Finalizada em 20/04/2021

Capítulo 1

Naquele dia, os cidadãos de Sonteperl foram dormir mais tranquilos, seguros de que, com a notícia da captura de um dos líderes do grupo de rebeldes saqueadores, o comércio voltaria a prosperar. Enquanto os pontos de luz na cidade começavam a se apagar indicando o final de mais um dia, o clima de euforia no castelo do rei não dava indícios de terminar tão cedo. O salão amplo, de pé direito imensurável, esculpido pelos mais talentosos construtores, abrigava dezenas de soldados, ministros e membros da elite que comemoravam a vitória do dia com barris e mais barris de cerveja.
Do segundo andar, no alto da passarela que cortava o salão inundado de comemorações, Irene, a curandeira real, acompanhada de , a aprendiz, acompanhava o desenrolar da festa.
- Olha só para eles... – a mais nova olhou com desgosto para os homens que erguiam seus copos e mais despejavam o líquido para fora do que acertavam o do outro para brindar – Parecem tão... Bárbaros!
Irene esboçou um pequeno sorriso antes de se voltar para a aprendiz:
- Não diga essas coisas... – repreendeu dura – Tão próxima dos oficiais. Pode causar problemas.
- Vou tentar, Irene. Farei o possív...
- Hey, vocês! – um dos guardas do castelo apareceu na ponta da passarela – Sua presença é requisitada nas masmorras. – mas nenhuma das mulheres esboçou qualquer indício de que se moveriam – Agora!
Com os olhos faiscando, Irene tomou a frente, sendo seguida por . Elas certamente não recebiam o tratamento que mereciam por curar e literalmente salvar a bunda de tantos marmanjos crescidos todos os dias. Um dia, as mulheres fariam revolução e ocupariam os principais postos das civilizações. Só assim, Irene achava que o mundo evoluiria. Se os homens mal eram capazes de fazer uma coisa bem feita, imagine assumir duas obrigações ao mesmo tempo.
As escadas para os calabouços subterrâneos eram imundas, parecia que ninguém dava uma varrida ali há anos. Enojada e cautelosa, puxava a barra do vestido esvoaçante para cima à medida que dava um passo em cada degrau. Se não limpavam aqueles lados, não seria ela que ofereceria o vestido como vassoura para arrastar parte da sujeira. Enquanto as mulheres ainda desciam a escada em caracol, sendo guiadas pelas chamas das tochas presas nas paredes de pedra, gritos podiam ser ouvidos.
- Seu bastardo! – o primeiro-ministro cuspia de ódio, desferindo chutes no homem estirado ao chão, que nem apresentava mais resistência pela falta de forças – Conte-nos onde está seu irmão!
Com os pensamentos turvos, os olhos quase se fechando e a boca preenchida pelo gosto metálico do sangue, Giovanni riu, sentindo o corpo reclamar pelo mínimo de esforço. Até parece que ele iria dedurar o irmão. Aqueles velhos eram caducos. No entanto, a reação interpretada como um deboche acarretou em punição. Um chute. Mais um. Depois outro. A violência só parou, ou foi pausada, pela chegada das duas mulheres requisitadas.
- Primeiro ministro. – a voz de Irene ecoou, fazendo a autoridade, acompanhado de outros três guardas, se virar.
- Finalmente... – o homem desdenhoso, sem nenhuma cordialidade – Tratem esse lixo! Nada demais. Apenas o suficiente para que não morra antes de abrir a boca. – olhava para o rebelde com repulsa – Vamos!
Certos de que o prisioneiro não oferecia mais perigo, todos deixaram a cela, ficando apenas as mulheres e o líder dos rebeldes. A curandeira oficial mirou o ferido com irritação. Não por causa dele, mas pela situação. Aqueles abutres sempre faziam bem o que entendiam e no final, sobrava para a e ela fazerem o trabalho sujo e limpar a bagunça. Detestável.
- Por onde começamos, Irene? – a aprendiz indagou, sem saber onde colocar as mãos. Para toda a parte que ela olhava, encontrava hematomas. Quando movia os dedos para uma região para tratar, os olhos automaticamente capturavam outro membro aparentemente mais danificado e urgente. A mulher mais velha arregaçou as mangas compridas do vestido antes de dar um suspiro. Aquele seria um longo e árduo trabalho.

