Contador:
Última atualização: 28/08/2020

Capítulo 1

12/08/2020



- VIRA, VIRA, VIRA! - Era só o que se escutava dentro daquele pub. Minha cabeça girava, mas eu estava preocupada demais em tomar os três litros de cerveja antes de Joey. Não, ele não iria nem fudendo ganhar de mim. Não interessa se ele era bom nisso, eu era ainda melhor que ele. Deixei o líquido gelado descer pela minha garganta o mais rápido que consegui, terminando de tomar todos os copos dispostos na mesa com a bebida.
- Nunca duvide da capacidade de uma mulher, Joey! - Levantei o último copo comemorando a minha vitória, enquanto Joey bateu o dele com força na mesa insatisfeito com a derrota da noite. Eu disse que iria ganhar, e eu ganhei. Mas como diz o ditado: alegria de pobre dura pouco, não é mesmo? Poucos minutos depois da minha comemoração, ouvi palmas irônicas nas minhas costas, e já podia imaginar de quem era. Ele não ia perder essa oportunidade, afinal eu já o tinha visto chegar no início da noite, mesmo ignorando totalmente sua presença naquele local. O pub era público, já tinha acabado meu horário de trabalho e eu não era obrigada a socializar com quem eu não gostava. Porém, eu sabia muito bem de quem eu não gostava e tinha nome e sobrenome: .
Virei em direção a ele, piorando ainda mais minha situação, pois o desgraçado conseguiu ficar ainda sexy mesmo depois do expediente. O terno bem alinhado em tom de um azul escuro, combinando com o sapato preto, o cabelo levemente bagunçado e os olhos quase transparentes brilhavam de satisfação, a qual eu desconhecia. Encarei-o ainda sorrindo, mas isso parecia fazê-lo sorrir ainda mais. Com certeza, ele estava planejando algo que acabaria com a minha felicidade. sabia jogar baixo quando queria.
- Parabéns, . Pelo visto você consegue ganhar alguma, não é mesmo? - Foi o parabéns mais falso que eu já recebi na vida. Nem dos parentes que eu não lembrava da existência tinha sido assim. Entretanto, não era algo pelo qual eu precisasse ser parabenizada. Mas ele era e precisava mostrar toda sua arrogância e prepotência de alguma maneira. Ele fez uma pausa tomando mais um gole do seu whisky. As mangas da camisa branca estavam dobradas até os cotovelos e mantinha uma mão dentro do bolso da calça. Incrivelmente irresistível. - Uma pena que dentro dos tribunais as coisas sejam diferentes. - Ele estava me provocando, afinal estávamos ali comemorando mais uma vitória do escritório.
- É feio ter inveja dos seus colegas só porque você não ganhou nada ainda. - As pessoas a nossa volta já tinham se dispersado, o que me fez agradecer mentalmente por isso. Ele queria me provocar, assim como fazia todo o santo dia dentro do escritório, apenas porque eu não babava ou rastejava por ele como todas as outras faziam descaradamente. Eu conseguia manter meu autocontrole e sanidade mental intactos perto dele, mesmo que isso fosse a coisa mais difícil a ser feita. Mas ele não precisava saber.
Caminhei em direção ao bar com o objetivo de pedir a bebida mais forte que ele tinha, mas nem ao menos consegui dar mais do que dois passos quando fui segurada pelo braço por .
- O que você quer? - Estávamos lado a lado, senti o calor de sua mão no meu braço. Olhei significativo para onde ele estava segurando e ele afrouxou um pouco, mas continuou me mantendo presa.
- Apostar. - Ele sorriu de lado. - Com você.
- O que eu ganho com isso?
- Se você ganhar te deixo em paz por um mês. Isso é o máximo que eu posso fazer. - Ele me fitou de cima a baixo, a malícia explícita no seu olhar. - Mas se eu ganhar, quero que você me busque e me leve em casa por uma semana para ir ao trabalho. - Soltei uma gargalhada alta. Agora eu tinha cara de motorista do bonito? Era só o que me faltava.
- Eu sei que você é cara de pau, mas quer mesmo que eu seja sua motorista? Juro que esperava algo sexual, é mais a sua cara. - Consegui me soltar de sua mão, chegando no bar e pedindo uma dose de tequila. Não me importava se ia passar mal até desmaiar quando chegasse em casa, eu só precisava beber.
- Se tudo der certo, no final da aposta o resultado vai ser esse. - Ele pediu três shots de tequila para nós dois. Então ia ser daquele jeito que resolveríamos nossa aposta. Encarei os copos cheios por mais alguns segundos, suspirei por fim e encarei seus olhos. Péssima escolha, estávamos próximos demais.
