir em seco. Por que insistia em buscar humanidade em Loki? Era patética a forma como ela tentava se humilhar de forma patética perante o deus à sua frente. Ele era um mentiroso nato, maldoso e manipulador. Nem naquele momento, a máscara dele caía.
— Você não consegue demonstrar uma mínima compaixão na morte de nossa mãe? — fechou as mãos em punho, furiosa. Se não houvesse uma barreira física, provavelmente ela promoveria uma agressão contra Laufeyson.
Ela detestava violência. Enxergava em Loki seus melhores aspectos; talvez, esta fora a melhor característica que herdara de sua mãe. Mas naquele momento, ele estava despido de qualquer bondade. Havia apenas fúria, ódio, uma violência descabida. A próxima fala do rapaz, entretanto, doera muito mais do que qualquer surra:
— Ela não era minha mãe. Muito menos sua.
Ela suspirou frustrada. Não haviam palavras suficientes para descrever o desprezo que tomou seu peito com a fala provocada pelo amado. Era frustrante aquele turbilhão de sentimentos simplesmente jogados na garota, deturpando sua visão de mundo. Não havia nada além da raiva que doía em sua alma.
— Eu te odeio! — gritou a plenos pulmões, com uma franqueza que não descarregava há tempos.
Aquele gesto não fora apenas por Frigga: fora pela prisão na Terra, pelas condenações que sofrera, as represálias, os olhares tortos que recebera. entregou a Loki a coisa mais valiosa que possuía: sua confiança. E ele simplesmente a descartou, como fazia com tudo que dava errado.
Loki finalmente encarou-a, levantando-se em meio aos tropeços, seguindo em direção a Freyadottir. Andou devagar, com passos calmos, notando as lágrimas evidentes em seus olhos — embora não demonstrasse o mínimo de compaixão pela loira.
— Estranha a forma como costuma expressar o desprezo que tem por mim, Freyadottir. — ele ironizou, com os olhos azuis tão gélidos quanto sua fala.
Aquele não era o Loki por quem ansiosamente suspirava. Era triste vê-lo em um estado tão deplorável, esgotado, sem sequer poder ajudá-lo. Não havia nada que Freyadottir pudesse fazer naquele instante; e de fato, Loki não merecia, de qualquer forma.
— Você está aí pela própria culpa, Loki. — a mulher espumou uma última vez apontando o dedo indicador em direção ao mais alto, impedida de tocá-lo apenas pela proteção da cela. — Não vou te ajudar dessa vez.
Ela finalmente virou suas costas, exausta. Caminhou em direção à saída do local, andando furiosamente em direção ao lado externo do castelo. Mas antes que se retirasse por completo, ouvira uma última declaração de Loki em sua direção, baixa e discreta:
— Eu não pedi sua ajuda.

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Thor finalmente encarou Odin com ternura. Havia uma calmaria nada usual em sua face, mas que o deus do trovão particularmente apreciava. Estava em paz consigo mesmo, pronto para seguir seu caminho e lidar com suas escolhas. Apesar da morte dolorosa de Loki, a qual presenciou inevitavelmente, Odinson tentava seguir em frente.
“Eu queria confiar em você” ele se recordara da admissão feita ao irmão, causando um sorriso amarelo em seus lábios. “Direi ao nosso pai o que você fez aqui hoje”. Sabia que não era isso que Loki queria; não era mais por Odin. Nunca fora, na verdade. Mas jamais deixaria que seu legado morresse daquela forma. Apesar dos defeitos, Thor nunca se vira sem Loki. O deus era uma das partes mais importantes de sua história.
— Mesmo que eu me orgulhasse do homem que meu filho se tornou eu não poderia dizer, isso ficaria apenas em meu coração. — Odin admitira, atraindo novamente a atenção do loiro, com um sorriso sucinto, diferente das outras vezes. Thor sentia orgulho quase que palpável na voz do progenitor. — Vá meu filho!
