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Finalizada em: 05/12/21

Capítulo 31 - Caindo na rotina

As semanas seguintes ao aniversário de pareceram uma eterna comemoração, e com motivo. Ele era o artilheiro isolado não só do time, mas do campeonato nacional e também do intercontinental, ele era quase como uma celebridade no mundo esportivo, toda semana aparecia em um programa esportivo diferente, podia se dizer que ele era o jogador do momento no Brasil. Seu rosto estampado em jornais da Argentina e Chile lhe rendiam uma atenção muito maior do que estava acostumado a receber e ele estava trabalhando mais do que nunca, quase não tendo tempo de se quer estar em casa, o que ele não tinha ideia de que poderia ser um problema se ele não vigiasse. , se sentindo um pouco só por passar a maioria dos dias dormindo sozinha, optou por passar alguns dias na casa dos pais para ter alguma companhia, além de ter seu antigo quarto de volta.
Outro fato importante para estar em casa era a saúde de seu pai, Elias. A hipertensão não era uma novidade, mas estava mais alterada do que o normal, mesmo que ele continuasse com sua medicação rotineira, e ela preferia não deixá-lo sozinho, pois sua mãe não saberia como agir caso houvesse uma emergência.

- , estou te achando um pouco triste hoje. Aconteceu alguma coisa? - ele perguntou enquanto servia, voluntariamente, o jantar dele, já que ele se sentia muito cansado.
- Só estou cansada, pai, é impressão sua - ela sorriu e se virou para ir até o fogão pegar comida para si também. - Hoje foi um dia muito longo de trabalho.
- E você quer que a gente acredite nessa história furada, minha filha? - Rose, que já estava jantando, perguntou enquanto voltava para a mesa. - Até entendo você passar uns dias aqui porque o está concentrado no CT, mas parece ter mais coisa aí.
- Não brigamos, nem nada, eu entendo que ele está trabalhando muito, a tabela está uma loucura. Só sinto ele um pouco distante, mas sei que não é de propósito - ela soltou um longo suspiro, estava de fato chateada. - Espero que melhore quando o campeonato acabar.
- Não que eu esteja defendendo ele, , mas quando você jogava, também estava distante. Acredito que em algum ponto entre uma carreira como a dele e o relacionamento, isso possa acontecer. Vocês vão ficar bem - Elias sorriu e esticou a mão para pegar um torresmo, mas recebeu um tapa ardido da esposa.
- Nem pensar! Está afim de morrer?
- Nada de frituras, pai, seu prato está verde e é por um bom motivo - repreendeu, pois ela própria havia preparado os legumes para o jantar.

⚽🖤📱

O Allianz Parque estava lotado para receber Palmeiras e Corinthians pelas quartas de finais da Libertadores. A torcida do time da casa compareceu em massa para apoiar, e não tinha torcida visitante, como mandava a lei, exceto por e Gabriela, que estavam infiltradas bem atrás na torcida atrás do banco de reservas do Corinthians. Gabriela usava uma jaqueta do time alviverde, afinal, era o seu time de infância e ela poderia se misturar muito bem com a touca também verde e branca, já , tremendo de frio, usava touca e cachecol branco, e uma jaqueta verde da adidas emprestada por Gabriela para que ela pudesse se misturar com os torcedores. Sabia que se fosse descoberta, perderia seu emprego e provavelmente a vida, mas o risco valia para acompanhar aquele jogo de perto, afinal, o jogo de ida em Itaquera ficou no 0x0 e agora os dois times tinham que buscar o resultado. Ela estava sob o efeito de calmantes, caso contrário jamais conseguiria estar ali.
Ela viu o momento em que os dois times entraram em campo e se posicionaram para o hino nacional, mas o que mais chamou a atenção foi a braçadeira de capitão no braço de , o que era uma novidade, visto que seu último jogo como capitão mais de um ano antes não tinha dado certo. Ela torcia para que daquela vez ele mantivesse a calma e então tudo ficaria bem. parecia concentrado e tranquilo, estava treinando o seu emocional há tempos e podia sentir a melhora, mas naquele jogo em específico, iria exigir muito mais.
Ele cumprimentou cada um dos jogadores adversários e tirou a sorte com o capitão palmeirense, tendo a oportunidade de escolher o gol do lado sul, como gostava de começar a partida, então pouco depois a bola estava rolando para o derby paulista. A princípio, começou como um jogo rápido, mas sem nenhum gol logo nos minutos iniciais. As faltas e entradas duras mexiam com os nervos dos atletas de ambas as equipes, mas estava exercendo a função de capitão e acalmando o seu time quando uma briga estava prestes a surgir. Ele estava sendo participativo de todas as formas, e a glória quase veio quando um de seus chutes acertou o travessão e o zagueiro mandou para escanteio. passou as mãos pelo rosto desacreditado, mas então foi até a bandeira do lado esquerdo para realizar a cobrança do escanteio.
Ele tomou distância para um chute longo, o goleiro defendeu na primeira tentativa enquanto se infiltrava não grande área. Luan o avistou livre e cruzou, se adiantou e cabeceou para dentro do gol sob os protestos dos adversários alegando que estava impedido. O time foi comemorar com ele para o felicitar, mas a alegria durou pouco, pois o VAR entrou em cena para verificar a condição do gol.

- Isso é ridículo, eu não estava impedido - murmurou para qualquer um que estivesse perto dele, e cuspiu no gramado.
- Eu acho que estava - Luan disse receoso e o ponta olhou para ele. - Você passou na frente do Felipe Melo que era quem te dava condição.
- Eu não passei - insistiu.

A demora da análise já estava deixando a torcida e os times irritados. Sobre vaias, o árbitro conferia no monitor o lance, então após chegar a uma conclusão, depois de cinco minutos de bola parada, ele optou por anular o gol, fazendo com que a torcida comemorasse como se fosse uma vitória. , sentada em seu lugar, estava em estado de choque, com as mãos no rosto, incapaz de demonstrar alguma reação.

- Disfarça melhor - Gabriela disse entre dentes enquanto aplaudia.
- Obrigada, São Marcos, por nos proteger dos gambás - disse alto o suficiente e Gabi riu, então ela continuou em um sussurro. - E vai tomar no cu, juiz.

No gramado, o jogo retomou após algumas reclamações dos corinthianos, mas já sentia a cabeça esquentar. Precisava manter a calma para alcançar o gol, ele confiava no próprio potencial e também na habilidade e concentração dos seus colegas, era apenas questão de tempo, pois os adversários já estavam estravando o estresse.
Na volta para o segundo tempo, foi exigido mais dos dois goleiros que faziam defesas exorbitantes que enlouqueciam os torcedores que compareceram naquela noite de quarta-feira do começo de agosto. tremia, fosse por frio, ansiedade ou medo sempre que um desentendimento acontecia no campo e estava no meio, mas felizmente ele estava em uma noite inspirada e era o primeiro a separar qualquer sinal de briga, além de estar apresentando o seu melhor futebol.
Mas mesmo com todas as tentativas, não foi o suficiente, e a classificação para a semifinal seria decidida nos pênaltis. optou por não olhar, afundou o rosto nas mãos e deixou que Gabriela narrasse para ela. As três primeiras cobranças para cada um foram convertidas em gols, e agora Lima ia para a quadra cobrança palmeirense.

- E o otário do Cássio pegou - Gabi fingiu se lamentar. Olhou para e viu os ombros dela se movimentando, entendeu que ela havia começado a chorar. - ... Relaxa, eles podem errar. Aquele é um bosta.

Mesmo nervosa, tremendo e chorando, ainda conseguiu rir da amiga. A quarta cobrança de pênalti corinthiana foi convertida por Luan, e depois Gustavo Gomez empatou para o Palmeiras. Cabia ao o gol da classificação.
O camisa 7 ignorou as vaias, ajeitou a bola e tomou a distância necessária. Ao apito do árbitro, chutou com frieza. A bola bateu no travessão de cima e entrou, o que o deixou desacreditado. Não aguentou o próximo peso e caiu de joelhos no chão enquanto o time vinha comemorar com ele, um caindo sobre o outro, e tendo certeza de que morreria sufocado ali. Mesmo depois continuou ali ajoelhado, estava chorando, não podia acreditar que tinha conseguido fazer aquilo. Estava sonhando acordado, tinha certeza.
estava vendo e chorando junto. Fosse seu lado torcedora, ou qualquer outro, o calmante já não era o suficiente para que ela ficasse tranquila. A adrenalina que percorria o seu corpo naquele momento era similar à dos jogadores. Eliminar um rival era bom, mas eliminar na casa dele não tinha preço, e o gol da classificação saindo dos pés de tornava tudo ainda mais utópico. Ele, mais do que ninguém, merecia aquilo.

- Vamos embora - Gabriela colocou a mão no ombro dela.
- Mas...
- Agora, - ela disse séria. Ficar já não era mais seguro, alguns torcedores estavam revoltados.

concordou, secou as lágrimas e se levantou, então juntas tentaram sair o mais rápido possível do estádio. Andaram em passos largos e rápidos até o estacionamento e Gabriela assumiu o volante, visto que não estava em sua melhor condição emocional para dirigir. Gabi trancou as portas e respirou fundo algumas vezes antes de ligar o veículo e dar partida para fora do estádio.

- Meu pai me enviou uma mensagem, acho que o cara de trás viu o Bruno no meu papel de parede quando a tela acendeu, ele me olhou estranho - ela finalmente se explicou. - Eu fiquei apavorada.
- Não dá para confiar, especialmente neles, você fez bem, ou eu ainda estaria lá chorando igual uma idioma. Bem, eu ainda estou chorando - riu, de fato algumas lágrimas ainda escorriam pelo rosto dela.
- Eu posso imaginar como você está se sentindo.
- Não acredito que eles conseguiram, Gabi, não acredito que o conseguiu.
- E em algum momento você duvidou dele?
- Não... Quero dizer, ele é nervosinho, não é? Ele poderia perder a cabeça, mas deu tudo certo, ainda bem... - ela soltou um suspiro aliviado e sorriu. - Já pode tirar essa jaqueta, estamos na semi!
- Dá um tempo, , tô morrendo de frio - Gabriela disse rindo porque tirar a jaqueta por puro clubismo estava fora de questão no frio de São Paulo.

⚽🖤📱

voltou para a casa dos pais após o jogo, recusando o convite de Gabriela para que pedissem pizza, alegou que não queria atrapalhar o momento de alegria dela e Bruno, e por isso achava melhor voltar pra casa dos pais, já que se quer sabia se voltaria pra casa ou permaneceria no CT. Ela também não se deu o trabalho de perguntar, já tinha desistido de ser insistente.

- Cheguei - ela anunciou ao abrir a porta. Seus pais estavam na sala, e sua mãe tinha lágrimas nos olhos. Rose se levantou do sofá e correu para dar um abraço na filha.
- Graças a Deus! Graças a Deus!
- Hum... Tudo bem com vocês? - perguntou quando ela a soltou. - Aconteceu alguma coisa?
- Ficamos preocupados com você, ! Odiamos quando você vai naquele estádio, é muito perigoso!
- Ei, relaxa. Eu tô aqui, mãe, fui embora logo depois que o jogo acabou, não aconteceu nada.
- Teve emboscada, briga de torcidas, sua mãe estava preocupada, mesmo eu insistindo em dizer que você estava bem - seu pai disse.
- Eu entendo a preocupação de vocês, sério, mas até parece que não me conhecem, não é? Acham mesmo que eu ia me envolver em briga de torcida? Eu só queria ver o jogar... E agora que eu já vi, estou de volta e a senhora já pode parar de chorar, dona Rose. Eu tô ótima.
- Eu avisei - Elias se levantou, mas não estava se sentindo bem, então se sentou novamente. foi até ele.
- Pai, o que foi?
- O jogo foi bem emocionante, não tenho o mesmo coração de vinte anos atrás - ele riu, tentando descontrair para aparentar estar bem, mas ela não acreditou. - Eu tô bem, , só preciso me deitar um pouco.
- Você deveria ir para o hospital, pai, já está ruim há dias! Isso é perigoso, sabia?
- Se eu não melhorar, então eu vou, está bem? Mas agora eu preciso ir dormir. Um corinthiano classificado não quer guerra com ninguém. Tenham uma boa noite.

ajudou seu pai a subir e ir para o quarto, e depois foi para o seu, tomou um banho demorado e vestiu o pijama que trouxe, então se deitou e só então pegou seu celular e viu que tinha algumas mensagens de , sendo a última de instantes antes dizendo que havia acabado de chegar em casa. estava tentando, mas sabia que não conseguia manter a postura de durona por muito tempo, e acabava cedendo em algum momento. Quando se deu conta, estava ligando para ele.
Por um lado, tinha suas razões para estar um pouco chateada, mas por outro, tentava entender que ele estava vivendo um momento importante da carreira. Estava completamente dividida, mas seu lado racional achava que uma conversa seria a melhor maneira de resolver aquilo de uma vez por todas.

- Oi, classificado - ela disse quando atendeu e ele riu.
- Oi, amor, que bom que você foi no jogo. Deve ter sido difícil ficar na torcida rival.
- Foi a pior experiência da minha vida, , mas valeu a pena no final. Estou feliz com o time.
- Que bom, eu estava preocupado com você... Mas a propósito, você não vai voltar pra casa?
- Eu acho que a gente precisa conversar sobre isso, . Eu entendo o seu trabalho mais do que ninguém, mas... Bom... Eu estava passando muito tempo sozinha, dormindo sozinha na sua casa.
- É a nossa casa, .
- Não, eu sei que não é, mas não é esse o ponto... Como eu falei, eu entendo totalmente essa parte, mas achei melhor passar uns dias com os meus pais.
- Eu sei que tenho andado meio avoado e ausente nas últimas semanas... Me desculpa, não é você, eu não quero parecer um babaca... Volta pra casa hoje, .
- , já é uma hora da manhã, não dá pra eu sair.
- Então fica acordada, eu tô indo aí. Até daqui a pouco.

desligou e ficou olhando para a tela do celular por alguns segundos. As mudanças de humor dele já não eram nenhuma surpresa para ela, até sabia lidar muito bem, mas ainda a fazia questionar como ele conseguia, e mais frustrante ainda era saber que ela não conseguia resistir, mesmo que tentasse muito, como estava fazendo nos últimos dias. sabia que não importava quanto tempo gastasse construindo muros altos ao seu redor, isso não funcionava com .

- Você deveria estar dormindo! - disse após abrir o portão quando ele chegou. Ele a abraçou e lhe deu um beijo rápido.
- Eu vim preparado - mostrou a mochila nas suas costas e ela riu, não podia acreditar.
- E quem disse que você pode dormir aqui?
- Ah, é verdade, esqueci que você é uma adulta de vinte e cinco anos que ainda pede autorização dos pais pra sair com o namorado. Me perdoe.
- , você é ridículo.
- E o que vem depois? Eu não posso dormir na cama com você porque não somos casados, vou ter que dormir no sofá, mas tudo bem, eu faço esse esforço.
- Para com isso! - ela riu novamente enquanto dava passagem para ele entrar. - E sobe sem fazer barulho, os meus pais já estão dormindo.
- Que emocionante, parecemos dois adolescentes - disse enquanto subia as escadas para o andar de cima.
- Realmente, porque você deixou uns dez anos lá no estádio e veio aqui só com quinze, não é? - eles entraram no quarto dela e fechou a porta.
- Que besteira, se fosse assim, eu não poderia dirigir - ele chacoalhou as chaves do carro na frente dela e depois guardou na mochila.
- Amor, é sério, você nem tinha que estar aqui, e eu deveria estar furiosa com você - se deitou novamente enquanto observava trocar de roupa.
- Mas você está?
- Só um pouco, não completamente. Você vai precisar de mais que um corpinho malhado pra me impressionar - se aproveitou do fato de ele estar trocando o moletom do clube por uma camiseta lisa e ele riu. - Se tivesse uma barriguinha de cerveja pra eu deitar a minha cabeça, talvez fosse mais fácil.
- Eu não posso fazer isso, mas vou tentar compensar minha ausência de outra maneira.
- Fazendo gols dentro de campo?
- E fora também, só golaços - terminou de se vestir e foi se deitar ao lado dela.
- Só se você perdeu o juízo - se desviou quando ele tentou beija-la. - Aqui não, .
- , eu ainda tenho um pouco de lucidez e sei que não estamos na nossa casa, eu não ia tentar nada - ele riu e se virou enquanto apagava a luz do abajur do seu lado da cama. - Então boa noite, né? Se você disse que não, então é não.

desligou o abajur do seu lado também, e por mais que não tivesse coragem, seria incapaz de recusar um beijo, ainda mais depois de dias sem se verem. estava de bom-humor, o que não era comum ultimamente, e ela não poderia deixar passar um momento de descontração como aquele. Ela se virou na cama e esticou o braço para que seus dedos tocassem o rosto dele, sentindo os fios grossos da barba por fazer roçando contra a sua pele. Não podia ver porque estava escuro, mas percebeu que ele se virou para o lado dela e foi questão de segundos para que os lábios dele se pressionassem aos dela em um beijo que começou lento, mas que não demorou para se intensificar. mordeu os lábios quando ele começou a beijar o seu pescoço ao mesmo tempo que a mão entrava por debaixo da camiseta do pijama, tocando o seu seio esquerdo. Seu corpo todo se arrepiou e ela conteve um gemido no qual percebeu.

- Senti falta disso, sabia? - ele sussurrou contra o pescoço dela. - De te deixar assim.
- E eu ainda nem tô molhada - respondeu no mesmo tom de voz e ele riu, deslizando sua mão pelo corpo dela, parando em baixo, na sua intimidade, por cima do tecido do short. - Ai, que merda... a gente não pode.
- Mas a gente quer, e eu sei como você gosta - começou a movimentar os seus dedos devagar e mordeu os lábios. Quando ele tentou colocar sua mão por dentro do short, ela não deixou, embora quisesse. Ao invés disso o puxou para um beijo e se colocou por cima dele rapidamente, rangendo a cama.
entendeu o recado, então retribuiu ao beijo, entendendo que era o máximo que teria naquela noite.
- Você diz que não, mas é difícil não ficar duro com você em cima de mim desse jeito - ele disse entre um beijo e outro, o que fez afastar o seu rosto do dele para responder.
- Juro que, se meus pais ouvirem alguma coisa, vocês nunca mais vão me ver, é sério, cala a boca.

Eles retomaram o beijo e tentou se conter o máximo que podia quando ela o provocou, indo e vindo devagar.

- Caralho, , não faz isso - ele sussurrou e gemeu baixo em seguida quando ela rebolou. - Porra.

Sentiam falta um do outro, mesmo sabendo que aquilo não iria mudar por enquanto, e por mais que quisessem muito passar de meros beijos ou toques, sabiam que não poderiam, ao menos não estando ali.

- Você vai voltar pra casa? - perguntou ao afastá-la para o lado quando acharam melhor parar e ele deitou de barriga pra cima.
- Não faz muito sentido eu voltar e ficar sozinha.
- ...
- Eu entendo, , você sabe que eu entendo melhor do que ninguém, mas eu prefiro ficar aqui enquanto isso.
- Eu não sabia que esse ano ia ser tão louco, eu queria que fosse diferente e eu tivesse mais tempo, mas...
- Para, deixa isso pra lá, eu vou voltar pra casa.
- Pra nossa casa.
- Já te falei o que eu acho disso.
- Teimosa - ele riu e ela concordou, não gostava de dizer que o apartamento era dela também, pois ela sabia que não.
- Vou voltar com uma condição.
- Qual?
- Só se você não amarelar contra o Grêmio. Se é seu ex time, tem que fazer gol.
- Como é que é? - ele acendeu a luz do abajur e se virou pra ela. - Você acha isso? Que eu vou entregar assim? Que tipo de profissional eu seria?
- Eu não acho nada, sou sua maior fã, espero que você se saia bem.
- Certo... Boa noite, então - ele apagou a luz de novo e se virou para o outro lado.
- ...
- Boa noite, .

Imediatamente se arrependeu, tentou parecer descontraída, mas deveria ter imaginado que ele se sentiria ofendido com a brincadeira, afinal, estava vivendo um bom momento na carreira e claramente se esforçando para dar o seu melhor. Antes de jogar para si, estava jogando para o time, como tinha aprendido recentemente, e ser questionado assim pela sua própria namorada não era exatamente o que esperava ouvir.

- Me desculpa - disse após algum tempo se remoendo.
- Deixa pra lá - respondeu já um pouco sonolento, mas não ia realmente deixar pra lá.
- , é sério...
- Depois a gente conversa, ... Boa noite.

Ele não iria brigar, já esteve errado vezes o suficiente e não queria estar errado mais uma vez. Não era como se pretendesse terminar ou algo do tipo, mas estava chateado o suficiente para se arrepender de ter ido para lá. Se fosse qualquer um, ele não se importaria, já estava acostumado a ser cornetado, mas ouvir da própria namorada soava como uma ofensa, quando na verdade, o apoio dela era o mais importante.
E ele não queria errar e decepcionar a todos outra vez.

⚽🖤📱

estava esvaziando o seu armário, não podia acreditar no que tinha acabado de acontecer. Depois de anos no clube, havia sido demitida repentinamente e sem um motivo forte, tendo a justificativa de que estavam reduzindo custos e outros funcionários também foram desligados. Ela sabia que não era um bom momento financeiro, mas estava sem palavras para expressar sua frustração e por isso foi embora sem olhar para trás. Pensou em ir pra casa de , mas certamente não era o momento mais apropriado pra isso, pois ele se quer tinha falado com ela naquele dia, sinal de que estava chateado, então voltou pra casa dos pais. estava frustrada com tudo, se quer tinha um lugar para chamar de seu, e agora sem emprego, não poderia alugar um quarto para morar. Para fechar, seu relacionamento estava em crise, tudo o que ela precisava. Ela era uma mulher de vinte e cinco anos desempregada, sem casa e com um namoro indo aos trancos e barrancos, muito diferente da menina promissora que era durante seus anos como jogadora. O que estava acontecendo, afinal? não sabia o que mais poderia dar errado.

- , está tudo bem? - seu pai perguntou quando ela chegou e percebeu que a filha estava chorando.

Poderia estar tudo uma grande merda, mas ela ainda tinha seus pais ali. Desabou sem se importar com os julgamentos, eles não iriam apontar a idade dela em sua cara, então se permitiu chorar e por pra fora o que estava sentindo, toda a frustração consigo mesma, e só depois de chorar muito, conseguiu explicar o que estava acontecendo.

- Eu só queria que as coisas dessem certo uma vez na vida, só uma vez - ela fungou enquanto tentava secar as suas lágrimas. - Eu não tenho um lugar pra mim, minha carreira foi ridícula, perdi o meu emprego, meu relacionamento está pior a cada dia... Eu desisto.
- , cada um tem o seu tempo...
- E o meu vai ser quando, mãe? Quando for tarde demais? É tão difícil as coisas darem certo? Eu não tenho mais nada!
- Você ainda tem a gente.
- Eu sei, pai, obrigada - ela deitou sua cabeça no ombro dele como fazia quando era criança.
- Por que você não vai tomar um banho? Eu vou preparar o jantar pra nós - Rose sorriu docilmente e concordou enquanto se levantava do sofá.

Ela foi até seu quarto para pegar uma troca de roupa e depois foi para o banheiro. Deixou a água quente escorrer pelo seu corpo e chorou muito mais, deixando as lágrimas se misturarem com a água, só queria sumir da vista de todos, já não via mais uma solução para fazer as coisas darem certo e nem queria continuar tentando. Estava sempre feliz pelas conquistas dos seus amigos e isso não mudaria, mas ao menos uma vez na vida queria que fosse com ela também.
Quando saiu do banho, ela desceu novamente e teve uma agradável surpresa no meio de todo aquele caos. Tobias estava lá para lhe fazer uma visita, o que fez ela se sentir um pouco melhor. Também tinha ele, seu melhor amigo para a vida toda, ele também não iria a lugar nenhum, sabia que poderia contar com Tobias sempre.

- Me disseram que alguém precisava de um abraço - ele abriu os braços pra ela e se deixou ser envolvida. - Seus pais me contaram.
- Alguém sabe? O sabe?
- Não.
- Ótimo, não conta pra ele, por favor - ela disse ao se afastar. - Prefiro que ele saiba por mim quando nos resolvermos.
- Vocês brigaram de novo, ?
- Mais ou menos, não foi uma briga, só fui infeliz nas palavras e ele não gostou... Basicamente chamei ele de pipoqueiro, ele está chateado com isso.
- Eu vim aqui pra te defender e você me solta uma dessas, ?
- Não foi de propósito, Tobias! Está tudo uma grande merda, não tenho um minuto de paz!
- Está bem... Eu não vim aqui pra brigar com você, vim te dar apoio moral e é isso vou fazer enquanto jantamos, porque eu amo a comida da sua mãe.
- Você só veio pela comida, eu sei - ela disse enquanto caminhavam na direção da cozinha.
- Calúnia!
- Tá bom, Tobias, vou fingir que acredito e a gente pode conversar como pessoas normais e você me dá o tal apoio moral que falou, porque realmente tô precisando hoje.

⚽🖤📱

O líder do campeonato recebeu o Grêmio em casa. Era um jogo especial, era o reencontro de com seu ex time, mas já fazia tanto tempo que ele não sentiu tanto quanto achou que sentiria. Estava tranquilo, cumprimentou seu antigo treinador com um abraço caloroso, mas só, já que Cebolinha não estava mais no time, foi vendido ao Benfica. não tinha com o que se preocupar, não tinha nada a temer, seu desempenho dependia apenas dele e seu emocional estava bom.
O primeiro tempo foi de domínio corinthiano, sendo que e Luan faziam uma excelente partida, estavam muito bem entrosados e sem qualquer problema fora do campo. Conseguiam enxergar um ao outro na grande área e hora ou outra desconcertavam os zagueiros gremistas com suas jogadas e tabelas ensaiadas, como deveria ser há muito tempo, mas que por imaturidade dos dois, não era possível. Felizmente, o passado era apenas passado, e o presente era um gol de com assistência de Luan aos quarenta e sete minutos do primeiro.
Eles comemoraram o gol juntos e agradeceu pelo cruzamento que recebeu para finalizar. Foi inevitável para os dois olhar para o banco de reservas do Grêmio para ver se Renato demonstraria alguma reação, é óbvio que ele não faria, mas alguma coisa no olhar do treinador dizia que ele estava estranhamente orgulhoso dos dois jogadores trabalhando em equipe.

- O próximo é meu - Luan disse enquanto voltavam para a posição e riu.
- Vou ajudar com isso! - respondeu bem humorado.

Foi necessário apenas uma única troca de passes para que o juiz encerrasse a primeira etapa. Apesar do clima bom no vestiário, o treinador corinthiano foi bem direto quando disse que não poderiam se contentar com o placar de 1x0 e precisavam buscar, pelo menos, o segundo gol no restante da partida. ouvia com atenção, ele era uma peça importante entre o meio de campo e ataque, o lado esquerdo estava rendendo muito bem com ele ali e precisava continuar assim.
Foi o que aconteceu na segunda etapa, ele voltou ainda mais motivado para ampliar o placar e chances não faltaram, mas os méritos da vez foram para o goleiro adversário e defesa que estavam fazendo um bom segundo o tempo. O Grêmio voltou diferente, mais ofensivo e organizado, especialmente no meio campo, o que dificultou o trabalho dos corinthianos, mas mesmo assim estava fazendo a sua parte apesar de tudo, buscando o jogo e indo pra cima.
Aos quarenta minutos, em uma falha de Gabriel, o time do sul puxou um contra-ataque, e a defesa estava exposta. O time voltou em massa para tentar impedir, mas Cássio sozinho não foi o suficiente para impedir um empate gremista no final do jogo. chutou o gramado em frustração, era como se todo o seu esforço tivesse ido por água abaixo, mas ele precisava continuar tentando.
Instantes depois, ele conseguiu deixar Jô na cara do gol, mas a bola foi na trave, e depois ele próprio tentou, mas o goleiro defendeu para dar início à tentativa de ataque gremista. O time teve uma boa troca de passes até chegar em seu campo de ataque, até voltou para ajudar na marcação, mas seu esforço de nada valeu, pois o Grêmio virou o jogo em cinco minutos e foi o resultado até o fim. se sentiu frustrado como não se sentia há algum tempo, quase conseguiu, era sua chance de fazer valer a lei do ex, mas deu tudo errado no final. Poderiam até manter a liderança, mas foi uma derrota muito amarga, especialmente para ele que tinha se esforçado tanto.
foi em direção ao vestiário, mas ouviu seu antigo treinador chamando por ele. Não queria ir e causar desconforto com a torcida, mas acabou cedendo.

- Você foi bem, garoto, tenho orgulho de você. Não abaixa a cabeça pra ninguém - Renato disse após um breve abraço dos dois.
- Obrigado, professor, meus parabéns pela vitória - respondeu com um sorriso entristecido e saiu, ignorando a imprensa e indo direto para o vestiário. Seu sábado à noite tinha sido arruinado.

⚽🖤📱

Mais um motivo para se sentir péssima: seu time havia perdido. Com exceção de e Luan, o restante do elenco estava sendo duramente criticada pela torcida nas redes sociais. Ela não estava preocupada com isso, só estava chateada. Encarava a tela do celular, pensando se deveria ligar para ou não, mas imaginou que ele não iria atender, certamente ainda estava no vestiário e muito mais frustrado do que ela.

- Elias, já chega! Você está ruim há dias, nós vamos para o hospital agora! - foi dispersa dos seus pensamentos quando ouviu sua mãe repreendendo o seu pai. - Você pode morrer se não se cuidar!
- Quanto dessa vez? - ela perguntou se referindo à pressão dele.
- Dezesseis por oito!
- Pai, vamos pro hospital já - se levantou do sofá, pronta para argumentar caso ele não quisesse ir, mas para sua surpresa, seu pai concordou sem reclamar, sinal de que estava realmente mal.

assumiu o volante, era a mais tranquila para aquilo, mesmo que estivesse nervosa e com medo, pois ele estava com a pressão alterada há dias e ela sabia o quanto era perigoso. Quando chegaram ao hospital que atendia o seu convênio, seu pai passou pela triagem e foi atendido com urgência. ficou do lado de fora aguardando enquanto sua mãe entrou. Ela estava olhando para a televisão onde passava um jornal noturno quando o seu celular começou a tocar, olhou na tela e viu que era . Decidiu atender, afinal, ele não tinha motivos para ligar e mesmo assim ligou.

