Fanfic finalizada

Capítulo Único

Sábados eram os dias em que o trabalho finalmente dava uma folga e, se eles fossem ensolarados, os adotava como sinônimos de colocar o apartamento em ordem..., mas só depois do meio-dia. Preguiçosa, a mulher despertou contrariada com a claridade invadindo a janela por inteiro. Ainda com as pálpebras meio grudadas, achou ouvir indícios de uma discussão. Coçando os olhos, mechas de cabelo bagunçadas se soltando do rabo que fizera antes de dormir e com o uniforme do ensino médio como pijama, a consciência dela ordenou que fosse checar o que estava acontecendo.
— Porra, Drew, cadê a educação que os nossos pais te deram? — A adolescente berrava para o irmão gêmeo, exaltada ao pressionar o braço recém-arranhado pelo portão do condomínio.
— Que pais? — Ele debochou, arrastando uma cadeira para se sentar à mesa onde faziam as refeições — Que educação?
— Se está incomodado, deveria falar essas coisas ao papai! — Juntou-se a Drew, ignorando a marca avermelhada contra a pele.
— Como se ele parasse em casa para poder nos escutar. — O amargor se fez presente na garganta, fazendo Dalia querer suspirar.
Apesar de serem irmãos gêmeos, ela havia saído do ventre da mãe antes.
— Custava segurar o portão? Além dele ser pesado, é uma desgraça toda vez que o deixam bater, parece que vai quebrar e levar o prédio junto.
— Vai ficar reclamando até quando, Dalia? — Indagou entediado, pondo-se a abrir as sacolas do mercado que acabaram de subir.
Algumas coisas da cozinha tinham acabado e o papel higiênico estava no último rolo do fardo fazendo uma visita ao mercado ser muito necessária. Drew e Dalia acharam que seria justo assumir a tarefa, visto que já passaria o dia limpando tudo. Na volta, no entanto, lotado de sacolas e uma caixa com produtos de limpeza, o adolescente não pensou muito e só seguiu na frente, empurrando o portão e o deixando para bater. Ele só não imaginava que a irmã tentaria se enfiar na fresta e entrar rapidamente ao invés de esperar fechar para abrir outra vez, acarretando em um raspão superficial em um dos braços. Não havia sido intencional, ele já tinha pedido desculpa, mas a mais velha parecia não querer parar de reclamar no ouvido dele desde que pisaram no elevador.
— Bom dia. — A fala rouca seguida por um bocejo atraiu a atenção dos dois para a entrada da cozinha — O que estão fazendo?
— Fizemos o mercado! — Dalia se empolgou para contar — Assim temos opções para hoje à noite, além de pedir delivery. — Tinha o dedo em riste para os alimentos que o irmão ia alinhando na mesa.
— O que temos hoje? — franziu o cenho com os olhos ainda semicerrados. Ela ainda não tinha conseguido acordar de verdade, por isso a decepção estampada no rosto de Drew ao ouvir o questionamento dela passou despercebido.
— Noite de jogos, ! — Dalia relembrou — Você esqueceu?
Alguns segundos mais foram necessários para processar o que estava acontecendo. Realmente, era final de semana. Sábado, mais exatamente. Dia que ela determinou ser bom para que eles se reunissem para conversar, fofocar sobre a semana enquanto jogavam os clássicos jogos de tabuleiro pelo menos uma vez por mês.
— Esqueci nada! — A mais velha balançou as mãos pelo ar para que não pensassem isso — Só que vocês compraram bastante coisa no mercado, achei que mais alguém poderia estar vindo hoje... — explicou observando as bandejas de carne enfileiradas — Essa casa está quase um açougue.
Pela primeira vez desde que apareceu, Drew reagiu, soltando um risinho pelo exagero da esposa do pai. Sem muito mais o que fazer ali, ele se levantou para retornar ao quarto, cômodo onde passava a maior parte do dia, senão ele todo.
— Hoje à noite, não se esqueça! — Deu um tapinha no ombro da mulher antes de cruzar o batente para o corredor.
— Pode deixar! — sorriu, sentindo o corpo esquentar, alternando o olhar para Dalia.
Há quinze anos, quando disse sim para o pedido de , aceitou não só um homem para a vida toda, como também a adição de duas crianças para a família, em troca quis preservar o sobrenome da família: . Dalia e Drew eram frutos de um casamento anterior do marido que não deu certo, tendo a guarda compartilhada com a ex, que se alternava de duas em duas semanas. Todos se tratavam bem e dessa forma ficaria enquanto houvesse respeito.
se lembrava da primeira vez que propôs a noite de jogos, numa tentativa de se aproximar e aumentar os laços com as crianças. Até os dez anos, os irmãos achavam uma maravilha ter alguém para sempre brincar. Aos quinze, começaram a torcer o nariz. Hoje, aos dezessete, quase dezoito, Dalia e Drew caçoavam um pouco, mas era nítido que o programa havia se tornado uma tradição. Drew era do estilo reservado, apenas se posicionava nas discussões em casos necessários e preferia ficar sozinho. Então, saber que ele estava cobrando para que ela não faltasse com a palavra e fizesse a noite acontecer era uma demonstração indireta de consideração que tinha com os esforços que fazia.
— Vocês estavam brigando antes de eu chegar?
— Nada que precise se preocupar. Só me arranhei sem necessidade por causa desse idiota.
— Não chame seu irmão de idiota. — Por mais que fosse costume entre adolescentes aquele tipo de tratamento, ela sentia que tinha obrigação de tentar estabelecer o máximo de paz na casa.
— Por que não, se ele é um idiota? — Ambas trocaram sorrisos — Acha que o papai volta para hoje?
O questionamento pegou a mais velha desprevenida. No fundo, Drew e elas sabiam a resposta. Entretanto, o fato de os adolescentes estarem sempre por perto perguntando pelo pai quebrava um pouco o coração de , pois era um indício de que criavam expectativas.
— Acredito que não, Dalia. — A mulher forçou um sorriso, dando-lhe as costas para alcançar uma caneca no armário — Deve ir direto para a casa do seu tio. Ele já faz isso em dias de semana mesmo. — Deu de ombros, tentando fazer indiferença quando a vontade real era de suspirar forte.
— É sério, vocês brigaram?
— Não. — foi sincera ao se virar para encarar Dalia outra vez — Acho que seu pai só se cansou da monotonia. Quinze anos fazendo as mesmas coisas todos os dias não deve ser mais tão interessante. — Outro sorriso amarelo — Logo voltamos com a rotina normal, não se preocupem! A casa do seu tio tem sido o point dos homens. Fofocar e beber, quem recusaria? — Juntou-se à filha na mesa.
— Então, você não liga? — A franziu o cenho, dando uma mordida no pão.
Claro que ela ligava.
— Não disse isso, mas preciso levar de boa para não causar brigas, né? Sinto por mim e principalmente por vocês. Drew e você não passam duas semanas no apartamento só para ficar olhando a minha cara.
— Drew não costuma mais me contar sobre o que está sentindo, mas pela pequena conexão que temos de irmãos, eu sei que ele fica chateado e frustrado. Eu fico! — Exasperou — Mas a gente adora você, ok, ?
não escondeu o sorriso largo pela demonstração de carinho tão cedo.
— Vocês não se preocupem que eu vou dar um toque nele. — Piscou.