- Boa sorte. - Levantei o copo na altura do rosto e esperei ele pegar o dele. Assim como eu, ele também não estava para brincadeira. Quando peguei meu terceiro e último shot, ele já tinha largado o copo vazio e eu nem tinha visto ele pegar o segundo. Bufei irritada, vendo-o rir da minha cara. - Esteja pronto às sete e meia da manhã. - Falei irritada, tomando por fim o último shot de tequila, o qual eu deveria ter sido mais rápida para tomar alguns segundos atrás, mas não fui. Já era tarde, agora era só aguentar no meu ouvido num trajeto de trinta minutos durante cinco dias da semana.
- Vai ser um prazer. - Lambeu os lábios e sorriu de forma provocativa antes de se virar para o bar e pedir mais uma dose de whisky. Não quis virar para trás para ver sua expressão de prazer e satisfação com a minha derrota. Peguei meu blazer jogado em cima da cadeira, que antes estava sentada com Joey e outros colegas do escritório. Me despedi do restante que ainda se encontrava ali, saindo do pub pronta para chamar um uber. Entretanto, estava disposto a me infernizar mais um pouquinho para terminar o dia com chave de ouro.
- Eu te levo em casa.
- Não precisa, já chamei um uber.
- Não chamou, não. Eu vi quando você xingou o aparelho, porque acabou a bateria.
- Está me espionando? Não vou entrar num carro com você bêbado.
- Não estou bêbado, aquele shot não fez nem cócegas. Vamos logo, é impossível conseguir um táxi nesta região. – Por que raios justo ele tinha que aparecer naquela hora, naquele lugar? Eu já teria que aturá-lo na próxima semana inteirinha e o diabo parecia me torturar cada vez mais.
- Me. deixe. na. minha. casa. - Caminhei em direção ao seu carro, um belo de um Audi E-Tron prata, que combinava perfeitamente com ele. O som do alarme sendo desativado soou quando cheguei perto do veículo, entrando no mesmo sem esperar entrar primeiro. Estava torcendo para que o caminho fosse rápido, mesmo sabendo que ele estava dirigindo mais devagar que o normal apenas de propósito. Deitei minha cabeça no banco, na intenção de que tudo a minha volta parasse de girar. - Você pode dirigir mais rápido?
- Você tem medo, ? - Escutei sua voz grave soar no silêncio, ignorando totalmente a minha pergunta, pois não aumentou a velocidade.
- Depende, do quê?
- De mim. - Fui obrigada a abrir os olhos quando escutei sua resposta. Medo dele? De onde ele tirou isso?
- Não? Por que eu teria?
- Não sei. Acho que você tem medo de provar e querer mais. - Ah, então era isso. Sexo, é claro.
- Por acaso, em algum momento, já passou pela sua cabeça que você só não faz meu tipo? - Frisei bem o não, para ver se assim ele entendia. A verdade é que era exatamente o meu tipo, mas tinha deixado de ser no momento que eu dei o primeiro fora nele e ele não aceitou muito bem, passando a me infernizar todos os outros dias a partir daquele.
- E qual o seu tipo? Não é querendo me gabar, mas...
- Já está se gabando.
- Eu sou o tipo de todo mundo. Não importa se você é homem ou mulher.
- Ainda bem que a minha mãe sempre me disse que eu não sou todo mundo.
- Eu acho que esse ódio todo é amor. Não é possível.
- Na verdade, é bem possível, sim. Você não aceitou a porra do fora que eu te dei. Ao contrário de todas as mulheres do escritório, eu não rastejo feito uma cadela no cio atrás de você. E a partir disso você resolveu fazer da minha vida um inferno. Então, sim, é possível que eu sinta ódio de verdade. - Talvez eu tenha ficado um pouco exaltada, porque a expressão de espanto no rosto de dizia exatamente isso. Me senti mil vezes mais leve depois que soltei o que estava preso há tanto tempo dentro de mim. A verdade é que pouco me importava se tinha magoado os sentimentos do queridinho do escritório. Eu quero mais é que ele se foda, e da pior maneira possível. Um alívio invadiu meu corpo quando ele estacionou o carro em frente à minha casa, quase dez minutos a mais do normal para aquele percurso.
- .
- É pra você. - Olhei uma última vez em seus olhos, querendo sair o quanto antes daquele carro.
- Você ainda não respondeu minha pergunta.
- Gosto de atitude. Você fala demais e age de menos.