- Oi, ...
- Eu só tô ligando pra dizer que eu tentei não levar a sério o que você me disse e me esforcei para aquilo não acontecer, mas sua boca é profética e você estava certa - disse diretamente, pegando de surpresa pela leve grosseria no tom de voz dele, mas ela relevou, afinal, não estava com cabeça para discutirem mais.
- , me desculpa, era só uma brincadeira, eu não estava falando sério, não queria te ofender.
- Por que disse aquilo, ? Eu não esperava, o seu apoio importa pra mim mais do que qualquer coisa. Eu sei que também já errei dizendo coisas que eu não deveria, mas... Aquilo foi muito desnecessário, espero que você saiba disso.
- Eu sei, me desculpa... - ela passou a mão livre pelo rosto e respirou fundo, não queria ter que ouvir um sermão.
- Sabe? Eu estava pensando esses dias sobre o rumo que nosso relacionamento está tomando. Primeiro de tudo, eu sei que não estou conseguindo conciliar tudo, estou errado nessa parte, mas acho que dessa vez, a culpa não é toda minha, está faltando diálogo das duas partes.
- Eu sei - soltou um longo suspiro, de fato ela não estava contando o que estava acontecendo em sua vida. - , está tudo uma grande merda, vamos ser sinceros. Eu nem queria falar sobre isso agora e no telefone, mas é melhor assim. Estamos desgastados, é isso, não tem rodeio.
- ... Eu sei que nós sempre devemos conversar e tentar uma forma de resolver os problemas juntos, mas acho que você concorda comigo que ultimamente nós não estamos fazendo isso muito bem.
- Eu concordo, você tem os seus problemas e eu tenho os meus, e eles são inconciliáveis agora - ela estava cansada, achava melhor concordar com tudo e desligar logo, depois resolveriam as pendências. - Eu não queria mesmo sugerir isso, mas... Acho que precisamos colocar nossas cabeças no lugar e rever alguns conceitos... Sei que não é certo falar isso por telefone, mas... - estava hesitante, não queria fazer aquilo, mas precisava. - Eu acho que a gente deveria dar um tempo... Por nós mesmos, pelo nosso bem.

Nada estava tão ruim que não poderia piorar, mas ela estava tão cansada e frustrada que não tinha forças para dizer o contrário, porque talvez quisesse terminar de vez. Carregar um relacionamento desgastado estava lhe custando muito, terminar por telefone era horrível, mas não era nem por isso que estava chateada, até preferia. Seu namoro fazia parte da sua vida, mas se todo o resto estava ruim, não seria ele o salvador de todas as coisas.

- Eu também acho - disse por fim, embora não quisesse realmente, mas estava chateado e de cabeça quente. - , eu não queria ter que concordar com isso, sinto muito, mas eu...
- Tudo bem, , eu não estou chateada por isso, também sei onde errei, só acho que no momento a última das coisas que importa pra mim é se eu vou ter um namorado ou não. Eu amo você, mas só isso não serve pra tocar a minha vida.

não sabia pelo que ela estava passando, não sabia que tinha sido demitida e que o pai dela estava com problemas de saúde, também não sabia sobre os conflitos internos e questionamentos pessoais que estava passando, e por isso ele levou como uma ofensa, mas respirou fundo e decidiu não brigar e perder o pouco de razão que achava que tinha. Já estava nervoso o suficiente, não queria se estressar mais, embora saber que ela considerava o namoro deles apenas mais um detalhe em sua vida, fosse muito chato de imaginar, ele não considerava dessa maneira.

- Acho que é isso... Precisamos resolver algumas coisas antes de nos acertarmos.
- Sim. Até outra hora, , obrigada por ser sincero comigo e me desculpa por qualquer coisa. Se cuida - disse por fim e desligou sem esperar uma resposta dele.

A tela de bloqueio do seu celular era uma foto deles na conquista da Copa América. Seus olhos começaram a marejar, ela se lembrava de como tudo estava bem, estavam felizes pelas conquistas um do outro, e agora tudo estava diferente. Assim como ela, também tinha muitos defeitos, mas sabia que poderia estar deixando ir a única pessoa que realmente amou e o único que a amava de verdade. Poderia ser apenas um tempo, ou poderiam terminar de vez, já que tudo parecia ser mais difícil para eles. não se importou se estava na sala de espera de um hospital, estava praticamente vazia, e ela chorou ali mesmo. Estava piorando, agora não tinha também e ela não sabia o que mais esperar.
Já tinha vivido um momento ruim, não era nenhuma novidade, mas parecia ser pior dessa vez. não tinha mais o que perder, restava apenas rezar pela vida do seu pai e torcer para que tudo ficasse bem.

Capítulo 32 - O pior dos piores

não estava vivendo os seus melhores dias, na última semana sua vida era resumida apenas em ficar em casa e ir ao hospital revezar os turnos de visita com sua mãe. Seu pai não conseguia apresentar melhora e precisou ser internado para acompanhamento médico, o que tornou tudo ainda mais difícil para ela aguentar. Estava tentando, mas cada dia que passava, as coisas ficavam um pouco mais complicadas.
Ainda tinha o aniversário de Gabriela por aqueles dias, e mesmo que a garota não tivesse optado por uma grande festa, gostaria de fazer algo apenas com pessoas mais próximas, e por isso convidou para ir, que a princípio recusou, mas sua mãe insistiu tanto que ela tinha que sair um pouco para distrair a cabeça que acabou por aceitar. Embora não quisesse realmente ir, por isso não fez questão de montar uma super produção com seu visual, apenas estava aceitável caso Gabriela insistisse em tirar uma foto. Seu humor não era dos melhores, e sua feição denunciava que estava muito cansada e abatida, mas ainda assim ela iria tentar.

- , talvez o venha, eu fiquei sem graça de não convidar ele - Gabi disse após receber a amiga em casa. Ela já sabia que eles não estavam mais juntos.
- Tudo bem, Gabi, nós não estamos brigados, só achamos melhor dar um tempo - tentou sorrir, mas seu sorriso soou muito entristecido.
- Eu sinto muito mesmo - a mais nova falou com sinceridade. Ver que sua amiga estava tão triste, lhe deixava triste também.
- Obrigada... Mas não vamos ficar pensando muito nisso. É o seu aniversário, você precisa se divertir. Onde está o Bruno?
- Está chegando, não vai demorar... Eu já volto, tá? Fica à vontade.

Gabriela deixou a sala de estar e foi em direção ao corredor que levava aos quartos da casa enquanto se serviu de alguns doces e salgadinhos em um prato e se sentou no sofá para comer, não se importava se estava sozinha e nem queria ter companhia, estava ali exclusivamente por Gabriela, e também porque sua mãe insistiu tanto ao ponto de deixá-la irritada. Os amigos de Gabriela eram muito mais novos e ela não se via confraternizando com todos aqueles jovens, sua coluna e mentalidade eram mais velhas do que as deles.

- Eu estava mesmo esperando que você viesse - ela foi afastada de seus pensamentos quando ouviu alguém se aproximando, então viu Samuel se sentando ao lado dela. Rolou os olhos, não queria conversar, e menos ainda com alguém com quem teve uma péssima experiência.
- É sério isso? O que você quer?
- Eu acho que nunca consegui me desculpar de verdade com você sobre aquele dia, . Eu não sabia que você tinha namorado, mas que bom que você está aqui hoje pra eu dizer que sinto muito mesmo.
- Eu nem lembrava mais disso, se você quer saber, Samuel - ela disse impaciente. - Além disso, só serviu para reforçar o que eu já sabia: homem só é legal com você se quiser te comer. Você provou isso.
- Isso não é verdade, , eu tinha achado você uma garota legal... É sério, eu não sou esse tipo de cara, tô arrependido de verdade.
- Tá bom, Samuel, não precisa insistir, eu já entendi. Deixa essa história pra lá, eu não sou nenhuma cavala.

Samuel se deu por vencido, não iria insistir se ela claramente estava de mal humor, mas ele sempre foi curioso demais e gostava de observar as feições das pessoas, unicamente por isso notou que parecia muito diferente do dia em que a conheceu. Estava séria, desanimada e com olheiras, quase uma outra pessoa da que ele gostou. Foi inevitável seu olhar ir direto para os dedos dela, notando que não usava nenhuma aliança de compromisso. Juntando isso ao fato de ela aparentar estar mal, ele tirou as próprias conclusões.

- Percebi que você parece um pouco triste.
- Está tudo uma grande merda - respondeu sem muita emoção enquanto mordiscava uma bala de goma.
- Bem, eu não sou o idiota que você pensa que eu sou, então não vou ficar insistindo se você não quer falar comigo - ele se levantou e tentou desamassar a sua camisa com as mãos. - Mas se você precisar conversar, eu vou ouvir você... Licença.

Samuel se afastou e o seguiu com o olhar. De fato, achava ele um idiota, mas ele tinha se desculpado pelo seu comportamento, e ela pensou que isso poderia significar alguma coisa, porque se lembrava de que no dia em questão, tinha esquecido sua aliança em casa e evitou falar sobre sua vida pessoal. Nada mudava o fato de ele estar errado, mas reconhecer o erro era o primeiro passo para ser melhor e ele tinha feito isso. Cabia a aceitar as desculpas ou não.
estava cada vez mais arrependida de estar ali. Não conhecia ninguém, e não conseguia encontrar Gabriela em lugar nenhum. Parecia até que tinha voltado para a adolescência quando se sentia sufocada em qualquer lugar que fosse, achando que era uma total desajustada, e de fato era uma naquele dia. Se ao menos conhecesse outra pessoa além da aniversariante, poderia se sentir um pouco mais à vontade ao invés de estar imitando um poste parada onde estava, mas felizmente suas preces foram ouvidas quando Bruno chegou um pouco depois. Parecia um pouco cansado também, mas no caso dele era por puro trabalho, e não porque sua vida estava bagunçada.

- Oi, - ele cumprimentou a mulher quando a viu.
- Oi, Bruno, quanto tempo que não te vejo sem ser no campo. Está sumido.
- Muito trabalho - o jogador se justificou e riu. - Cansa carregar esse time nas costas, sabia?
- Está andando muito com o , Bruno, está começando a ficar convencido também - disse com bom-humor, mas Bruno não soube como reagir quando foi mencionado, apenas riu um pouco sem graça. - Tá tudo bem, ele e eu não estamos brigados.
- Ele parece um pouco triste ultimamente... Um pouco não, muito triste.
- Não dá pra terminar um relacionamento e seguir logo depois como se nada tivesse acontecido, eu também estou muito triste - ela sorriu de canto e ele assentiu.
- disse que vocês tinham dado um tempo.
- É... Nós demos um tempo, mas tô evitando pensar nisso, tem muita coisa acontecendo de uma vez.
- Eu entendo. Seu pai está melhor?
- Um pouco, mas ainda vai continuar internado, eu vou mandar notícias quando ele melhorar.
- Certo... Você viu a Gabi?
- Acho que ela esqueceu de mim, se eu fosse você iria atrás, ou vai ficar plantado aqui comigo - ela disse fazendo os dois rirem e Bruno pediu licença para ir atrás da namorada.

achou melhor se servir de alguma bebida para aguentar o resto da festa sem reclamar ou ir embora antes das dez. Procurou por um copo e deu o azar - ou muita sorte - de ver Samuel misturando vodka com energético, exatamente o que ela queria. Foi até ele com o copo estendido, Samuel olhou surpreso pra ela, mas apenas fez sinal de que queria também.

- Tenho medo que você possa jogar essa bebida nos meus olhos - ele disse enquanto despejava vodka no copo dela, que por sinal, era bem grande.
- E eu deveria? - perguntou.
- Não sei e prefiro não arriscar para saber. Eu percebi que você é brava e não quero ir parar no hospital.
- Eu não sou violenta, e nem pensa em colocar mais energético do que vodka, eu quero ficar louca hoje.
- Se você está dizendo - ele pegou o copo da mão dela e misturou do seu jeito, então devolveu a bebida pra ela. deu um longo gole. - Nossa, você deve ser profissional.
- Normalmente eu passo vergonha, hoje eu não sei o que esperar - ela disse por fim e se afastou, achou melhor ir para o jardim onde não tinha ninguém. Samuel a seguiu. - Você vai pagar pra ver?
- Vou. Ou melhor, garantir que você não vá fazer nenhuma besteira.
- Não é nada demais, ultimamente estou bem comportada, mas na última vez em que mau pude ficar em pé, acabei beijando o meu namorado que era só um amigo. Quero dizer, meu ex-namorado - ela deu um longo gole e teve que se conter para não fazer uma careta. Ele parecia curioso, mas decidido a não perguntar nada. - Demos um tempo, não estava dando certo - se justificou e ele assentiu.
- Deve ser difícil namorar com um jogador, eu vejo a Gabi tendo que ceder muito.
- É exatamente assim. Gabi e Bruno sabem lidar melhor, e eu tentamos por muito tempo e deu certo, mas as pessoas mudam e já não somos mais os mesmos de quase dois anos atrás.
- Eu sinto muito por isso, é uma pena que só amor não sustente um relacionamento.
- Não sinta, não fala essas coisas, eu sei que você quer ficar comigo.
- Mas eu não vou tentar fazer isso, .
- Fofo. Talvez até o fim da noite, eu mude de ideia e fique com você - ela encostou o seu copo no dele como se estivesse brindando e se sentou na cadeira de balanço que Gabriela tinha.

Samuel puxou um banco para ficar ao lado dela. Foi pego de surpresa, mas não estava planejando tentar alguma coisa, mesmo que agora soubesse que estava solteira. Ela estava bebendo como se fosse água, e por isso achou melhor pegar petiscos para ela intercalar, mas também pediu mais uma garrafa para beberem juntos.

- Se eu fosse você, seria mais prudente.
- Samuel, pra alguém mais novo, você é bem velho - murmurou e pegou uma coxinha contra sua vontade.
- E como você vai pra casa depois?
- Gabi é minha amiga, não se importa se eu passar a noite aqui. Preciso beber um pouco e esquecer que minha vida tá uma grande merda.
- Você quer contar o que aconteceu?
- Terminei meu namoro, perdi meu emprego, meu pai está internado no hospital e eu não tenho a mínima ideia do que quero fazer da minha vida. Não tenho casa, carro ou qualquer perspectiva - ela disse rápido como se estivesse lendo uma receita. - E talvez eu esbarre com o por aqui, e é por isso que estou aqui fora.
- Eu sinto muito, , é uma merda perder tudo de uma vez, eu já passei por isso também.
- E como lidou com isso?
- Não enchi a cara desse jeito - apontou discretamente para o copo e ela riu. - Só entendi que tempo é relativo e eu precisava ter calma pra fazer dar certo.
- Você é novo ainda... Tem tempo.
- E você tem quantos anos? 75? Tá bem conservada. Eu não sou tão mais novo que você, acho que você também precisa ter calma.
- É... Talvez você tenha razão.

E ele tinha, mas não estava conseguindo enxergar uma solução para a sua vida naquele momento e se lamentar aliviava o seu estresse de alguma forma, além de estar desabafando com um desconhecido. costumava ser uma bêbada divertida, mas a última das coisas que queria naquele momento era, de fato, ficar animada.

- Tenho que admitir que estou surpreso, você ficou tão brava naquele dia e depois a Gabriela brigou tanto comigo, que achei que você se casaria com aquele cara.
- Não é questão de casar, é questão de ser fiel à pessoa. Enquanto estou em um relacionamento, não olho pra mais ninguém - deu mais um gole generoso. Estava levemente alterada, tinha certeza disso.
- Bom, você tá certa, traição não é uma opção pra mim também, eu realmente não sabia que você namorava, não sou muito fã de futebol e não sabia quem era o seu namorado.
- Tudo bem, eu esqueci a aliança em casa, além disso, eu não era propriedade dele. De qualquer jeito não importa mais, agora sou solteira, posso olhar pra outras pessoas.
- Eu queria que você olhasse pra mim, isso sim - Samuel riu, não falou com maldade, mas se rolasse alguma coisa ali, também não acharia ruim.
- Estou olhando - virou o pescoço na direção dele. - Nunca fiquei com um cara mais novo.
- Pra tudo tem uma primeira vez, se você quiser experimentar - ele se aproximou só um pouco, deixando a decisão nas mão dela.

ponderou por um instante. Estava solteira, não tinha problema, certo? E achava Samuel um rapaz muito bonito, não tinha motivos para não o fazer. Ela esticou o pescoço e eles deram início a um beijo que a princípio pareceu um pouco desajeitado, mas encaixou rápido. Era estranho beijar outra pessoa que não fosse , e não que achasse que estava sendo ruim - definitivamente não estava -, mas por que estava pensando justamente nele ao invés de estar aproveitando o beijo? tentou esquecer ao menos por um instante.

- Eu sabia que um dia eu ia conseguir beijar você - Samuel disse após o beijo, quando ela se afastou e riu enquanto bebia mais um pouco. Era engraçado pensar que alguém realmente tinha essa meta.
- Até que você é bem legal, Samuel.

⚽🖤📱

Quando chegou na casa de Gabriela, tentou não olhar muito para os lados para não encontrar com , pois não sabia como reagir na frente dela, então tentou se enturmar com pessoas bem mais novas do que ele, o que não estava dando certo, e aparentemente, sua melhor companhia para noite seria Bruno que não exigia que Gabriela ficasse o tempo todo perto dele. A aniversariante estava tentando ser atenciosa com todo mundo e ele entendia isso, felizmente tinha para conversar, mesmo que o amigo não estivesse com o seu melhor humor, mas pelo menos estava tentando.

- É uma pena que o formato do Mundial da FIFA mudou, já pensou se a gente ganha a Libertadores? - comentou enquanto bebericava a sua cerveja. Queria muito poder jogar o Mundial naquele ano, mas a edição de 2019 havia sido a última.
- Mas nós vamos ganhar - Bruno tentou soar otimista.
- Se depender de mim, com toda a certeza, o problema é que só vamos pegar times brasileiros. Se a final for contra um deles, vai ser muito difícil.
- Já está se rendendo, ?
- Jamais! Só estou sendo realista. O Flamengo têm o Gabigol e o Bruno Henrique.
- E a gente tem você.
- Puxa saco - riu e se levantou. - Vou precisar de algo mais forte do que cerveja pra aguentar essa bajulação toda ou mudamos de assunto, tô de saco cheio de futebol. Eu já volto.

foi até a cozinha para procurar por outra bebida além de cerveja. Encontrou tequila e procurou um copo para se servir. Para seu azar, estava na frente da janela onde tinha uma visão do quintal da casa de Gabriela. Olhou despretensiosamente pro lado de fora, mas então viu e ela não estava sozinha, um rapaz conversava com ela e eles pareciam estar se divertindo enquanto bebiam. tentou olhar para qualquer outra direção, mas não conseguiu, seu olhar estava fixado nos dois e na forma como estava sorrindo para o rapaz, o sorriso que antes era pra ele.
Mas ainda poderia piorar e ele viu o exato momento em que ela esticou o pescoço e eles se beijaram. Depois se afastou rindo e bebeu mais um pouco, sem ter a mínima ideia de que estava sendo observada pela única pessoa que não deveria ver aquilo. não podia acreditar no que estava vendo, pensava que se quer tinham terminado em definitivo, estava se sentindo traído de certa forma. Talvez não fosse mesmo uma traição, afinal, não estavam mais juntos, mas ele não queria saber. Ele voltou para a sala e se sentou ao lado de Bruno de novo. Sua noite tinha acabado e ele estava péssimo.

- Quem morreu? - Bruno perguntou ao perceber que o amigo parecia chateado.
- Eu vi a com outro cara no quintal - disse sem rodeios. O coração batia acelerado no peito e suas mãos tremiam.
- É sério? Mas , ela não estavam só conversando, não é?
- Ela beijou ele. Meu Deus, não acredito que tô passando por toda essa merda de novo, Bruno - se inclinou no sofá e jogou a cabeça pra trás. - Eu sou tão ruim assim?
- Não, , não fala assim - Bruno não sabia o que dizer, estava visivelmente aflito, mesmo que tentasse se manter calmo.
- Eu sei que eu sou um otário às vezes, mas é sério isso? A gente se quer terminou de verdade e ela estava beijando outro! Eu sei que eu tenho um milhão de defeitos, mas eu não faria isso com ela nunca, eu...
- Por que tenho a impressão de que estou atrapalhando uma sessão de terapia? - Gabriela apareceu perto deles e se sentou ao lado de Bruno, mas notou que estava diferente. - , tá tudo bem?
- Ele viu a beijando outro cara - Bruno achou melhor tomar partida da situação.
- Eu vou chorar quando chegar em casa, eu juro - deu um generoso gole na sua bebida enquanto Gabriela processava a informação.
- Você tem certeza, ?
- Eu sei o que eu vi! Bem ali no seu quintal, me desculpa por estragar o seu dia, mas dessa vez não é culpa minha.
- Eu não acredito nisso - ela levou a mão ao rosto, batendo com a palma na testa. - , tem alguma coisa que a gente possa fazer por você?
- Não, Gabi, obrigado, eu vou ficar bem. Eu vou ficar mais um pouco e depois vou embora.
- Eu não vou ficar chateada se você for embora antes.
- Vou ficar mais um pouco, acabei de chegar.
- Eu tô péssima, eu não sei nem o que dizer.
- Relaxa, Gabi, não é a primeira vez que isso acontece comigo. Vai curtir com os seus amigos, hoje é o seu dia, espero que goste do meu presente.
- Ele tem razão, vai curtir, eu vou ficar aqui. Acho que ele precisa de apoio moral agora - Bruno disse para a namorada que concordou, se levantou e saiu.
- Bruno, eu tô legal, vai curtir também. É uma festa.
- Não vou conseguir fazer isso e te deixar aqui sozinho.
- Então eu vou pra casa, ainda posso dirigir - deixou o copo na mesa de centro e se levantou. - Eu só vou beber uma água pra tirar esse gosto de tequila da boca.

voltou para a cozinha e evitou ao máximo se aproximar da janela ou da porta que dava acesso ao quintal, se limitou apenas a procurar por um copo de vidro e beber água para tirar um pouco do gosto de álcool da boca. Deu azar novamente, entrou quando ele estava terminando, e estava acompanhada por Samuel, por isso não conteve o espanto quando o viu ali, mas apenas olhou pra eles, tentando parecer o mais indiferente possível, sabia que não tinha conseguido, então se limitou a sair dali.

- Eu já volto - disse para Samuel, e mesmo que estivesse um pouco alterada, foi atrás de .

Ela chamou por ele, mas ele não olhou para trás. Deixou a casa e só se virou para quando já estava na calçada, quase chegando no seu carro.

- , espera.
- Eu nem vou me dar ao trabalho de dizer qualquer coisa, porque eu vou estar errado... Como sempre - disse com muita calma, não iria se alterar naquela discussão. - Eu vi você beijando aquele cara, mas tudo bem, você vai dizer que a gente tava dando um tempo, você vai sair como certa e eu como o errado mais uma vez, então pode voltar pra lá e aproveitar a festa.
- Dar um tempo e terminar, pra mim é a mesma coisa - tentou se justificar, mas ele começou a rir.
- Infelizmente o mundo não é baseado no seu achismo, . Pra mim não é a mesma coisa, mas eu já disse que não vou falar nada, acho que não vale a pena.
- Não haja como se só eu estivesse errada.
- E lá vem você inverter o jogo - ele rolou os olhos. - Pode dizer tudo o que você tem pra dizer, vou te ouvir. Vai em frente, fala.
- Você se afastou de mim e focou só na sua carreira, como acha que eu me senti?
- Péssima, né?
- É, , péssima. Você nem sabe tudo o que aconteceu porque não estava comigo quando eu precisei, parou de falar comigo por causa de uma piada infeliz.
- Certo... Eu errei também, tenho a minha parcela de culpa. Concordo quando você disse que eu estava distante, sinto muito por ter feito você se sentir sozinha, se eu pudesse voltar e fazer diferente, faria com certeza, mas isso já passou e este não era o ponto, você tá tentando justificar um erro com outro erro... Por que você simplesmente não assume que errou também? Por que você sempre faz questão de estar certa e me pintar como uma pessoa horrível?
- Achei que tínhamos terminado, o que esperava agora? Que eu ficaria sozinha pelo resto da minha vida?
- Você sugeriu de darmos um tempo pra gente colocar a cabeça no lugar, e eu concordei, mesmo que fosse por telefone, o que também não foi legal... Por que está agindo como se só seu fosse um babaca? Você foi tão clara quanto eu... Se você entendeu de outra forma, então tudo bem, mas então agora eu vou ser mais específico, está bem? Acabou, pode voltar lá e beijar aquele cara à vontade, você é livre pra isso, não vou ser eu a pessoa que vai te prender.
- ...
- E a propósito, eu sei que já errei com você também, e você me perdoou... Mas isso? Não sei, vai levar um tempo pra eu deixar pra lá.
- Eu não traí você, .
- Pra mim traiu sim, vou usar do meu achismo, já que você pode usar do seu... Por favor, volta pra dentro, não vale a pena continuar com essa conversa - praticamente suplicou, queria apenas ir embora. - Você ainda tem a chave, pode passar lá e pegar as suas coisas que ainda estão em casa, mas deixa a chave debaixo do tapete da entrada, ok? Tchau, .

entrou no seu carro e foi embora. observou, e sentiu uma grande culpa tomando conta dela, talvez ele tivesse razão, interpretaram de maneiras diferentes, ela entendeu como um fim definitivo e ele como um tempo para se resolverem, literalmente, como havia sugerido. Ela o amava, jamais o trairia, não ficaria com outra pessoa se não tivesse certeza de que estavam definitivamente separados, ainda mais porque ele já tinha sido traído antes de uma maneira horrível. Ele tinha defeitos, é verdade, muitas vezes esteve errado, mas estava errado daquela vez também? Era isso o que ela pensava enquanto voltava para dentro da casa. Samuel ainda estava na cozinha e não parecia contente com o que viu. sabia que teria que se explicar para ele também.

- Samuel...
- Por que tenho a impressão de que vocês ainda têm coisas pra resolver um com o outro? - ele a interrompeu. - Ele pareceu bem surpreso e chateado. , não é porque eu queria ficar com você, que eu aceitaria ser uma segunda opção, eu disse que não iria fazer nada.
- Você não é uma segunda opção, Samuel - não entendia porque continuava negando e contrariando tanto o que disse quanto o que Samuel dizia, mesmo achando que os dois tinham razão. - Eu sinto muito.
- Eu também - ele disse por fim e saiu da cozinha, deixando sozinha.

⚽🖤📱

No dia seguinte, foi ver o seu pai no hospital para que sua mãe pudesse ir pra casa e descansar um pouco. Ele não estava bem, a medicação para manter a pressão estável era forte o suficiente para o deixar ainda mais fraco, mas estava se esforçando para se manter acordado e passar um tempo com , notando que a filha não estava bem desde o momento em que ela entrou.

- Eu fiz uma coisa horrível, pai - admitiu e mordeu os lábios para conter a terrível vontade de chorar, pois já tinha chorado a noite inteira. - nunca mais vai confiar em mim, acho que acabou de vez.
- Impossível - ele disse em um sussurro e sorriu fraco. - Todo mundo erra, .
- Mas eu errei mais, eu acho...
- - ele respirou fundo e juntou suas forças para conseguir falar. - Ninguém é perfeito, e em um relacionamento menos ainda, alguém sempre vai errar, e não cabe ao outro julgar se já errou também.
- Nada do que o já fez foi tão ruim quanto o que eu fiz.
- O que aconteceu?
- Eu acho que traí ele, pai - ela disse de uma vez porque sabia que não seria julgada. - Ontem fui no aniversário da Gabriela, acabei bebendo demais e beijei um cara, estava lá e viu, óbvio que ele terminou de vez. Não considerei como traição, mas ele sim, talvez ele tenha razão, eu não sei, tô muito confusa...
- Se não estavam juntos, não foi traição, filha, e se ele errou também, não pode apontar o dedo pra você.
- Ele não fez isso, pai, ele também sabe onde errou, mas não vamos falar sobre isso. Descansa, tá? Eu vou ficar aqui com o senhor.
- Certa ou errada, , você ainda tem a mim, e eu amo você.
- Também te amo, pai. Obrigada.

⚽🖤📱

concentrou todas as suas energias no treino tático do dia seguinte, evitando pensar na sua vida pessoal para não perder o foco das atividades do dia, já que estavam se preparando para o próximo jogo do campeonato brasileiro, e também para a semifinal da Libertadores contra ninguém menos que o Flamengo em casa logo no jogo de ida. Ele estava chamando a responsabilidade para si e dando o seu melhor para que pudesse trazer a glória eterna para o clube junto com seus companheiros.
Hora ou outra quando tinha alguns minutos para respirar e se hidratar, se pegava pensando no que estava acontecendo, ao ponto de se distrair e não notar que falavam com ele, mas acabava por se desculpar e ficar por aquilo mesmo. Ele sabia que não era de ferro, não podia ignorar suas emoções como se não valessem nada, mas durante seu horário de treino, estava lutando o máximo que podia para se concentrar e esquecer os problemas em casa. Notou que Bruno parecia preocupado com ele, mas evitou puxar conversa para não perder a concentração, e pensou que qualquer coisa que o amigo tivesse para dizer, que fosse depois das atividades do dia.

- , presta atenção! - Vital esbravejou com ele quando perdeu o tempo da bola e a deu de graça para Gabriel que estava na marcação. - Perdeu outra bola!
- Desculpa, tô um pouco lento, foi mal - disse qualquer coisa e eles retomaram a atividade que era em campo reduzido.

Ele estava tentando uma jogada ensaiada com Luan que não estava dando certo, nenhum dos dois conseguia finalizar para dentro do gol. não conseguia acertar porque se atrasava ou pegava a bola de mal jeito, enquanto Luan não recebia bons passes e assistências de . Se fosse em tempos de Grêmio, diria que o ponta estava fazendo aquilo de propósito para o prejudicar, mas percebeu que parecia distraído, muito diferente de quando começou o dia.

- Você tá bem, ? - ele perguntou após errar mais uma finalização, mesmo recebendo um passe perfeito.
- Eu vou ficar - foi o que respondeu antes de voltar para a sua posição.