Thor apenas sorrira. Ele amava Asgard, mas também amava a Terra, Jane e as oportunidades que lhe foram concedidas. Ele amava ser um Vingador, amava ser um super-herói. Sua jornada era extremamente grandiosa e se submeter ao trono não estava nos planos. Pelo menos, por ora.
Obrigado, pai.
Thor finalmente saiu do Grande Salão, deixando para trás toda aquela jornada caótica que vivenciaram. Ele estava a buscar novos propósitos agora, e abençoado por seu pai, sentia-se mais poderoso do que nunca.
Exceto pelo fato de que aquele sentado ao trono, não era seu pai. O homem que estava ali sentado estava longe de ser o deus da sabedoria.
— Não… Eu agradeço.
A fisionomia antes do velho Odin, revelou-se apenas mais uma ilusão do notório Loki. Agora, o usual traje dourado, os cabelos negros e o sorriso malicioso faziam-se presentes, conforme o deus da mentira estava sentado ao trono.
Loki era um bom ator. Havia esquecido-se do quão bem podia interpretar alguém; ludibriar as pessoas era algo extremamente comum em sua rotina, mas naquela ocasião, fora muito mais divertido. Thor fora simplesmente tapeado pelo irmão, enganado por poucas palavras, deixando o que ele mais desejava livre: a ascensão e o poder.
Pobre Thor.
Você não se sente culpado em enganá-lo tanto, Laufeyson? — A voz doce de se fez presente, ao passo que ela caminhará em direção ao trono. — É realmente um tremendo cínico…
Loki encarou-a, observando-a com uma expressão beirando à uma incógnita. O vestido preto era extremamente minúsculo, valorizando cada curva sinuosa daquele corpo tentador. Os acessórios em ouro puro destacavam-se na pele bronzeada; os cabelos loiros estavam enormes, ondulados, perfeitamente penteados e brilhantes.
Sentiu-se momentaneamente arrependido por todas as atribulações que submeteu a mulher. As palavras que dissera tempos atrás lhe atormentavam sem parar; sabia que havia errado com , mas tentava se redimir. E isso já era algo diferente do que normalmente faria para outras pessoas.
Ela era especial e Loki sabia muito bem disso.
Ele pegara suavemente em sua mão, deixando um beijo ligeiro e gentil em seu dorso. sorriu, um pouco balançada pelo ato carinhoso vindo de Loki, olhando fixamente nas orbes azuis. Ele retribuíra, entrelaçando seus dedos com afetividade.
— Não sinto culpa alguma em poder viver meu glorioso propósito ao seu lado, .
Admissões verbais, confissões, não eram o estilo de Loki Laufeyson. Principalmente no âmbito amoroso, que deixava-o exposto e vulnerável. Mas após tudo que foi vivenciado por ambos, as tribulações, as brigas, prisões e separações que sofreram, eles queriam paz. Eles necessitavam da paz, apenas um pelo outro. Loki e eram o complemento perfeito e com o tempo, perceberam isso.
sentou-se em sua perna direita, cruzando as pernas. Loki a observou, retirando algumas madeixas loiras de sua face, conforme encarava-a profundamente. Sua mão dirigiu-se gentilmente até a curva de sua cintura, enquanto a outra repousou sobre sua coxa. O simples contato entre a pele de ambos, era capaz de causar choques elétricos por todo o corpo da mulher, parcialmente desnudo pela roupa.
Loki finalmente beijou-lhe, avançando contra seus lábios de forma lenta e gradativa. Não fora como das outras vezes que se tocaram amistosamente; sequer fora parecido como das vezes que fizeram um sexo rápido e necessitado, ansiando apenas pelo toque momentâneo. Aquele ósculo fora calmo, doce e conclusivo, com suas respirações ofegantes e carecidos um pelo outro. Finalmente estavam onde queriam estar: um com o outro, poderosos, no trono de Asgard. Ninguém era maior que eles, não havia nada acima deles.
— Ainda me odeia, Freyadottir? — Loki sussurrou, carregado em cinismo no seu tom de voz. O sorriso sacana em sua face indicava suas intenções com a pergunta descabida.