Capítulo 2

não tinha pais, ou pelo menos não tinha lembranças deles, não sabia como veio ao mundo e nem porque era sozinha antes de Irene aparecer. Ainda assim, tinha desejos de ser grande e poder desbravar o mundo, assim como a tutora. Recém-chegada, não sendo uma cidadã legítima de Sonteperl, a mulher não abrigava conhecimentos dos fatos e histórias da cidade, como o abominável grupo de rebeldes saqueadores, os Renegados.
- Mas por que um único homem causa tanto alarde? Ele é tão perigoso assim? – questionava no encalço de Irene, que fazia o registro do estoque restante das ervas.
- São rebeldes, . Vão contra os ideais da Coroa. Isso basta para levantarem a bandeira vermelha. – riscou um punhado de anotações no pergaminho.
- Isso eu entendi, mas quais foram os crimes deles? Tudo nesse castelo parece estar voltado para o mais recente prisioneiro desde que chegou. Os guardas não piscam, os soldados estão à espreita e seu nome não sai da boca do alto escalão!
Vendo que não sossegaria tão cedo, a mais velha se viu obrigada a deixar a tarefa de lado para encará-la:
- Os irmãos s abraçam uma fama de assassinos por vários reinos. Ninguém sabe onde se escondem, mas dizem que há outras centenas de semelhantes a eles abrigados em algum lugar das matas. Acredita-se que os rebeldes estão formando tropas, juntando forças, para iniciar uma guerra. Além de ameaça à Coroa, são flagrados muitas vezes saqueando os pequenos comércios da cidade.
- Inacreditável. – tinha a boca e os olhos arregalados.
- O que é inacreditável?
- Tudo isso que você contou. Quer dizer que aquele homem que tratamos todos os dias, que está sendo torturado e mal se aguenta em pé é um grande matador?
- Dizem que o irmão é pior. Até hoje, ninguém conseguiu colocar as mãos em . A cabeça dele vale muito.
- Uau.
- Não deveria ficar deslumbrada com essas coisas. Não devemos tomar partido nesses assuntos. Cumprimos nossas tarefas e recebemos. Só isso, entendeu, ?
- Sim, senhora.
Quando a mais velha deixou os olhos recaírem nas próprias anotações, tornou a falar:
- Precisarei me ausentar do castelo por alguns dias. Faz tempo que não faço uma viagem para repor o meu estoque. Com o tanto que estão usando de munição contra o prisioneiro todos os dias, a quantidade de ervas têm diminuído drasticamente. – balançava a cabeça em repúdio. A cura não era uma mágica que se fazia em um piscar de olhos, mas os soldados pareciam tratar como uma. Medicamentos e ervas custavam caro, eram trabalhosas de coletar para serem desperdiçadas por capricho.
- Posso ir junto?
- Claro que não. Não dessa vez, . Deve permanecer no castelo, à disposição do rei. Esses trogloditas se matariam sozinhos sem a nossa ajuda.
Com os ombros caídos em desânimo, concordou.



não se intimidou por estar sem a tutora para tratar os enfermos. Pela pouca e não menos traumática experiência que ela havia adquirido em Sonteperl, existia pouca coisa que poderia amedrontá-la e a lista apenas diminuía conforme ia se deparando com mais virilhas cortadas e costas rasgadas. O que ela poderia fazer? Tinha estômago forte.
Quando alcançou a entrada das masmorras, no mesmo horário de sempre, os dois guardas postos um em cada lado da porta que guardava o local pareciam a esperar. Os cumprimentos foram mudos. Diante da porta de madeira, carregando o usual saco de medicamentos, teve uma bandeja de refeição empurrada contra si.
- Toma. Entregue ao prisioneiro. – um dos guardas disse bruto, com ela limitando-se a rolar os olhos. Aquela comida não tinha aparência de comestível, ou com qualquer indício de nutrientes. Parecia uma ração de nada. Se fosse por ela, não valeria à pena viver assim.
Com as mãos ocupadas, usou a bandeja para empurrar as grades da cela para abrir caminho e entrar. Giovanni tinha um olhar desfocado e vago nos fenos pisoteados do chão. Graças aos cuidados dela e da tutora, ele parecia bem melhor.
- Parece bem melhor hoje, . – iniciou um monólogo – Pediram para que eu trouxesse sua refeição. Prefere comer antes ou depois que eu te tratar?
Nenhuma resposta.
bufou.
A refeição foi posta no piso, diante do homem. Não havia nenhum móvel a mais naquela cela, além de dois bancos maciços que poderiam servir de cama quando o calabouço não estivesse lotado. Enquanto buscava os itens que precisaria na bolsinha, a bandeja de metal foi arrastada pelo chão.
Giovanni estava comendo.
se virou curiosa. Talvez ela devesse esperar ele terminar para trocar os curativos. Ainda de pé, ao pé da entrada da cela, ela não conseguiu se segurar:
- Você tem um irmão, não tem? Como ele é? – quis saber, depois de tudo que Irene lhe confidenciou – Olha... Você não tem muita escapatória aqui. A única saída, sem ser pela porta da frente, seria as grades no alto. Mesmo que consiga se livrar delas, vai parar direto no campo de treinamento do exército. Seria sair de um inferno para ir a outro. Logo os oficiais estarão de volta para mais uma sessão de tortura. Então, o maior entretenimento que posso oferecer é uma conversa. Por que não aproveita seus últimos momentos, Giovanni?
O caçula não olhava para . A mente conseguia absorver todas as informações que ela estava despejando. A curandeira estava do lado de Sonteperl, não dava para distinguir até que ponto ela estava sendo idiota por revelar as posições dos guardas e até onde aquilo poderia ser um jogo deles. De qualquer forma, ele guardaria as informações para um momento oportuno. Por enquanto, o deveria economizar energia.
- Não é muito pretensioso dizer que você é o meu melhor entretenimento aqui dentro? – aquela foi a primeira vez que o ouviu, sem ser em gemidos de dor – Você não cala a boca, mulher. Isso me soa como um castigo do inferno.
Apesar do ataque verbal, Giovanni não era importante o suficiente para que pudesse se sentir pessoalmente ofendida.
- Como você foi capturado?
Não foi respondida.
- Cadê o seu irmão, Giovanni?
Estariam eles a usando para tirar informações do paradeiro de ?
- Não sei. Deveria torcer para nunca encontrá-lo. Não seria poupada.
Depois disso, a conversa não se desenvolveu mais. Pela má educação, se aproveitou da posição para pressionar os ferimentos do homem com mais força do que a necessária no tratamento, causando ardência desnecessária. Afinal, garotos malvados mereciam ser punidos.