Ele continuou tentando fazer o seu trabalho durante o restante do dia, entrou no vestiário mudo e saiu calado para ir embora, evitando até mesmo conversar com Bruno que optou por respeitar o espaço do amigo. Quando entrou em seu carro, se permitiu relaxar um pouco antes de deixar o centro de treinamento, estava exausto fisicamente e mentalmente por estar tentando bloquear aquele sentimento que ele conhecia muito bem. Na primeira vez ele simplesmente liberou a sua raiva, extravasou como podia, quebrou o que viu pela frente, inventou xingamentos também, mas agora ele não conseguia fazer nada a não ser observar suas mãos trêmulas segurando o volante com força, de tamanha decepção. Chorar não era uma opção para , ele não iria se dar ao trabalho de sofrer para quem quisesse ver, o melhor seria guardar para si, para ele era humilhante demais trabalhar com a hipótese de saber como ele estava se sentindo de verdade.
Após respirar fundo algumas vezes, ligou o carro e seguiu seu caminho. Só queria chegar em casa, tomar outro banho e dormir, já que não tinha vontade de fazer mais nada, assistir algum jogo de basquete lhe passou pela cabeça, e talvez realmente o fizesse para se esquecer um pouco do seu presente de merda. Quando chegou, deixou a mochila no sofá, se livrou dos tênis e tirou a camisa porque estava com muito calor, então foi até o seu quarto para pegar uma roupa mais confortável, mas deu de cara com que estava esvaziando o seu lado do guarda-roupa e colocando tudo em uma mala. Ele não sabia exatamente como reagir, então se limitou a ir para o outro lado onde estavam suas camisetas.

- Eu já estou indo - tentou dizer alguma coisa, mas se sentiu estúpida.
- Não precisa ter pressa - disse enquanto se vestia. - Pra não esquecer nada.
- ...
- Nem perde o seu tempo.

Ele foi até o banheiro para deixar a camiseta no cesto de roupas sujas e pretendia voltar pra sala, mas se colocou na frente dele.

- Por favor, me escuta.
- , eu não quero conversar, por favor. Já acabou.
- Você falou tanto, mas não me deixou falar...
- Ah, é mesmo? Você vai dizer o quê? Que eu não sei o que vi? - ele riu e colocou as mãos na cintura. - Por que você fez isso mesmo eu tendo te contado tudo o que a Camila fez?
- Eu não traí você, , eu nunca faria isso... - se quer sabia como se explicar, mas ela precisava ao menos tentar. - Estávamos separados, não é? E se fosse ao contrário, eu não ia me importar de te ver com outra pessoa.
- Você não só se importaria como faria questão de esfregar na minha cara o meu erro - ela pensou que talvez ele estivesse certo. - Para de ser hipócrita. Temos opiniões diferentes sobre dar um tempo, então não adianta discutir sobre isso porque não vamos chegar a lugar nenhum.
- Se você pensa assim, então não vou mais tentar te convencer do contrário.
- Obrigado!
- Mas... Será que eu posso te contar o que estava acontecendo comigo? Ou melhor, ainda está.
- Fala - ele disse impaciente e cruzou os braços.
- Eu fui demitida, fiquei desempregada, e meu pai está internado no hospital por causa da hipertensão. Achei que não podia piorar, então terminamos.
- Sinto muito pelo seu pai e pelo seu emprego.
- Então já que você tem certeza que eu te traí, será que você pode me perdoar? Eu entendo que sendo traição ou não, eu fiz uma coisa ruim que te magoou, e eu já tenho tantos problemas, não quero carregar mais essa culpa também! Por favor, me perdoa - ela juntou as mãos em súplica. Estava se sentindo patética, mas precisava tentar.
- - ele riu novamente e abaixou as mãos dela. - Para, é ridículo. Todo mundo carrega uma culpa, eu tenho as minhas, e enquanto eu não me sentir pronto, você vai ter que carregar essa também... Lamento pelo seu emprego, mas tenho certeza que logo você vai arrumar outro, e me disponho a fazer qualquer coisa pelo seu pai, qualquer despesa que ele precisar, qualquer coisa mesmo, mas... Eu também tenho o meu tempo... Por favor, não demora muito, eu quero ficar sozinho.

deixou o quarto e foi para a sala afim de assistir a uma reprise de um jogo de basquete enquanto terminava de fazer a mala aos prantos. As palavra dele doeram, mas ela podia imaginar como ele se sentia, e justamente por isso sentia a necessidade de se desculpar de alguma maneira, mas iria respeitar o espaço que ele precisava naquele momento.
pegou o máximo de coisas que podia, mas infelizmente teria que fazer uma outra viagem, já que algumas roupas mais pesadas e seus troféus não cabiam na mala de vinte e três quilos que ela tinha levado, então após respirar fundo e secar suas lágrimas, ela decidiu sair, e encontrou na sala assistindo televisão.

- Eu vou precisar voltar - disse para chamar a atenção dele. - Meus troféus e umas jaquetas não couberam na mala.
- Tá bom - ele respondeu sem dar muita importância. - Precisa de ajuda com a mala?
- Não... Tchau.
- Melhoras para o seu pai. Pode me devolver a chave?

Ela apenas assentiu, abriu a porta e jogou a chave. pegou em um bom reflexo e voltou sua atenção para o jogo enquanto foi embora. Deixar a chave significava alguma coisa, e ela então percebeu que talvez não tivesse mais volta.
Insistir não era a melhor opção.

⚽🖤📱

- Ele disse que cada um tem as suas culpas pra carregar, e eu teria que carregar essa - tentou secar seus olhos com o lenço que Gabi lhe deu, mas chorava tanto que era impossível.
- Eu sei que eu errei, Gabi, mas tem tanta coisa acontecendo que eu só queria que ele me perdoasse...
- , eu não acho que você traiu ele, e talvez o perceba isso, mas ele está muito chateado porque ele viu, então querendo ou não, é diferente. Dá um espaço pra ele esfriar a cabeça - Gabriela disse compreensiva. Estavam na casa dela e ela deixou desabafar. - E se você ficar insistindo, você só vai ser maltratada. Não vale a pena.
- Eu sei, mas... Gabi, eu jamais trairia o , eu não deixei de gostar dele, eu não traí. Eu queria que ele soubesse.
- Ele está com a cabeça quente, não vai entender agora nem mesmo se o Papa for explicar pessoalmente... Eu sei que é difícil, amiga, mas deixa o um pouquinho de canto pra poder focar em outras áreas da sua vida, seu pai precisa de você agora, aproveita que a sua área está se expandindo para arrumar outro emprego... Ficar pensando nele assim só vai te fazer mal, você não merece isso.
- Mereço.
- Não merece! Todo mundo erra uma vez, e você não é perfeita. , eu sempre admirei vocês, especialmente você por toda a sua força e a sua história, não pode ser um cara que vai parar a sua vida, e não importa o quanto você ama ele. Você é uma mulher forte e independente, comete erros como todo mundo, e se o não enxergar isso, o problema é todo dele.
- Dizendo assim até me sinto a certa da história - ela tentou soar descontraída ao dar risada, mas não tinha achado graça.
- Para de buscar um certo ou errado, , eu já percebi que você tem essa mania, mas não é relevante nesse caso, vocês dois reconhecem onde erraram e pronto. Não adianta você ficar se martirizando, só dá um tempo pro pensar, não vai atrás dele e você vai ver como ele vai vir atrás de você.
- Você acha que ele vem? - os olhos de brilhavam com a hipótese.
- Acho, mas não quer dizer que você tem que esperar por isso. A que eu conheço não fica se arrastando por homem nenhum.
- Não estou me arrastando, Gabi, é diferente. Eu nunca gostei de alguém como eu gosto do - ela deitou a cabeça nas pernas da amiga quando Gabriela deixou. - Ele tem os defeitos dele, mas depois dos meus pais, é a pessoa que me apoiou em tudo, ficou comigo quando eu precisei... Ele era uma das poucas pessoas que se importava comigo de verdade.
- ... Eu entendo, sério, você nem tem ideia do que eu passei antes de conhecer o Bruno, sei exatamente como você está se sentindo, mas... Tudo passa. Talvez ele volte, talvez você siga a sua vida, mas vai passar e você vai sentir vergonha desse momento.
- Para, eu tô sofrendo de verdade - riu do comentário de Gabriela.
- Relaxa, , é parte do processo. Se o não quiser, vai ter quem queira esse espetáculo de mulher que você é. Fica tranquila.

Elas voltaram a atenção para o filme de ação que estavam assistindo, já que não queria assistir qualquer filme romântico que lhe rendesse mais lágrimas para chorar. Ela já tinha chorado tanto que, ao final do filme, seus olhos estavam pesados o suficiente para ela adormecer, pois já passava da meia noite. acordou na manhã do dia seguinte no mesmo horário que Gabriela, pois a mais nova iria para a faculdade bem cedo para estudar na biblioteca. Ela aceitou a carona da amiga que a deixou em casa e então seguiu o seu caminho. entrou em casa e chamou por sua mãe, mas imaginou que ela tinha passado a noite no hospital com seu pai. Seu estômago estava roncando de fome, então ela optou por preparar um café da manhã com o que já tinha nos armários. Ela estava terminando de coar o café quando o seu celular começou a tocar em cima da mesa, pegou para atender e viu que era sua mãe ligando.

- Oi, mãe - atendeu e esperava por boas notícias, mas se quer recebeu uma resposta dela, apenas ouviu ela fungando do outro lado da linha.

Ela já podia imaginar do que se tratava.

- Mãe?! - ela chamou de novo e dessa vez pôde ouvir um choro.
- , o seu pai...
- O que tem o meu pai?? - mordeu os lábios com força para reprimir o choro, mas as lágrimas começaram a escorrer pelo seu rosto.

Mas ela não teve resposta alguma, o choro alto da sua mãe já explicava tudo. se sentou em uma cadeira antes que caísse, suas mãos tremiam ao ponto de deixar o celular se chocar contra a mesa.
Aquilo não poderia estar acontecendo.

Capítulo 33 - O pior dos piores

Naquela manhã, e o time titular faziam o treino matinal na academia, e ele estava tentando canalizar boas energias e concentração para não perder o foco. Gostava mais de trabalhar a parte física do que dos treinos táticos, pois se divertia mais. Conversando com os amigos e rindo entre os exercícios, as horas passavam rápido e ele se esquecia de tudo o que estava sentindo, mesmo que por pouco tempo.
E por mais que ainda tivesse o treino tático na parte da tarde, ele não fazia questão de reclamar, afinal, precisavam manter a liderança do campeonato e pra isso tinham que treinar muito e árduo. Por isso, na hora do almoço, ele tirou daquelas horas para descansar. Acompanhou Bruno ao vestiário para que pudessem pegar os seus celulares.

- Aconteceu alguma coisa - Bruno disse quando viu as várias chamadas de Gabriela ao pegar o celular. - Gabi não é de ligar muito.
- Ela me ligou também - olhou para o próprio celular, notando que tinham cinco chamadas perdidas da amiga. Isso era incomum, ela nunca havia ligado para ele antes. - Será que é grave?

Os dois se olharam preocupados e então Bruno retornou a chamada. Gabriela atendeu um pouco depois, estava chorosa do outro lado da linha e precisou respirar fundo algumas vezes para dizer ao namorado o que tinha acontecido, pois já tinha lhe dado a notícia.

- Meu Deus - foi tudo o que Bruno conseguiu dizer após Gabi ter dado a notícia. Olhou para que parecia mais curioso do que nunca. - Ela deve estar arrasada.
- E está, ela se quer saiu de perto do caixão - Gabriela, que estava no velório, disse. - Achei que vocês deveriam saber, o enterro vai acontecer às cinco. Seria melhor se viessem dar apoio pra .
- Eu vou... Nós vamos, me passa o endereço.

Gabriela disse o nome do cemitério onde o corpo estava sendo velado e Bruno memorizou, então desligou e voltou sua atenção para .

- Bruno, o que aconteceu? - perguntou não se contendo de curiosidade.
- O pai da morreu - Bruno achou melhor dizer sem enrolar, porém com muito pesar.
- O quê?! - perguntou incrédulo.
- Ele não resistiu, mas a Gabi não explicou muito bem como aconteceu, ela está no velório e perguntou se nós vamos, a está muito mal.
- É claro que nós vamos - ele sentiu uma tremenda vontade de chorar e não se conteve. - Será que você pode ir pedir liberação?
- É claro. Fica aqui, eu já volto.

Bruno deixou o vestiário e se sentou no banco. Abaixou a cabeça e deixou as lágrimas escorrerem pelo seu rosto, não podia acreditar que aquilo estava acontecendo e ele se quer teve a oportunidade de se despedir, pois estava ocupado demais pensando em si mesmo. Elias era a figura mais próxima de um pai que tinha, já que não fazia questão de ir atrás do seu mais uma vez, e se ele, que não tinha qualquer ligação de sangue, estava se sentindo assim, não poderia imaginar como estava se sentindo. Se perguntou o motivo de ela não ter avisado, talvez apenas porque não quisesse, mas ele não seria insensível em não prestar condolências e não ir ao velório, afinal, imaginou que ela estaria lá para ele se fosse ao contrário. De qualquer maneira, ele também estava triste, e podia sentir a dor da perda. Talvez não da mesma maneira, mas podia.
Bruno voltou um pouco depois informando que o treinador concordou em dispensar os dois do treino tático na parte da tarde, voltando apenas na manhã seguinte. Eles trocaram de roupa e deixaram o CT no carro de Bruno, que apesar de estar triste, estava em melhores condições de dirigir do que .

- Você tá legal? - Bruno perguntou após algum tempo em silêncio, embora já soubesse a resposta.
- Eu nem pude me despedir - se lamentou. - Estava ocupado demais achando que só minha vida importava.
- Não fala assim, ...
- Como não? E a ... Ele deve estar arrasada... É por isso que ela pediu para que eu perdoasse ela, eu não sabia que era tão grave assim.
- Vocês terminaram, não tinha como saber - Bruno omitiu o fato de que ele próprio sabia, mas não contou nada por insistência de Gabriela.
- Eu deveria ter perdoado...
- , para de falar isso, não vai mudar nada. Já aconteceu, agora a gente só tem que dar apoio pra .
- Não sei nem se ela vai querer me ver, mas... Por ele eu vou, eu quero me despedir também.

Bruno apenas assentiu e eles seguiram o resto do caminho em silêncio. Quando chegaram ao cemitério, procuraram pela sala onde o pai de estava sendo velado. Não estava cheio, mas era compreensível, afinal, não daria tempo de parentes distantes chegarem na cidade em poucas horas, visto que ainda não era nem duas horas da tarde. Bruno entrou na frente e foi recebido por Gabriela, enquanto foi atrás, deixou com que Bruno prestasse suas condolências para enquanto ele procurou por Rose. Talvez ela estivesse ainda pior, mas ainda conseguiu exibir um sorriso, mesmo que entristecido, por vê-lo ali.

- Eu sinto muito mesmo, meus sentimentos - disse com toda a sinceridade enquanto dava um abraço apertado nela.
- Que bom que você veio, , ele gostava muito de você - ela falou ao se separarem e ele sentiu ainda mais vontade de chorar.
- E eu dele - olhou para o corpo no caixão e não se conteve, - Me desculpa por não ter estado lá...
- Você não tem que se desculpar por nada, querido, o Elias sabia o que estava acontecendo pra você não estar lá, ele entendia, e torceu para que tudo ficasse bem. Ele se preocupava com você também.

concordou, deu a volta no caixão e parou ao lado de , que não tinha percebido a aproximação dele. Ele já não sentia mais raiva, ver aquele corpo sem vida lhe fez refletir que a vida era curta demais para não liberar perdão, e quando fosse a vez dele de ser encaixotado com pessoas chorando ao seu redor, não queria que fosse tarde demais. Colocou sua mão sobre o ombro de devagar e ela olhou assustada para trás, vendo que estava ali. Não sabia como reagir, mas pelos olhos avermelhados dele, sabia que não seria pra brigar.

- Eu sinto muito, - foi tudo o que ele conseguiu dizer.
- Obrigada por ter vindo, ele tinha perguntado sobre você - respondeu com a voz falha e viu ele morder os lábios e espremer os olhos.

Ela não se conteve, se levantou da cadeira e eles se abraçaram. Ela não conseguia parar de chorar, mas aproveitou daquele breve minuto para se intensificar. Eram os braços aonde ela gostaria de estar mais que tudo, mas não naquela circunstância. Não avisou unicamente porque se esqueceu, pois foi ela que correu atrás de tudo, mas se sentiu um pouco melhor por ele ter ido até lá prestar condolências. Deixaram a briga e qualquer diferença de lado, queria dar todo o suporte que precisava naquele momento.

- Eu perdoo você - ele disse quando se afastaram um pouco, mas continuaram abraçados de lado. - Espero que me perdoe também.
- É claro. Obrigada - repousou sua cabeça contra o peito dele, mas não conseguia tirar os olhos do caixão. - Eu ainda não consigo acreditar que ele se foi, eu me sinto tão... Sozinha agora, sem ele aqui comigo...
- Você não tá sozinha, . Vai ser muito difícil, mas você não vai ter que passar por isso sozinha. Juntos ou não, eu estou aqui.
- Obrigada, , de verdade - o abraçou de novo e foi retribuída, ter ele ali naquele momento difícil lhe prestando condolências e apoiando era muito importante.

não saiu do lado dela por um minuto que fosse durante todo o velório assim como Júnior e Tobias, que compareceram no final, mas respeitaram o espaço da família durante o enterro, ficando mais afastados junto com Gabriela e Bruno. Os cinco fecharam os olhos e respeitaram o momento de oração, independente da religião de cada um, pois a família de , e o próprio Elias, eram católicos. estava bem na frente com sua mãe, vendo a cova sendo aberta e o caixão sendo baixado.
Ainda era inacreditável. Era o seu pai, seu confidente, seu melhor amigo. Não sabia como seria sua vida dali em diante, com quem ela iria contar a partir de agora? Quem a conhecia tão bem quanto ele? Quem lhe daria conselhos realistas? Tinha a plena consciência de como seria difícil dali em diante, fosse em como seguir em frente ou até mesmo financeiramente falando, mas esse era o último dos problemas. Conforme o caixão descia, ela se perguntava se algum dia aquele aperto no seu coração iria passar e se ela poderia se acostumar com a saudade, mas a resposta para todas as suas perguntas era não. Ela simplesmente não sabia como iria superar.
Quando a terra cobriu totalmente o caixão e s cova foi fechada, as pessoas começaram a dispersar e ainda viu seus amigos um pouco distantes observando, nenhum deles tinha ido embora ainda, então ela pediu licença para sua mãe que estava sendo amparada por alguns familiares e foi até eles.

- Obrigada por terem vindo.
- Desculpa por chegar tão em cima da hora, , mas não conseguimos liberação antes - Júnior se explicou e ela assentiu.
- Não precisa se desculpar, eu entendo - sorriu de canto de forma compreensiva.
- Qualquer coisa, você pode contar com a gente, está bem? Qualquer coisa mesmo.
- Eu sei... Obrigada, Tobias... Eu vou pra casa com a minha mãe, porque acho que ela ainda está pior do que eu, mas... Muito obrigada por terem vindo, significou muito pra mim - ela disse com toda a sinceridade.

Se despediu de Júnior e Tobias que foram embora primeiro, depois de Bruno e Gabriela que foram esperar no carro, mas ele ficou, estava relutante se deveria ir embora ou não, não sabia o que fazer.

- Você vai ficar bem? - ele perguntou.
- Eu vou tentar - respondeu encolhendo os ombros. - Foi importante pra mim que você tenha vindo. Obrigada, .
- Vocês não querem uma carona pra casa?
- Essa vai ser a parte mais difícil, você não vai querer ver... Minhas tias estão com a gente, mas obrigada mesmo assim.
- , eu nem sei mais o que dizer...
- Não tem muito o que dizer, , e nem o que fazer. É um ciclo, e o dele acabou... E é isso, agora eu tenho que seguir minha vida.
- Pode contar comigo. Sempre.
- Eu sei que eu posso - ela esboçou um sorriso bem entristecido e eles se abraçaram mais uma vez antes de ir embora.

⚽🖤📱

Com muito custo, a vida precisava seguir para eles, e por mais que os dias seguintes tivessem sido os piores da vida de , ela estava tentando se agarrar à esperança de que dias melhores viriam. Seu pai era uma pessoa otimista e sempre tentava ver as coisas pelo lado bom, então ela estava tentando adotar essas filosofias para a sua vida enquanto passava pelo processo do luto junto com sua mãe, ficando mais próximas do que nunca e fazendo praticamente tudo juntas, já que agora só tinham uma à outra.
, por sua vez, treinou arduamente durante os dias que se seguiram e respeitou o espaço que precisava no começo. O jogo seguinte seria contra o Internacional e ele convidou as duas para que fossem, pois o time tinha uma surpresa para elas. aceitou o convite de e foi com a sua mãe para o jogo no estádio, assim poderiam sair um pouco de casa e pensar em outras coisas, afinal, a parte mais difícil era justamente ficar em casa com tudo o que lembrava seu pai.
e sua mãe se sentaram nas poltronas do camarote que reservou para elas. Dali tinham uma visão boa para o campo e se sentiu feliz por entrar no clima do futebol novamente. Sentir a energia da torcida apoiando e a atmosfera de jogo lhe faziam muito bem, mas estava preocupada pelo adversário, pois não sabia o que esperar de mais um encontro de e Paolo Guerrero, então lhe cabia apenas ficar ali aguardando o desfecho da história, ansiosa por saber qual seria a tal surpresa que mencionou para ela um dia antes.
Quando os times entraram em campo, precisou espremer os olhos para ter certeza de que estava vendo certo. O time da casa entrou com uma faixa gigante na qual todos os atletas precisavam segurar, e nessa faixa preta com letras brancas, estava o nome completo do pai de , sua data de nascimento e de morte, seguidas pela frase "eternamente dentro dos nossos corações".

- Não acredito - disse enquanto sentia as lágrimas se formando nos seus olhos.
- Ele merece - sua mãe disse igualmente emocionada.

E de fato merecia, era um torcedor apaixonado como tantos outros. Aquela homenagem significava muito, mas o grande impacto foi quando houve um minuto de silêncio em sua homenagem antes do início da partida. Pareceu durar muito mais do que apenas um minuto, e sua mãe estavam abraçadas e não se importavam de chorar para quem quisesse ver. Estavam vestindo camisas de jogo que eram dele, tinha um grande valor emocional, era como se Elias estivesse ali com elas também. Por mais que ainda guardasse mágoas pela forma como deixou o clube, se esqueceu disso por um momento e focou na singela homenagem, e só caiu na realidade novamente quando a bola estava rolando.
No campo, a bola já estava rolando para Corinthians e Internacional. O primeiro tempo foi bem equilibrado com os dois times jogando bem e criando chances claras de gol, embora o time do sul levasse uma leve vantagem para cima dos alvinegros, mas isso não foi o suficiente para que eles desanimassem, pois foi Jô que marcou um gol de cabeça que abriu o placar nos acréscimos e com isso o time levou a vitória parcial da primeira etapa para o vestiário.
No segundo tempo, foi Guerrero que empatou para o Internacional, e logo em seguida Galhardo virou, mas o empate corinthiano veio aos vinte e cinco anos com um gol de Luan e assistência de , aquela dupla realmente estava funcionando, para a surpresa de todos. E por mais que o jogo continuasse disputado é muito acirrado, ainda tinha mais uma dedicatória e estava lutando bravamente para o fazer acontecer, mesmo sabendo que seria punido com um cartão amarelo, e justamente por isso estava evitando confusões e provocações do time adversário.
E parecia que a sorte estava do seu lado quando ele sofreu um pênalti que culminou na expulsão do goleiro depois da análise do VAR que demorou devido ao nível de dificuldade da jogada. apenas aguardava enquanto o time adversário discutia fervorosamente com o árbitro contra a expulsão do goleiro e também contra o pênalti, queria ficar longe de qualquer polêmica, especialmente naquele jogo que ele sabia que todos estavam de olho nele dado ao seu histórico dos últimos jogos contra os colorados. Ele não queria mais ter a sua imagem relacionada à todas aquelas confusões.
Depois de ao menos três jogadores amarelados e uma substituição de um meia pelo goleiro reserva, foi autorizado pelo árbitro à realizar a cobrança do pênalti. Se posicionou na marca, tomou distância e não hesitou ao cobrar com maestria, virando o jogo. O time veio comemorar com ele, mas correu em direção à torcida, tentando ficar o mais perto possível de onde com sua mãe estavam. Ele tirou a camisa e se pôde ver que ele tinha escrito o nome do pai de com a mesma frase da faixa. Ele não enxergava tão bem assim de tão longe, mas sabia que estava olhando para ele dali, ele nem tinha ideia de que ela não conteve a emoção, e mesmo depois de ele ter tomado um cartão amarelo por tirar a camisa e o jogo já ter recomeçado, ela ainda não tinha conseguido se recompor.
se quer sabia como agradecer.

- Eu acho que ainda não acabou - Rose disse para que olhou espantada para ela.
- Ele disse que me perdoou, mas... Não sei, talvez não tenha mais volta - ela caiu na realidade novamente, imaginou que só estivesse sendo gentil por ela estar de luto. - Ele não confia mais em mim como antes, só tá sendo legal.
- O que ele está fazendo não é só coisa de quem está sendo legal, , quando que você já viu uma coisa dessas acontecendo?
- Mãe... - respirou fundo, por mais que sua mãe tivesse uma parcela de razão, ela sabia muito bem que não era uma pessoa tão simples de lidar. - tem um coração enorme, mas não é bobo, ele sabe o que eu fiz, ele não esqueceu e nem deixou de gostar de mim, assim como eu vou continuar gostando dele por muito tempo, mas... Sinceramente? Olha só pra ele, está voando, vai ter eliminatórias da copa daqui umas semanas e ele com certeza vai ser convocado, e se o time continuar assim, podemos esquecer dele pra próxima temporada... Onde eu fico no meio disso?
- Você fica com ele, a vida dele não é só o futebol.
- Eu fico com a senhora, mãe, somos só nós duas agora. Eu preciso de você, e você precisa de mim. Eu não tô com cabeça pra isso agora e ele está respeitando o meu espaço.
- Eu entendo, , só espero que você se permita ao menos uma vez, seja agora ou depois, só não se arrependa mais tarde do que você poderia ter feito agora, mas não fez...

⚽🖤📱

A data FIFA de setembro ocorreu exatamente como disse, com sendo convocado para dois jogos eliminatórios contra Colômbia e Peru, sendo o primeiro disputado em Santiago, no Chile, com vitória brasileira e o segundo seria disputado em Quito, no Equador, onde a Seleção Brasileira já estava concentrada para a partida que seria no dia seguinte. se quer teve tempo de aproveitar o primeiro jogo, chegou na data limite e treinou muito para poder jogar, embora tivesse sido aproveitado apenas na segundo etapa, e sequer teve tempo de conversar com Arthur, então estava usando da concentração no quarto de hotel em Quito para isso.
, Arthur e Coutinho estavam entretidos no vídeo game em um jogo de luta entre os dois primeiros, mas Arthur estava levando vantagem sobre que acabou perdendo a partida e passando a vez para Coutinho. pegou seu celular que estava carregando debaixo do travesseiro para se entreter enquanto os outros discutiam sobre qual personagem escolher. Ele viu uma foto que postou com o seu pai, realçando o quanto estava com saudades dele e o quanto amava, ele curtiu e deixou um coração, também sentia saudades de Elias, afinal, era um amigo também.
se perguntou se era imprudente da sua parte interagir tanto com ela já que continuavam separados, mas ele não conseguia se afastar sabendo o momento difícil que estava passando. Às vezes pensava em cortar relações de vez, mas simplesmente não conseguia porque sabia que um simples bom dia da parte dele já melhorava os dias dela que estavam sendo tão longos quanto os dele, a diferença era que tinha com o que distrair a cabeça, já ela não.

- Eu não vou mais jogar essa merda, você só rouba! - Coutinho jogou o controle na cama enquanto Arthur comemorava mais uma vitória.
- A culpa não é minha se você não sabe perder, Philippe - Arthur se defendeu. - , é sua vez - ele não recebeu resposta e se virou para olhar o amigo que estava distraído no celular. - !
- Quê? - o jogador olhou para eles sem entender o que estava acontecendo.
- É sua vez de jogar. Ou melhor, de ser roubado pelo Arthur.
- Podem jogar, eu vou na próxima.
- , você tá bem? - Arthur perguntou preocupado. - Tá meio distraído desde que chegou. É a ?
- É... Já te falei que não estamos mais juntos, mas eu não consigo me afastar porque sei que ela tá passando pela maior barra.
- O fato de terem terminado não quer dizer que não possam mais ser amigos - Philippe aconselhou.
- Eu sei, mas... É complicado, o que aconteceu foi péssimo, eu perdoei ela, mas manter só uma amizade é mais difícil do que eu achava.
- Mas você quer se afastar dela, ? Quer mesmo? - Arthur questionou, sabia o quanto o amigo poderia ser indeciso.
- Não sei... - disse com sinceridade. - Às vezes eu quero, mas não consigo, no final sou eu que corro atrás, e...

Ele foi interrompido por batidas na porta e Philippe foi abrir.

- O ousado chegou - Neymar anunciou entrando no quarto. riu, achava que aquilo nunca perderia a graça. - O Jesus tá putinho porque o Firmino ganhou dele outra vez no FIFA, não aguentei e tive que sair de lá. Qual é o papo aqui?
- Arthur está roubando no jogo igual o Firmino e o tá sofrendo. Eu só tô aqui existindo mesmo.
- Problemas com a gata, ? Eu sei bem como é, parça. Mulher é um bicho doido mesmo.
- Só as que você arruma, felizmente o resto de nós tem juízo - Coutinho se defendeu e Arthur concordou, não concordavam com o pensamento do amigo.
- Eu terminei com a minha namorada, o pai dela morreu nesse meio termo e agora não tem Bruna Marquezine que me faça sair de perto dessa mulher, eu simplesmente não consigo. Com todo o respeito - disse tudo de uma vez e riu da careta que Neymar fez ao ouvir o nome da ex.
- É complicado, né? Mas se o pai dela morreu, eu não acho certo você se afastar desse jeito, cara.
- Eu sei, é por isso que eu não consigo, ela está mal - ele soltou um longo suspiro.
- Para de pagar de desapegado, , olha aí seus olhos brilhando quando fala dessa menina, e além disso, a não é pouca coisa, ela não vai ficar se arrastando atrás de você - Arthur disse um pouco impaciente, aquela conversa era muito óbvia.
- Mas eu não quero que ela fique se arrastando atrás de mim, Arthur - tentou se defender, mas os três olharam para ele como se não acreditassem. - O que foi?
- Cara, a gente não quer se intrometer na sua vida. Se você acha que deve se afastar mesmo nesse momento, então vá em frente, mas como o Arthur disse, ela não é pouca coisa, e outro vai passar na sua frente muito rápido. Espero que tenha ajudado e vamos voltar pro jogo, por favor, eu vou bater no Arthur dessa vez - Coutinho disse afim de encerrar aquela conversa e pegou o controle que estava antes para que ele e Arthur pudessem voltar a jogar.

voltou a atenção para o celular quando os amigos iniciaram mais uma partida, se quer tinha notado que Neymar o observava.