Durante a faxina no próprio armário, se deparou com uma caixa preta enterrada debaixo de todas as pilhas de roupa desmoronando. Sem pressa para concluir a limpeza e praticamente sozinha em casa, visto que Drew só seria visto no horário do jantar e Dalia estava com as amigas no shopping, se permitiu sentar no chão por alguns instantes para revirar o conteúdo encontrado.
Ela lembrava bem o que tinha ali.
De tempos em tempos, pegava-se mexendo nas coisas para relembrar do passado.
A primeira coisa que ficava exposta aos olhos quando levantava a tampa eram os anuários da escola dela, desde a metade do fundamental até o fim do ensino médio. encarava as fotos dos colegas e as próprias em um misto de humor e horror. Ela não tinha ângulos muito bons e nem habilidade para ficar posando e sorrindo sem espontaneidade aos fotógrafos e a boca começava a tremer só de lembrar que tinha que manter o sorriso até que conseguissem todas as fotos.
Céus, ainda bem que acabou.
Depois das fotos de turma, havia alguns envelopes rosas com cartinhas trocadas com as amigas. Letras cheias de garranchos e frufrus, canetas coloridas, canetas gel com cheirinho, adesivos preciosos arrancados das primeiras páginas dos cadernos e ainda declarações sem sentindo nenhum. se pegou sorrindo boba. Entre a pilha de papéis que tinha entre os dedos, uma ponta amarela ganhou a atenção total.
O coração que estava abalado pelas memórias acelerou instantânea e involuntariamente. Um amor que ela se arrependia até hoje de não ter vivido. Ainda bem que o marido não lia mentes, porque nos momentos mais inoportunos, ela insistia em voltar para o “E se...?”
O envelope amarelo foi separado do resto da montanha de recordações que voltaria para a caixa.