Ela apenas sorriu em retrospecto, sem dirigir-lhe uma palavra em resposta ao deus. Seria hipocrisia admitir que o odiava com um sorriso no rosto. estava genuinamente feliz, ignorando todo o caos que vivenciara até o momento. Só o agora importava e aquilo bastava.

All the things I did just so I could call you mine. All the things you did, well, I hope I was your favorite crime

2018, presente


fechou os olhos com força, sorrindo para si mesma com as lembranças que sua mente a levou, uma única lágrima escorrendo por seu rosto.
Talvez fosse verdade.
Talvez tudo tenha sido verdade.
E talvez, naquele momento, à beira da morte, fosse verdadeira a lembrança de uma vida.
O gosto terrível de sangue em sua boca a fez tossir algumas vezes e cuspir para o lado. Deitada no chão, sem conseguir sentir seu corpo responder a qualquer de seus comandos, abriu os olhos com certa dificuldade. Pela pancada que tinha levado, estava se julgando até que bem e com sorte por ter acordado. Seus olhos demoraram alguns instantes para focalizar novamente e ela se moveu ligeiramente, tentando apoiar-se de alguma forma para levantar-se. Mas não conseguiu. O macacão preto que vestia estava totalmente destruído e, por baixo dele, dezenas de machucados estouravam seu corpo, como nunca.
De todas as memórias e lembranças que teve até aquele momento, duas coisas chamaram sua atenção. A primeira delas é que nunca, jamais, tinha sequer estado em uma situação parecida com aquela. Asgard tinha sido destruída. Atacada e invadida, a maior parte de seu povo estava morta e, os que restaram vivos, navegavam pelo espaço em uma nave improvisada em busca de refúgio até serem, novamente, atacados. E ali estavam os deuses, os supostos protetores de Asgard, os dotados e poderosos, líderes de um povo, guardiões de uma cultura milenar invejável e intocada, que perecia bem diante de seus olhos.
nunca tinha vivido nada sequer parecido com aquilo. E, por isso, não conseguia saber como deveria reagir, como se sentir ou o que pensar. Como mecanismo de defesa, talvez, sua mente a levava constantemente para o passado, revivendo nela memórias que mal se lembrava de ter.
A segunda coisa que chamou sua atenção, entre o caos de sentimentos e memórias que estava tendo naquele instante, foi o fato de Loki ter aparecido na maior parte de suas lembranças. Como um protagonista de sua vida, lá estava ele nos momentos ruins e nos momentos bons, sendo vilão e sendo o amor que jamais o deixou saber. Nunca tinha se arrependido de nada na vida. De nada que fez, de nada que perdeu ou que viveu. Ao contrário, costumava ter muito orgulho de tudo que se metia, mas naquele segundo foi diferente.
Naquele segundo, pensando em retrospecto tudo o que tinha sido sua vida, se arrependeu de não ter dito a Loki como se sentia. E desejou, do fundo de seu coração, que mesmo sem proferir sequer uma única palavra sincera sobre seus sentimentos por ele, ele soubesse exatamente o que ela sentia.
Já era tarde demais para dizer qualquer coisa.
— Podem achar que isso é sofrimento — a voz de uma das criaturas no local falava calma, enquanto o barulho de seus passos podia ser ouvido ao fundo — Não, é salvação — a criatura parou de caminhar um momento — A balança do Universo tende ao equilíbrio por causa do seu sacrifício, pois se tornaram, até na morte… — engoliu seco, ouvindo o barulho de uma das lanças de outra criatura ceifar mais uma vida — …filhos de Thanos.
De onde estava, mais ao lado, conseguia ver Thor na mesma situação que ela. Deitado, extremamente machucado, ele parecia exausto e não conseguia se mover, apesar de estar acordado, como ela. estendeu sua mão para ele, mas o que veio em resposta foi bastante diferente do esperado por ela. A criatura enorme, talvez três vezes maior do que ela, e de pele arroxeada pisou em seu braço sem qualquer cerimônia e, no instante seguinte, a pegou pelo pescoço, a levantando.