- Espero que esteja me analisando pra me levar pra jogar com você - ele disse quando se deu conta e o jogador riu.
- Não, você não ia aguentar três minutos com o Mbappé, ele é muito chato... Só tô pensando... Eu não desistiria se fosse você, não só porque ela perdeu o pai.
- Cara, tem muito mais coisas envolvidas, eu terminei por um bom motivo.
- Mas você nunca errou antes? Quero dizer, eu acho que ninguém errou tanto quanto eu em alguma coisa, mas ninguém desistiu de mim.
- Eu já errei muito com ela - esboçou um sorriso entristecido, seus momentos egocêntricos lhe causavam uma repentina vergonha.
- É só a minha opinião... Eu desisti muito fácil de alguém, não gosto de ver os outros cometendo o mesmo erro que eu.
- Sinto muito - disse com sinceridade por entender o que ele estava falando. - Você tem razão, talvez não valha a pena...
- Imagino que quando você conquistar o mundo, vai ser ela que vai estar do seu lado.
- Ela já está... - por um segundo, ele parou para refletir e de fato, esteve em todas as recentes conquistas deles. - Nossa... Eu acho que eu fiz uma merda enorme...
- Usa toda essa sua inteligência no campo fora dele também.
- Quem diria que logo você ia dar um conselho pra alguém, adulto Ney - Arthur, que prestava atenção na conversa, disse sem desviar o olhar da TV. - Relaxa, o é artilheiro dentro e fora do campo, vai marcar um golaço com a .
- Sabe como é, Arthur, o pai tá on e tem que mostrar como faz.
- Talvez não seja o Mbappé o chato - disse divertindo, fazendo os quatro rirem, e a conversa tinha se encerrado ali.

⚽🖤📱

Pela primeira vez, estava verdadeiramente tranquilo jogando pela Seleção. Ele não estava emocionado como na primeira vez e nem pilhado como na final da Copa América, muito pelo contrário, estava abraçando a responsabilidade, mas sem partir para o emocional. Tinha a plena consciência de que aquele jogo era o caminho para a Copa do Mundo de 2022 e ele queria fazer bonito, mas não estava sozinho, estava jogando pelo time e o time jogando por ele.
Do outro lado, não era qualquer time, e mesmo que ele já tivesse enfrentado Paolo Guerrero um pouco antes por outra competição, ele sentia a necessidade de colocar um ponto final naquela rixa boba, estava disposto a ceder e deixar aquilo para trás, afinal, foi justamente aquela briga que o afastou dos gramados por meses, mas não queria continuar cometendo os mesmos erros, e quando apertou a mão do jogador adversário e desejou um bom jogo, foi com sinceridade, o que despertou a curiosidade do rival.
E quando a bola começou a rolar, ele fez a parte dele. A pedido do técnico Tite, abusou da sua velocidade pelos lados, já que o seu marcador estava perdendo a maioria das jogadas, e com isso, conseguia entrar na área ou cruzar para dentro dela na maioria das vezes, o que resultou em um gol de Neymar aos trinta minutos do primeiro tempo.
Após Guilherme Arana interceptar uma bola e avançar, o lateral passou a bola para que conseguiu fugir da marcação e entrar na grande área, mas foi derrubado. O árbitro imediatamente apitou um pênalti e aplicou cartão amarelo no zagueiro peruano, e enquanto o time adversário argumentava contra, continuou caído, o tornozelo que antes havia lesionado estava doendo devido à solada que ele levou. Não doía como no dia em que machucou, mas era o suficiente para ele ficar preocupado. Antes de ir conferir o VAR, o árbitro da partida foi até ele para ver se precisava de atendimento, mas se levantou e firmou o pé no chão para mostrar que estava bem antes que os médicos do time entrassem em campo, então o juiz foi conferir o lance no VAR.

- Tá com a corda toda hoje, moleque - Neymar comentou com ele enquanto aguardavam a revisão do lance. - Uma assistência, um pênalti...
- Um pênalti bem doloroso - fez uma feição de dor quando deu um passo e mancou. O outro olhou um tanto preocupado pra ele. - Nada demais.
- Cara... Se você não aguentar, é melhor falar, ele vai colocar o Coutinho.
- Não, eu tô bem - ele insistiu e então o árbitro voltou para a área um pouco depois, validando o pênalti à favor dos brasileiros.

A movimentação no campo começou para que Neymar batesse o pênalti. Ao som do apito, o camisa 10 efetuou a cobrança, mas o goleiro peruano defendeu, não sendo capaz de evitar um rebote no qual se aproveitou e marcou. Já não sabia quantos gols tinha marcado com aquela camisa, só tinha certeza que todas as vezes a sensação era a mesma, e ver o time correndo para comemorar com ele era algo que ele nunca iria esquecer.
No intervalo do jogo, garantiu que estava bem para voltar para o segundo tempo, pois queria entregar mais, e Tite vendo a vontade dele, concordou em não o substituir naquele momento para ver até onde ele poderia ir sem comprometer o desempenho do lado esquerdo.

- Você vai mesmo tomar o meu lugar, pivete - Coutinho comentou bem humorado enquanto voltavam para o campo.
- Você não se importa, não é? Preciso fazer bonito - respondeu rindo e o amigo negou com a cabeça.
- Vou levar você na minha mala pra jogar comigo lá fora - ele disse por fim e andou em passos rápidos em direção ao banco de reservas.

parou de caminhar para absorver o que Coutinho disse. Seria possível? Ele já quase não pensava mais nisso, estava feliz e consciente de que poderia alcançar coisas grandes ainda naquela temporada, e era apenas isso que estava buscando. O que vinha depois disso já não tirava o seu sono. Seu contrato com o Corinthians já estava quase no fim e ele queria ouvir a proposta do clube para renovar e quem sabe permanecer por mais um bom tempo.
Poderia ser loucura, mas queria.

- Para de atrapalhar o caminho! - ele acordou com um empurrão de Arthur e os dois deram risadas enquanto entravam no campo. - Tava pensando em quê?
- Tive uma epifania, Arthur.
- Ah, é? Por quê? Descobriu que é o nosso craque?
- Não, eu descobri que eu sou feliz pra caralho.
- Se você está dizendo... – Arthur negou com a cabeça enquanto ria e os dois seguiram caminho.

⚽🖤📱

O segundo tempo estava sendo árduo para a Seleção Brasileira, pois a equipe peruana voltou diferente e com vontade de virar o jogo, o que resultou em uma segunda etapa mais faltosa, e uma parte do time adversário já estava amarelada, era questão de tempo até alguém ser expulso. estava evitando qualquer confusão e sofria as faltas sem revidar, provavelmente sendo o jogador que mais apanhava depois da substituição de Neymar por Firmino.
Ele não queria desistir, mas após uma dividida em que cabeças se encontraram, ele caiu com o tornozelo latejando e o supercílio esquerdo aberto, escorrendo sangue pelo seu rosto. se sentou no gramado e levou a mão ao local, sujando a sua mão de sangue. A cabeça doía um pouco por causa do choque, mas o tornozelo incomodava mais. precisou de um instante para se situar, estava tonto, mas quando o árbitro chegou nele de novo para ver se ele precisava de atendimento, ele sabia que não podia mais continuar e pediu substituição. Arthur foi até ele para ajudar o amigo a se levantar.

- Você foi gigante hoje, cara, obrigado - disse enquanto deixava se apoiar nele, pois estava mancando muito.
- A praga do Coutinho pegou, olha pra mim, tô todo arrebentado - tentou soar descontraído, mas sentia como se tivesse acabado de ser nocauteado em uma luta.

Philippe aguardava deixar o campo - sob muitos aplausos da torcida - para poder entrar. Parabenizou o amigo quando ele passou da linha e entrou enquanto foi até o banco e se sentou, respirando fundo logo em seguida, estava exausto e dolorido, porém com a sensação de dever cumprido. Se deixou ser atendido sem se preocupar com o diagnóstico, pois qualquer coisa que fosse teria valido a pena, estava orgulhoso de si mesmo.
Ele assistiu o resto da partida sentado ali sem mexer o tornozelo que estava com um saco de gelo em cima, e o supercílio que sabia que levaria alguns pontos depois. Ainda viu a Seleção Peruana marcar um gol, e Gabriel Jesus marcar mais um para time antes de encerrar a partida. O Brasil estava muito perto de garantir vaga para a Copa do Mundo e sabia que tinha colaborado um pouco para isso, estava em paz como não se sentia há algum tempo.
E pensando em paz, ele se levantou no fim do jogo e foi cumprimentando todos os jogadores que passavam por ele para sair. Guerrero, por sua vez, tentou passar despercebido, mas não conseguiu.

- Não foge de mim! - fez sinal para que ele se aproximasse e foi mancando até o rival.
- Não tô afim, cara - o peruano disse chateado com a derrota.
- Para com isso, você fez a sua parte.
- Hum... Acho que você bateu a cabeça com força.
- Olha... Eu sinto muito pelo que eu disse pra você, criamos uma rivalidade boba só por causa dos nossos times... Eu não sou mais quem eu era há dois anos atrás, espero que você possa me perdoar - dizia enquanto tirava a camisa. - Quer trocar?
- Por que está fazendo isso agora? - Guerrero perguntou desconfiado enquanto tirava a sua também.
- Porque eu preciso... Como eu falei, eu não sou mais quem eu era antes, e não quero mais ficar guardando ressentimento de ninguém.
- É... Você parece mudado, isso é bom - ele estendeu a camisa para . - Deixa essa merda toda pra lá. Me desculpa também.

sorriu e pegou a camisa dele, entregando a sua em seguida. Guerrero agradeceu e seguiu seu caminho enquanto foi para o vestiário em passos lentos, pensando que seria uma longa caminhada. Só queria se livrar daquela chuteira apertada e descansar. Não sendo uma lesão grave, não precisava se preocupar com mais nada.

⚽🖤📱

- Mandei tantos currículos hoje que acho que a minha mão vai cair - comentava com sua mãe enquanto elas comiam a pizza que haviam pedido.
- Isso é muito bom, , mandou pra sua área?
- Sim! Quero voltar a trabalhar com mídias, mas acho que vai ser melhor dar um tempo do futebol e focar em outras áreas do marketing, mas caso eu não consiga, também mandei para outros tipos de vagas. Eu só preciso ocupar minha cabeça um pouco...
- Ele ia querer que seguíssemos em frente o mais rápido possível, filha - Rose esboçou um sorriso entristecido. Falar do marido continuava sendo doloroso.
- Eu sei... Mas já estava ruim antes, agora só piorou sem ele aqui. Eu me pergunto se ele teria orgulho de mim, mesmo com tudo isso.
- , é claro que sim! Seu pai sempre teve orgulho de você, nunca pense o contrário. Todo mundo passa por um momento difícil, mas eu posso garantir que ninguém dava tanto orgulho pra ele quanto você.
- Sinto saudade dele - estava reprimindo à vontade de chorar, era impossível não pensar no seu pai o tempo inteiro e ela não sabia se iria conseguir seguir em frente algum dia.
- Eu também, eu também...
- Como a senhora está conseguindo ser tão forte, mãe? Parece que o mundo acabou pra mim.
- Eu não sou forte, , eu só... - diferente de , Rose permitiu se levar pela emoção. - Eu só tenho você agora e é nisso que eu me agarro.
- Nós vamos ficar bem, mãe - tentou sorrir e soar otimista, mas seus olhos marejados denunciavam o quanto seria difícil.

Elas continuaram comendo e conversando sem entrar muito no mesmo assunto. Assistiram a um filme juntas e então era a hora de dormir, já havia passado de uma hora da manhã e estava com muito sono. Ela já estava para desligar a TV, quando em um telejornal noturno, viu que estava sendo noticiada a vitória da Seleção Brasileira sobre o Peru, jogo este que ela havia esquecido completamente, de tão distante que estava do futebol. Ela prestou atenção e se sentiu feliz por ver que era o destaque da notícia, mesmo com Neymar e Gabriel Jesus marcando os outros dois gols da vitória, a bravura dele foi destacada, mas deixando claro que o diagnóstico da sua lesão seria dado apenas no Brasil quando ele já tivesse retornado ao seu clube, por isso decidiu desligar a TV e subir para o seu quarto.
Se lembrava de quando sofreu uma lesão séria um ano antes e de como ele sofreu, estava torcendo para que dessa vez não fosse tão grave quanto antes. Ela foi colocar o celular para carregar e finalmente dormir, mas uma mensagem de chegando no mesmo instante, perguntando se ela estava bem, a fez mudar de ideia.
Era difícil estarem separados justo quando ela mais precisava, mas ver a preocupação dele diante da situação era um pouco reconfortante, ao menos ele não estava indiferente e se mostrava prestativo, inclusive pagando por todos os gastos funerários necessários, algo que já havia agradecido tanto nos últimos dias e mesmo assim achava que era pouco. Queria ter por perto mais do que tudo, mas sabia que não teria, afinal, ela continuava se culpando pela sua atitude e imaginou o quanto seria difícil recuperar a confiança dele, algo que ela não estava com cabeça para fazer no momento.

"Eu tô bem, obrigada! Acabei não vendo o jogo hoje, mas vi que você levou a pior de novo. Sinto muito e espero que não seja nada grave e você possa voltar a jogar logo ❤"

"Aqui já é bem mais tarde e eu tô com muito sono kkk mas depois a gente se fala. Boa noite!"

Era estranho digitar aquelas mensagens sem se expressar como queria. Ela não perderia um jogo dele por descuido, não desejaria uma boa noite sem reforçar depois que o amava, e também não seria tão superficial ao desejar melhoras, ela própria faria com que ele se sentisse melhor. Se ficou preocupada? Muito, mas não queria soar como uma chata insistente, então tentou ser o mais educada possível sem soar insensível, mas para ainda era pouco. Queria mais do que tudo que estivesse ali, mas sabia que precisava deixar ele ir, achava que já não se encaixavam mais e ela precisava focar na sua própria vida e recuperar o amor próprio antes de dar amor para outra pessoa.
Era doloroso, mas ela precisava.

Capítulo 34 - Mais uma tentativa

Semanas depois...

já tinha se esquecido de como era cansativo pegar o metrô todos os dias e enfrentar aquela batalha diária, mas não podia reclamar, afinal, era questão de tempo até que pudesse ter o seu próprio carro. Seu novo trabalho na sua área de formação era o seu emprego dos sonhos e aos poucos ela estava seguindo em frente e retomando a sua vida com o apoio de sua mãe e dos seus amigos mais próximos.
Após mais uma semana inteira de muito trabalho, ela recebeu convite de Gabriela para que pudessem sair juntas e acabou por aceitar, achando que um happy hour cairia bem e já fazia algum tempo que ela não saía para se divertir um pouco. Ela e Gabriela optaram por um restaurante australiano famoso já que eram apenas as duas e ficava perto de onde Gabriela morava.

- Eu trabalhei mais no último mês do que na minha vida inteira, tenho certeza disso - disse após as cervejas chegarem e ela dar um gole. - Não tenho tempo nem de respirar.
- E eu com a faculdade e o estágio. Bem-vinda de volta à idade adulta - Gabriela fingiu brindar e as duas riram. - Mas veja pelo lado bom, pelo menos você está ocupando a cabeça.
- Mais do que isso, tô conseguindo me organizar muito melhor, estou até pensando em fazer outra faculdade no ano que vem. Talvez publicidade e propaganda ou design gráfico.
- , isso é muito legal. É bom te ver bem e feliz de novo.
- Eu acho que é o que ele queria, não é? Eu estou tentando, tem dias que é fácil e tem outros que eu mal consigo levantar da cama, mas a saudade vai deixando de ser uma dor e vira uma lembrança boa.
- Isso é lindo - Gabriela sorriu, mas não conseguia se imaginar vivendo sem o seu pai, admirava a força de .
- Mas vamos mudar de assunto! Já decidiu pra que área você vai?
- Já, e é meio óbvio. Quero fazer especialização na recuperação de lesões de atletas, e sim, tem uma mão toda do Bruno nessa história.
- Sorte a dele ter uma massagista em casa - comentou divertida e as duas deram risadas.
- Isso quando ele está em casa, né? Só fala da Libertadores agora, acho que ele tá com dificuldade de separar as coisas.
- Meu Deus, eu esqueci completamente da Libertadores - não estava acompanhando o time recentemente e havia empatado o jogo de ida pela semifinal contra o Flamengo. - Quanto foi?
- Empataram, a decisão vai ser no Maracanã semana que vem, então o Bruno tá concentrado, mas me surpreende eu saber disso e você não.
- Eu não estou acompanhando o time, sabe? Não que eu tenha deixado de ser torcedora, mas foquei em outras coisas, além disso, não quero ficar olhando pra cara do meu ex namorado toda quarta e domingo - ela tentou soar descontraída, pois o contato com diminuiu até sumir. - Desejo todo o sucesso do mundo pra ele, mas pra que ficar revirando o passado, né? E ele parece estar ótimo.
- O tá bem, vi ele esses dias com o Bruno, tá tentando seguir a vida dele, parece que a renovação do contrato dele vai ser uma novela. O time quer renovar, mas o empresário dele está tentando negociar luvas e o valor da multa rescisória, sabe? Ele é tipo, muito, muito valioso.
- Nossa, o mundo deu voltas, você está muito mais por dentro das novidades do que eu. Estou impressionada.

Elas conversaram sobre tudo o que tinham pendente, beberam e deram risadas. era grata pela amizade que cultivou, sentia falta de ter uma amizade daquela com uma mulher, e de longe Gabriela havia se tornado sua melhor amiga e esteve com ela quando mais precisou. Torcia pelo relacionamento dos amigos e estava feliz de ver que eles estavam construindo uma vida juntos e certamente tinham um futuro bom pela frente.
Já estava tarde o suficiente para optar por não voltar pra casa sozinha e aceitou quando Gabriela sugeriu que ela passasse a noite em sua casa.

- Vai ser só a gente, o Bruno quase não está voltando pra casa mesmo - a garota dizia enquanto abria a porta de casa, mas se assustou quando viu o namorado na sala jogando videogame.

E Bruno não estava sozinho. não escondeu a sua surpresa por ver que estava com ele. Só estava se perguntando o que os dois estavam fazendo ali naquele dia e horário.

- Hum... Boa noite? - Gabriela tentou não parecer tão espantada quanto realmente estava. - Bruno, achei que você ia ficar na concentração.
- E eu ia, mas voltei, já que o jogo é só no domingo - Bruno se explicou.
- Gabi, você atrapalhou a noite dos meninos - tentou soar descontraído, mas só pensava no quanto era constrangedor.
- E vocês atrapalharam a noite das meninas - Gabriela respondeu.
- Não se preocupa, eu já estou indo embora.
- Como se o seu carro não está lá fora?
- Meu carro está no concerto, seu namorado é o meu motorista particular por enquanto e vai me levar embora.
- Não tô te expulsando, , deixa de ser besta. Tem batata e costeletas aqui, se quiserem - ela mostrou a sacola com o que elas não conseguiram comer e entregou para Bruno, depois se virou para . - Amiga, vem comigo, vou te mostrar um rímel incrível que eu comprei - ela puxou pelo braço e elas deixaram a sala.

Subiram as escadas rapidamente até o quarto de Gabriela, e não precisou se esforçar muito para ver que não tinha rímel nenhum e sim que a amiga estava evitando um constrangimento maior pra ela.

- Valeu, eu não esperava encontrar ele aqui - ela admitiu.
- O Bruno não avisou que ia voltar pra casa, me desculpa, .
- Relaxa, Gabi, eu não odeio o , só tô surpresa - disse rindo para amenizar a preocupação da amiga. De fato, não tinha ressentimento nenhum entre os dois.
- Sério mesmo?
- Juro! Até acho que ele tá lindo com aquele cabelinho cortado, não é? Até fiquei com saudades! - tentou descontrair para ela relaxar.
- Ah, sei, sei. Você finge que me engana, , e eu finjo que acredito.
- Vou voltar lá e te mostrar que está tudo bem.
- Vou fingir que acredito. Pode ir lá, eu vou trocar de roupa e já desço.

concordou e deixou o quarto. Desceu as escadas e voltou para a sala, vendo que estava jogando sozinho, o que ela não esperava, mas como estava tudo perfeitamente bem, ela não via motivos para fugir. Se sentou no outro sofá e observou, não sabia como puxar assunto, mesmo ela sendo a pessoa que o conhecia melhor do que ninguém. Era estranho, ela não conseguia ser ela mesma, mas precisava ao menos tentar.

- Onde está o Bruno? - ela perguntou pouco depois.
- Ele disse que ia ao banheiro, mas acho que desceu pelo vaso - respondeu sem tirar os olhos da TV, seu time estava atacando.

apenas assentiu e achou melhor não perguntar mais nada, sabia como ele gostava de se manter concentrado quando estava jogando, então ela se limitou a observar até que acabasse. Era uma daquelas partidas de quinze minutos e ele já estava no final do segundo tempo.

- Quer jogar? - ele perguntou quando terminou, oferecendo o outro controle para ela.
- Eu vou passar vergonha, mas tudo bem - ela aceitou e precisou trocar de lugar para enxergar melhor, se sentando perto dele, então começaram a escolher os times. - Você não deveria estar dormindo? Não que seja da minha conta, mas... Bem, você deveria.
- Eu sei, vou ficar agradecido se você não contar pra ninguém - riu e escolheu o Bayern München.
- Ah, fica tranquilo, era pra eu estar dormindo também - dizia enquanto escolhia o PSG.
- E o que você tem feito de bom?
- Trabalhando mais do que na minha vida inteira - ela riu. - Arrumei um emprego na minha área.
- Sério, ? Isso é muito bom, eu fico feliz por você. A sua mãe está bem?
- Ela tá seguindo... Se ocupando com o trabalho dela, estamos ficando bem.

corrigiu a postura no sofá quando eles começaram a jogar para que não começasse em desvantagem. era bom no videogame, mas ela não se intimidava por isso e usou do que sabia. Estavam tão entretidos que não repararam que Gabriela e Bruno estavam observando do corredor, mas eles saíram nas pontas dos pés para não fazer barulho e chamar a atenção deles. Achavam que ainda não tinha acabado.

- Nossa, , não dá pra jogar com você. Você é muito apelão! - disse após sofrer um gol e riu.
- O quê? Eu não fiz nada! Não tenho culpa se eles são o melhor time do mundo.
- Acho meio irônico você dizer isso justamente sobre o time que humilhou o seu Barcelona, mas tudo bem, eu concordo.
- Não precisa me lembrar disso, ok? Eu já tinha superado - os dois riram e voltaram a atenção para o jogo.

ganhou com um placar final de 3x2, pois também tinha as suas habilidades como gamer, mas depois eles já não tinham mais assunto. Era um pouco incômodo, afinal, nunca faltou assunto e esse seria um momento de intimidade entre os dois que poderia levar a algo a mais depois, mas não dessa vez.

- Estranho o Bruno e a Gabi terem sumido - comentou para saírem do silêncio.
- Bobinha, amo sua inocência - riu e ela olhou para ele curiosa.
- Com certeza eles nos viram jogando e saíram achando que iria acontecer alguma coisa entre a gente.
- Eu juro que vou deitar esses dois na porrada, me dá licença - foi se levantar, mas segurou o braço dela.
- É tão ruim assim ficar perto de mim? Eu juro que estou muito melhor - ele disse bem-humorado e riu enquanto se sentava de frente pra ele.
- Não foi isso o que eu quis dizer, mas como já faz algumas semanas que eu não falo com você, então não sei se você mudou alguma coisa.
- Hum... Deixa eu pensar... Bom, eu pedi desculpas para o Guerrero no último jogo da Seleção, esqueci de te dizer.
- É sério? Nossa, isso é um passo enorme, daqui a pouco vai dizer que o Luan tá morando com você - foi impossível para ela não rir com a gargalhada dele.
- Sim, ele está dormindo no seu lado da cama, palhaça!
- , eu não acredito que em dois meses você já me substituiu assim, eu tô muito ofendida.
- É impossível substituir você, .

parou de rir com o que ouviu, mas parecia bem tranquilo com o que disse. Não estava usando de nenhuma cantada, apenas expressando o carinho que tinha por ela. É claro que a amava, aquele sentimento não iria embora nunca, ele não achava prudente dizer naquele momento, mas sempre era o momento certo de dizer que a admirava.

- Para, ...
- Não é uma cantada, eu juro! - ele sorriu de canto.
- Jura mesmo? Parece uma pra mim - tentou parecer séria, mas se fosse uma ela não se importaria.
- Você queria que fosse, não é? Eu te conheço - ele decidiu arriscar, e pela feição de , ele percebeu que ela não sabia exatamente o que responder.
- Eu não acharia de todo ruim se fosse.
- E você quer que seja?
- Essa é a pior flertada da minha vida - ela riu de si mesma, se sentia ridícula. – Isso não funciona com a gente.
- Você nunca foi muito boa em flertar, de qualquer jeito, mas compensa sendo uma grande gostosa - baixou o tom de voz gradativamente, como se estivesse contando um segredo, olhou para os lábios de que prendeu a respiração.

Qualquer outra pessoa no mundo seria esbofeteada por se a chamasse de gostosa de maneira tão explícita, mas era quem estava dizendo e, de certa forma, ela gostava, se sentia muito atraída.
Foi que rompeu a distância e juntou seus aos lábios nos dele, exatamente como fez quase dois anos antes quando deram o primeiro beijo, este que ela se lamentava por não lembrar, mas já não se importava. O que realmente importava era estar ali com ele, mesmo que durasse só alguns instantes. Foi que interrompeu o beijo, olhou confusa pra ele, mas segurou as mãos dela, deixando um beijo em cada.

- Eu amo você, e sinto a sua falta todos os dias, mas se não for pra ser, não posso criar expectativas em nós dois, , eu não quero que ninguém se machuque.
- , eu sei que eu errei, e estaria mentindo se eu dissesse pra você que já superei, porque acho que o que a gente teve não vai ser superado nunca.
- , nós dois erramos, para de se culpar... E eu tive muito tempo pra pensar, e exagerei. Estávamos separados, você podia ficar com quem quiser.
- Mas...
- Deixa essa história pra lá, , não importa mais... - ele suspirou, era frustrante ter aquela conversa se não chegariam a lugar nenhum. - Eu acho que está na hora de eu ir embora, vou avisar o Bruno e pedir um uber. Licença.
- Espera, - se levantou ao mesmo tempo que ele. - Deixa eu ir com você.

pareceu surpreso e curioso por um instante, mas esboçou um sorriso de canto ao concordar, ele não iria deixar passar a oportunidade de poder ficar mais um pouco com ela.

- Eu já volto.

Ele se levantou e saiu da sala, mas não demorou muito para voltar acompanhado por Bruno e Gabriela que eram péssimos em disfarçar, especialmente porque tinham sumido de propósito, mas foi elegante ao fingir que não sabia de nada.

- Estamos indo embora - ele anunciou enquanto mexia no celular.
- Eu vou te levar, .
- Não precisa, eu tô chamando um uber pra gente - ele percebeu o olhar dos dois pesando sobre ele. - Com paradas.
- Tem certeza que não precisam?
- Relaxa, Gabi, a gente não quer atrapalhar vocês - deu uma piscadinha para amiga que corou.

e se despediram de Gabriela e Bruno e então foram para o lado de fora esperar pelo carro. Estava uma madrugada fria, e a jaqueta jeans que vestia não esquentava o suficiente. Ela encolheu os ombros e cruzou os braços, mas viu e se aproximou, envolvendo os seus braços ao redor dela para aquecer.

- Lembra da primeira vez que você fez isso naquele estacionamento? - ela perguntou.
- Lembro, você estava usando uma blusa roxa horrorosa - pontuou fazendo gargalhar.
- Precisava lembrar disso? Eu estava falando do momento.
- Eu sei... O que você sentiu naquele dia?
- Eu senti que seria pra valer.
- E eu ia te contar o que eu estava sentindo, mas perdi a coragem - contou aquilo pela primeira vez e olhou pra ele com curiosidade.
- Por que não contou?
- Não sei, achei que você não sentia o mesmo... Eu não queria perder a amizade.
- Você teria sido correspondido - levou uma das mãos ao rosto dele e fechou os olhos por um instante para sentir o toque dela.
- Tô com saudade.
- Eu também...

se curvou para deixar um selinho demorado na boca dela e não puderam passar disso, pois o carro chegou logo em seguida. Os dois entraram e a puxou para perto, deixando encostar a cabeça em seu ombro. Ele já estava dando sinais de sono, seus olhos começavam a pesar e por pouco não dormiu ali mesmo antes de chegarem ao destino. Quando chegaram no apartamento dele, já estavam sonolentos o suficiente para acabar com os planos que tinham antes.

- Ainda tem roupas suas aqui. Estavam sujas - apontou para uma das gavetas que antes tinham as roupas dela.
- Só porque eu queria usar as suas - riu e foi até a gaveta para ver o que tinha, mas pegou uma calça de moletom e uma camiseta e jogou pra ela.
- De nada!

aceitou e trocou sua roupa desconfortável pelas dele. Ela se sentia à vontade até demais estando ali, aquela cama também já foi a sua uns meses antes, mas melhor ainda era se deixar ser envolvida pelos braços dele como sempre faziam na hora de dormir antes de cada um ir para o seu canto. Provavelmente era um dos momentos que mais se pegava pensando.