Os relógios marcavam dez para a meia-noite e as risadas não cessariam tão cedo. cogitou em pedir para que se controlassem melhor, pois os vizinhos poderiam abrir uma reclamação formal ao síndico do prédio, porém no mesmo instante Drew tirou no dado um número que o fez voltar para o início do tabuleiro outra vez. O trio ria em sintonia, tendo os rostos manchados de vermelho pelo frio da noite e o esforço das bochechas pelas crises.
— Vai, é você de novo, Drew! — Dalia entregava o dado com uma mão ao mesmo tempo em que a outra passava rente aos olhos para limpar as lágrimas.
Apesar dos pais não estarem presentes, as noites de jogos nunca decepcionavam. Os irmãos se sentiam muito confortáveis na presença da madrasta que nem aparentava ter o dobro da idade deles. Ela os ouvia e se importava o suficiente para sempre estar pegando os detalhes no ar para ajudá-los. sabia transbordar a quantidade de emoções em uma quantidade suficiente para cobrir a ausência dos progenitores naturalmente.
O som de chaves e da maçaneta sendo empurrada fez todos se calarem. havia chegado em casa mais cedo naquele dia.
— Pai! Vamos jogar? — Dalia prontamente convidou ao ver o homem tirar o casado e jogá-lo no sofá, balançando os braços, animada, do lado oposto do apartamento.
Surpresa, assistiu o marido se aproximar à medida que dobrava as mangas da camisa preta.
— Chegou cedo. — Estranhou, recebendo um beijo de ponta cabeça de — Aconteceu alguma coisa? — Insistiu, acompanhando-o contornar a mesa por trás para dar um carinho aos filhos.
— Não aconteceu nada. Só não queria ficar muito no meu irmão hoje. — Apoiou as mãos no encosto das cadeiras dos gêmeos — Como vai a minha família? O que estão fazendo?
Menos expressivo e sem olhar nos olhos do pai, Drew repetiu a pergunta da irmã feita instante atrás:
— Vai jogar?
recuou um passo, soltando os encostos.
— Ah, não. Vocês estão bem assim. Vi que estão se divertindo bastante. Podem continuar, acho que vou me deitar. — Começou a se afastar — Estou cansado.
As mulheres trocaram um breve olhar decepcionado pela falta de tato do mais velho ao repararem em como Drew havia ficado.
— Err... — limpou a garganta — Alguém quer mais refri?



Quando você ignora problemas que não podem ser ignorados, eles passam por cima de você feito um trator. O velho formigar que começava pela pele, cravava nos músculos, roía os ossos e só parecia perecer quando a alma se despedaçava em mil pedacinhos. conhecia aquela sensação. A realidade sempre batia quando ela se permitia pensar um pouco mais. Perceber que a tentativa de enganar os outros e principalmente a si de que tudo estava sempre bem não funcionava mais era como um golpe certeiro de dor. Se ela tivesse dito tudo que tinha entalado na garganta antes, teria poupado alguns anos de frustração na vida?
A ausência de no casamento era um grãozinho que incomodava e sem perceber, tornou-se uma bola de canhão: insustentável e perigosa. Ela queria poupar uma briga, mas percebeu que ele não merecia toda essa consideração no instante em que a mandou se foder por tentar lhe abrir os olhos.