— Eu sei como é perder — Thanos comentou sereno, arrastando — Ter a certeza de que está certo e falhar mesmo assim.
Sem forças para se livrar dele, para sequer se mover, ela tentou protestar, mas nada mais do que ruídos e gemidos baixos saíram de sua garganta. A passos lentos e despreocupados, Thanos a carregou até onde Thor estava e, do mesmo jeito que a pegou, puxou o deus do trovão do chão com a outra mão. Arrastando os dois por entre os corpos dos asgardianos mortos no chão, ele os carregou até onde outras criaturas os esperavam.
— É aterrorizante — Thanos continuou. Ignorando a dor insuportável que sentia, olhou para as outras pessoas à frente do titã, seus olhos caindo nos de Loki como costumavam fazer. Sem querer demonstrar o pavor que sentiu ao vê-la ali, ser carregada de qualquer jeito naquela situação, tão machucada, com Thor na mesma, ele engoliu em seco. Mas Thanos parecia saber exatamente com quem estava mexendo, exatamente quem estava atingindo — Deixa as pernas trêmulas. Mas eu pergunto: para que? — Thanos se aproximava de Loki a passos lentos e tranquilos. O deus da mentira estava cercado pelos Filhos de Thanos, prontos para contê-lo se fosse necessário — Tema, gente fugir, todos têm o seu destino. E o de vocês está aqui, porque vocês têm a mim.
Vestindo uma manopla dourada, Loki percebeu que ele tinha em sua posse uma única Joia do Infinito. Tinha usado ela para dizimar brutalmente o povo asgardiano, tinha usado ela para ir contra Thor e que o tentaram impedir. Sem nunca ter dito isso a ela, Loki admirava a paixão e a responsabilidade que a deusa da beleza tinha com seu povo e sabia o quanto perder qualquer um deles, para ela, era difícil. era fiel a seus próprios princípios, sempre foi e, descendo seu olhar até ela naquela situação, naquele momento, Loki sabia que ela sempre seria.
Mas só princípios e luta física não eram o suficiente para parar o poder de uma Joia como aquela, muito menos quando seu portador era um louco feito Thanos. Loki tinha que pensar em algo, tinha que dar um jeito de tirar e seu irmão dali, antes que o destino deles fosse o mesmo das centenas de pessoas cujos corpos estavam jogados ao redor.
— Você fala demais — Thor murmurou, engasgado com o sangue em sua boca.
— O Tesseract — segurando as cabeças de Thor e , ajoelhados um de cada lado de seu corpo, Thanos os força a ficar de frente e encarando Loki — ou a cabeça de seu irmão. — riu cínica. Aquela era uma troca completamente falida. — Imagino que tenha uma preferência.
— Ah, eu tenho — Loki o encarou sério. Os poucos machucados de seu rosto sendo notados por , que arfava baixo pela dor que sentia — E não é ele.
Thanos pareceu ficar desconcertado por um momento. Não estava esperando por aquela resposta e nunca tinha dado nada para as histórias que ouviu de Loki. Sempre o achou um covarde mimado, não seria difícil trocar nada com ele. Mas aquela não era a resposta esperada.
— Não sou de negociar, mas creio que valha a pena nesse caso — Thanos empurrou Thor com descaso, o fazendo cair deitado de bruços no chão e pisou em suas costas, o imobilizando. Com a mão que o segurava antes, ele segurou e aproximou do rosto dela a joia na manopla — O que me diz dessa aqui? O Tesseract ou a vida da aclamada deusa da beleza?
Loki sentiu seus olhos encherem-se de lágrimas, ao tempo que uma ira brutal crescia em seu peito. Não podia negociar a vida de , em hipótese alguma aquilo deveria estar acontecendo. A mulher olhou para ele dolorida, engolindo o choro em seco e sorrindo triste, leve. Sabia qual era a resposta dele e sabia o que ele faria naquela situação, apesar de minimamente parecer ponderar. O propósito vinha sempre acima de tudo. E de todos.