- Puta merda, eu senti falta disso mais do que tudo - ela disse enquanto observava o peito dele subindo e descendo ao respirar.
- Eu também senti, é horrível dormir aqui sozinho, mas que bom que você está aqui hoje.
- É... Não acredito que vim aqui pra transar e acabei indo dormir agarrada com você. Eu sou uma vergonha - por mais que ela estivesse falando sério, acabou rindo junto com ele.
- Dá um desconto, eu tenho que acordar cedo!
- Eu sei, fica para outra ocasião. - fechou os olhos para relaxar, mas continuou falando.
- Eu, como o rapaz puro que sou, estou me guardando para depois do casamento, você que lute pra me conquistar.
- Puro, sei! - ela riu. - , se você quiser se casar comigo, precisa namorar primeiro, é a regra.
- Você quer voltar? - perguntou sem rodeios, já que tinham entrado no assunto, ele não ia ficar ofendido se ouvisse um não.
- Quero, eu quero muito - admitiu e ergueu a cabeça para olhar pra ele. - Mas não como estava antes, sabe? A gente só estava morando junto, mas não levávamos mais uma vida a dois como deveria ser. Se decidirmos voltar, então precisamos resolver isso.
- Você tem razão - ajeitou a postura e se apoiou no cotovelo para ficar de lado. – Não consigo parar de pensar nos jogos e eu tenho medo de não saber conciliar tudo... Não quero deixar você de lado de novo.
- , eu mais do que ninguém, entendo isso, eu mesma não soube conciliar quando eu jogava, deixei meus pais e amigos de lado, não posso mais exigir isso de você.
- Vamos fazer o seguinte: não vamos voltar ainda. A semi está chegando, a renovação do meu contrato está uma grande bola de neve e eu não tenho que te encher com isso. Deixa passar a semi e essa maratona doida que eu estou passando, e nós decidimos o que é melhor pra gente. O que você acha?
- Eu acho bom, mas só vou aceitar com uma condição - fez mistério até ver que ele estava curioso o suficiente. - Quero ir ver o jogo de volta no Maracanã. Dá os seus pulos.
- Achei meio aproveitador da sua parte, mas feito.

Foi que deu início a um beijo, e por mais que ela quisesse se prolongar, optou por respeitar a imposição dele que deveria estar em pé em poucas horas. Apesar disso, estar ali já era reconfortante, porque por mais que aos poucos sua vida estivesse tomando um novo rumo, ela ainda sentia que pertencia àquele lugar, e aquele momento sempre era a sua parte preferida do dia. Se fosse para dar certo, então ela estava disposta a esperar um pouco mais.

⚽🖤📱

precisou acordar muito cedo para que pudesse voltar pra casa e se arrumar para ir ao trabalho, já que não tinha nenhuma roupa ali que servisse. Ela precisou pedir um carro para poder chegar rápido, mas não sem dar uma leve satisfação para sua mãe que estava saindo para ir ao trabalho no momento em que ela chegou.

- Que bom que você lembrou que tem casa, .
- Desculpa, mãe, esqueci de avisar.
- Posso pelo menos saber onde você estava?
- Com o - disse sem papas na língua e viu um largo sorriso se formando nos lábios dela. - Não começa, não aconteceu nada.
- E mesmo se tivesse, você já é grandinha, filha... De qualquer forma, está tudo bem, eu não canso de dizer o quanto eu gosto do .
- Gosta mais dele do que de mim, inclusive! - disse rindo. - Bem, estamos pensando em voltar.
- Eu sabia que não ia durar muito tempo! Eu fico feliz por vocês, mas não quer dizer que eu posso me atrasar, então tenha um bom dia!
- Boas aulas, mãe.

tomou um banho muito rápido e se vestiu para poder ir trabalhar, mas durante o dia inteiro, só conseguia pensar em uma coisa, em uma pessoa. Seus colegas de trabalho notavam o quanto ela parecia distraída naquele dia em questão, mas ela se quer tinha notado isso, revivia a noite anterior em sua mente repetidas vezes. Reatar o relacionamento era animador, e de uma forma madura e saudável era melhor ainda.
podia ver o quanto estava diferente, mas era um processo longo, e assim como ela já não era a mesma de quando se conheceram, ele também não era. Muitos achismos e traços ruins de ambas as personalidades tinham deixado de existir, e ela sentia que tinha extraído o melhor dele, assim como ele fez o mesmo com ela. Não eram perfeitos e estavam longe de serem, ainda errariam muito um com o outro e seria necessário perdoar para seguir em frente, e ela olhava isso com bons olhos, afinal, não estava esperando por um super-herói, e sim um humano cheio de defeitos como qualquer outro, como ela. Tinham descoberto muitas coisas em comum, talvez o futebol fosse a maior semelhança entre os dois, mas não foi o que os juntou, e certamente não seria o que iria separa-los. esperaria o tempo necessário para que tudo pudesse ficar bem.

⚽🖤📱

Estádio do Maracanã, Rio de Janeiro.

O grande dia havia chegado para Flamengo e Corinthians, um dos dois representariam o Brasil na final da Libertadores naquele ano, e do outro lado seria Boca Juniors ou River Plate. Seria difícil, mas ainda tinha aquela semifinal para acontecer e as duas equipes iriam lutar pelo seu espaço, sendo que o Flamengo buscava um bicampeonato continental para defender o posto de atual campeão da América. Do outro lado, um paulista que há oito anos havia conquistado de forma invicta o campeonato, mas que nunca mais chegou perto. Finalmente tinham uma segunda chance.
estava tão concentrado que não prestava atenção na movimentação ao seu redor, estava em posição na fila apenas aguardando permissão para que as equipes entrassem juntas. O fato de a torcida da casa ser a grande maioria não o deixava com medo ou inseguro, e nem enfrentar o atual campeão. queria fazer sua parte acima de tudo e jogar pelo time, não tinha espaço para estrelismo, ele não queria o protagonismo para si e tudo o que importava era sair dali com a classificação para a tão sonhada final. Claro que pensava em vencer o torneio e ter duas Libertadores no currículo com apenas vinte e seis anos de idade, mas finalmente tinha aprendido que era um passo, um jogo de cada vez até alcançar a glória e ele estava mais preocupado com o momento. Seja lá o que viesse depois, ele sabia que sentiria orgulho do seu desempenho, mas principalmente do seu time por ter chegado até ali.
No sofá de casa, assistia ao jogo sozinha, sua mãe já estava dormindo. Ela viu o momento em que os times entraram no gramado, acompanhou a execução do hino nacional e então o jogo começou com o mando do Flamengo, que em um descuido da zaga do Corinthians, abriu o placar aos três minutos com Bruno Henrique e isso foi o suficiente para guiarem os primeiros quinze minutos, fazendo o time visitante jogar recuado, e até os jogadores mais avançados estavam voltando para marcar.

- Vamos, , faz alguma coisa - ela murmurou baixinho, seu corpo tremia de tanto nervosismo que ela estava sentindo.

Foi como se pudesse ouvi-la de lá. Após a bola ser desarmada pela defesa, foi marcada uma falta para o time paulista e a distância era boa, e enquanto os jogadores flamenguistas reclamavam com o árbitro, foi até a beira do campo para ouvir as instruções do seu treinador.

- Deixa o Luan bater, quero que você se infiltre na grande área, eles não vão estar esperando por você lá. É pra chegar de surpresa.
- Certo - respondeu após molhar a boca com água e cuspir, então voltou para a jogada, indo para a direção de Luan. - Eu vou pra área, tenta jogar em mim, vou cabecear.
- Tudo bem - o jogador respondeu enquanto posicionava a bola.

Luan esperou os dois zagueiros irem para a área e o árbitro ainda precisou chamar a atenção dos que se empurravam entre si. não era o mais alto ali, e normalmente não era tão efetivo cabeceando, mas ele imaginou que sabia do que estava falando, pois viu que ele recebeu instruções do treinador. Então após o apito do árbitro, ele efetuou a cobrança da falta e a bola foi em direção à grande área, mais especificamente em , como ele havia pedido. As instruções do técnico foram bem claras e precisas, pois pulou sozinho entre dois flamenguistas, não dando chances para o goleiro e empatando o jogo. comemorou, mas estava tão concentrado que só queria que a partida recomeçasse, afinal, já haviam se passado trinta e cinco minutos e eles precisavam virar.
O gol foi o suficiente para que o time melhorasse e passasse a dominar o restante do primeiro tempo, conseguindo levar um empate satisfatório para o vestiário. A instrução para a segunda etapa era atacar mais, estavam criando boas oportunidades, mas faltava a finalização, e para isso, foi orientado a jogar mais avançado como um falso 9, centralizado, e ele aceitou sem fazer qualquer comentário, não seria a primeira vez que faria aquilo.
E as mudanças pareciam surtir efeito na volta para o segundo tempo, pois o time estava conseguindo dominar o adversário que precisou recuar sua marcação, iriam apostar em um contra-ataque surpresa, que quase deu certo aos dez minutos, mas parou nas mãos do goleiro alvinegro. E quando o jogo parecia estar mais equilibrado e se encaminhando para uma decisão nos pênaltis, foi dos pés de Luan que o segundo gol saiu, com uma assistência do próprio . Foi a primeira vez que comemoraram juntos, se abraçaram como bons colegas de time, talvez ainda não fossem amigos, mas já era o suficiente. O que importava era o time, e naqueles minutos finais, o coletivo estava falando mais alto.
Ao final do jogo, o time comemorou a classificação, mas não deixaram de cumprimentar e incentivar os jogadores adversários que estavam claramente abalados pela eliminação. Quando estava indo em direção ao vestiário, com a camiseta trocada de Gabriel Barbosa jogada no ombro, ele foi parado para dar uma entrevista para uma emissora de televisão, além de ter sido eleito o melhor em campo.

- Eu não mereço sozinho porque eu não jogo sozinho, e o que esse time está fazendo é sem igual, e pode ter certeza que vamos brigar por muito mais. Foi uma semi, daqui a um mês vamos voltar aqui e, se tudo der certo, voltar com a taça pra São Paulo. Parabéns ao time por mais um grande jogo - ele disse por fim e saiu, indo em direção ao vestiário.

A partir dali, seria apenas comemoração.

⚽🖤📱

Eram raras às vezes em que usava salto alto, mas ela não podia negar que adorava o barulho que eles faziam quando ela andava em passos rápidos e decididos. Eles tinham endereço, um que ela conhecia muito bem, e a mochila que carregava nas costas com uma troca de roupa denunciavam que ela iria pra ficar. se sentia estranhamente ansiosa, como se fosse a sua primeira vez ali, como se já não tivesse compartilhado a cama com tantas vezes antes, e saber que ele estava esperando por ela fazia o seu estômago revirar de tanta ansiedade. A porta estava aberta, e ela simplesmente entrou, olhando ao redor e vendo que sala e cozinha estavam vazias.

- ? - ela chamou por ele enquanto olhava de novo.
- Achei que não viria mais - surgiu no corredor que dava acesso ao seu quarto.
- Me desculpa, tive muito trabalho pra fazer hoje.
- É brincadeira, eu estava esperando por você - ele sorriu e se aproximou dela, apontando a mochila que ela carregava nas costas. - Isso quer dizer que você vai ficar hoje?
- Só se você quiser que eu fique - ela envolveu seus braços ao redor do pescoço dele enquanto as mãos dele repousaram em sua cintura. não conseguia parar de sorrir. - Eu estou tão orgulhosa de você, , é nítido ver o quanto você mudou.
- Antes era tão ruim assim? - ele perguntou em tom de brincadeira e ela riu enquanto negava.
- Não é isso, mas todo mundo amadurece, e te ver conquistando tanta coisa me deixa muito feliz.
- Você sabe que eu não conseguiria fazer nada sem você, não é? Se eu não tivesse ouvido algumas verdades, provavelmente ainda seria o mesmo de antes... E se um dia eu conseguir conquistar ainda mais coisas, vai continuar sendo por você.
- Não me faz chorar - disse com a voz embargada, e sentiu as lágrimas começarem a se formar em seus olhos. Ela não podia perder ele mais uma vez. - Você também me ajudou tanto, e esteve comigo quando eu mais precisei, cuidou de mim mesmo que não fôssemos mais um casal...
- Que tipo de pessoa eu seria se simplesmente te virasse as costas? , eu não vou mais deixar que o meu trabalho me afaste de você, e se você quiser voltar pra cá, se você quiser voltar pra mim... Bem, a sua parte do guarda-roupas continua vazia só esperando você voltar.
- Eu quero voltar, , mas sem pressa... Uma roupa de cada vez - ela sorriu de canto enquanto acariciava as bochechas dele com seus polegares.
- Certo - respondeu, exibiu os dentes em um sorriso largo.

tirou um segundo para o admirar. Não foi a beleza que se destacou primeiro nele, mas não cansava de pensar em quanto o achava bonito. Os cabelos que quase sempre estavam bagunçados porque simplesmente não paravam no lugar e a barba por fazer deixavam com cara de mais jovem, e mesmo com a cicatriz discreta que ele tinha acima do supercílio, ela continuava achando lindo.

- Por que tá me olhando assim? - perguntou após alguns segundos em silêncio.
- Eu estava pensando... Eu sei que o que vale é o interior de alguém, e você também é lindo por dentro, mas... O que você queria comigo?
- O quê? - ele arqueou as sobrancelhas e gargalhou. - De onde você tirou isso, ?
- Eu não sei, só me passou pela cabeça agora...
- Bom... - sorriu sem graça, trazendo para mais perto dele. - Vou levar como um elogio, mas acho que você está enganada, e eu posso revirar essa cidade inteirinha, eu sei que não vou achar ninguém melhor.
- Ah, valeu, estou me sentindo linda.
- Porque você é linda.

fechou os olhos para sentir os lábios dele contra a sua pele, descendo para o seu pescoço. Não tinha como esquecer a sensação de quando estavam juntos, e se no outro dia foram vencidos pelo sono, ela não iria perder a oportunidade de novo. Deixou as alças da sua mochila escorregarem pelos seus braços e cair no chão.

- Você vai ficar hoje à noite? - perguntou ao ouvir o barulho, roçando a sua boca na dela.
- Vou ficar o tanto que você quiser que eu fique - respondeu por fim, acabando com a mínima distância entre eles quando o beijou.

Capítulo 35 - Libertados

- Estou renovando o meu contrato por mais duas temporadas, pra mim é uma honra poder continuar nesse clube que me recebeu tão bem - dizia em sua coletiva após o treino e assinado o novo contrato. - Quero agradecer aos meus companheiros, diretoria, comissão técnica e aos torcedores por tornar esse momento tão especial pra mim, e eu prometo trazer muitas alegrias. Estamos perto de algo grande, mas vamos lutar por mais, o torcedor pode contar comigo, estou dando a minha palavra.
- - uma jornalista ao fundo ergueu a mão ao mesmo tempo em que se levantava para falar com ele. - Primeiramente boa tarde... A sua renovação era uma incógnita até o início dessa semana, estão circulando notícias de sondagens de clubes do exterior ao seu respeito... O que impulsionou essa renovação de contrato?
- Eu te garanto que eu e meu empresário não recebemos qualquer contato de fora recentemente - ele respondeu com tranquilidade, vendo Dantas ao fundo da sala concordando com o que ele disse. - E se vier, vamos analisar com cuidado e envolvendo todas as partes, mas o que está em contrato agora é que eu fico pelos próximos dois anos. Eu não sei o dia de amanhã, não posso garantir nada, mas se eu realmente quisesse sair, então não esconderia se eu tivesse algum interesse nisso. Minha vontade de ficar foi o que tornou essa renovação possível.

A pergunta seguinte foi direcionada ao diretor de futebol ao lado dele, falando vagamente sobre a multa rescisória que tinha aumentado, e aumentaria ainda mais caso o time vencesse os campeonatos que estava disputando.

- veio de graça, não houve qualquer intervenção do Grêmio, é um jogador importante pro time, e muito valioso. Saindo ou ficando, está sendo feito o que é melhor para todos os lados, mas foi claro quando disse que, no momento, o seu desejo é ficar com a gente.

A entrevista coletiva foi longa, expressou toda a sua perspectiva em relação ao restante da temporada, se mostrando calmo em relação à final da Libertadores e ao fato de que poderiam ser campeões brasileiros em duas rodadas. Fugiu do protagonismo que a imprensa insistia em lhe dar, estava insistindo nos méritos de toda a equipe e que jamais conquistaria qualquer coisa sozinho. Sabia que estava falando com as paredes, ele continuaria ganhando destaque, e por mais que isso aumentasse a sua popularidade, não era o que ele queria. Aprendeu da pior maneira que não valia a pena, pois naquele dia ele era herói, mas no dia seguinte poderia se tornar o vilão, e já estava cansado de ser o vilão.

- Você foi cirúrgico, . Foi incrível - Dantas dizia enquanto deixavam o CT juntos naquele fim de tarde ensolarado do começo de novembro.
- Estão tentando me queimar, jogando esse heroísmo todo para me queimarem no meu primeiro erro - disse aborrecido. - Mas não vão conseguir.
- Não vou deixar que isso aconteça de novo, .
- Eu sei que não - parou na frente do seu carro enquanto Dantas ia até o dele. - Espera aí.
- O que foi? - o empresário se virou para ele.
- Não tem mesmo nenhuma sondagem, não é?
- Não, , provavelmente você saberia se tivesse, né? Mas não quer dizer que não estejam de olho, em algum lugar do mundo tem alguém te observando, os olhos do mundo inteiro estarão te observando semana que vem no Maracanã.
- Isso me assusta, eu nunca cheguei tão perto quanto agora - admitiu um pouco assustado. Ele queria muito ficar, mas tinha consciência de que estava prestes a fazer algo muito grande, sabia que o time passava por problemas financeiros e qualquer venda um pouco mais gorda seria benéfico.
- Já chegou sim, mas recusou porque quis ficar no Grêmio, e isso foi legal da sua parte com o time, mas você já tem vinte e seis anos e está no seu auge, eu não sei por quanto tempo você ainda quer ou aguenta jogar, mas se acontecer alguma coisa, se alguém se interessar, eu espero que você pense muito bem a respeito, porque pode ser a sua última chance.
- Eu sei... Obrigado.
- Vai pra casa, , só se preocupa em viver esse momento, a gente não sabe quando vai acontecer de novo, se cuida.

concordou, se despediu e entrou no seu carro para voltar pra casa. Estava tentando focar na final e evitar se distrair com futildades, mas o seu futuro era muito importante. Insistir em ficar para renovar o seu contrato foi um ato de coragem, e era o que ele queria, mas era impossível não criar expectativas diante do que estava bem diante dos seus olhos. Precisava viver o momento e manter os pés no chão, mas estava falando do seu sonho de garoto, era algo que mexia com ele.
Ele chegou em casa tão envolvido nos seus pensamentos que se quer tinha percebido que não estava sozinho. Estava tirando o par de tênis dos pés quando surgiu no corredor da sala vestindo roupas dele. Ela ainda não tinha se mudado de volta para lá porque não tinha coragem de deixar sua mãe sozinha, então não sabia quando veria ela lá ou não. Foi uma surpresa agradável.

- Que bom que você está aqui hoje - ele sorriu após se levantar e ela o receber com um beijo.
- Eu saí do trabalho e vim direto pra cá, nem troquei de roupa, então espero que não se importe de eu usar as suas.
- Não, não... Acho que ficam melhores em você, sério.
- Não sei como ainda levo os seus xavecos a sério depois de quase dois anos - ela rolou os olhos enquanto ele ria. - De qualquer forma, eu estou fazendo o jantar pra gente, então senta aí e relaxa que daqui a pouco vai estar pronto.
- Com licença, em que século você vive? Não vou ficar aqui parado sem fazer nada - rebateu ofendido e caminhou até a cozinha para verificar o que ela estava fazendo. - Em que eu posso ajudar?
- Por essa eu não esperava - disse surpresa, mas se deu por vencida. - Não tem muito o que fazer, o frango já está quase no ponto, os legumes já estão cozidos e o suco já está na geladeira.
- Natural, certo? - ele perguntou em tom de provocação, não tomava sucos industrializados.
- Direto da feira do bairro, seu fresco.
- Não é frescura, aquilo é pedra no rim embalada!
- Eu sei, só estou brincando - riu e se curvou na frente do forno para conferir de novo o frango que estava assando. - Eu vi a sua coletiva, foi muito boa.
- Você achou?
- Sim, você foi bem claro quando disse que queria ficar, era o que todo mundo queria... A propósito, eu estava lembrando que você pretendia discursar na premiação da final do campeonato, lembra? A favor do futebol feminino. Você ainda vai?
- Sinceramente, eu nem me lembrava mais disso, eu não sei se dá pra encaixar ainda - se xingou mentalmente por ter esquecido dos seus planos passados. - Mas eu vou tentar, eu prometo, vou falar com o Dantas. Você pode me ajudar a pensar em alguma coisa?
- Claro - sorriu de canto. - Seu engajamento é importante, foi quando eu comecei a te olhar com outros olhos... Ver que você se importava foi legal.
- É claro que eu me importo - se aproximou um pouco e segurou as mãos dela. - Se eu tivesse te conhecido antes... Eu faria de tudo para que fosse um diagnóstico diferente, e eu tenho certeza que seria, você é incrível e merecia ganhar tudo.
- Eu posso não ter ganhado tudo o que eu queria, mas eu ganhei o que eu precisava. Achei que nunca iria conseguir superar, nos primeiros meses eu não queria nem lembrar que esse esporte existia, mas olha só pra mim hoje... É por isso que importa tanto pra mim.

sorriu e puxou e namorada para os seus braços, envolvendo em um abraço. Sempre teria a sensação de que ela era capaz de voltar, mas não sabia como convencer do contrário, provavelmente o machismo da época e a imprudência médica fizeram uma lavagem cerebral nela que ele não conseguia reverter. Ter ela torcendo para ele na arquibancada era o que o motivava em cada jogo, mas sabia que ela podia fazer muito mais. Não por ele, mas por ela própria.

- Sempre vou torcer por você do mesmo jeito que você torce por mim - ele disse ao se afastarem e ela sorriu.
- Quem me dera ter te conhecido antes...
- Eu acredito muito que cada coisa tem o seu tempo, e eu tenho certeza que se você tivesse me conhecido só um mês antes daquele dia no CT, a gente provavelmente não teria dado certo.
- E por que não? - arqueou as sobrancelhas por curiosidade.
- , eu era insuportável de tão arrogante e estava vivendo o pior momento da minha vida, você não ia querer me aguentar, acredite em mim, você ia querer dar um soco na minha cara - tentou soar descontraído para fazer ela rir, mas tinha certeza de que estava certo.
- Talvez você tenha razão, e eu não era a pessoa mais paciente e simpática do mundo naquela época também - ela riu enquanto se preparava para tirar o frango do forno.
- Não daria certo, , mesmo se a gente tentasse muito.
- É, mas... Que diferença faz agora, não é?

tirou o frango do forno e colocou sobre a pia para esfriar um pouco, logo estavam jantando juntos e ela contava sobre o seu dia de trabalho, que apesar de ser completamente diferente do que ela fazia antes, ainda sim era animador e ouvia com atenção, pois parecia muito feliz e motivada, o que o deixava feliz também, já que a perda do pai foi um baque para ela que precisava superar.

- Eu gosto do jeito que você fala do seu trabalho - comentou e notou que encolheu os ombros timidamente. - Que bom que você está feliz.
- Não é que eu estou feliz, é só que... Eu preciso, ele não ia querer me ver tão pra baixo, sabe? - sentiu um repentino aperto no peito por lembrar do seu pai. - Eu queria que ele estivesse aqui pra se orgulhar de mim.
- Ele está. Não fisicamente, mas está com você de qualquer jeito. Ele tinha orgulho de você, e lá de cima continua tendo. Você não está sozinha, - esticou o braço por cima da mesa para tocar a mão repousada dela.
- Eu sei - ela sorriu de canto. - Tudo isso me faz pensar que a vida é muito curta.
- Eu também... - soltou a mão dela, de fato o provérbio deixava ele pensativo. - Se eu morrer amanhã, vou morrer cheio de rancor, mas... Eu não consigo deixar pra lá.
- Tá falando do seu pai, não é? - perguntou e ele concordou. - Eu sei que não é um assunto que eu devo me intrometer, mas não te incomoda guardar isso por tantos anos?
- Sim, isso me incomoda mais do que tudo, eu não queria que fosse assim, mas é tão difícil - espremeu os lábios em uma linha fina, não conseguia manter o controle quando falava de seu pai.
- E se... E se ele estiver diferente? - procurava ser cautelosa e sútil. olhou para ela como se ela tivesse dito uma grande besteira.
- Ele pode até ter mudado, mas não muda nada pra mim e pra minha família. Meus primeiros anos de futebol foram uma merda por causa dele que insistia em dizer que não ia dar futuro.
- Ele estava errado.
- Ele estava tão errado que depois, quando eu tinha quatorze anos, já sustentava a minha família com o que eu recebia, que nem era tanto assim pra época. Te contei do dia em que ele tentou voltar pra casa?
- Hum... Não, eu acho.
- Ele tentou voltar com mala e tudo, eu estava de férias no sul. Cida fechou a casa inteira enquanto eu e o meu irmão fomos para o portão e ficamos lá até amanhecer que foi quando ele chegou, não deixamos ele entrar de jeito nenhum. Rony falou tudo o que estava guardado, e olha que ele só tinha uns onze anos, e depois disso nunca mais falou com ele. Eu deveria ter feito a mesma coisa...
- Ah, ... Eu sinto muito - não sabia o que dizer, sempre que ele contava uma história da infância, ela sentia a raiva dele exalando.
- Tudo bem, um dia eu vou conseguir. Eu vou tentar, é sério, eu não posso odiar ele pelo resto da minha vida.
- Não se cobre tanto, você tem o seu próprio tempo.
- Eu acho que eu vou falar com ele quando eu for ao Rio semana que vem.
- ...
- Você vem comigo?
- Vou - ela respondeu prontamente, embora soubesse que não seria uma boa ideia, ou ao menos pensava que não fosse. - Mas por favor, não fica pensando muito nisso, foca na final, ok? Isso é importante pra gente.
- Não se preocupa, eu vou dar o meu melhor para trazer essa taça pro time, eu prometo.
- Eu, como torcedora, fico muito agradecida e empolgada, meu coração bate acelerado toda vez que penso nessa final - riu, de fato estava ansiosa. - Vocês vão entrar pra história, .
- Eu espero que sim - disse com modéstia, não queria para si glórias que ele achava que não merecia. - Se a Conmebol não passar a mão na gente, claro.
- Não se preocupa, o River vai voltar pra Buenos Aires com o rabinho entre as pernas, porque nunca que um argentino vai erguer uma taça em território brasileiro, e antes que você venha com toda a sua ética, você é um torcedor brasileiro e concorda comigo que eu sei.
- Bem... Eu quero tanto esse título quanto você, mas... Não posso negar que ganhar dos argentinos é ainda melhor.
- Meu garoto!

⚽🖤📱

Rio de Janeiro

estava hesitante parado perante a porta da casa de seu pai, se questionando se tinha tomado a atitude correta ou não. Tinha pouco tempo para resolver aquilo, ainda não sabia como conseguiu ser liberado a tão pouco tempo da final, mas queria ao menos tentar resolver aquilo antes de ir embora. Suas mãos estavam suadas e ele insistia em secá-las na calça jeans, mas sem sucesso. viu o nervosismo dele e como ele respirava pesado, mas sabia que não poderia fazer muita coisa para ajudá-lo a não ser demonstrar apoio. Não achava que era uma boa ideia estar ali e temia que outro desentendimento pudesse acontecer entre os dois, mas não iria mudar de ideia, já era tarde demais e cabia à ela apenas torcer para que desse tudo certo.
tocou a campainha e não precisaram esperar muito para serem atendidos. Foi Sandra que os recebeu, não escondeu a surpresa ao ver o casal ali, mas sorriu receptiva para eles, os convidando para entrar.

- Eu não sabia que viriam aqui hoje! Ah, olha só pra mim, me desculpem, estou limpando a casa, não reparem a bagunça.
- Sandra, eu vim falar com o meu pai, ele está? - perguntou educadamente, se sentindo constrangido por achar que estava atrapalhando a rotina da madrasta.
- Não, ele ainda não voltou do trabalho, mas acho que daqui uns quinze minutos ele chega, se quiserem esperar.
- Tudo bem, nós vamos esperar, obrigado - ele sorriu de canto e se acomodaram no sofá, recusando o convite da mulher para que jantassem.

Um silêncio pairou na sala depois que Sandra os deixou ali porque alegou que iria trocar de roupa. estava pensativo, e cansada da viagem às pressas em uma sexta-feira à noite. Teve que sair mais cedo do trabalho e correr com Gabriela, pois viajaram de carro de São Paulo para o Rio, dirigindo por nove horas, havia acabado de chegar e estava exausta, mas não teve coragem de recusar o convite de . Alguém precisava vigiar ele.

- Você tá bem? - olhou para ela que assentiu.
- Só tô um pouco cansada da viagem - forçou um sorriso para tranquilizar o namorado, mas ele parecia preocupado. - Tô bem, , é sério.
- Você deveria ter vindo amanhã.
- E quem ia ficar de olho em você agora, hein? - tentou soar bem-humorada, mas estava sério e tenso.
- Eu errei em vir aqui? - ele perguntou em voz alta, mas a pergunta foi mais para ele mesmo do que para ela.
- Não posso te dar uma resposta, - disse por fim e ele assentiu, trazendo ela pra perto e deixando com que ela repousasse a cabeça em seu ombro para descansar.

Para , os quinze minutos duraram uma eternidade toda. Olhava para o relógio na parede e ele parecia marcar o tempo dez vezes mais devagar, sacudia sua perna para se livrar da ansiedade, porém em vão. Tentou se distrair com um jogo de celular também, mas nada parecia suficiente, assim como a companhia de Sandra que se juntou a eles. E só quando a porta da sala se abriu e os dois homens se viram, entendeu que não podia mais voltar atrás.

- O veio te ver - Sandra se levantou para falar com o marido que ainda parecia surpreso, então se virou para para que as duas os deixassem a sós. - Vamos?
- Vai lá - sorriu de canto quando se virou preocupada para ele.
- , por favor, não faz nada - ela suplicou em um sussurro.
- Vai ficar tudo bem, eu prometo.

se levantou e acompanhou Sandra até a cozinha, de repente tinha ficado ainda mais tensa do que , torcendo para que aquilo terminasse bem.