— Deveria passar mais tempo em casa. — Rolou na cama até ficar cara a cara com o marido que chegava da casa do irmão. espiou o visor do celular. Quase quatro da manhã, como ele conseguia ficar de pé para trabalhar no dia seguinte com apenas três horas de sono?
— Ficou acordada até agora me esperando? — Removia os sapatos sociais, deixando-os espalhados juntamente com as meias.
— Seus filhos sentem a sua falta. — Insistiu no assunto.
— Daria e Drew têm dezessete anos já, ! Estão na idade de querer sair e namorar. Pais são o de menos.
— Não os seus filhos.
— Está querendo dizer que conhece mais dos meus filhos do que eu?
Aquele tom... Aquela expressão... viu que a conversa estava ganhando um caminho que evitou a todo custo.
— Não. Não estava insinuando nada disso. Mas se tivesse dito, também não estaria mentindo. Eu vi essas crianças crescerem! Elas não têm o meu sangue, mas fazem parte da minha rotina há quinze anos!
— Não foi isso o que você entendeu... — se apressou a justificar, contudo a mulher não deixou.
— Dane-se. Eu não quero falar sobre a minha relação com os seus filhos. É sobre você, ! Você é o problema! — Ela precisou sair da cama para disparar tudo que estava engasgado.
— Como que alguma coisa pode ser culpa minha, se eu nem fiz nada?
— Exatamente. Você não está fazendo nada! — Apontou acusatoriamente com o dedo em riste — Dalia e Drew podem estar na idade de anseio por liberdade, mas nada dispensa a presença de um pai, se eles têm um. Podem até dizer para que tomemos distância, mas você tem que estar a par do que acontece com eles.
Os tons das vozes começaram a subir.
— Já está tarde. Podemos conversar sobre isso amanhã?
Aquilo foi o estopim para ela. A fala foi a prova que precisava para cair na realidade que não estava levando a discussão a sério.
— Para conversar com os seus filhos já está tarde, mas para ficar com o seu irmão fazendo seja lá o que, não é? — O agudo que algumas palavras estavam atingindo era a demonstração pura de que ela estava furiosa. não conseguia reconhecer o homem com quem casou e tal sensação não era de hoje — Se fosse para ser assim, era melhor que Dalia e Drew nem tivessem um pai. Pouparia decepções. — Aquela foi a cartada final dela
— Cala a boca! Cala a boca, ! — Ele perdeu a compostura.

Então, percebeu que, atualmente, não havia nenhuma área da vida que a proporcionava satisfação ou orgulho, ou os dois juntos. De repente, em um apartamento que dividia com outras três pessoas, sentiu-se mais solitária do que nunca. Pensou em buscar compreensão com os pais, mas não teria o que precisava deles. Depois que um filho se casa, nenhum problema no mundo incomoda o suficiente, era assim que os progenitores pensavam. Rapidamente, buscou por um contato no celular.
— Oi, amiga... — iniciou tímida ao perceber que a chamada havia sido atendida — Você está ocupada?