— Mantenho a minha preferência. — segurando as lágrimas, Loki respondeu o mais firme que pode. Sem tempo a perder, incrédulo com aquela postura desprezível, Thanos apertou a manopla contra a testa de , liberando nela toda força da Joia do Poder. Loki assistiu ela gritar alto de dor, fechando os olhos por longos minutos enquanto era torturada. Ele se manteve firme, engolindo o choro pesadamente, querendo matar todos eles ao redor, tirar ela dali a qualquer custo. não aguentaria por muito tempo, estava debilitada e fraca, ele não podia perdê-la.
— Já chega, chega! — ele gritou cansado, implorando para que pudesse parar de sofrer. Thanos cessou a tortura e encarou o deus com curiosidade, esperando que ele fizesse qualquer movimento.
— Nós não estamos com o Tesseract — desesperado, Thor gritou na sequência, tentando se soltar dali para ajudar — Ele foi destruído.
Mais uma mentira que Loki havia contado. A mentira que mais havia lhe custado em toda sua vida, o preço que ele nunca poderia ter pagado. E, se soubesse, teria feito tudo, absolutamente tudo, diferente. Naquele instante, contudo, acreditou que estaria fazendo uma troca justa. Que salvaria e que sairiam dali se entregasse ao titã o que ele havia pedido.
Loki esticou ligeiramente sua mão para o alto e, em segundos, fez surgir, como em uma projeção, o Tesseract, ao tempo em que Thor murmurava "você não toma jeito, meu irmão". Penoso, contrariado e enfurecido por perder justamente a única coisa pela qual tanto lutou em sua vida para conseguir, ele deu alguns passos à frente e entendeu o objeto para Thanos, enquanto dizia:
— Eu lhe asseguro, meu irmão: o sol brilhará sobre nós outra vez.
— Sobre vocês, pode ser — Thanos respondeu calmo, pegando pelo pescoço ao passo que Loki se aproximava — Mas para ela, não posso dizer o mesmo. — Loki parou completamente por um instante, segurando o cubo em suas mãos com tanta força que poderia quebrá-lo. Sem entender exatamente o teor daquelas palavras, com o coração acelerando a cada fração de segundo enquanto assistia a única mulher que tinha amado em toda sua existência ser puxada para cima pelo pescoço, ele estendeu a outra mão em direção ao titã, mas seus aliados se aproximaram por trás, apontando suas lanças em suas costas. Estavam encurralados em todos os sentidos.
— Você já tem o que você quer, solta ela — rangendo os dentes, Loki ordenou, matando aquela criatura do pior jeito possível em sua mente. tentava tirar a mão dele de seu pescoço, que parecia apertá-la cada segundo mais.
— A maior beleza em se descobrir que amamos alguém é o fato de que só descobrimos, verdadeiramente, quando estamos prestes a perder tudo — Thanos falou baixo, olhando .
— Solta ela — o deus repetiu furioso, as lágrimas não mais sendo seguradas, escorrendo pelo seu rosto enquanto encarava chorar silenciosamente.
— Eu sei como é perder quem mais amamos — Thanos a sufocou ainda mais — Tive que perder pessoas para chegar até aqui e, por isso, admiro sua coragem em fazer escolhas por propósitos.
já não sentia mais o ar entrar em seus pulmões e seu corpo parecia formigar, entorpecido. Loki a chamou algumas vezes seguidas, mas ela não conseguia responder. A mão pesada e firme de Thanos em seu pescoço a impediam de emitir qualquer som. Estava pálida, o dourado e o sol que sempre emanava dela, que ele tanto amava, já não estavam mais lá e os cabelos loiros pareciam esbranquiçar-se. Loki sentiu uma dor violenta tomar conta de si. A risada de ecoou em sua mente, o sorriso que ela lhe dava sempre, o jeito que passava as mãos pelos cabelos, o toque carinhoso, os beijos que trocaram.