- Você parece bem preocupada, mas vai dar certo, tenho certeza - Sandra tentou soar otimista, mas soltou um longo suspiro.
- Não sei, eu não queria que ele viesse hoje. Tinha que estar concentrado no hotel, não sei nem como conseguiu sair. Essa é uma péssima ideia, péssima.
- Não vamos pensar negativo, , se o veio é porque ainda se importa.
- É exatamente o que me preocupa. Não é que ele realmente queira fazer as pazes porque eu sei que ele não quer, ele só está assim reflexivo porque meu pai faleceu.
- Ah, meus sentimentos pra você e sua família.
- Obrigada - esboçou um sorriso entristecido. - Espero mesmo que dê tudo certo.

Na sala, não fez questão de se levantar, apenas esperou até que o homem de olhar curioso se acomodasse no sofá da frente.
estava tenso, não tinha preparado nada para falar, se arrependeu imediatamente de sair da concentração pouco antes de uma final importante, mas já que estava ali, tinha que continuar e ir até o final.

- Eu não esperava que vocês viessem aqui, mas que bom que ainda estão juntos.
- Não pretendo me separar dela - ele respondeu enquanto encarava a mesa de centro que os separavam, seus dedos brincavam nervosamente se entrelaçando uns nos outros. - Pai, eu preciso entender.
- Entender o quê, ?
- Por que tudo teve que ser assim? Por que você fez aquelas coisas com a nossa família?

olhou para o seu pai e notou o quanto ele parecia constrangido com aquilo. Ele estava ansioso por uma resposta, mas ao mesmo tempo temia por tal. Passou anos imaginando e criando coragem para finalmente ter aquela conversa, mas estando ali era ainda mais assustador do que na sua mente. Não era o adulto, o atleta profissional ali, era a criança tímida e assustada que costumava ser e agora sentia a necessidade de colocar pra fora.

- Eu não sabia o que eu tinha até perder, e até hoje não tenho nenhuma desculpa pra isso... Eu sei que o que eu fiz é imperdoável, não que eu não amasse você e os seus irmãos, mas...
- Mas também nunca demonstrou - ele interrompeu e o outro concordou. - Não é esse o problema, na verdade acho que é o menor deles, mas o que me deixa puto sempre é pensar que minha mãe não merecia nada daquilo. Não sei o que passava pela cabeça dela em aceitar isso.
- , você tá falando dos anos 80, 90... as coisas eram diferentes naquela época. A minha criação e a dela foram muito diferentes da que você provavelmente vai dar para os seus filhos, se você acha que eu fui ruim, e fui mesmo, deveria ver o seu avô, agradeça por ele ter morrido antes de você nascer e não ter conhecido ele.
- Você aprendeu com ele? - imediatamente se arrependeu do que disse, mas já era tarde demais. De fato, não conheceu seu avô paterno, não tinha a mínima ideia do que seu pai queria dizer com o fato de ser pior.
- O meu pai era como a maioria da época dele - ele explicou calmamente, apenas assentiu para que continuasse. - Para os outros era tudo muito lindo, mas dentro de casa era um inferno. Uma vez, depois que a minha mãe voltou da missa comigo e meus irmãos, ele tava tão bêbado que começou a gritar e perguntar onde ela tinha ido, dizendo que ela estava traindo ele, e só posso dizer que naquele dia sobrou pra todo mundo, principalmente pra sua avó e pra mim que era o mais velho e tentei defender ela... Então sim, o meu pai foi pior, se responde a sua pergunta.
- Eu não sabia disso... - não sabia o que dizer, mal se lembrava da sua avó paterna, mas se lembrava de ela ser um pouco estranha e assustadora aos olhos de um menino de cinco anos, vendo agora ele podia resumir ela como uma mulher triste e machucada.
- Eu não vou ficar te contando tudo pra parecer um coitado, acho que não foi pra isso que você veio aqui. , eu não sei porque fazia aquilo com vocês, eu não queria ser como o meu pai, mas acho que às vezes fui tão insensível quanto ele. Eu sei o que eu fazia, e eu me arrependi, mas já era tarde porque vocês já estavam crescidos e sabiam que era grave. Não tem um dia que eu não pense em você, nos seus irmãos e no mal que fiz pra nossa família.
- Eu jurei pra mim mesmo que nunca ia ser como você, e eu até consegui, mas a que custo? Pai, eu tive que sair de casa com treze anos e ir morar em outro estado pra poder sustentar a família, tem noção de como isso é grave? Eu era só uma criança, e por mais que hoje eu tenha chegado onde eu queria, ainda não muda o fato de que eu tive que crescer muito rápido e não tive um pai presente. E depois que eu soube que você tinha se casado de novo, fiquei ainda mais puto com essa merda toda.
- Eu sei que eu não mereço a Sandra, mas ela é a minha chance de querer fazer do jeito certo dessa vez, e não pensa que ela acha tudo o que eu fiz lindo, porque se eu mudei foi por causa dela. Mas mesmo assim, não muda o fato de eu ter perdido os meus três filhos. Mesmo que a gente brigue sempre, eu fico feliz quando posso te ver, porque eu sei que nunca mais vou ver ou falar com o Rony e a Cida.
- Eles não sabem que eu vim aqui, eles não iam deixar eu vir se eu contasse, e eu até queria ser como eles e fingir que nada aconteceu, mas eu não consigo - agitava a perna esquerda sem parar de tamanha ansiedade, finalmente estava dizendo tudo. - Não consigo mesmo.
- Você sempre foi assim, , sempre foi o que mais tentou vir atrás de mim, era o mais quieto dos três. A sua irmã era a mais responsável, o Rony era o mais bagunceiro e extrovertido, mas você sempre foi o mais sensível e tímido, não esperava que você fosse crescer e virar um homem com uma personalidade tão forte e com um senso de justiça tão grande assim.
- O futebol e as circunstâncias me fizeram ser assim, nenhum time quer um jogador "tímido e sensível" - ele fez aspas com os dedos. - Como eu disse, eu precisei crescer muito cedo, e graças a Deus deu tudo certo, mas o preço foi muito alto.
- Eu espero que vocês possam me perdoar um dia, , de verdade.
- É complicado, pai... Eu já tentei, mas... - não sabia como se explicar, ensaiou aquele momento por muito tempo, mas tinha se esquecido de tudo. - Não dava... Eu quero, mas... Eu ainda preciso de mais tempo, espero que você entenda. Ouvindo tudo isso, posso entender melhor também.
- Eu entendo, , eu tô muito feliz por você ter vindo aqui hoje. Independente de tudo, eu amo muito vocês três.

não esperava aquilo tão espontaneamente, arregalou os olhos por um breve momento em um susto discreto, piscou algumas vezes. Se lembrou de todos os dias dos pais que não era como o das outras crianças, ou das vezes que recebeu uma resposta atravessada quando tentou demonstrar algum carinho pelo pai. baixou a guarda por um instante, podia perceber que seu pai estava sendo sincero, e pela primeira vez nos seus vinte e seis anos de vida, ouviu aquilo. Ele estava tentando reprimir qualquer vontade de chorar quando se levantou abruptamente do sofá.

- Eu já volto - caminhou rapidamente até a cozinha, fazendo com que as mulheres ali se assustassem. - , vem comigo.

concordou e seguiu que dava passos rápidos e largos, e ela sendo menor correu um pouco para o acompanhar até o lado de fora da casa, indo até o carro dele que estava sobre a responsabilidade dela por aqueles dias. Ela olhava preocupada pra ele enquanto ele apalpava os bolsos da calça.

- , o que aconteceu?
- Me dá chave, por favor.
- Nós já vamos?
- Sim, mas me dá a chave.

Hesitante, devolveu a chave do carro para ele que foi até o porta-malas. O motivo era bobo, se lembrou que tinha deixado uma camisa de jogo lá, ia levar para a família, mas acabou ficando ali e agora era o momento.

- Eu preciso de um favor - ele disse ao pegar a camisa que era preta com listras brancas. - Entrega pro meu pai.
- Por quê?
- Só entrega, eu vou esperar aqui fora. Eu prefiro que você entregue.
- , eu não tô entendendo o que você quer.
- Só entrega - deu a camisa nas mãos dela. - Agradece pelo tempo deles e diz que eu pedi pra entregar pra ele, mas faz isso antes que eu me arrependa. Anda, vai lá.

Ainda hesitante e confusa, acabou concordando e entrou novamente, vendo que o casal estava na sala e claramente esperavam ver de novo.

- Eu não estou entendendo o que tá acontecendo aqui, mas... o pediu para te entregar essa camisa - mostrou a camisa e entregou.

Rogério segurou a camisa nas mãos e sorriu. Estava receoso antes porque achou que tinha reagido mal, pensou que tinha perdido a chance de reatar qualquer laço com o seu filho, mas aquilo significava muito mais do que só uma entrega de camisa.

- Esse é o jeito do dizer que tá tudo bem - se explicou, ainda sorrindo com o presente. - Eu disse que amo ele, e eu sei que ele não ia dizer de volta, achei que ele ia estourar e ir embora, mas... É o jeito dele. Bem no começo da carreira dele, tentei conversar, mas você conhece o , entrou por um ouvido e saiu pelo outro, perguntei se podia ter uma camisa e ele disse que não porque um pedido de desculpas não ia fazer tudo ficar bem.
- Agora você pode colocar essa junto com as que você comprou - Sandra disse contente e se explicou para depois. - Todo ano ele compra uma camisa com o nome do , ele tem várias e de todos os times que ele já jogou.
- Mas essa é a mais especial - ele completou. - Obrigado por terem vindo, . Hoje deve ser o melhor dia da minha vida.
- Que bom que tá tudo bem entre vocês e eu espero que melhore ainda mais - sorriu. - Eu sei o quanto isso é importante para o .
- Quando ele era criança, queria que eu fosse ver ele jogar. E nós vamos fazer isso amanhã, mas não conta pra ele, por favor, eu não quero atrapalhar a concentração dele. Vamos contar depois.
- Ele vai ficar muito feliz quando descobrir, isso é incrível - ela alargou ainda mais seu sorriso. - Então espero que possamos nos ver de novo, e muito em breve.

se despediu deles e saiu. esperava por ela encostado no carro com os braços cruzados e a cabeça baixa, mas quando ele olhou para ela, percebeu que lágrimas pesadas escorriam pelo rosto dele. Ela congelou no lugar em que estava, não sabia o que fazer.

- ...
- Eu me sinto muito melhor, - ele disse com a voz embargada, mas sorriu. - Obrigado por ter vindo comigo.

sorriu também e o abraçou. Deixou que levasse o tempo que ele precisasse ali, não queria apressar nada, ver ele chorando de felicidade era algo novo, ela nunca tinha visto, mas estava grata por ter presenciado um momento tão especial.

- Ele gostou da camisa? - perguntou ao se separarem.
- Ele amou, disse que é o melhor dia da vida dele. Ele tem uma de cada temporada e de cada clube que você jogou, mas essa é a mais especial. Tudo palavras dele - ela respondeu enquanto passava as mãos pelo rosto dele, secando as lágrimas e afastando os cabelos da testa suada devido ao calor. - Eu tô muito orgulhosa de você, , você finalmente conseguiu.
- Eu precisava fazer isso, amor.
- Eu sei, isso só mostra o que eu já sabia: que você não desiste de ninguém.
- Eu só preciso de mais tempo.
- Você já fez muito, eu tô muito orgulhosa de verdade, agora deixa o tempo curar você. Vamos embora? Você precisa voltar pra concentração.
- Você tá certa, vamos embora.

Os dois entraram no carro e assumiu o volante. Deixou que desabafasse à vontade, ele parecia tranquilo, fosse pela final ou pelo que tinha acabado de acontecer. Ela estava feliz por ele, se o que ela havia presenciado um ano antes era só um caso isolado de uma vida inteira, então ela se quer poderia mensurar o alívio que estava sentindo com aquilo.

⚽🖤📱

Estádio do Maracanã

sentia seu corpo tremendo da cabeça aos pés e por isso estava sentada no seu lugar no camarote. O estádio estava dividido entre torcedores de River Plate e Corinthians, e por mais que a final fosse em terras brasileiras, os torcedores argentinos ocupavam pouco menos da capacidade do local.
O fato de o River Plate ser o adversário assustava um pouco, afinal, era disparado o melhor time da América do Sul no momento, o time a ser batido, chegando em finais ano após ano, e mesmo tendo perdido para o Flamengo no ano anterior, ainda não alterava o fato de que era o melhor, pois era um trabalho de muitos anos. Seria um grande jogo.
foi afastada de seus pensamentos quando Cida se sentou ao lado dela. Estava nervosa também, e conforme a horário se aproximava, começava a ficar tão tensa quanto .

- Não é como se a gente nunca tivesse passado por isso, mas... Quero dizer, eu sei que ele é o melhor, e vai se destacar, mas... E se ele não conseguir? E se não der certo? Ele vai ficar arrasado se perder - ela disparava as perguntas sem parar, o que fez rir.
- Se o time vai ganhar, eu já não sei, mas que o vai tentar, pode ter certeza que sim. Ele melhorou tanto, que mesmo que percam, ele já vai sair vitorioso.
- Eu acho que essa melhora dele tem um dedinho seu, . Quase dois anos atrás você chegou na vida do meu irmão e fez ele perceber que existe toda uma vida fora do mundinho dele.
- O não era uma pessoa ruim quando nos conhecemos, ele sempre foi legal comigo, um bom amigo, ele só era um pouco cabeça dura e talvez um atleta um pouco arrogante, mas... Bom, parte da minha mudança também tem dedo dele - ela sorriu, se lembrando de como era tão diferente antes, mas mudou para melhor ao longo daqueles dois anos.
- Obrigada por trazer tanta felicidade pro meu irmão e pra nossa família, nós te amamos muito - Cida se debruçou, abraçando de forma desengonçada, e pelo cheiro de cerveja que exalou, percebeu que a cunhada estava levemente alterada.
- Ganhei outra família - respondeu, se soltando, e olhando de relance para trás para ver sua mãe e a família de interagindo.

Não demorou muito para a partida começar, nos dez minutos seguintes as equipes já estavam no gramado, todos muito concentrados, e ao som do apito do árbitro chileno, o jogo único da final da Libertadores 2020 havia começado.

- O vai fazer três hoje, anota aí - Rony disse para que acabou por se assustar.
- Ai, garoto, que susto! Isso aqui não é campeonato paulista não, sabia?
- Se você não acredita no seu namorado, então eu acredito no meu irmão - ele sorriu. - E lá vai ele.

disputou a bola com o adversário e acabou perdendo, mas o outro não conseguiu passar pela marcação pesada de Gabriel que tocou para Fábio Santos, o lateral avançou e ia na frente, se infiltrando na área com marcação em cima dele, Fabio cruzou para a entrada da grande área, fazendo com que a bola fosse parar nos pés de Luan, que vendo que não dava para arriscar dali, avistou e deu um passe para ele. bem que tentou, mas não conseguiu ângulo, sendo desarmado pelo zagueiro argentino em um jogo de corpo que o derrubou no chão. Apesar dos protestos de seus colegas, o juiz mandou o jogo seguir, alegando que havia se jogado.

- Pelo menos ele tentou - Rony tentou soar otimista.
- Tô preocupada, a marcação tá forte em cima dele, você sabe como são os argentinos, ele vai apanhar muito - respondeu chateada, odiava assistir os jogos em que era o saco de pancadas preferido dos adversários.
- Mas vai dar tudo certo, você vai ver.

estava certa, apesar de o time ter boas peças, o lado esquerdo do ataque estava sendo quase anulado porque nada do que tentava estava dando certo, a marcação em cima dele era forte e vez ou outra ele ia ao chão quando não era desarmado ou deixado para trás, mas no coletivo o time todo estava se saindo bem. A defesa estava fechada, o meio campo desempenhava bem sua função, a linha de três com , Luan e Otero funcionava bem, e Jô como o último homem estava fazendo o que podia. Apesar dos esforços, o time foi para o vestiário após o primeiro tempo com o revés de 1x0 para os argentinos.

- Ainda dá pra virar, vai dar tudo certo - tentou se manter positiva enquanto bebericava sua cerveja.
- É claro que vai, o River pode até ser um time bom, mas eles não têm o cara que com certeza vai ser o craque da partida.
- Rony, eu adoro a sua confiança, mas vamos combinar que está difícil sair alguma coisa daquele lado, a marcação em cima do está pesada.
- Mas o Rony tem razão. , você é relativamente nova aqui, mas conforme os anos forem passando, você vai entender melhor que pra gente, o outro time pode ser o melhor do mundo, mas não importa, eles não tem o nosso irmão no elenco, e nós sempre vamos acreditar no - Cida disse e foi apoiada pelo irmão menor.
- Ok, vocês tem razão. É, eu preciso pensar assim também.

Até mesmo as crianças sentiam o peso da final, pareciam mais sérias do que seriam em um jogo como este, mas era de se esperar, já estavam crescendo, Maya já havia completado oito anos e Belinda seis, já não eram tão pequenas quanto se lembrava.

- Seu pai ia estar dando voltas no tapete da sala se estivesse com a gente - ela parou de olhar para as meninas quando viu sua mãe.
- Ele já estaria xingando o time até os netos dos jogadores por estarem perdendo - as duas riram concordando.
- É verdade, mas ia poupar o , depois ia dizer todo orgulhoso que era o genro dele ali.
- Acho que Deus arrumou uma TV pra ele lá no céu agora pra ele ver o time dele só mais uma vez - sorriu e abraçou a mãe de lado. A saudade se misturava com as boas lembranças. - O pai da veio, está no meio da torcida.
- É sério? Que ótimo!
- É ótimo, mas ninguém sabe, nem o , ele me pediu pra não dizer, além disso, os irmãos dele não sabem o que aconteceu, acho que o não quer contar agora, mas eu precisava contar isso pra alguém - riu, mas não via a hora de contar para a novidade.
- Não se preocupa, filha, vou ficar quietinha.

A volta para o segundo tempo foi um pouco tensa, o time sentiu o gol e voltou um pouco mais inseguro, o que resultou em mais um gol do River Plate apenas no segundo minuto, mas foi o suficiente para o time brasileiro acordar e começar a reagir, tentando jogar o que o treinador instruiu no intervalo, jogando na falha do adversário, o que deu certo quando, aos quinze minutos, Jô fez um gol de cabeça para a equipe. A partir daí, a partida ficou mais acirrada, as faltas ficaram mais duras e frequentes, a bola rolava menos, dando espaço a leves desentendimentos, mas em especial estava tentando fugir daquilo, evitando ceder às provocações de seus marcadores e levantando à cada pancada recebida. A panturrilha direita já estava doendo após uma entrada dura, mas ele não queria se render, queria buscar o segundo gol e não ia desistir enquanto não levasse aquele jogo para a prorrogação.
Após receber um lançamento curto, mas bem executado de Cantillo, ele avançou pela lateral do campo para se infiltrar no meio e tentar tabelar com Luan, mas novamente foi derrubado perto da entrada da grande área. O árbitro não relevou e amarelou o jogador do River Plate que reclamava muito enquanto estava no chão rolando de dor com a mão na mesma panturrilha que já doía antes. Doía tanto que ele estava quase pedindo para sair, parecia que não conseguia se levantar, então o árbitro autorizou o atendimento para ele, que mesmo mancando, conseguiu se levantar para ser atendido do lado de fora.

- , você vai conseguir voltar? - o treinador perguntou enquanto molhava a boca com água e cuspia fora depois.
- Eu vou tentar, eu preciso tentar - ele respondeu ofegante. Estava com muita dor, mas não ia desistir.

não podia entrar ainda, teve que ver do lado de fora do campo a barreira sendo montada enquanto Luan e Otero se preparavam para cobrar a falta. Ao som do apito, o camisa 11 chutou a bola com efeito, ela chegou a passar de raspão por um jogador da barreira e também pelos dedos do goleiro, mas foi uma cobrança tão bem executada que terminou em gol. O time inteiro correu para comemorar junto com o banco, estava em êxtase, mas olhou no telão e viu que já estavam nos quarenta minutos, ainda tinha ao menos cinco minutos para tentar alguma coisa.
O jogo recomeçou, e de forma rápida o River Plate foi pra cima, mas os nervos estavam aflorados, o que custou erros de passes nos minutos seguintes, e perderam uma chance clara de gol por um descuido bobo que Bruno se aproveitou para desarmar o atacante e dar início ao contra ataque. Tocou para Cantillo sem marcação que avistou , mandando um lançamento para ele. recebeu, e mesmo com marcação correu muito, correu o máximo que podia, só conseguia ver o gol se aproximando, como se não tivesse mais nada ali. Até viu Otero se aproximando e ele poderia dar um passe, mas decidiu arriscar chutando com a sua perna boa, e aos quarenta e cinco minutos do segundo tempo, o Corinthians virou o jogo. foi para a comemoração, mesmo sentindo dor, e desabou no chão, vendo todos aqueles jogadores caindo por cima dele, mal podia acreditar que tinham conseguido virar aquele jogo, o sonho estava vivo novamente, mas para , era a hora de parar. Sinalizou para o banco pedindo uma troca quando a euforia passou, não podia mais correr, a panturrilha doía muito, e com uma troca à disposição, o treinador concordou e substituiu por Dentinho sobre muitos aplausos da torcida que gritava seu nome e o ovacionava.
O camisa 7 foi cumprimentado por todos e só depois se sentou em um acento livre. Olhou para o cronômetro no telão e viu os cinco minutos de acréscimo dados. não se conteve, deixou as lágrimas de alívio saltarem de seus olhos, de repente a dor já não era mais uma grande vilã. Ele só conseguia se lembrar dos últimos dois anos de sua vida e dos altos e baixos que passou até chegar ali. Finalmente havia conseguido dar a volta por cima, e estava a cinco minutos de alcançar a glória.
Não foram cinco minutos fáceis, foram longos, o River Plate pressionou, a torcida apoiava, mas dava para sentir a pressão. , em seu lugar, revezava o olhar entre o campo e no banco para ver se ele estava bem, embora não desse para ver dali, mas pôde ver quando todo o banco já estava em pé pedindo para o jogo acabar, e mesmo que já tivesse dado os cinco minutos, nos segundos finais o River Plate conseguiu um contra ataque, deixando Fagner, Gil e Bruno para trás. Apenas Cássio poderia salvar o time naquele momento, e o goleiro naquele instante cresceu significativamente, espalmando a bola para fora. Ao som do apito, podiam soltar o grito.
A América tinha um novo campeão, e era brasileiro.

- Eu disse pra você que ele ia conseguir - Rony disse com a voz embargada para que já estava aos prantos.
- Você é ridículo, Rony, me deixa em paz - ela se sentou na sua poltrona e colocou as mãos no rosto para chorar.

Não podia acreditar que aquilo estava acontecendo de verdade, o time merecia, mas merecia ainda mais, ela sentia que poderia morrer de orgulho ali mesmo naquele momento. Esteve com ele em momentos ruins, mas agora estava ali para prestigiar também e estava grata por isso.

- Vão começar a entregar os prêmios individuais, levanta daí - Cida puxou pra cima. - Eu aposto no craque da partida pro , fiquem vendo.
- Eu tenho certeza que ele vai ser o Rei da América.
- Concordo com o Rony - completou e foi apoiada pelo cunhado.

Conforme o painel ia sendo montado, os jogadores faziam a festa junto com a torcida, fogos de artifício se destacavam no céu de fim de tarde no Rio de Janeiro, deixando ainda mais bonito. Alguns minutos depois, os alto-falantes do estádio anunciaram Cássio como o melhor goleiro da competição, o atacante do River Plate como o segundo melhor, e como o melhor da partida, que recebeu o seu troféu e pousou para a foto como o seu melhor sorriso.

- Eu disse - Cida avisou.
- A gente só vai saber quem é o Rei da América no final de dezembro, então ainda temos chances de estarmos certos, maninha - Rony sorriu triunfante.

Após as premiações individuais, foi a vez dos jogadores do River Plate receberem suas medalhas de segundo lugar, o que era bem decepcionante por ser o segundo ano consecutivo, e só depois o campeão, estampando seu escudo no caneco pela segunda vez, recebeu a taça erguida pelo capitão Cássio.
Era oficial, a América tinha sido pintada de preto e branco.

Capítulo 36 - Ano novo, clube novo.

Algumas semanas depois

- Ah, essas miniaturas das taças ficaram lindas - disse orgulhosa enquanto colocava as duas taças lado a lado na prateleira, miniaturas das taças da Libertadores que havia ganhado. - Você tem mais Libertadores do que outros times por aí - ela riu e se virou pra ele, vendo que estava rindo também.
- Você não começa, ainda precisamos pendurar as medalhas - ele exibiu as medalhas que carregava, a da Libertadores e a de campeão brasileiro, título conquistado apenas uma semana depois do torneio continental.

deixou uma medalha pendurada no gancho debaixo da mini réplica da taça da Libertadores, e a do Campeonato Brasileiro colocou no gancho ao lado, onde em cima estava um espaço reservado para sua próxima conquista. Deu dois passos para trás e admirou suas novas peças da coleção, estava orgulhoso de si mesmo pelas conquistas. Não queria soar arrogante e prepotente, mas achava que merecia desfrutar um pouco.

- Ainda custo a acreditar que a gente conseguiu fazer isso.
- Vocês mereceram, foram os melhores, .
- Eu não estou falando só do time, estou falando da gente - ele olhou para ela.
- Mas eu não joguei com vocês - sorriu sem jeito.
- E você acha mesmo que eu ia conseguir qualquer coisa sem você do meu lado puxando a minha orelha? Sou indisciplinado e ruim, lembra? - riu. - Sem você eu sou só um cara prepotente e um jogador nervosinho, quem me dera ter te conhecido antes! Você veio e trouxe a felicidade que faltava pra mim.

continuava a sorrir e o abraçou de lado. Nunca tinha sido considerada tão importante pra alguém como agora, sempre era surpreendida por essas pequenas declarações, que antes não dava valor por achar que nunca ia acontecer com ela. estava longe de ser perfeito, às vezes errava, passava dos limites, mas mesmo assim já era muito mais do que ela julgava merecer. Nunca esperou por ninguém, nunca foi atrás de alguém, se quer acreditava que aquele tipo de amor realmente era pra ela, mas todos os seus questionamentos já não existiam mais. Ela também tinha seus agradecimentos pra fazer.

- Se eu for falar alguma coisa, eu vou chorar - foi tudo o que ela conseguiu dizer, quase não conseguindo se conter. riu e envolveu seus braços ao redor dela.
- Quem diria que aquela nervosinha na verdade era uma chorona, hein?
- Para, , você sempre soube que era tudo fachada.
- Claro que era fachada, você sempre foi louca por mim, me quis desde o começo, pode admitir.
- Garoto, você se acha demais, para de ser ridículo - ela rolou os olhos, mas acabaram rindo, exatamente como faziam no começo. - Mas até que eu gosto, eu admito.
- Eu sabia, sempre soube. Vamos pedir comida, vida, tô com fome e quase de férias já, quero começar a aproveitar logo.
- Acho uma ótima ideia!

⚽🖤📱

recebeu o troféu de melhor jogador do campeonato brasileiro masculino e tirou um instante para admirar o troféu, era tão bonito que o fez sorrir, e ser aplaudido por todos ali era ainda mais gratificante. Seus olhos percorreram o salão até encontrar na mesa que dividiam com Gabriela e Bruno. Ela estava deslumbrante em seu macacão preto e brilhante, ele poderia ficar horas ali admirando, mas o que tinha para falar era ainda mais urgente, e mesmo que ela tivesse noção do que era, decidiu rasgar o discurso ensaiado e falar com suas próprias palavras.

- Primeiramente é uma honra estar aqui hoje e receber esse prêmio, é um sonho realizado, não estou falando como um atleta, falo como o menino do sul, da periferia de Porto Alegre, que saiu cedo de casa com um sonho, mochila nas costas e chuteira no pé. Eu tenho tanta gente pra agradecer, mas vou tentar ser breve: quero agradecer à minha família por ter me apoiado até aqui, nada disso seria possível se não tivessem sonhado junto comigo, à minha mãe que me levou a todos os treinos até que eu pudesse ir sozinho, aos meus irmãos que não pensaram duas vezes antes de me escolherem para viver um sonho, sacrificaram muito por mim, mas estou aqui hoje para recompensar tudo o que fizeram. E claro, à minha namorada , que desde que cheguei ao clube tem sido um pilar pra mim, sou melhor graças à ela. , esse prêmio é muito mais seu do que meu, obrigado - ele não tinha uma boa visão dali, ela estava longe, mas dava pra ver ela aplaudindo. - E outra coisa também, foi graças à , ex jogadora de futebol feminino, que eu fui introduzido à essa modalidade incrível.

Por mais que tivesse notado olhares desinteressados, ele continuou. A premiação incluía também a entrega dos prêmios para a modalidade feminina e os olhares curiosos das jogadoras fez ele sorrir.

- Eu, como a maioria dos homens aqui, cresci sem qualquer referência de mulheres no futebol, e não que eu fosse contra, mas também não fui atrás para saber... Bem, eu perdi muito tempo olhando pro meu próprio nariz quando no Brasil e mundo à fora, milhares de mulheres habilidosas lutam diariamente para conseguirem seu espaço e respeito em um meio tão machista como o futebol. Tive várias oportunidades de ver jogos do time feminino, assisti a um jogo da Copa do Mundo na França ano passado, e ver essa modalidade ganhando mais visibilidade a cada dia que passa me faz pensar que vocês, mulheres do esporte, são a inspiração para as meninas que ainda virão, e por que não os meninos? É lindo ver a torcida comparecendo em massa nos jogos, levando as suas crianças para que cresçam livres de preconceitos arcaicos criados por homens estupidos e velhos, e infelizmente, por mulheres machistas também, mas saibam que queremos e vamos mudar isso. Nos dois últimos anos vimos um aumento significativo de visibilidade para a modalidade e vamos atrás de mais, eu vou atrás de mais. Se um dia eu tiver um filho, vou ensinar para ele a importância de respeitar a todos, e se eu tiver uma filha, ela vai ter todo o meu apoio se quiser seguir os meus passos. E como só fazer um discurso bonito não é o suficiente, eu me comprometo, de hoje em diante, a colaborar com as futuras gerações de jogadoras que ainda vão chegar. Eu, , dou início hoje a um projeto que me veio em mente apenas nesta madrugada enquanto eu não conseguia dormir, mas que quanto mais eu penso, mais empolgado eu fico: vou abrir uma escola de futebol exclusiva para meninas, e todas que quiserem, serão bem-vindas. É um projeto grande e ousado, mal sei por onde começar, mas eu sei que vou. Pode levar um, dois, cinco ou dez anos, mas eu quero que outras meninas tenham a chance que jogadoras do passado não tiveram - disse diretamente para e ele sabia que do lugar dela, ela podia entender. - Da mesma forma que vocês respeitam suas mães, irmãs, filhas e esposas, respeitem as jogadoras também. Dirigentes, não enxerguem como obrigação manter um time feminino, e sim como um privilégio, é uma honra para mim dizer que a modalidade feminina do time que eu jogo é a melhor do país, e eu torço, do fundo do meu coração, para que outros times atinjam o mesmo patamar. Mulheres aqui presentes, jogadoras, vocês são incríveis, nunca desistam desse sonho tão lindo, vocês são inspiração pra mim, pra muita gente e toda uma geração que está por vir. Obrigado por estarem escrevendo a história diante dos nossos olhos, eu dedico esse prêmio para vocês também. Muito obrigado e tenham uma ótima noite.

não esperava a chuva de aplausos que se iniciou logo em seguida. Foi ovacionado e aplaudido de pé pela grande maioria, e por mais que se sentisse um pouco tímido, não podia deixar de pensar que realmente queria fazer a diferença. Apesar de ver tantos sorrisos lançados em sua direção, ele estava procurando por um em específico. Desceu do palco e andou pelo salão até o final, indo até a mesa e percebendo que não estava ali.