Capítulo 3

Havia se passado dois dias e Irene não dera sinal de vida. estava cansada da mesmice dos dias. Ela deveria ter se oferecido para ir no lugar da tutora em busca das especiarias. Enquanto conferia os estragos das agressões feitas no dia anterior em Giovanni, deixava suspiros frustrados escaparem. Se continuassem naquele ciclo, as células dele não conseguiriam se regenerar.
- Estão solicitando a mudança de cela do prisioneiro.
A aparição repentina de um guarda no lado de fora das grades fez o coração dela quase subir a boca. Com a mão no peito, se ergueu, ainda acelerada, então franziu o cenho.
- Mudança de cela?
Em todos aqueles dias, ninguém se importou muito com as condições do , por que aquela decisão agora?
- ?
O sussurro do prisioneiro ativou o alerta da curandeira que se virou para encarar o recém-chegado de armadura. De fato, aquele era o uniforme dos guardas de Sonteperl. havia se infiltrado. No primeiro movimento brusco, teve uma espada colocada em riste contra o pescoço. prendeu a respiração, deixando as mãos amostras. Ambos deram passos cheios de cautela, em círculo, até que os lados estivessem trocados e conseguisse chegar ao lado do irmão.
- Giovanni? Vamos sair daqui. – enquanto uma mão estava com a espada apontada para a mulher, a outra foi para puxar o irmão – Consegue andar? – o mais novo assentiu.
- Como chegou aqui?
Imóvel, de soslaio, encontrou um pedaço perdido de madeira do lado de fora da cela. Os movimentos foram cirúrgicos. Com parcialmente distraído em cuidar do caçula, a curandeira se aproveitou para golpeá-lo no braço com toda a força que tinha.
O mais velho urrou, largando a arma em um lapso, deixando o irmão desamparado.
- Vagabunda!
Quando estava prestes a dar outra paulada, se adiantou para devolver um golpe no cotovelo dela. O pedaço de madeira foi deixado no ar e antes que pudesse atingir a mulher na cabeça, o mais velho novamente agiu, puxando-a para perto a ponto dos narizes quase se tocarem e as respirações mesclarem.
- Você não vai querer lutar comigo de verdade. – os olhos de demônio e o tom ameaçador a fizeram engolir seco. Sem perceber, nem respirava mais.
- Deixe-a, . Temos que sair daqui.
- Pelo contrário, Giovanni. Ela vai ser a chave para escaparmos daqui. Consegui um traje desses para você. – apontou para a armadura – Vai nos camuflar, mas não por muito tempo.
O único som que partia da cela eram os dos gemidos de Giovanni pelos esforços em colocar o uniforme pesado. Enquanto se vestia, estava encostada contra a parede, vigiada de perto por . Aquela lâmina que brilhava mesmo naquele ambiente hostil, a garganta dela secou, certamente cortava muito mais que maçãs.
- Não vão conseguir ir muito longe. – afirmou seca, ainda com o olhar preso na espada contra si – As feridas dele não foram tratadas até o fim graças à chegada repentina. Elas vão se abrir com tanto esforço.
Com a mão livre, torceu o braço dela, desacreditado na praga que estavam recebendo.
- E você é o quê? Vidente? – apertou mais o antebraço, arrancando uma careta da ao sentir a própria pele raspar na espada. Se ela não se cuidasse mais com o que falava, poderia ver o fim mais próximo do que esperava.
- Ela é uma das curandeiras. – dessa vez foi Giovanni que respondeu por ela.
- Vai ter mais utilidade que imaginava. Está com sorte hoje, curandeira.
- Vai se danar!
não sabia como, mas conseguira se livrar até mesmo dos dois oficiais que faziam a guarda da porta antes da escadaria. Giovanni mal conseguia se colocar na postura. Ela se perguntava quanto tempo mais os soldados se dariam conta de que ali estavam os fugitivos.
- Qualquer gracinha ou sinal subliminar, eu faço essa espada atravessar o seu peito sem dó, está entendendo, curandeira?
Com aquelas palavras carinhosas, como ela poderia ser contra?
- Meu nome é .
- E daí?
- Só achei que ficaria mais equilibrado, visto que eu sei o de vocês, .
- Vamos!
soltou o ar pela boca e estremeceu ao sentir a ponta da faca ser apontada contra sua coluna. Para evitar maiores suspeitas, havia recolhido a própria espada e apelado para uma adaga. Lado a lado, os irmãos andavam quase que grudados em que vinha uns centímetros à frente. Um movimento errado e ela seria furada, simples assim.