Saí do carro sem esperar qualquer resposta. Eu já tinha sanado sua dúvida, e a noite acabou ali, eu só precisava da minha cama depois de um belo banho quente. Mas meus pensamentos foram interrompidos quando senti uma mão firme me empurrando contra a porta. Antes mesmo que eu pudesse encaixar a chave na fechadura, meu corpo estava sendo prensado pelo de na porta da minha casa. Sua íris quase transparente tinha um brilho diferente, causando uma onda de arrepios pelo o meu corpo. Não era medo, jamais seria medo quando o assunto era . Mas, com certeza, era algo novo que eu não estava pronta pra sentir. Contudo, deixei a emoção falar mais alto quando senti os lábios famintos dele em busca dos meus. Àquela altura, eu já não respondia por mim, mesmo sabendo que no outro dia me arrependeria amargamente de estar correspondendo ao beijo. Porém, que culpa eu tinha se o desgraçado tinha um beijo maravilhoso? Sua mão na minha cintura colando ainda mais nossos corpos em nada ajudava a minha sanidade. O encaixe das nossas bocas parecia ter sido feito uma para outra, assim como a sincronia das nossas línguas a procura de mais espaço ao mesmo tempo que travavam uma verdadeira guerra. O formigamento quando os lábios de deixaram os meus foi instantâneo, do mesmo jeito que o sorriso que surgiu naquele rosto. O sorriso ladino do jeito que eu odiava vê-lo sorrir estava sendo estampado bem na minha frente. E o pior, o motivo era justamente por ter conseguido o que eu mais temia. Um beijo, para não dizer que tinha sido O beijo daquela noite.
- Agora você pode falar para suas amigas como é beijar . - Ele passou os dedos pelos cantos da boca, a fim de tirar a marca do meu batom vermelho que ficou. - Mal posso esperar para começar a nossa aposta. Boa noite, . - Do mesmo jeito que apareceu, ele foi embora. Do nada. Pisquei ainda desnorteada com suas palavras, vendo o carro se afastar lentamente. Peguei minha chave do chão e finalmente pude abrir a porta, dessa vez sem interrupção. Subi direto para o meu quarto, jogando a bolsa e o blazer na poltrona no canto do quarto. A calça e o restante da roupa foi se perdendo pelo caminho até o banheiro. Eu queria um banho quente, mas me contive com um banho gelado para afastar os pensamentos e as sensações daquele beijo. Você me paga .

- O que você fez? - Escutei minha irmã gritar, andando de um lado para o outro, no meio do quarto. Tapei minha cabeça com o travesseiro ou ela era capaz de explodir.
- Eu já disse. Apostei com o e eu perdi, agora tenho que dar carona pra ele durante a semana.
- , você estava maluca quando apostou com aquele infeliz? Ele não presta.
- , eu juro que se você gritar na minha cabeça de novo eu te jogo pela janela. - Minha irmã finalmente entendeu que eu não estava para brincadeira e sossegou o rabo na poltrona, jogando as coisas que estavam em cima no chão. - Eu sei que ele não presta, mas ele duvidou de mim e eu caí feito uma tonta em suas provocações. Tá satisfeita? - Caminhei até o banheiro, ainda me sentindo um pouco tonta. Mas sabia que era só o efeito de ter levantado rápido demais da cama. Joguei água fria na minha cara, escovei os dentes e prendi meu cabelo num rabo de cavalo alto. Voltei para o quarto com me seguindo, quase colada em mim, tomei o comprimido para dor junto da água que estava ao lado da minha cama. Segurei a pelos ombros, de forma que ela se sentasse na cama dessa vez. Ela entendeu que deveria ficar ali e parar de andar atrás de mim feito um cachorro atrás de seu dono.
- O que você vai fazer? - Perguntou murchando os ombros, já sabendo minha resposta.
- Vou cumprir com a aposta. Não sou mulher de fugir, e não vou fazer isso só porque se trata de você sabe quem. - Consegui achar uma roupa decente dentro do meu guarda-roupa, qualquer roupa que não fosse social. Por fim, acabei escolhendo um vestido azul escuro com botões na frente e meu all star branco. Bem diferente do que eu estava acostumada a usar durante a semana, mas também ajudava a disfarçar que eu estava beirando aos trinta anos. - Você vai assim? - Olhei para minha irmã vendo-a fazer uma careta.
- Vou me trocar. - Logo ela saiu do meu quarto, enquanto eu terminava de passar uma maquiagem na cara para disfarçar o porre da noite passada. Peguei meus óculos escuros, indo para a sala esperar minha irmã. Apoiei minha cabeça na guarda do sofá, e minha vida, de repente, começou a passar em câmera lenta pela minha cabeça.