Trancada em uma das divisórias do banheiro feminino do shopping, chorava copiosamente de exaustão mental. Ela não aguentava mais sustentar um falso sorriso no trabalho todos os dias, sabendo que em casa tudo desmoronava. Depois da discussão com , houve ainda outro escândalo pela carta do amor dos tempos de escola dela que ele encontrou em uma das gavetas do móvel anexo à cabeceira da cama. Se antes o marido não voltava para casa, agora tinha motivos para isso. O quarto havia se tornado somente dela. preferia dormir no sofá da sala. Não bastasse o clima esquisito, ela precisava aturar mais ladainha no emprego. Era como sair de uma furada para adentrar de cabeça em outra.
Ela não tinha para onde fugir.
Ouvir o chefe bosteando toda semana que eles não deveriam contratar mais mulheres, porque todas eram desequilibradas ela aturava, pois precisava do salário e faria questão de provar o quão desequilibrada poderia ser. Ainda assim, assistir de camarote os colegas bajuladores sendo promovidos por simplesmente inflarem o ego dos superiores era desesperador. A empresa não se sustentava com papo furado. Se não eram eles os motivos de choro dela, era o filho do chefe, sem formação, escalado para lhe dar ordens e supervisionar todas as tarefas com nenhum fundamento e propriedade. O que ela tinha feito com a própria vida?
Naquele dia, antes de ir para casa, recebeu uma mensagem de Dalia pedindo para que se lembrasse de comprar sabonete líquido, uma vez que trabalhava no shopping próximo à loja de departamento com os preços mais em conta.
Sem muita paciência, a mulher nunca fora tão objetiva em uma compra. Ela entrou mirando a sessão de higiene e depois foi direto para os caixas. Nenhum chocolate para deixar na bolsa. Nenhuma promoção que ela não precisava. Na fila que tinha algumas pessoas na frente, não ousava levantar muito o rosto, temerosa de que vissem seu estado deplorável. O inchaço do rosto pela crise de choro de mais cedo ainda podia ser sentido.
— Próximo!
Era a vez dela.
— Boa tarde. — O cumprimento saiu quase falho pela tentativa dela de omitir o desânimo da voz.
— Boa tarde, senhora. Gostaria de levar a nossa promoção de três pares de meia por dois?
Os olhos dela que estavam baixos analisaram a pilha de meias brancas para onde apontava, mesmo sabendo que não iria levar mais nada, e depois subiram para o rosto do atendente.
O tempo ao redor deles pareceu congelar por uma fração de segundo. Sem conseguir controlar o ímpeto, engoliu seco, sentindo os orbes quererem saltar para fora da órbita.
— Não... Obrigada, moço. — A resposta saiu robótica.
O homem atrás do caixa alternava os olhares entre passar um produto no leitor e encará-la. tinha quase certeza de que o reconhecimento foi instantâneo e mútuo, mas nenhum dos dois deu o primeiro passo. No fim, ela só indicou que seria no débito e agradeceu outra vez.
Mesmo sabendo que não estaria em casa, ela não queria voltar. Buscou por uma mesa vaga na praça de alimentação e ali ficaria pelas próximas horas, acompanhando o tempo passar. Qual era a chance de o antigo amor estar trabalhando no mesmo shopping e ainda conseguir atendê-la? se encontrava pensativa, balançada da mesma maneira que ficou no dia que encontrou a carta. parecia não ter mudado em nada, ao menos na aparência. Pegou-se rindo sozinha de como ele era encrenqueiro e amava desafiar os professores. Se por um lado ele tinha um apreço por atormentar os funcionários, a ela foi sempre tudo para agradar.
— Então, era você mesmo... em carne e osso.
A mulher parou o que estava fazendo no celular para encarar o recém-chegado.
— Ainda se lembra de mim? — Arqueou as sobrancelhas
— Com certeza. Posso? — O homem indicou a cadeira do outro lado da mesa e ela se limitou a acenar com a cabeça — E você, lembra-se de mim?
— Não mudou nada, . Quer me ensinar qual é o truque para não envelhecer?
— Só se me passar a sua receita. Está envelhecendo feito vinho... — não demorou a notar a aliança que carregava no dedo — Oh, você é casada. Desculpe, não quero que ache que sou algum tipo de comedor de casadas.
Apesar da baixaria, foi o primeiro momento do dia que sentiu os pulmões fazerem cócegas para rir. Aquilo foi tão inesperado que precisou jogar a cabeça para trás para gargalhar.
— Não mudou nada mesmo, . Como tem estado? — Quis saber assim que se recompôs.
— Nada demais. Correndo atrás do tempo perdido. Não fui para a faculdade. Não tenho muitos contatos, mas estou juntando meu dinheiro para fazer alguns cursos. Como pode ver, estou sendo caixa e repositor de estoque na loja.
— Legal! Espero que conquiste tudo que desejou. Você merece! — Desejou do fundo do coração, rindo — É engraçado...
— O que é engraçado? — pareceu atento e um pouco ansioso.
— Nós... As coincidências. Lembrei-me de você há poucos dias. — O sorriso singelo simplesmente não queria sumir do rosto.
— É mesmo? Foi bom ou ruim? — Inclinou-se mais sobre a mesa, curioso.
— Foi bom. — vacilou no olhar por instantes, brincando com o dedo nervosamente — Encontrei uma carta sua e senti como se estivesse de volta aos tempos de adolescente.
— Oh, a carta... — foi a vez dos olhos dele perderem o foco.
— Você se lembra das coisas que escreveu?
— Lembro.
— Lembra?
— Você merece um amor infinito. Um amor que nasça e morra todos os dias junto com o sol, que se renove e traga o melhor de si sempre.
Os versos tão familiares sendo recitados com tamanha calmaria causaram um estardalhaço no interior dela. Se as roupas não estivessem no caminho, ele poderia ter notado que ela se arrepiou da cabeça aos pés.
— Eu... Eu... Eu... Nem sei o que dizer. Você lembra de verdade!
— Confesso que não lembrava muito bem, mas então olho para o seu rosto e são sempre esses pensamentos que me brotam. Merece um amor infinito, , e acho que o encontrou. — Indicou discretamente com o queixo para o círculo dourado em volta do dedo anelar.
— Para você ver como são as coisas...
— Bom... — começou a se levantar — Meus minutos de descanso estão acabando. Foi bom conversar com você, ! Sabe onde me encontrar. — Piscou, afastando-se em seguida.