A mente dela maquinava entre os prós e contras de tentar uma fuga. Eles estavam com dois cavalos roubados, Giovanni mais à frente e ela com e a maldita adaga ainda apontada contra as costas. Se decidisse pular, iria atrás para puni-la, ou interpretaria como um favor divino e seguiria com o irmão? Giovanni não estava em seu melhor estado após um inevitável embate nos portões de Sonteperl para seguirem viagem.
Em meio aos devaneios, a pressão do objeto pontiagudo embaralhou tudo nela, exigindo atenção. De coluna ereta, avaliou que a melhor chance seria na próxima parada deles para buscar água. Aguardaria. No entanto, a espera dela não demorou. A parada que tanto desejava não veio da forma que esperava. Debilitado e sem mais forças, Giovanni que liderava o caminho acabou despencando do cavalo, inconsciente. soltou um grito de horror pelo baque que ouviram. Sem ligar para ela, desceu do animal, indo ao socorro do irmão.
Aquele era o momento perfeito.
- Giovanni! – corria desesperado.
desceu também. Mirando os lados, questionou-se se era pertinente entrar na mata. Ela provavelmente se perderia, mas ainda era menos exposto que seguir a trilha por onde vieram. À cavalo, eles a abateriam fácil.
- Giovanni, acorda! – os chamados atraíram sua atenção – Irmão! Eu estou aqui. Já estamos chegando. Aguente firme!
A mulher se odiou por um instante.
Por céus, ela era uma idiota.
A chance perfeita estava sendo desperdiçada. Seguindo os mesmos passos de , correu para Giovanni. Bruta, trombou com o irmão mais velho, colocando-se na frente.
- Sai do caminho! – ordenou, levantando a barra do vestido, sem ligar em estar expondo as pernas. As mãos ágeis tateavam as camadas das vestes procurando algo. Um pacote reserva – Eu disse que ele não aguentaria tanto esforço! – vociferou, jogando-se de joelhos, lamentando ter que gastar os últimos recursos tão cedo – Deixar um acabado desse assumir um cavalo, sozinho! – riu – Você é uma piada! Vai acabar fazendo o que os soldados de Sonteperl tanto queriam: matar Giovanni.
- Eu ainda tenho uma faça e uma espada aqui. Controle sua boca, curandeira de merda! – alterou-se, sem esconder as feições de preocupação com o caçula.
parou tudo que fazia para encarar com deboche.
- Me mate e seu irmão morre aqui mesmo. Vocês não tem chance sem mim.
O homem contraiu o maxilar. Satisfeita em ver que ele não falaria mais nada, fez os preparos. Checou todos os machucados e aplicou a pasta de sementes sobre pontos estratégicos do corpo e principalmente rosto. De pé, assistia agir. As mãos ágeis e habilidosas pareciam dançar no ar com tamanha delicadeza e precisão para tratar o irmão. De fato, dons impressionantes. Entretanto, o que voltava a preocupa-lo é que mesmo com tantos movimentos e tentativas, Giovanni não se mexia.
- Por que ele não está despertando? – não resistiu em perguntar, assombrado de medo.
- Porque isso não é magia. Ele não vai despertar... Por enquanto. O corpo não aguenta, está exausto demais. Precisa de um tônico e descanso de verdade. Quanto tempo ainda resta de viagem? – pôs-se de pé, de frente para o homem.
- Um pouco. – fugiu do olhar da mulher. Pelo andar das coisas, demorariam mais do que o normal.
A solução para seguirem em viagem foi deixar um dos cavalos para , enquanto os irmãos ficariam no outro, com o mais velho segurando o desacordado. Ele tinha que evitar outra queda de Giovanni e ao mesmo tempo conduzir dois cavalos para que a curandeira não escapasse. definitivamente alcançara o inferno. Ao chegarem ao vilarejo escondido, foram recepcionados pelos amigos preocupados. Giovanni foi levado rapidamente para enfermaria, restando outros residentes, e ele.
As crianças que ali estudavam ao ar livre correram em curiosidade com a recém-chegada.
- Olhem, olhem! – uma delas puxou a barra do vestido de – Uma princesa!
- Uau!
- Nossa!
- Princesa? – repetiu horrorizada.
- Sim, tia! Você se veste igual a elas.
- Eu não sou uma princesa! E nem a sua tia! – a mulher puxou a barra do vestido com grosseria para escapar do contato dos menores.
Homens sangrando, à beira da morte, não a assustavam, mas aquelas crianças hiperativas...
- Quem é ela, ? Por que a trouxeram? – a mulher que lecionava e teve a aula interrompida se irritou, pondo-se ao lado do amigo.
- É uma princesa, sim! – uma das crianças caiu em gargalhada estridente – Igual aos meus livros, vem ver!
A curandeira do castelo foi arrastada. teve o ímpeto de impedir que a afastassem de seu campo de visão, mas logo parou. não poderia fugir de lá sem causar alardes. Ele estava no comando da situação agora.
- Foi conveniente, Blair. Pelo momento e porque ela pode ser útil. – a mulher ao lado cerrou os olhos, descrente – Giovanni disse que ela é curandeira. Ficará a serviço do vilarejo e acompanhará o quadro dele.
- Tem certeza?
- Eu mesmo vi. Ela sabe o que faz.
- Espero que sim. Tomara que não tenha colocado o segredo do vilarejo em apuros, .
O homem suspirou. Antes que pudesse abrir a boca, ele a mataria. Afastou-se de Blair para ir atrás da recém-chegada. Talvez não fosse tão bom deixá-la sozinha com as crianças de lá. Não era seguro para os menores.
- Crianças, o tio precisa conversar com a nova amiga de vocês. – puxou pelo braço sem muita delicadeza – Vocês brincam outro dia.
- Ah, não! - as mais novas o encararam pidonas.
- Sejam boazinhas! – direcionou-se às crianças e depois se voltou para a mulher, rude – Vamos!
Enquanto entravam cada vez mais no vilarejo, não conseguia esconder a surpresa. Aquela cidade no meio do nada, ela nunca encontraria. Era um esconderijo perfeito.
- O que é esse lugar? – indagou boquiaberta – Como vocês montaram tudo isso no meio do nada? – encarava as ruas por todos os lados.
- Todos são cidadãos que tiveram seus negócios tomados pela Coroa ou foram despejados por não conseguirem pagar os impostos. Esse lugar é um refúgio para todos aqueles que não podem ter um lugar nos grandes reinos.
- Como é possível? – embasbacada, encarava as construções. Era tudo muito simples e humilde, mas passava uma sensação boa de conforto – E o que assassinos como você e seu irmão fazem aqui?
riu.
Ela não sabia o que dizia.
- Do mesmo jeito que os soldados do rei são pagos para se livrarem de qualquer oposição, nós aqui seguimos a mesma política com os inimigos, Sonteperl no caso. Mas por que só a Coroa não é chamada de assassina?
- Nunca disse que ela não era.
Não tomar partido. Fazer o trabalho e receber. Essas eram os maiores princípios que deveria seguir se quisesse sobreviver. estaria do lado que lhe fosse conveniente e nada mais.
- Está entregue.
- Espera, o quê? – olhou para frente, dando de cara como uma prisão pequena.
- Prendam-na. – ordenou, dando um empurrão em pelas costas, fazendo-a tropeçar para frente – Em nenhuma hipótese ela deve escapar, estão entendidos?
A curandeira estava pouco se importando com as ordens do líder. Ocupada em achar falhas no sistema, os olhos corriam de um canto para o outro tentando guarda o máximo de detalhes na cabeça.