O baile, as provocações, as brincadeiras de criança, a companhia silenciosa sempre que ele precisava. Os objetos que roubaram, o jeito que ela dançava, os olhos cheios de vida e de intensidade que ali já não estavam mais. O cheiro do perfume, o sono confortável, os dias tormentosos e a companhia de uma vida que ele nunca mais encontraria. Chorando copiosamente, enfraquecido como nunca se sentiu, Loki deixou-se ajoelhar no chão, chamando por ela entre as lágrimas que engrossavam a cada silêncio dela, a cada milésimo de segundo.
Queria ele estar partindo.
E estava de certa forma. Com morria também a parte mais bonita de sua vida. Morria o amor.
Consciente do que acontecia, pensou em sua mãe por um segundo. Se perguntou se poderia, finalmente, reencontrá-la e teve medo de estar sozinha.
— Mas eu não gosto de enganações — Thanos voltou a falar — e não gosto de injustiças. Você teve duas escolhas, duas vidas, e eu peço uma única contrapartida. Você, asgardiano, abriu mão deles e vou dar o meu recado.
— SOLTA ELA AGORA! — Loki berrou em plenos pulmões, desesperado, angustiado, seus olhos presos na mulher — ? !
— Como quiser — Thanos soltou de uma vez, a fazendo cair no chão de qualquer jeito — Veja bem o que suas trapaças fazem. Sem mais enganações.
A luz que normalmente reluzia pelas orbes azuladas de Freyadottir, agora estavam apagadas, ofuscadas pela frieza da morte repentina. Tão jovem, tão bela, sem sequer conhecer a própria história. Lá estava ela, descartada por uma frieza cruel do titã louco.
Aquela frase final foi o decreto para qual fora destinada. O corpo daquela que um dia Loki amou, adorou, beijou, sentiu e se perdera nas curvas, não era nada mais, agora, além de um corpo morto e sem alma. Toda a humanidade que um dia habitou a alma de Freyadottir simplesmente se foi, como se toda a luz do universo tivesse sido, repentinamente, apagada. Para sempre.
O grito silencioso de Loki fora a coisa mais dolorosa de toda aquela situação. Não poder estar ao lado dela, defendê-la e ampará-la, não poder naquele momento e nunca mais fazer absolutamente nada por ela, com ela, doía como o inferno. Nenhum ferimento físico era capaz de sequer comparar-se ao que sentia seu coração, completamente despedaçado, caótico, atordoado e vazio. Estava quebrado, irado, incompleto. E agora, sabia que não havia mais volta.
A vendo fechar os olhos pela última vez, em seu último suspiro de vida, Loki teve a certeza de que foi, e sempre seria, o seu crime favorito.



Fim.



Nota da Jú S.: Que alegria poder fazer parte da sua jornada como escritora, Tha. Favorite Crime me deu um tempo maravilhoso de aprendizado, de desenvolvimento de novas técnicas de escrita e uma aventura, e tanto, em me desafiar a escrever cenários e personagens tão complexos e incomuns. Costumo dizer que as partes boas de minha vida só são boas porque têm as pessoas certas nelas. E aqui vai mais um exemplo.
Obrigada por ser o Loki do meu Thor! ❤️
E obrigada pelo convite em escrever essa obra contigo, pelo tempo partilhado e pela amizade que amo. Você é incrível!
E para todos que leram FC, obrigada por nos darem uma chance, por conhecer esse universo um pouco diferente e espero que tenham se apaixonado por esse casal como eu me apaixonei, depois de escrevê-los.
Um beijo, Ju S. :) x

Nota da Thaís Santos: Oiê! E aí, o que vocês acharam dessa colaboração?
Gostaria de agradecer imensamente a Júlia por ter colaborado comigo nessa linda trajetória que foi favorite crime. Eu simplesmente amei unir as coisas que mais adoro: música pop e Marvel, com o drama que só a Jú poderia proporcionar!
Espero que tenham apreciado a leitura até aqui, como amei narrar cada pedacinho do amor do Loki e da . Não deixem de comentar o que acharam, é muito importante para nós!
Muito obrigado a vocês pela leitura e a Júlia pela parceria! Beijo!




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