Não era sobre ela querer ficar com . Não era mais sobre cogitar se ela teria um final feliz com . Era sobre ela não estar mais à vontade ao lado de . Não era nada sobre homens. Era sobre ela e apenas ela. Sobre saber respeitar o próprio tempo e saber reconhecer, enquanto ainda houvesse tempo, de que nem todas as decisões que tomamos são as corretas e que o status do que é certo também é transitório.
O choque pelo reencontro com o antigo amor havia reacendido uma parte que estava apagada dentro de si. A vontade de se redescobrir todos os dias, de viver e perceber coisas novas. Poeticamente, era a vontade de enxergar o mundo colorido outra vez. Com o apoio das amigas da faculdade, passaria uma temporada fora de casa até conseguir preparar os trâmites para o divórcio.
Preocupar-se com Dalia e Drew não era uma responsabilidade afetiva que precisava carregar. repetia o alerta da amiga na cabeça. Aquele papel não era dela. Os gêmeos tinham um pai e uma mãe saudáveis, a vida chega com alguns baques às vezes, e eles sobreviveriam. Independentemente do que estivesse disposta a fazer com o relacionamento desgastado, os filhos dele não poderiam ser chaves para prendê-la em algo que perdera sentido com o passar dos anos. Casamento é um compromisso sério. Ela não estava exigindo surpresas todos os dias e nem reclamando da rotina
Por um longo tempo, pelo orgulho do tamanho do mundo que sustentava, acreditou que desistir seria automaticamente aceitar a derrota. Ela estava errada. Há vezes que saber quando desistir e aceitar desistir são o maior sinônimo de força que pode ser encontrado. Desistir e largar essa situação eram um ato de coragem e...
Era a hora dela ir.




FIM



Nota da autora: Oieeeee! Se você está lendo isso, obrigada por chegar até aqui <3 Foi uma loucura ter aceitado pegar a música em um prazo mais curto, mas espero ter feito jus à letra. Um agradecimento muito especial e indispensável para a menina Rapha do grupo de Ficstapes Perdidos que aceitou e se voluntariou para dar uma luz no plot. Se a faixa foi escrita na altura das expectativas dela, isso já é outra coisa kkkk De qualquer forma, fica registrado os meus agradecimentos <3 Espero que estejam se cuidando e continuem sempre assim.
Obrigada por darem uma chance à fic!

Beijos,
Ale
Nota da beta: Oi! O Disqus está um pouco instável ultimamente e, às vezes, a caixinha de comentários pode não aparecer. Então, caso você queira deixar a autora feliz com um comentário, é só clicar AQUI.





Outras Fanfics:
05. Mobile
09. I Don’t Have to Try
10. Fuego (restrita)
Universo de Harry Potter
Felicitatem Momentaneum (principais interativos)
Finally Champion (Olívio Wood é o principal)
Finally the Refreshments (sequência de Finally Champion — restrita)

Qualquer erro nessa fanfic ou reclamações, somente no e-mail.


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