Capítulo 4

Pão e água. Esse era o cardápio dela para todos os dias, em todas as refeições. Aqueles caras eram uns filhos da mãe. Nem mesmo Giovanni havia recebido um tratamento tão ruim nos calabouços de Sonteperl. Tudo bem que as gororobas do castelo não eram muito atrativas, mas ele sempre teve um leque maior de opções. passava os dias na cela, com os movimentos limitados pela corda que a prendia nos pulsos e estava amarrada na grade da cela. O único sol que via era o que atravessava a quase imperceptível janela no teto. Ela precisava armar uma fuga, ou definharia ali.
- Ora, ora... – os irmãos apareceram do outro lado da cela – Parece que os nossos papéis se inverteram, . – Giovanni provocou.
Ela não o respondeu, fazendo cara feia. O mais novo ainda mancava. Estava na cara que ele não havia melhorado, não estava em condições de caçoar.
- O que foi? O gato comeu a sua língua? Como é que você falava mesmo? Sem perspectiva de fuga, tratamento ruim... Deveria conversar comigo. Será o único entretenimento que terá.
A mulher mordeu o próprio lábio, sem se conter:
- Se enxerga, perneta dos infernos! Deveria se tratar antes de falar alguma coisa.
- Já chega, vocês! – tomou as rédeas – Você vai tratar a perna dele, .
- Não vou.
- Não tem escolhas.
- Tenho, sim. E a que estou fazendo é não trata-lo.
- Então, vai escolher morrer? – destrancou a cela, chegando mais próximo dela, com as sobrancelhas arqueadas.
- Pode ser! – respondeu enfezada – Morrer e ficar apodrecendo nessa cela me parece a mesma coisa.
O mais velho riu.
- Não está raciocinando bem, Curandeira Real. – deu um peteleco na testa dela que pareceu fazer o cérebro todo tremer – É uma ordem, vai fazer por bem, ou por mal.
- Eu não ligo. – pirraçou, ainda com uma careta pela testa que ardia. Aquele homem tinha dedos poderosos – Vocês são uns nojentos. Sempre fiz o que pude e dei o melhor tratamento ao perneta. Agora, olha só o que recebo em troca? Deus realmente tem seus favoritos e eu já vi que não sou eu.
- Você nunca me ajudou quando eles me agrediam, mentirosa! – Giovanni se exaltou.
- Não era a minha função! Seu irmão que deveria estar lá. Não eu!
Aquilo tocou em um ponto sensível do mais velho. não estava toda errada. Uma operação mal calculada resultou na captura de Giovanni. Se ele estava assim, era porque uma parcela de culpa cabia a .
- Giovanni, saia daqui.
- , não tem que ouvir as palavras dessa mundana...
- Saia! Eu preciso dar umas palavrinhas a sós com essa mulher.
Naquele momento, se obrigou a puxar um ar. Ele ia bater nela. Não importasse o quão corajosa fosse, a ideia de ser espancada, sem chances de defesa a fazia estremecer. Entretanto, era tarde para suplicar por piedade e até estúpido esperar consideração de um assassino reconhecido. Viu arregaçar as mangas e fechou os olhos esperando pelo pior.