- Cadê a ? - perguntou para Bruno e Gabriela enquanto deixava o troféu sobre a mesa.
- Ela foi ao banheiro, estava muito emocionada. Foi lindo, , de verdade - Gabriela disse com a voz embargada, seus olhos estavam marejados.
- Obrigado, Gabi, se quiser fazer parte, será muito bem-vinda, mas se me derem licença, preciso ir atrás da .

se afastou deles e procurou pelos banheiros que ficavam em um corredor fora do salão principal. Estava vazio, exceto por encostada na parede, cobrindo o rosto com as mãos, tentando chorar baixo, se quer tinha notado que estava ali.

- - chamou por ela enquanto se aproximava. Ela olhou para ele, sua maquiagem estava borrada. - Nossa...
- Eu não queria que você me visse assim.
- Até sei o motivo, é a primeira vez que te acho feia - tentou soar descontraído e deu certo, pois riu enquanto tentava amenizar a situação. - Por que você não vai limpar esse rímel escorrido da cara e a gente conversa depois, hein?
- Me dá um minuto.

entrou no banheiro feminino e levou alguns minutos para voltar, agora com menos maquiagem e sem marcas de rímel escorrendo pelas bochechas. desencostou da parede e se aproximou dela.

- Você tá bem?
- Tô, é que... O seu discurso mexeu muito comigo, , eu não sabia que você se importava tanto, isso foi o que me fez gostar de você, mas agora faz eu amar ainda mais, foi tudo tão...
- Eu não falei da boca pra fora, . Se é importante pra você, então é pra mim também.
- Eu sei, é que... Eu voltei no tempo, sabe? Eu passei por tanta coisa pra conseguir chegar no profissional, joguei em campos que você não teria coragem de pisar, vesti uniformes de qualidade tão duvidosa quanto às roupas que vendem no Brás, eu se quer tive patrocínio, tudo veio do meu bolso e graças a Deus a minha família sempre teve condições de me ajudar, mas mesmo assim, foi muito difícil. Foi como reviver isso de novo por uns minutos.
- Me desculpa, , eu não sab...
- Não, eu não tô brigando com você, eu quero te agradecer. A sua iniciativa vai abrir portas para muitas meninas, é muito importante o que você tá fazendo, elas vão ter o que eu não tive, e graças a você.
- Graças a você, que me inspirou tanto - ele segurou as mãos dela. - Nada seria possível sem você, não esquece disso.
- Obrigada por tudo, .

Em resposta, recebeu um abraço dele. De longe, era o seu lugar preferido, e cada dia que passava se tornava ainda mais. Tinha orgulho do homem que ele estava se tornando, deixando o menino mimado para trás e se tornando alguém que usava seu poder aquisitivo e influência para fazer o bem.

- Mesmo que você não jogue mais, e nunca mais vá jogar de verdade, sempre vou torcer por você. Na arquibancada da sua vida, sou seu torcedor número um - ele disse ao soltá-la e deixou um beijo na testa dela. - Do mesmo jeito que você torce por mim.
- Você vai me fazer chorar de novo - ela riu, mas já estava com os olhos marejados novamente.
- Não chora, vamos voltar, ok?
- Bem que a gente poderia ir embora, não é?
- Eu queria, mas eu preciso ficar. Não se preocupa, o resto da noite vai ser só a gente, eu prometo.

⚽🖤📱

- Tenho mesmo que fazer isso? - perguntou pela terceira vez enquanto fazia careta. O troféu que carregava já estava ficando pesado e suas mãos suadas.
- Olha, você acabou de receber o prêmio de Rei da América, será que dá pra parar de resmungar e deixar eu tirar essas fotos? Só mais algumas e já estamos terminando, você sabe que precisa fazer isso, é só um pouco de publicidade - disse em um tom de bronca que ele acatou.

concordou e, como se não estivesse nem um pouco entediado com aquilo, exibiu o seu melhor sorriso para a câmera. Era dia trinta e um de dezembro e tinha sido eleito oficialmente o Rei da América, e por mais que estivessem curtindo as férias em Jericoacoara, no Ceará, ele precisava posar para algumas fotos, e que lugar melhor para fazer isso no verdadeiro paraíso na terra? havia sido muito inteligente ao juntar as duas coisas, o resultado seria uma publicidade leve e divertida.

- Acabamos, foi tão ruim assim? - devolveu o celular para ele quando terminaram e ele riu.
- Até que eu gostei, mas se conheço a minha família, daqui a três minutos vão estar aqui querendo tirar fotos também. Aliás, viu eles por aí?
- Sua mãe e a minha foram dar um passeio de Jeep ou algo assim, não entendi direito - foi até a sua cadeira debaixo do guarda-sol e colocou os óculos de sol. - A Cida e o Leo foram levar as meninas pra praia e sabe-se lá Deus onde o Rony foi parar, agora senta aí e relaxa também.

pediu um momento para colocar o troféu no quarto e esperou por ele desfrutando do sol escaldante do nordeste. Até queriam ir para a praia, mas a piscina do Resort também era convidativa e como queriam passar um tempo juntos, decidiram ficar por ali mesmo e durante a noite iriam para a praia afim de verem a queima de fogos. estava tentando aproveitar cada segundo daquela viagem, embora já tivesse conhecido lindos lugares pelo Brasil e pelo mundo, aquele sem dúvidas estava sendo o seu preferido até o momento. Quando foi até ela dizendo que havia fechado um pacote para a família inteira e sem a possibilidade de qualquer um recusar, ela se viu na obrigação de ir, mas não podia reclamar de nada, estava em um lugar lindo curtindo o recesso de fim de ano do lado da pessoa que mais amava, tudo estava perfeito.

- ?

Ela abriu os olhos, puxou o óculos para cima e se sentou. Piscou algumas vezes para ter certeza de que estava vendo certo, e mesmo depois de tantos anos, podia reconhecer os cabelos compridos até a altura dos ombros que seu ex namorado, Daniel, sempre teve. E aparentemente ele não parecia estar de férias também.

- Daniel? - questionou ainda um pouco surpresa. - O que você faz aqui?
- Eu trabalho aqui - ele sorriu um pouco sem jeito e percebeu que não sabia muito bem o que dizer. - Faz um tempo, na verdade, saí de São Paulo há alguns anos e acabei vindo pra cá.
- Que ótimo... Bom, pra você é verão o ano inteiro.
- Quase isso - Daniel continuava a sorrir e se perguntava se ele já estava indo embora. - Nossa, já faz tanto tempo que quase não te reconheci, você tá ótima! Ainda joga?
- Por favor, não finge que você liga pra isso, você sabe que não, que eu já parei há muito tempo - ela tentou ser educada, mas acabou descobrindo que ainda guardava mágoa dele por não ter recebido apoio quando ainda era jogadora.
- Eu sei que eu fui um babaca, você tá certa em não gostar de mim, mas levou um tempo pra eu perceber que você tava no caminho certo, hoje eu vejo isso com outros olhos, me desculpa por não ter te apoiado antes.
- Já é passado, deixa pra lá, não importa mais, que bom que você mudou o seu pensamento, e... - ela notou a aliança dourada no anelar esquerdo dele quando a mesma refletiu o sol. - Casou? Que ótimo.
- Ah... É, é por causa dela que eu penso diferente - ele sorriu e sentiu um repentino alívio por entender que ele não estava tentando se aproximar dela com segundas intenções.
- Que bom, eu fico muito feliz por você, Dani.
- E pelo visto não sou só eu que tô bem, não é? - ele apontou discretamente para o anel dela e concordou.
- Eu tô muito, muito bem - também sorriu e olhou para sua aliança prateada. - Acho que agora vai.
- , eu sempre tive certeza que um dia eu ia te ver de novo pra poder me desculpar pela forma como eu te tratei no passado, e eu espero que você possa me perdoar.
- Tá tudo bem, é sério, eu já deixei isso pra trás, eu sei que eu também não era uma pessoa muito fácil de lidar pelo meu comportamento explosivo, todo mundo teve a sua parcela de culpa, mas é passado.
- Eu fico feliz de ouvir isso... Bom, eu tenho que voltar pro trabalho, mas foi um prazer poder te ver de novo. Feliz ano novo.
- Igualmente, Dani. Feliz ano novo.

Daniel se afastou e precisou de alguns segundos para processar o que havia acabado de acontecer. Não falava com Daniel há muitos anos, se quer pensava nele desde que havia chegado, também não esperava um pedido de desculpas do nada, mas até que se sentia bem com aquilo. Foi uma época complicada, ela era muito jovem e imatura, e ele era machista e controlador, jamais poderia dar certo e isso não a incomodava de maneira alguma, mas a sensação de resolver uma pendência era boa e trazia paz.

- Perdi alguma coisa? - perguntou ao se aproximar, tinha visto de longe enquanto caminhava até que já estava reclinada não cadeira de novo. - Aquele cara mexeu com você?
- Não, tá tudo bem - respondeu com tranquilidade, mas olhou para e ele parecia preocupado e curioso. - Por favor, não surta.
- Eu não vou surtar, só queria saber se ele fez alguma coisa com você - ele se sentou na cadeira ao lado dela e esticou as costas para relaxar também.
- Na verdade ele fez, mas já faz muitos anos... , aquele é o Daniel, meu ex namorado. Ele trabalha aqui, aparentemente, e parou pra me cumprimentar e... bem, pedir desculpas pela forma como terminamos.
- Ah, legal, qual é a probabilidade de isso acontecer, não é?
- E quem esperava que a gente ia encontrar com a sua ex namorada e super modelo numa premiação de campeonato, né? - rebateu a ironia. - Qual era a probabilidade de acontecer?
- , pelo amor de Deus, eu não tô brigando com você! Para de ser doida - riu, não estava falando sério e muito menos com ciúmes.
- Eu nunca sei quando você tá falando sério ou sendo irônico, .
- Eu estava brincando, mas é claro que eu jamais imaginei que isso fosse acontecer... Então quer dizer que ele era um babaca?
- Muito, nunca me apoiou em nada, mas parece que casou e deu um jeito na vida, deixou de ser otário. Ótimo pra ele.
- Você falou de mim pra ele, né?
- ! - esticou o braço em uma tentativa falha de dar um tapinha nele, mas os dois acabaram rindo. - Ele notou antes de eu falar, se você quer saber.
- Que pena, eu queria ter me exibido pra ele um pouco, fazer pose... Você sabe, me impor.
- Claro, macho alfa, eu sei, então você tem masculinidade frágil? Duvido que ele saiba quem você é, ele não gostava de futebol.
- É sério? Então definitivamente aquele homem não servia pra você, mas esse que tá aqui do seu lado agora é perfeito, pense nisso.
- Você se acha demais, sabia? Quantas vezes vou ter que dizer isso?

gargalhou em resposta e acabou rindo também. Seriam sempre assim, não tinha jeito, eram namorados, mas também melhores amigos. Sempre iriam implicar um com o outro, estava na essência e não iria mudar nunca.

⚽🖤📱

Para a celebração do ano novo, havia apostado em um macaquinho branco e sofisticado. Apesar do decote cavado, era um modelo delicado que marcava sua cintura e era soltinho nas coxas, totalmente apropriado para o calor que estava fazendo. Ela estava terminando de se arrumar, não ousou passar maquiagem porque sabia que ia derreter, optou apenas por um rímel nos olhos, então tentou fazer um rabo de cavalo bem esticado para conter os fios rebeldes, e um chinelinho de dedos com as alças brilhantes que mostravam suas unhas impecavelmente feitas uns dias antes. Ela estava satisfeita consigo mesma.

- Ei, gata, tem namorado? - havia acabado de sair do banheiro enrolado na toalha e de cabelos molhados, mas não deixou de notar a roupa dela.
- Tenho, sai daqui - ela riu e deu uma última conferida, se dando por vencida. - Fecha o zíper pra mim, por favor.
- Fechar? Meu amor, essa roupa é um convite pra eu tirar tudo - ele disse enquanto se aproximava dela e fechou o zíper que ficava nas costas.
- Não me provoca, - fechou os olhos quando sentiu os lábios dele no seu pescoço, dando um chupão de leve, e as mãos repousando sobre a sua cintura, apertando.
- Eu não tô provocando você, mas acho que ainda tem tempo até meia noite - ele disse baixo ao pé do ouvido, deixando mais um beijo ali. - Três dias aqui e até agora não conseguimos aproveitar de verdade.
- Até onde eu me lembro, depois daqui ainda vamos passar uma semana em Noronha só nós dois, então não vai faltar a oportunidade. Além disso, você tá todo molhado - ela se afastou dele, mesmo querendo ficar. - Anda, vai se vestir, eu não quero chegar atrasada na praia.
- Será que até o fim dessa viagem a gente vai ter um momento só nosso? - se deu por vencido e foi até a mala procurar pela bermuda que havia levado, a camisa já estava sobre a cama.
- Talvez até o fim da noite eu mude de ideia, bonitão - disse por fim ao ir em direção à porta, mas deixou um tapinha na bunda dele antes de sair.

Os quartos eram um pouco afastados uns dos outros no resort e ela caminhou pelo corredor até o quarto mais próximo onde Cida estava terminando de preparar as meninas. Maya já estava pronta e entretida ouvindo música no celular enquanto Cida fazia uma trança nos cabelos cacheados e volumosos de Belinda.

- , você tá incrível - Cida disse ao notar a cunhada ali.
- Obrigada, Cida, você também. Viu minha mãe por aí?
- Eu não vi, mas tenho certeza de que à essa altura a sua mãe e a minha já viraram melhores amigas da vida porque não se separaram um minuto desde que chegamos, e com certeza sua mãe já deve ter visto algum nude do quando criança que minha mãe sempre faz questão de mostrar, tem tudo no celular.
- Ele vai dar cria quando descobrir, com certeza - as duas riram. - Mas essa viagem tá fazendo bem pra minha mãe, ela está muito sozinha desde que o meu pai faleceu, é bom pra ela ter uma amiga.

se sentou na cama ao lado de Maya e nem precisou falar nada, a menina já ofereceu um lado do fone para elas ouvirem músicas juntas.

- O que você tá ouvindo, Maya?
- BTS, tia. É K-pop.
- Legal, vou ouvir com você. De quem você gosta mais?
- Do V, ele é bonitinho, né?
- Claro, uma graça - não tinha a mínima ideia de quem era, mas também não iria descordar. - Ah, olha só pra você, toda crescida já, quase uma adolescente, daqui a pouco vai estar mais alta do que eu, o que não é muito difícil - as duas começaram a rir.
- Calma, ela só tem oito anos ainda, é um bebê.
- Não sou um bebê, mãe - Maya rolou os olhos. - A Belinda que é.
- Não sou nada! - Belinda rebateu imediatamente para a irmã, mas as duas foram repreendidas pela mãe.

Não demorou muito para que todas estivessem arrumadas, então saíram do quarto, encontrando com os três homens no corredor. até pensou em entrelaçar seus dedos aos de , mas Maya passou na frente ao estender a mão para o padrinho enquanto Belinda pediu colo para o seu pai, Leo.

- Podemos ir? - Rony perguntou.
- Sem a dona Regina e a dona Rose? Essas duas estão piores que adolescentes, me dá um minuto - Cida foi até o último quarto do corredor e, alguns minutos depois, voltou acompanhada pelas duas mulheres. - Pronto, resolvido.
- Mãe, a senhora esqueceu que eu existo? - perguntou em tom de brincadeira, colocando as mãos na cintura.
- , não haja como se tivesse sete anos e ainda precisasse de mim pra alguma coisa, você já é adulta.
- Podia dormir sem essa.
- Me erra, - ela rolou os olhos e então seguiram caminho.

A caminhada até a praia não era longa, em apenas dez minutos já estavam lá, e faltava pouco menos de vinte minutos para a meia-noite.

- Já tem as suas metas de ano novo? - perguntou ao abraçar por trás, envolvendo seus braços pelos ombros dela.
- Eu acho que já tenho tudo o que eu queria há um tempo atrás - respondeu com sinceridade, já tinha alcançado suas metas. - Só quero voltar pra faculdade e fazer uma pós graduação, mas eu não sei... E você?
- Tendo todos vocês comigo nada mais vai importar. Que ano louco, quase que a gente se separou de verdade...
- Pois é, mas que bom que conseguimos continuar juntos, e que dure por muito mais tempo.
- Pode ter certeza que eu vou fazer de tudo pra isso acontecer, e espero que um dia você mude de ideia e possa me dizer sim, porque o meu você já tem.

Dois anos antes, teria se afastado dele imediatamente e teria dito que ele enlouqueceu, que ela não precisava se amarrar a alguém pelo resto da vida, mas o tempo tinha passado e ela tinha mudado, ainda não tinha certeza se seus ideais eram os mesmos, mas de repente compartilhar o resto de sua vida com não parecia ser tão assustador quanto ela achava que seria. Claro que isso significava não ter uma rotina fixa, estaria sempre se mudando e se adaptando, e isso a deixava pensativa, mas estava tão mudada que poderia pensar melhor sobre.

- Eu já mudei tanto desde que te conheci, que não me surpreende essa ideia não me assustar mais - ela confessou com seu olhar perdido nas ondas do mar, pegando de surpresa.
- Então isso é um talvez?
- Isso é um eu não sei o que vai acontecer amanhã, e nem depois, só sei que quando penso nesses dias que vão vir, você tá lá nos meus planos.
- Não vou apressar nada, , quando você se sentir preparada, eu vou estar também.
- Esse foi o quase pedido de casamento mais bonito que eu já recebi - ela disse rindo.
- Na verdade, eu pedi, mas foi o não mais esperançoso que eu já ouvi. Mulher, eu ainda vou casar com você, nem que eu leve o resto da vida pra conseguir isso.
- Calma, talvez você não precise esperar tanto tempo.
- Vou esperar pelo seu tempo, .

Era o que precisava ouvir. Talvez estivesse se preparando para isso, não tinha clareza, mas ele respeitava seu espaço e escolhas, o que a deixava tranquila. A maioria dos jogadores de futebol costumam se casar e construir cedo suas famílias, era até um pouco surpreendente o fato de não ser casado e não ter filhos com a idade que tinha mesmo sendo jovem ainda, e embora ele quisesse muito, não estava pressionando em nada, o que naturalmente fazia ela começar a pensar diferente ao longo dos anos.
Os vinte minutos finais do ano se passaram rápido e logo estavam em contagem regressiva. Na virada, a primeira pessoa que abraçou foi a sua mãe, afinal, era o primeiro ano que eram apenas as duas, o que tornava as coisas mais difíceis. Ela queria, mais do que nunca, que seu pai estivesse ali, que fizesse as mesmas piadas bobas de todos os anos, mas tudo o que restou foi a saudade que apareceu através das lágrimas das duas quando se abraçaram. Sua mãe era a família que tinha, não que não tivesse outros parentes, mas não era tão próxima deles assim, o que tornava a relação de mãe e filha ainda mais próxima.
E a segunda pessoa não poderia ser outra a não ser . Passaram por tanto naquele ano que parecia difícil de acreditar que estariam juntos na virada, mas estavam, e muito bem, por sinal. Entendiam que tinham personalidades fortes e em algum momento bateriam de frente com o outro novamente, desentendimentos entre casais são comuns, mas o diferencial é que sempre tentavam mais uma vez porque valia a pena. Nenhum dos dois eram perfeitos e estavam longe de ser, mas ao menos queriam sempre fazer dar certo. sabia que era uma raridade e não deixaria ela ir tão fácil, ele pensou que até já tinha se apaixonado antes ou se interessado por outras mulheres bonitas e inteligentes, mas para ele superava qualquer expectativa.

- Talvez eu tenha uma meta pra esse ano - disse após o beijo, mas continuaram abraçados. olhou para ela curioso.
- E o que é?
- Vamos continuar tentando, tá? Nunca foi fácil e não acho que vá ser algum dia, mas por favor, não desiste de mim.
- Só se eu estivesse completamente maluco - sorriu, era o melhor pedido que ele poderia receber. - Eu não vou desistir nunca.

estava pronto para beija-la novamente, mas foi interrompido quando suas sobrinhas pediram abraços, e ele, claro, seria incapaz de negar. Tinha um pouco dele para cada mulher da sua vida.

⚽🖤📱

e chegaram no quarto por volta das três horas da manhã após aproveitarem a festa do resort. Mesmo cansados, ainda puderam aproveitar o tempo a sós como queriam. dormiu logo depois, mas continuava acordado, estava inquieto, simplesmente não conseguia dormir, mesmo estando exausto, mexia de um lado para outro na cama, mas sem sucesso. Era cinco e meia da manhã e ele tinha certeza que veria o nascer do sol se continuasse daquele jeito.
Entediado, pegou seu celular debaixo do travesseiro e começou a responder mensagens dos seus amigos e familiares nas redes sociais para ver se o sono vinha, mas tudo o que conseguiu foi despertar ainda mais quando, algum tempo depois, muitas mensagens de Dantas começaram a chegar de uma vez.

"Feliz ano novoooo !"
"Tô bêbado, desculpa"
"Tenho uma surpresa pra você"
"Vou contar"
"TCHAU BRASIL!"
"A janela abre hoje, não esquece"
"Você sabe falar inglês?"
"Próxima parada: Inglaterra"
"Desculpa o spoiler, eu ia contar depois"


piscou algumas vezes e leu as mensagens novamente para ter certeza, estava confuso. Claro que Dantas sempre corria para lhe contar qualquer sinal mínimo de sondagem, e nos últimos dias ele soube, através da mídia esportiva, que clubes do exterior estiveram sondando seu futebol durante o ano, mas ele não esperava receber uma às cinco e meia da manhã do dia primeiro de janeiro. Não podendo se conter, ele respondeu:

"Do que você tá falando???"

E a resposta de Dantas veio pouco depois em um áudio longo e arrastado devido à embriaguez dele.

- Olha só, meu parceirinho, eu vou ter que falar porque digitar não dá mais, mas resumindo: você sabe que arrebentou esse ano... ano passado... porra, não sei! Não ia contar agora, guardei pra te fazer surpresa, mas eu tenho certeza que o Chelsea vai fazer proposta, e como eu sei disso? Bom, tem um cara aqui no meu e-mail há dias, porque aparentemente os ingleses só trabalham e não curtem o ano novo como pessoas normais, e esse carinha, , representante do Chelsea no Brasil, quer saber quem é você, e é isso. Tô muito bêbado pra dar mais detalhes agora, mas prometo que vou fazer isso logo. Feliz ano novo, parceiro, o melhor ano da sua vida!"

- Meu Deus - foi tudo o que conseguiu dizer após ouvir tudo.

Não era brincadeira, Dantas jamais brincaria com um assunto tão sério, mas ainda era difícil de acreditar totalmente. Estaria chegando o seu momento? Teve uma temporada incrível, era verdade, talvez a melhor da sua carreira, mas era o suficiente para mostrar seu potencial? trabalhou a vida inteira para chegar nesse momento, mas não tinha certeza se de fato o momento havia chegado mesmo. Poderia dar errado como sempre, ou ele poderia recusar e continuar no Brasil, mas tinha tantos fatores envolvidos que ele simplesmente não conseguia pensar em tudo de uma vez, precisava descansar um pouco.
Somente quando o sol começou a entrar de forma mal-educada no quarto, atravessando as finas cortinas de linho branco, foi quando conseguiu fechar os olhos e dormir um pouco. Ainda tinha o resto das férias para aproveitar, mas se aquilo fosse mesmo a vida real, ele precisava descansar para poder acordar bem e, quem sabe, tomar a melhor decisão.

Capítulo 37 - A despedida

São Paulo

revezava o olhar entre o filme que assistia na Netflix e o seu celular para ver se iria mandar alguma mensagem, mas já passava das nove da noite e ele não tinha dado notícias, sinal de que provavelmente ainda estava em reunião. Ela estava tão ansiosa quanto ele porque provavelmente naquele dia chegariam a um acordo, e depois de quase um mês de especulações, poderia se tornar oficialmente um jogador do Chelsea.
sabia o peso do que estava acontecendo, não era pouca coisa, se tratava de um dos melhores clubes ingleses da atualidade, o time que tinha um elenco cheio de ótimos jogadores e Thomas Tuchel no comando técnico. Ela sabia que o sonho de era jogar no Barcelona, mas também podia ver que ele estava disposto a esperar mais um pouco se fosse preciso. Sites brasileiros e ingleses já davam como certa a contratação do jogador, mesmo ela sabendo que não era bem assim e nada estava fechado ainda, mas ela sabia que o Corinthians não faria qualquer esforço para manter no clube, afinal, a multa rescisória dele era uma das mais altas do elenco e tinha valorizado ainda mais depois de todas as conquistas recentes, além de o salário também ser um dos maiores da folha, e todo o dinheiro que iria entrar, além do alívio do pagamento de salário, seria bem-vindo ao clube que precisava daquele dinheiro. Cabia apenas ao próprio decidir se queria ou não.
E se sentia egoista por pensar aonde ela se encaixava no meio de tudo isso. Se ele realmente fosse, como ela iria também? Largaria tudo por ele e seguiria com para um país estranho no qual ela não falava tão bem assim o idioma? Se adaptaria ao lugar? Se adaptaria à língua? Se adaptaria ao frio? Ela se sentia muito egoista por pensar assim, mas não podia evitar, e também sabia que se dissesse para , ele iria repreender, dizendo que não era egoísmo e o relacionamento deles vinha primeiro, mas era assim que ela se sentia. Não era sobre ela, e nem sobre eles, mas unicamente sobre e ela não poderia fazer nada para mudar caso alguma coisa não fosse do seu agrado. Poderia apenas esperar até que tivesse um desfecho.
Demorou um pouco, mas finalmente chegou em casa. Trancou a porta da sala devagar e bocejou enquanto esfregava os olhos de tamanho cansaço após um dia de treino e aquela reunião logo depois, só então se deu conta de que estava ali olhando para ele apreensiva.

- E aí? - ela questionou e desligou a TV quando ele se aproximou e se sentou de frente pra ela no sofá.

olhou para ela um instante, mas depois desviou o olhar, olhando pros lados e pra baixo. Parecia hesitante, não dava para saber o que ele iria dizer enquanto não saísse dos seus lábios se a resposta era sim ou não.

- Eu aceitei - ele finalmente respondeu e foi até o sofá se sentar ao lado dela. - Eu vou me transferir para o Chelsea.
- E você não tá feliz? - ela questionou de novo, imaginando que ele estaria saltitando de alegria.
- Muito, eu tô muito feliz, mas...
- Você queria ir pro Barcelona, né?
- Não é isso. Eu gosto daqui, - ergueu o olhar e percebeu que ele estava com os olhos marejados, tal como a voz ficou embargada. - Eu adoro estar onde estou, eu amo São Paulo, eu aprendi a amar o clube que eu tô jogando, eu vivi dois anos incríveis aqui, e achei de verdade que teria mais um, talvez eu não esteja pronto pra dizer adeus.
- Por que você não recusou? - perguntou com o máximo de sutileza que poderia, sabia que era um assunto delicado.
- Não dava, os valores são coisas de outro mundo... nunca vi tanto dinheiro na vida, estava pensando na minha família também, mas... é complicado, eu odeio me apegar tanto a um lugar e ter que ir embora, foi assim quando saí do Grêmio também. É uma sensação tão estranha...
- Você foi feliz aqui, , chegou contestado e ganhou tudo, vai sair pela porta da frente com status de ídolo, é compreensível você se sentir assim, mas... sempre foi seu sonho - sorriu, tinha abraçado a causa. - Você ralou a vida inteira pra chegar nesse exato momento, olha só pra você, vai jogar na Europa! Pode não ser exatamente como você queria, mas não deixa de ser o seu sonho, né? Você merece, merece demais, merece muito. As lembranças vão continuar com você, assim como o carinho da torcida, nunca vão esquecer tudo o que você fez e as alegrias que trouxe. , você já realizou os sonhos de muita gente, mas agora é a hora de ir atrás do seu. O mundo é seu agora, abraça a oportunidade.
- Você tem razão, é só que... eu tô com medo de fracassar de novo.
- Você é grande, é um campeão, você é o meu orgulho. Independente do que aconteça, você tá voando alto e merece conquistar o mundo, eu tô com você sempre.

abriu os braços e deixou se aninhar nela. É claro que ele estava feliz, mas tinha muito mais coisas envolvidas para resolver do que a própria felicidade. Ele estava claramente confuso, e se quer tinha começado os preparativos para essa grande mudança, então deixou que ele ficasse ali e levasse todo o tempo que precisasse para processar a novidade, e somente depois, ela pensaria no que faria a respeito da própria vida.