Um acordo.
nunca imaginou que estaria negociando com assassinos saqueadores, mas sem planos melhores e pela sobrevivência, ela faria. Em troca de tratar os líderes dos rebeldes, ela receberia liberdade para transitar pelo vilarejo, ainda que vigiada de perto.
Daquele lugar, o que não faltava era tratamento hostil. Há pouco tempo, ela ainda era uma representante de Sonteperl, os residentes não a viam com bons olhos. , que a vigiava de perto, acabou se tornando muito mais segurança dela do que do povoado. Jogavam-lhe restos de comida, pedras, como se fosse a pior escória. Não é como se ela fizesse questão de estar lá também. O maldito que a prendia ali era Giovanni, o infeliz que não conseguia sarar nunca. Por outro lado, não deixava de se perguntar o que fariam consigo assim que o caçula melhorasse. A urgência e utilidade de seus conhecimentos terminaria. Seria aquele o caminho para a morte?
- Vai ficar com as crianças a partir de hoje. – comentou, sentindo a cabeça doer – Seria muito problemático ter que ficar todo dia entrando no meio de brigas suas com os civis.
- Poderiam me libertar para poupar estresses... – sugeriu, falsamente interessada em ajudar.
- Boa tentativa, . – deu um sorriso debochado – Vai ficar com as crianças.
A curandeira bufou. Aquele não foi exatamente o combinado entre eles.
A escolinha improvisada ao ar livre era liderada por Blair, que ensinava os menores a escrever e ler todos os dias. Crianças bem educadas jamais cairiam em golpes do Estado, elas cresceriam e aprenderiam a lutar por um mundo onde pudessem fazer as próprias escolhas. Olhando por cima, podia ver que as crianças pintavam alguma coisa. Enquanto Blair arrastava para soltar alguns desaforos, uma das crianças se aproximou para puxar a curandeira:
- Você sabe pintar, princesa?
Aquelas crianças... quase rolou os olhos.
- Acho que sim.
- Venha pintar conosco!
Talvez, os melhores aliados que ela pudesse conseguir estivessem ali. Agachada ao lado da mesa de madeira da garotinha que a puxou, começou a ajudar com os rabiscos, logo outra menor se aproximou elogiando os cabelos da “princesa”.
- Vocês que trazem uma prisioneira e sobra para eu segurar as pontas? – Blair olhava feio para o amigo – O que eu faço com ela aqui?
- Não precisa fazer nada. é inofensiva...
- Não tinha sido ela que causou esse roxo no seu braço?
instintivamente olhou para a região do braço coberta pela camisa. A paulada que a curandeira havia desferido quando ainda estavam no calabouço de Sonteperl ainda vivia. se lembrava dela todas as manhãs quando se encarava no espelho. Suspirou.
- não causará problemas, Blair.
- , é? – caçoou do quão íntimo eles pareciam ter ficado – Ela oferece perigo para as crianças. Imagine o que os pais achariam de uma Sonteperl infiltrada na escola.
olhou para , no outro lado do campo, rindo com os menores, levando Blair a fazer o mesmo.
- Eu estarei por perto sempre. No povoado, ela causa muita comoção. Sabe que até pedras atiraram nela.
- Malditas pedras mal miradas, então! – cruzou os braços, arrancando risada de – Essa desgraçada tem uma sorte dos infernos! Não deveria estar protegendo tanto uma mulher que defende os interesses da Coroa e está do mesmo lado que os homens que torturaram seu irmão.
- Ela não é minha protegida.
- Você tem um bom coração, amigo. Ainda assim, é homem. Deixa-se levar por um rabo de saia fácil. É mais forte que vocês.
- é só outra coitada no meio do caminho. Nossos problemas são com o rei e é nele que focarei meus esforços. Uma curandeira novata não precisa carregar todo o sangue que aquela nação derramou. Nós nos vingaremos e não vai ser com ela. Mandei alguns homens para Sonteperl e ninguém parece preocupado com o sumiço dela. Pobre coitada!
- De coitada não tem nada. – encarou o assunto com suspeita – Vai ver, ela ainda vai descer o pau pelas suas costas e eu vou dizer “Eu avisei”.
- Pode ser. Tanto faz. – deu os ombros – Mas permanecerá aqui nos momentos que não estiver na prisão.
- Tanto faz. – Blair retrucou seca.