- Quando você vai? - ela perguntou após alguns minutos em silêncio.
- Tenho quinze dias no máximo - respondeu após soltá-la.
- Nossa... É pouco tempo, né? - tentou disfarçar para não perguntar o que tinha em mente.
- , você não precisa ir agora - disse como se pudesse ler os pensamentos dela, pegando ela de surpresa. - A gente tem muito trabalho por aqui. Temos que guardar tudo o que a gente quer levar, cuidar da nossa documentação, devolver esse apartamento pra imobiliária... Vou tentar adiantar tudo, mas você não precisa acompanhar o meu ritmo, se eu conseguir fazer as malas sozinho já vai ser muita coisa.
- Era o que eu estava pensando... Quero dizer, eu tenho a minha vida toda aqui, né? Adoro o meu trabalho novo, quero voltar pra faculdade e fazer pós-graduação, e tem a minha mãe também... É só a gente agora, e eu preciso ter certeza antes de fazer qualquer coisa.
- Você tá certa, eu não quero que você se arrependa de nada, , leva o tempo que você precisar, eu vou entender totalmente, nem uma casa pra ficar a gente tem - riu, mas era por puro nervosismo por pensar que ainda tinha que ir atrás de uma casa pra alugar. - Fica tranquila, a gente vai dar um jeito, só preciso fazer uma coisa de cada vez, e por enquanto, preciso me concentrar no meu último jogo no domingo. Você vai poder ir?
- É claro. Você não vai chorar, não é?
- Que pergunta ridícula, , é claro que eu vou chorar - os dois começaram rir, mas tinha quase certeza de que iria sim. - Parece que o clube vai me dar uma placa ou algo do tipo.
- Merece uma estátua por tudo o que fez pela gente.
- Assim você inflama o meu ego.
- E com razão, lorde! Agora relaxa aí, você merece.

⚽🖤📱

Para o último jogo de , quis fazer diferente, deixou de lado o camarote habitual e optou por ir de arquibancada, atrás do banco de reservas onde a torcida costumava ser mais tranquila, assim poderia ver mais de perto, e ele também poderia ver ela. O jogo era contra o Oeste pelo Campeonato Paulista e valia a liderança do grupo em que o time estava. Era domingo de manhã, o sol quente tornaria o jogo ainda mais difícil.

- Veja pelo lado bom, não vai ter isso na Inglaterra - Gabriela disse para após a mesma reclamar do calor, tinha decidido acompanhar a amiga.
- Gabi, não fica rindo de mim, porque não vai achando que o Bruno vai ficar aqui pra sempre, tá? E não vai demorar nada até ele sair também.
- Enquanto isso não acontece, eu vou fazer esses comentários, amiga. Fala sério, vocês vão pra Europa! Qualidade de vida, poder aquisitivo...
- É... ainda tô vendo o que eu vou fazer - admitiu, mal estava dormindo à noite por tanto pensar na mudança. - Me preparei tanto pra isso, mas ainda não sei se eu tô pronta de verdade.
- Você não quer ir?
- Eu quero, mas... é complicado, eu tenho uma vida toda aqui, eu não quero ficar longe da minha mãe... eu ainda não sei o que vou fazer.

Antes que Gabriela pudesse responder, os times entraram no gramado para a execução do hino nacional. estava com a braçadeira de capitão, o que era uma surpresa, já que o rodízio de capitães não acontecia há muito tempo, mas ele parecia muito à vontade. No campo, ele percorria o olhar pelo estádio, se dando conta de que era a última vez que fazia aquilo, que sentia o calor daquela torcida, que teria seus amigos como parceiros de vestiário. Por mais que estivesse concentrado para entregar o seu melhor, não podia deixar de se sentir emocionado por todo o apoio e carinho que estava recebendo, seria eternamente grato por tudo o que passou ali.
Quando a partida começou, a primeira chance clara de gol foi do Oeste aos cinco minutos, mas foram preciso apenas dezoito toques na bola, desde a construção da jogada com o goleiro até que a bola parasse nos pés de e ele abrisse o placar ao receber um cruzamento e mandar de letra para o gol. E se aquele fosse o seu último gol, não via outra maneira de comemorar se não fosse nos braços da torcida que o acolheu quando ele se mostrou capaz. Mesmo recebendo um cartão amarelo por isso, ele estava se sentindo muito bem e realizado.

E não parou por ali, no finalzinho do jogo ele fez mais um, resultando em um placar final de 4x0. Quando o árbitro apitou o fim da partida, se ajoelhou no gramado e agradeceu pela oportunidade de estar ali. Dizer adeus era difícil, mas tinha chegado a hora de se despedir ao menos da torcida. Aplaudido pelos seus companheiros de time, ele se levantou e respondeu os aplausos da torcida com mais aplausos, começando a dar uma volta olímpica enquanto via uma pequena estrutura sendo preparada para ele perto do banco de reservas. E foi perto do banco que ele viu o aplaudindo, estava tão perto que podia ver os olhos marejados dela. Ele pulou o painel de patrocínios e subiu a escada até onde ela estava, puxando ela para um abraço apertado onde caiu no choro e ele teve que se conter para não chorar junto.

- Obrigado por ter me dado uma chance e ter acreditado em mim até quando eu mesmo não acreditava mais, eu te amo - ele deixou um selinho demorado nos lábios dela e então se afastou, precisava ver o que o clube tinha preparado para ele.
- Felizmente eu registrei tudo, me agradece depois - Gabriela mostrou o celular exibindo o vídeo que ela havia acabado de gravar enquanto ria e secava suas lágrimas.
- Ainda não acredito que ele tá indo mesmo, ele merece muito, eu tô tão... nem sei explicar.
- Não precisa, dá pra ver - Gabi sorriu compreensiva e então as duas voltaram a atenção pro campo.

Uma pequena estrutura foi montada com os cinco troféus que conquistou em suas duas temporadas ali. Dois campeonatos paulistas, um brasileiro, uma libertadores e uma sul-americana, as cinco taças enfileiradas para que ele tirasse fotos com elas, e depois todo o time se juntou a ele para uma última foto e agradeceu um por um, abraçando a todos. Após mais uma salva de palmas para a torcida, ele criou coragem para deixar o gramado e ir para o vestiário, estando cada vez mais difícil de conter a emoção, tinha um estádio inteiro gritando o seu nome e aplaudindo. Não olhou para trás, apenas seguiu o caminho que conhecia tão bem, sabendo que era a última vez.

⚽🖤📱

revirava de um lado a outro na cama, estava completamente sem sono, uma semana já havia se passado e ela ainda não sabia o que fazer. Deveria ir? Deveria ficar? Estava disposta a deixar seu emprego e a vontade de fazer uma faculdade para trás e começar do zero mais uma vez? Conseguiria aprender inglês britânico? Se adaptaria à cultura e ao inverno europeu? Seu relacionamento continuaria o mesmo?
Tantas perguntas rondavam sua mente e ela não conseguia chegar em nenhuma conclusão. Estava se pressionando a tomar uma atitude o mais rápido possível, mas não conseguia pensar direito. Sempre que tomava uma decisão, mudava de ideia logo em seguida. Primeiro tinha decidido que iria, mas então viu sua mãe chorando com saudades do seu pai, não pensou duas vezes antes de escolher ficar com ela. Depois decidiu que iria ficar e seguir sua vida, mas então viu o quanto estava se animando para ir e incluindo ela em tudo o que ele pretendia fazer, e ela queria muito ser parte de tudo aquilo. Estava totalmente dividida e o tempo estava acabando, mesmo ele dizendo que ela não precisava ter pressa, mesmo assim ela queria tomar uma decisão rápido.
Ela se levantou da cama e foi até o banheiro do quarto. Abriu a torneira e jogou um pouco de água gelada no rosto e na nuca para se refrescar visto que estava calor. Se olhou no espelho e percebeu que estava com olheiras, mas isso era fruto de noites mal dormidas e trabalho excessivo. Tinha que levantar em algumas horas, mas estava ali sem sono e se sentindo perdida, seria mais um dia longo. soltou um longo suspiro, estava cansada daquilo, e não demorou nada para que toda a sua confusão se transformasse em lágrimas pesadas que ela tentava conter, escondendo o rosto nas mãos para chorar e fazer barulho, mas foi questão de minutos até que visse encostado no batente da porta olhando pra ela.

- , eu não sei o que fazer - ela finalmente admitiu pra ele o que estava sentindo e ele já desconfiava.
- , são três horas da manhã, você não tem que tomar uma decisão agora e nem tão cedo - respondeu com a voz arrastada, estava com sono, mas tinha acordado quando ela se levantou. - Você não precisa fazer isso agora.
- Isso tá me matando, eu quero ficar, mas eu quero ir com você também, eu...
- Você tem o seu tempo e eu o meu, já disse pra você não ficar preocupada, leva o tempo que você precisar, eu vou te apoiar no que você decidir, você sabe disso.
- Mas e se eu não ir? E se eu for, mas não me adaptar? E se eu voltar? E se a gente não der certo depois disso?
- Então eu vou aceitar e respeitar a sua decisão - tentou soar convincente, mas pensar que poderia acabar ali até tirou um pouco do seu sono. - Mas não vou desistir assim tão fácil, você disse pra eu não desistir de você, lembra? Eu faço o que for preciso, , mas não quero, de jeito nenhum, que você fique ansiosa por isso, tá? Você vai ter o meu apoio sempre.

entrou no banheiro e a abraçou. parecia inconsolável, ele não sabia mais o que falar e nem o que fazer, ele já tinha tomado a sua decisão, mas não podia decidir por ela também. Sabia que ela tinha mil motivos pra ficar, e outros mil pra ir, mas ele não podia forçar, não seria status e dinheiro que ele conquistaria que a convenceriam, ela não era assim e nunca foi. estava angustiado por pensar que poderia acabar, mas ele precisava ser forte e aparentar estar no controle de tudo quando na verdade ele só queria poder continuar com ela a todo custo, mas o que poderia fazer? Nada, a não ser esperar.

- Vamos voltar pra cama? Você precisa descansar, vai trabalhar mais tarde.
- Não consigo dormir.
- Então eu vou ficar acordado com você.

concordou e eles voltaram pra cama. Se deitaram juntos e ela se aninhou nele, sentindo a mesma sensação de sempre, de que estava no seu lugar favorito. Sentia a mão dele passando pelos seus cabelos soltos, acariciando devagar, e ela fechou os olhos para poder sentir, talvez fosse as últimas vezes que acontecia e ela queria ir poder aproveitar aquele momento antes que acabasse.
percebeu que adormeceu quando a respiração dela ficou mais pesada. Estava cansado, ainda tinha que terminar de fazer as malas e encaixotar tudo o que pretendia levar, então não demorou para que voltasse a dormir também, sonhando com sua nova casa e seu novo time, estava lá e tudo parecia muito bem.

⚽🖤📱

Organizar uma festa de despedida em meio à mudança não foi fácil, mas conseguiu dar esse presente para dois dias antes de ele ir embora, tendo muita ajuda de Gabriela. Conseguiu reunir o time e a família dele para uma última despedida, o que resultou em um emocionante adeus, ou até breve, como o próprio disse, garantindo que tinha sim o desejo de voltar, talvez até encerrar a carreira por ali, mas de qualquer forma um dia ele gostaria de voltar.
E então, dois dias depois, era a hora de ir embora. Junior e Tobias ainda compareceram uma última vez para ajudar a colocar toda a bagagem no carro e também podiam ter uma despedida digna, já que não sabiam quando veriam o amigo novamente. Foi difícil para dizer adeus para o lugar que se tornou a sua casa, mas ele tentou não se prolongar, ou choraria ali mesmo. Ainda tinha muita coisa sua ali que enviaria em caixas, então de certa forma ainda era sua casa e ele sentia como se estivesse indo passar um tempo fora, mas logo voltaria. Sabia que não era bem assim, mas esse pensamento tornava tudo mais fácil.

No aeroporto, primeiro se despediu dos seus irmãos, abraçando os dois de uma vez. Cida não era de chorar, mas não se conteve, ainda enxergava como o seu irmãozinho menor que ela sempre cuidou por vontade própria, saber que ele iria para tão longe era difícil porque ela não estaria lá para cuidar dele, mas sabia que já era a hora de deixar ir e crescer. Rony, por sua vez, estava orgulhoso e empolgado, sabia que tinha tudo para fazer sucesso, e mesmo que não desse certo, ele iria apoiar o seu irmão sempre, ele era sua grande inspiração na vida e sempre seria. Acompanhar o sucesso dele de longe seria difícil, mas não impossível, e ele sempre iria torcer.
Depois dos irmãos, se despediu do seu cunhado e da sua mãe. Ele sempre dizia que tudo o que fazia era para ela, para dar uma vida digna. Tirou sua família da periferia de Porto Alegre, de uma casa pequena e simples para poder dar a melhor vida que ela poderia ter, e ainda iria atrás de mais, tudo para ela, que não desistiu dele nem mesmo quando tudo colaborou para isso. Não deixava faltar nos treinos, ia sempre ver as suas partidas, aceitou que ele fosse morar em outro estado para jogar mesmo sendo tão novo, e por essas coisas que sempre ia buscar o melhor para sua família, achando que ainda era pouco para retribuir tudo o que fizeram para ele.
Ficou ainda mais difícil na hora de se despedir das suas sobrinhas. Maya era mais velha, já entendia o trabalho de e que ele precisava ir, mas Belinda ainda não. Ele sabia que não estava sendo o tio/padrinho mais presente na vida delas, mas fazia o que podia para acompanhar o crescimento delas, afinal, seu momento preferido era quando ganhava um título e comemorava com elas no campo, elas eram suas torcedoras número um. Foi difícil mudar para São Paulo e deixar elas em Porto Alegre, mas ir para mais longe ainda, do outro lado do mundo, doía ainda mais. Ele sabia que precisava fazer isso por elas, e talvez um dia pudesse ver elas todos os dias, mas enquanto isso, tinha que ser forte.
E por fim restou que observou tudo sem contestar, mas que agora entendia que era hora de partir. A família de respeitou o espaço deles e deu um momento para que pudessem se despedir, foi que se atirou nos braços dele, mas que a beijou. Ela ainda não tinha se decidido, mas estava dando todo o apoio que ele precisava e isso era fundamental para que pudesse se mudar. Ele tinha certeza que logo ela estaria com ele em Londres, mas enquanto isso não acontecia, a beijou como se fosse a última vez, não sabia quando ia acontecer de novo. Queria sentir o gosto dela mais uma vez para não se esquecer, e não importava o quanto tinha se preparado nos últimos quinze dias, dizer adeus ainda estava sendo mais difícil do que ele sabia que seria.

- Obrigado pelos últimos dois anos, nada disso seria possível sem você - ele disse após o beijo, mas continuaram abraçados.
- Você merece conquistar o mundo, , todos precisam saber quem você é - sorriu enquanto acariciava o rosto dele com o polegar. - Vai, a gente tá aqui torcendo por você, eu tô torcendo.
- Eu vou esperar por você - admitiu e sentiu um nó se formando na garganta.
- Vai, - ela pediu novamente, não queria prometer nada para ele.

Eles se abraçaram novamente e a beijou mais uma vez antes finalmente ir para o seu portão de embarque. Olhou para trás mais uma vez e acenou para eles, mas então seguiu em passos rápidos para o seu destino, para o seu sonho. Não tinha a mínima ideia de como seria dali pra frente, mas ele precisava se arriscar para ver o que iria acontecer, e todas aquelas pessoas que ficaram para trás eram o maior motivo de tudo o que ele estava fazendo.
Não tinha mais volta, e por mais que a caminhada fosse longa e difícil, ele estava ansioso, mal podia esperar para saber quais eram as surpresas que a vida tinha reservada para ele.

Mas ele esperava que fossem grandes.

Epílogo

Londres, Inglaterra.

1 mês depois

Eu finalmente podia descansar em casa, o último mês foi uma loucura insana, eu estava longe de me acostumar com a minha nova vida, mas depois de uma semana fora devido ao calendário de jogos, eu finalmente podia dormir no conforto da minha nova casa.
Bem, isso até eu começar a me mexer na cama. Ouvia um barulho distante, mas ainda estava meio dormindo, demorou para eu entender que era o meu celular tocando debaixo do travesseiro. Com dificuldade, procurei por ele e vi que estava ligando. Por ser três horas da manhã, eu imaginei que fosse muito importante, então atendi.

- Oi, amor - falei com a voz arrastada. Estava com tanto sono que mal podia ficar de olhos abertos, mas o fato de não ter respondido me preocupou. - Alô?
- Oi, - disse com voz de choro, só então me dei conta de que ela realmente estava chorando. - Eu te acordei?
- São três horas da manhã aqui, ... - tentei não soar grosseiro, ela parecia não estar bem. - O que aconteceu? Por que você tá chorando?
- , eu não vou conseguir. Eu...

Ela simplesmente não parava de chorar e eu não sabia muito bem o que fazer. Estava com sono, cansado e longe, muito longe dela, mas eu precisava fazer alguma coisa, ouvir ela chorar compulsivamente daquela maneira estava me deixando mal também.

- Amor, eu preciso que você se acalme pra gente poder conversar, está bem?

Instrui ela a respirar fundo e expirar algumas vezes, era um ótimo exercício para a ansiedade e funcionava comigo sempre que eu estava muito nervoso. Aparentemente funcionou com também, pois apesar de continuar com uma voz muito chorosa, ela se acalmou o suficiente para poder falar sem gaguejar.

- Quer me contar o motivo de você estar chorando assim? - acendi o abajur ao lado da cama, já estava começando a perder o sono.
- , eu... - respirou fundo mais uma vez. - Eu não tô pronta ainda... Não dá... Você me entende, não é?
- Entendo - eu sabia sobre o que ela iria falar, mas não o queria de fato. - Eu entendo...
- A minha mãe precisa de mim, eu preciso dela... tudo está tão...
- , você não precisa vir agora, tá tudo bem, não me importo de esperar mais um tempo. Eu sei que está muito difícil sem o seu pai e eu sei que você gosta do seu novo trabalho. É sério, não precisa ser agora.
- Eu preciso ficar, sabe? Não é o momento de ir... talvez seja pra você, mas pra mim não é... a minha vida é aqui e eu sempre me perguntei como seria quando você fosse jogar em outro time, eu sabia que isso ia acontecer, mas nunca tive uma resposta. Na verdade, ainda não tenho... e eu acho que você não precisa passar por isso também.
- Eu não me importo de esperar um pouco, - insisti. Não, ela não podia terminar agora. - Você tem razão, é o meu momento, mas que tipo de parceiro eu seria se desistisse de você justo agora que você mais precisa de mim?
- Não é sobre isso, , mas justamente por você ser tão bom pra mim, sei que não posso fazer isso com você - a voz dela começou a mudar gradativamente, ela ia chorar de novo.
- , por favor...
- Eu sou tão grata por tudo o que você fez por mim! Eu nunca tinha amado alguém do jeito que eu amo você - ela fez uma pausa e respirou fundo. - Mas eu não posso ir além disso, , não agora. Não daria certo, eu não ia conseguir me adaptar e todas as questões que me fazem ficar iam pesar pra que eu voltasse pra casa.
- Mas você pode tentar... a gente pode tentar - eu sentia o nó se formando na minha garganta. Já tinha perdido totalmente o sono, não podia acreditar que estávamos tendo aquela conversa por telefone.
- Eu não quero estragar a sua experiência, você trabalhou muito por isso, .
- Mas eu só consegui porque você me ajudou.
- Agora você já pode fazer sozinho... eu não vou pra Inglaterra, , e eu acho melhor a gente parar por aqui antes que alguém se machuque.

Eu já estava machucado ali mesmo. Não podia ser verdade, por que ela estava fazendo aquilo? Por que estava desistindo da gente? Pra falar a verdade, eu já esperava, mas não cabia a mim julgar. era forte e independente, não precisava e nem queria depender de mim pra alguma coisa.

- Alô? Você tá aí?
- Tô, eu só... não posso acreditar.
- Eu não queria fazer isso, , e menos ainda por telefone, mas eu não consigo mais viver porque eu só consigo pensar nisso o dia todo, por favor, eu preciso que você me entenda.
- Eu entendo... mas é difícil de concordar.
- Por favor, não fica com raiva de mim.
- Não tô com raiva - talvez eu estivesse, mas ainda não tinha certeza. - Você está fazendo o que acha melhor.
- Eu sou muito, muito grata mesmo, por tudo o que a gente passou junto e o tempo que a gente teve, eu tenho certeza que nunca fui tão feliz, eu amo você demais, mas não posso mais continuar.
- Eu também amo você - apertei os olhos quando senti eles marejarem, mas não iria chorar e mostrar pra ela que estava abalado. - E quero que você seja feliz antes de qualquer coisa.
- Me perdoa, ...

caiu no choro novamente e eu deixei que ela chorasse, afinal, eu estava concentrado em fazer exatamente o contrário, mas para ser sincero, eu não estava conseguindo me segurar, por mais que estivesse espremendo os olhos como se ela pudesse me ver.

- Eu... eu preciso voltar a dormir - foi tudo o que eu consegui falar, mas provavelmente passaria o resto da noite acordado. - Fica bem, tá? Se cuida.
- Isso foi uma discussão?
- Não, não, obrigado por ter sido sincera comigo. Agora eu só preciso ter meu próprio tempo pra passar por isso.
- Me desculpa, me desculpa...

Ela estava tão mal que eu não tive coragem de desligar, tentei conforta-la inúmeras vezes dizendo que não era necessário pedir desculpas e que podíamos ser amigos, mas acho que eu estava dizendo aquelas coisas mais para mim mesmo do que para ela, pois eu não conseguia imaginar a na minha vida apenas como uma amiga.

- Você pode ficar comigo na linha até eu dormir? Eu não quero ter que desligar.
- Tudo bem - eu não queria ficar na linha, mas sabia que era a última vez que faríamos aquilo e depois disso eu sentiria falta dela pelo resto da vida.
- Eu vou sentir muito a sua falta...
- Não fica pensando muito nisso, tá? Vai ser mais difícil.
- A gente pode ser amigo mesmo?
- Claro - eu achava que não, mas talvez só estivesse confuso pelo momento.
- Posso te fazer uma pergunta?
- Pode.
- Eu te fiz feliz?
- Fui o cara mais feliz do mundo pelos dois anos que estive com você - falei com sinceridade. - Você me fez muito feliz, , e me trouxe uma paz que eu nunca tinha sentido quando se trata de relacionamento. Sou grato por isso, foi muita sorte a minha ter me apaixonado por você.
- Eu sinto que tô deixando ir a chance que a vida me deu...
- Se for pra ser, então um dia vai ser de novo. E se não for, então terá sido minha melhor lembrança.
- A minha também...

E depois disso não disse mais nada, estava sonolenta assim como eu, então ficamos em um silêncio eterno. Vinte minutos depois ela adormeceu e eu hesitei em desligar, mas o fiz conforme ela pediu.
Ao encerrar a chamada, senti como se estivesse fechando um livro ou encerrando um capítulo da história da minha vida. Eu não podia resumir a minha vida à , mas podia dividir entre antes, durante e depois. O depois havia chegado e eu não sabia o que fazer, eu não estava trabalhando com essa hipótese.
Mas para ser bem sincero, eu sabia que isso iria acontecer, eu estava sentindo. Ela parecia confusa o tempo todo, mesmo quando eu ainda estava no Brasil, estava dando todos os sinais de que não iria dar certo, mas que eu fechei meus olhos porque ainda tinha o mínimo de esperanças de que ela viesse. Eu não estava bravo, eu até podia entender o lado dela, mas não poderia negar o quanto aquilo me magoou, e saber que não éramos mais um casal era um tanto desesperador. Eu estava sozinho em um país desconhecido, ainda estava deslocado no time, não falava inglês muito bem e tinha que me virar com meu espanhol enferrujado para conseguir me comunicar, ainda estava difícil me acostumar com aquele frio desumano, eu ainda não conseguia me alimentar como antes, e minha maior esperança era saber que ela estava a caminho e tudo ficaria mais fácil pra mim. Bem, não foi exatamente assim.
Não, não iria simplesmente bater na porta da minha casa e dizer que iria ficar, eu não ia ver ela na arquibancada torcendo por mim, não iria chegar em casa e encontrar ela me esperando, não acordaria com ela ao meu lado da cama e nem iria dormir trazendo ela para junto de mim, também não iria mais rir das piadas horríveis dela, nem ouviria ela me chamando de metido em tom de brincadeira. Por um instante me senti perdido, o que eu ia fazer dali em diante? Entrei em um breve momento de desespero, aquilo não poderia ser verdade, a mulher da minha vida não poderia estar simplesmente desistindo de mim assim, eu me recusei a acreditar que realmente tinha acabado. Eu prometi pra ela que não ia desistir, então por que ela estava desistindo de mim e de tudo que a gente ia viver junto?
Eu não conseguia encontrar nenhuma resposta, e não sabia se queria tal coisa. Eu estava tentando entender, afinal, ela tinha todos os motivos plausíveis para ficar. finalmente tinha conseguido um emprego estável que lhe dava independência financeira, tinha amigos que a queriam por perto, estava superando a perda repentina do pai dela. Quem era eu no meio disso tudo para ousar interferir? Eu não podia fazer nada a não ser aceitar, exatamente como disse antes, e seguir a minha vida. Sempre tive o ideal de lutar por amor, mas entendi que nem sempre era o melhor a se fazer. Sim, ela poderia ter tudo comigo, eu daria tudo pra ela, mas será que ela aceitaria? É claro que não, era uma mulher forte e independente, ia atrás dos seus sonhos e não deitava para ninguém, não seria eu que mudaria isso nela, e nem queria. Ela merecia conquistar tudo o que desejava, e mesmo que eu não estivesse lá para ver o desfecho, eu precisava entender que ciclos acabam, especialmente os meus.
Eu não queria que fosse só um ciclo, por mim duraria a vida inteira, eu tinha amor o suficiente para fazer durar, mas se eu fosse um ciclo que ela precisava encerrar, então eu iria tentar entender e seguir em frente, eu tinha todo um mundo pra conquistar ainda, não podia deixar a oportunidade escapar por estar com a cabeça longe. seguiria os sonhos dela e eu os meus, era hora de cada um trilhar seu próprio caminho. Foi lindo e incrível enquanto durou, eu sabia que jamais acharia outra como ela, era única, mas agora, mais do que nunca, eu precisava focar em mim e nos meus objetivos.
Então era isso, estava encerrado, fim. Se estava doendo? Com toda a certeza, eu queria chorar e espernear, pegar o primeiro avião para o Brasil e trazer aquela garota à força para ficar comigo, queria implorar de joelhos para ela ficar comigo, queria me arrastar e me humilhar pra ela, mas eu não podia fazer isso. Não, eu precisava ser forte.
De alguma forma, eu sentia que ainda não tinha acabado definitivamente. Não sabia se iria ver ela de novo, mas minha intuição era forte, então enquanto esse dia não chegasse eu ia tentar viver. sempre disse que eu era um campeão, que eu era grande, que o mundo precisava me conhecer, e... bem, estava na hora de fazer acontecer, e o que me confortava era saber que de longe ela torceria por mim.

É, eu tinha certeza disso.
Ela com certeza iria torcer por mim, como a boa torcedora que sempre foi.

⚽🖤📱




FIM


Nota da autora: e acabou... depois de 2 anos, encerro mais uma história, mais um ciclo. Tô triste pelo final, mas feliz por ter conseguido cumprir o que planejei (quem me conhece sabe o quanto sou ruim em seguir planos).
Eu sei que esse não era o final que todo mundo queria, mas este sempre foi o final que eu planejei, desde o dia 1, quando a história nem tinha um nome e eu já sabia que terminaria assim. Algumas vezes eu mudei de ideia, fiz outros finais, mas este era o que se encaixava melhor, afinal, as coisas se encaminharam pra isso, eu guiei a história para que terminasse assim.

Nem consigo explicar o quanto eu mudei ao longo desses 2 anos escrevendo essa história! O tanto de coisa que vivi, os aprendizados, os meus gostos mudaram, mudei de trabalho 3 vezes, fiz cursos, eu me apaixonei e tive o coração partido... cara, a gente muda demaaaaais! Mas isso não é ruim, pois graças às mudanças que eu passei, também pude fazer o mesmo com os personagens, pois a evolução deles desde o cap 1 até esse epílogo é muito clara, exatamente como eu queria. Tenho muito orgulho de cada personagem, mas especialmente tenho orgulho dos principais, me apeguei de um jeito que eu não achei que ia acontecer... e é por isso que a história deles não pode parar por aqui, vamos conhecer um pouco mais sobre eles, conhecer um outro lado em ONG2 que logo logo estará aqui também.

Quero muuuuuito agradecer a cada um que leu, votou, comentou, riu, sofreu e chorou comigo. Não sei quantas vezes pensei em deixar pra lá e abandonar, mas um simples comentário fazia o meu dia e eu sou grata demais por tudo, muito obrigada! E também o meu mais sincero agradecimento à Carol, minha scripter, que abraçou a ideia e me ajudou demaaaais ao longo desses dois anos, surtando comigo e dando dicas quando necessário kkkk. Carol, muito obrigada pela paciência e disposição, mesmo com a correria da vida <3

Mais uma vez, muito muito muito obrigada a todos. Felizmente não é um adeus, pois em janeiro eu já vou começar a postar a parte 2. Por isso, quem quiser acompanhar, entra lá no meu grupo de leitoras no face onde eu sempre aviso sobre atualizações, ou vez ou outra dou spoilers ahahaha de qualquer forma, vou avisar por lá quando a parte 2 estiver disponível, então muito obrigada e até lá <3

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Nota permanente:
Desde já, peço desculpas se em algum momento você possa ter se sentindo ofendido (a) com algo relacionado ao seu time caso ele tenha sido mencionado em algum momento da narração. Apesar de a fic se passar no Corinthians, eu tento ser o mais imparcial possível para não ofender ninguém, afinal, o que importa mesmo é o nosso amor pelo futebol. Lembre-se: rivais sim, inimigos nunca. ☺

Spin-off de ONG

07. Essa eu fiz pra esquecer
18. Espero Minha Vez
Fico com você

Outras Fanfics:
Ad Perpetuam Memoriam
Ad Perpetuam Memoriam - They Don’t Know About Us
06. Moving Along
03. Holiday
Love & Blood (Harry Potter)

Nota da Scripter: Eu não acredito que a história acabou! ( acabou?!) Foi um prazer scriptar acho que a primeira fanfic com futebol nacional e com uma autora incrível ainda. Que o Lucas e a Anna se encontrem e sejam muito felizes, juntos ou separados
Essa fanfic é de total responsabilidade da autora, apenas faço o script. Qualquer erro, somente no e-mail


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