Estar do outro lado era surpreendente. Todos os dias, acompanhava, muda, às crianças na escola, aprendendo a escrever e sobre a história dos reinos. A rotina de cada um de lá estava quase que decorada. Em breve, ela poderia agir e os planos deveriam acontecer antes que Giovanni estivesse totalmente melhorado, ou ela poderia descartada e morta. A necessidade do caçula era o único motivo que impediam de colocá-la na fogueira, imaginava.
Enquanto o momento propício não chegava, se obrigava a ouvir Sonteperl sendo pintado como um grande vilão a ser evitado por todos dali. Achar graça era inevitável. Tudo na vida dependia de pontos de vista e como havia aprendido desde pequena com Irene: elas não deveriam tomar parte das lutas. Elas estavam sozinhas no mundo e não existiam boas pessoas que tomariam suas dores.
Mais tarde, quando o sol começava a se por, concluiu que era o momento de testar o que sabia fazer de melhor. Após ter escutado uma conversa sussurrada dos homens de fazendo pressão para que se livrassem dela logo, a curandeira compreendeu que não poderia esperar mais. Com a confiança que tinha das crianças, preparou um chá especial e deu um jeito de convencê-las a presentear a professora Blair, como se fosse um mimo diretamente e somente delas.
- Tem certeza que podemos ficar com toda a glória, ? – um garotinho de cabelos cacheados que ela não se importou de guardar o nome insistiu.
- Jamais! Levem o chá para ela, depressa! Depois de um dia de trabalho, Blair vai ficar muito feliz e orgulhosa por terem se lembrado dela!
Eufóricos, os mais novos assentiram, disparando a correr em seguida para entregar o pote cheio à professora. Enquanto a bebida especial não fazia efeito, a curandeira checava os arredores. Nenhum sinal de . O homem deveria dando um dos usuais sumiços de todos os dias. O coração começava a ficar agitado. Ela não era a melhor acostumada com planos de ação.
Dando alguns minutos para o efeito da poção, se aproximou de Blair, sorrateira. Essa, sonolenta, liberou todos os estudantes, sentindo um cansaço bater de súbito. Antes que pudesse ir de encontro com o chão, a curandeira a alcançou e a deitou, certificando-se a todo instante de que estavam fora da vista de todos. Ela era uma curandeira, não bruxa. Mesmo sentindo que não era a pessoa favorita daquela professora, havia dado apenas uma poção do sono. Dentro de algumas horas, a outra despertaria de um sono, confusa, e ficaria só nisso.
Totalmente inofensivo.
Deixado Blair para trás, começou a se mover, de fininho, até os limites do vilarejo. Ela não era idiota para sair pela porta da frente, aqueles lados estavam sendo mais guardados que qualquer outro canto pelos homens de confiança de . Caminhando pelas bordas do terreno, a mulher ia se afastando mais e mais de onde ficava a escola, começando a desbravar áreas que não haviam sido apresentadas. Com o coração acelerando, as expectativas dela iam baixando à medida que descobria que não havia muito para onde fugir. As terras eram irregulares. Ela jamais conseguiria transitar por elas. Por mais que tivesse uma boa resistência, não aguentaria escalar a mata e ainda poderia acabar escorregando sem nenhuma chance de socorro.
- Se eu fosse você, não gostaria de ainda estar aqui quando Blair despertar.
A voz que estava se tornando usual no dia a dia fez o ar se esvair todo dos pulmões dela. , ainda de costas para o homem, tremeu involuntariamente. Ela havia sido muito ingênua por acreditar que dominara o inimigo com tanta facilidade nas terras dele.
- Você estava me observando esse tempo todo e mesmo assim deixou andando feito uma barata tonta? – afrontou, virando-se para encará-lo de frente, apesar de nunca ter sentido o corpo tão paralisado e entorpecido de medo.
estava usando a tradicional armadura para combates. Carregava consigo, a espada de estimação e uma corda nas mãos.
- Não estava te vigiando com tanto afinco, se quer saber. – foi verdadeiro – Mas devo dizer que não estou surpreso pela tentativa de fuga. Foi só piscarmos um olho e dar um voto de confiança que você veio com a apunhalada. Nunca será um de nós.
- Blair não está morta. – ela não soube o por que da necessidade de se justificar.
- Eu sei que não.
- Em minha defesa... – apressou-se e o cérebro parou – Espera, o quê? – a afirmação inesperada dele saber da situação da professora fez a mente dela se perder na discussão toda que havia montado. Ele havia fugido do roteiro. Em um universo idealizado, eles batiam boca até ela conseguir uma brecha para sair correndo, mas aquele não estava sendo o caso.
- Vamos dar um passeio, querida? – deu um sorriso ladino, girando a corda que tinha em uma das mãos.


Os homens bem educados que conhecia em Sonteperl jamais permitiriam que uma mulher andasse atrás deles, sendo arrastada por uma corda em volta dos pulsos. Homens de verdade, abririam passagem e a ajudariam a escalar o penhasco, mas não .
Um escorregão dela.
Mais outro.
As vestes e sapatos que trajava não haviam sido feitos para uma escalada. Os pensamentos dela sobre ser impossível adentrar aquelas matas densas estavam erradas e a maior prova disso era o castigo que estava sofrendo com o mais velho.
- Anda! – o homem que liderava apenas apressou, puxando a corda – Mais rápido.
Era como se fosse uma mula.
Em muito pouco tempo, ela estava arfando de exaustão, imunda e com um vestido que não poderia ter outro destino senão o lixo.
- Para onde está me levando?
Naquela altura, a curandeira nem pensava no que poderia vir a acontecer. Se fosse do desejo divino, ela seria levada.
- Viemos procurar algumas plantas medicinais. – finalmente começava a dar sinais de que eles fariam uma pausa – Você vai me ajudar com todos os conhecimentos que tem.
- Uma varinha boa não é o suficiente, se o feiticeiro que a usa é um asno.
- Como é que é? – girou para encará-la, soltando a espada na terra de qualquer jeito.
- Estou dizendo que pode ter as melhores plantas do reino, mas não vai adiantar se não souber manipulá-las.
- Eu entendi essa parte. – o líder dos rebeldes rolou os olhos – Não entendi por que isso foi dito a mim.
riu, usando os pulsos amarrados para se debater.
- Por tudo que eu vi de medicina do vilarejo, que foi nada, achei que fosse óbvio. Vocês não tem ninguém com a minha função para evitar perdas em batalhas. Panos molhados e água quente não vão segurar vocês para sempre. Giovanni é um desgraçado sortudo, sabia?
Infelizmente, conhecia as fraquezas do seu exército e estava cercada de razão. Os Renegados não tinham margens para erros. Qualquer deslize em campo era um caminho fatal, sem voltas.
- Por que ajudou Giovanni naquele dia, depois da queda do cavalo? – a rondou, andando em círculos, fazendo-a se sentir em um tribunal de acerto de contas.
- Porque se não fosse eu, tampouco seria você.
- Isso é óbvio. – constatou – Mas tem uma coisa que tem me intrigado nos últimos dias. – continuava a contorná-la. que tinha os olhos focados em um ponto perdido no chão de terra coberto por folhas secas finalmente levantou a cabeça para olhá-lo – Por que não fugiu quando deveria?
- Eu não sei. – o olhar desviou para a espada jogada a poucos metros.
Quais seriam as chances dela de erguer a espada contra um assassino cruel e treinado?
- Resposta recusada. Por que, ? – pressionou. A resposta que saísse dali seria decisiva para o que viria a acontecer no resto daquele passeio.
- Fiz o que acredito que fui destinada a fazer nessa vida. Não é sobre salvar um . É sobre salvar vidas. – os olhos se encontraram – Essa é a minha função nessa vida e tudo o que aprendi e sei. Essa é a minha motivação e meu orgulho. Não tenho família com quem devo me preocupar e nem para se preocupar comigo.
Os olhos sérios de se demoraram nela. A intensidade daquele contato era tão forte que se viu obrigada a se remexer de incômodo. Como o cenário não estava pendendo para seu lado, decidiu que um último desabafo sincero soava como uma ideia confortável para prepara-la para seja lá o que tivesse reservado à ela.
Colher plantas medicinais.
Ela não era idiota.
Vira aquela ladainha ser contada no castelo várias vezes e, em todas elas, quem ia jamais voltava.
- Tem motivos muito nobres para quem está do lado de grupo de matadores.
quis debochar. Ele se referia à Sonteperl, ou aos rebeldes?
- Como já disse uma vez: não tenho lados. Faço o que sou paga para fazer e só.
- Pela atitude louvável, estou te dando a chance de lutar por sua vida, . – afastou os pés, adquirindo uma postura de luta – Terá que brigar comigo e vencer, se quiser sair daqui viva.
só faltou soltar fogos com a reviravolta. De repente, de nenhuma chance que tinha antes de escapar, ela podia dizer que partira para uma. Tão animador... Uma curandeira versus um saqueador rebelde.
O mundo era bem justo.
Ele estava brincando com ela.
Os olhos ágeis passearam correram pelo terreno. Se queria resistência, resistência seria o que ela daria. Sem delicadeza ou dó, levou as mãos para a terra, buscando um punhado de areia, terra e folhas para atirar no rosto do homem. A ação rápida obrigou a recuar dois passos enquanto virava o rosto para se proteger. Ainda agindo, a curandeira aprendiz disparou para alcançar a pequena pedra que tinha nos pés para atirar contra ele. Aquilo não o feriria, uma vez que ele estava de armadura, mas os golpes o faziam entrar em modo de defesa, recuando até onde ela queria que ele estivesse desde o início para abrir a oportunidade de alcançar a espada.
Ela não tinha postura ou técnicas militares, contudo lutar era muito parecido com o processo de curar. Os dois eram cenários urgentes que a obrigavam a dar tudo de si e usar o que estivesse a disposição para alcançar o sucesso.
Com a espada em riste contra o peito de , bem protegido pela camada de metal, ditava a dança que faziam. Ambos andavam em círculos, em silêncio. E agora, o que ela fazia? Ela não sabia usar uma espada. Não era uma assassina. As perguntas não precisaram ser respondidas, visto que usou do lapso de distração e indecisão para agarrar o pulso dela e girá-la até que o peito estivesse colado nas costas da mulher.
Mais uma vez, ela tinha a espada no pescoço.
usou força. Apertou a mão dele, que segurava o cabo da lâmina, com tanto afinco que os dedos chegaram a tremer e ficar esbranquiçados tamanho esforço. Então, para a sua surpresa, o contato se afrouxou. Deu com o pé para trás para chutá-lo e usou a mesma pedra de antes para se defender. Um erro não seria cometido duas vezes. Ao invés de arremessar o conteúdo contra , usou como arma para golpeá-lo na testa.
O homem titubeou, sentindo tudo ao redor embaçar. Os sentidos e os movimentos do corpo já não lhe pertenciam. Mesmo fazendo esforço para se manter em pé, a textura áspera que as mãos encontraram para se apoiar indicava que ele estava no chão. Gemeu, tentando mover a cabeça ao mínimo para que a dor fosse embora logo. Afetado, passou os dedos em um dos olhos que pinicava de incômodo. Mirou o próprio palmo e viu sangue. A ferida no supercílio estava fazendo um filete de sangue escorrer.
Imóvel, assustada com o que tinha acabado de fazer, sentiu a respiração ficar pesada. Aquele momento era dela. Era hora de fugir. À medida que se afastava, sem um rumo certo, sem um destino final, alguns questionamentos começavam a ser levantados e com eles, a curandeira aprendiz mantinha os avisos de Irene frescos na memória. Não deveria se deixar levar pela vitória fácil. era um matador. O golpe que conseguira desferir nele era obra de sorte, ou em segunda instância, por mais difícil que fosse crer, pode ter sido um ato proposital de piedade para aliviar e facilitar sua fuga.
Não o momento para pensar muito. Da última vez que desperdiçara uma chance de se libertar, acabara enfornada em uma prisão comendo apenas pão e água. Ela precisava ir.
Aquela não seria a última vez que se veriam e ela sabia disso.
- Até um dia, . – murmurou, esgueirando-se pelas trilhas sem olhar para trás.


FIM



Nota da autora: Oieeeee! Se você está lendo isso, obrigada por chegar até aqui <3 Fiquei tanto tempo idealizando esse plot e no final, não consegui chegar em 1/3 de onde realmente queria, mas está tudo bem, né? KKKK Estamos em tempos difíceis e ninguém está sendo poupado. Vai ficar tudo bem! Sonteperl é rico demais para ser inteiramente explorado em um único ficstape. Sinceramente? Não tenho planos futuros para eles hahaha’
De qualquer forma, espero que estejam se cuidando e... Mais uma vez obrigada por darem uma chance à fic!
Beijos,
Ale


Outras Fanfics:

Universo de Harry Potter:
Felicitatem Momentaneum (principais interativos)
Finally Champion (Olívio Wood é o principal)
Finally the Refreshments (sequência de Finally Champion – restrita)

Ficstapes:
04. Bigger
05. Mobile
09. I Don’t Have to Try
10. Fuego (restrita)


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