, 28 anos, advogada trabalhista. Deixei meu pai orgulhoso quando decidi que queria seguir a tradição da família, mesmo sabendo que ele me apoiaria até mesmo se eu não quisesse cursar nenhuma faculdade. Eu sabia que era privilegiada, principalmente por ser considerada nova e já ter uma carreira estabilizada no meu ramo. Não tinha um escritório só meu e, muito menos, trabalhava para o meu pai. Mas gostava da minha vida, o rumo que ela estava tomando me agradava. , minha irmã mais nova e muito mais responsável do que eu, já tinha decidido outro lado para a sua vida. E esse tinha agradado muito mais a minha mãe. Minha irmã morava comigo, já que minha casa ficava a apenas algumas quadras de sua faculdade, economizando tempo e dinheiro com transporte. Ela decidiu ir para o lado das artes e focando sua carreira sendo ilustradora. E posso dizer com todas as letras que ela era maravilhosa e sabia muito bem o que fazia. Eu amava a companhia dela, mesmo ela sendo mil vezes mais cabeça dura do que qualquer outra pessoa. Mas eu já estava acostumada com a fera, além de ser a a pessoa que conseguia colocar um pouco de juízo na minha cabeça quando eu estava prestes a enlouquecer. Era até irônico pensar que logo ela, a mais nova e destrambelhada, era quem colocava ordem na casa e juízo na minha cabeça, quando na verdade essa tarefa deveria estar sendo desenvolvida por mim. A irmã mais velha e a nova advogada da família. Meu pai, o tão respeitado Michael , fazia questão de me lembrar desse posto, mas eu odiava ser reconhecida por isso. Não, eu não odiava o meu trabalho. Pelo contrário, eu amava o que eu fazia. Ficava extremamente orgulhosa e satisfeita quando conseguia solucionar qualquer caso que fosse entregue a mim. Mas o jeito que eu era exposta, como se não estivesse fazendo mais que a minha obrigação. Eu não gostava dessa exposição toda.
- Estou pronta, vamos logo. Papai já está me mandando mensagem. - apareceu na sala, me tirando dos meus devaneios. Sorri após perceber que minha casa já não era mais a mesma desde que ela chegara.
- Vamos lá. - A abracei pelos ombros, empurrando-a porta a fora. Entramos no carro, ligando o rádio no último volume e cantando todas as músicas que tocavam. Não era sempre que eu podia me dar esse luxo de passar um dia com a minha família, mas sempre que eu conseguia tentava aproveitar ao máximo. Meu pai fazia questão de morar no outro lado da cidade, uma viagem de uns quarenta minutos quase. Mas, ainda assim, eu amava ir pra lá. A casa dele ficava próxima da praia e era perfeita para um pôr do sol no final da tarde. Quando entrei em sua rua, a enorme casa de madeira com um verde escuro chamava a atenção, típico do meu pai. Estacionei em frente à casa dele, com minha irmã pulando de alegria ao meu lado. Eu também estava animada, alguns meses sem vê-lo me deixava um pouco emotiva.
Entramos na casa com a intenção de ir direto para os fundos, onde ficava a piscina e a churrasqueira. Mas uma voz me fez parar no meio do corredor. NÃO!
- Pai! - Fui recebida de braços abertos, num abraço longo e apertado, cheio de saudade.
- Filha. Ah, que saudade. - Eu sentia muita falta do meu pai, mas o trabalho impedia nossas visitas. No fim, insistia tanto para visitá-lo que eu sempre acabava dando um jeito de conseguir um tempo aqui e outro ali para irmos até sua casa. - Esse é o , ele é sobrinho do Alexander e é advogado também.
- , prazer. - Estendi minha mão torcendo para que ele entendesse e entrasse no meu jogo. Senti seu olhar por todo meu corpo, parando por fim na minha mão entendida. Droga, aperta logo e finge que não me conhece.
- , prazer. - Soltei um suspiro quase inaudível. Mas o desgraçado tinha um sorriso encantador no rosto, me deixando quase hipnotizada. Apenas por alguns segundos. Fiquei mais alguns minutos conversando com meu pai, mesmo que na maior parte do tempo eu não estivesse prestando atenção em suas palavras. Me sentia mal por isso, mas era mais forte que eu, e a pessoa ao meu lado não ajudava em nada.
- Então como andam os processos? Eu sei que você anda tendo que resolver bastante coisa, mas meu escritório sempre vai estar aberto para você.
- Ah, por favor, não vamos falar de trabalho hoje. Vou pegar uma cerveja, mas a tem novidades pra te contar. - Falei alto o suficiente para minha irmã escutar, ao invés de discutir com Thomas, nosso primo, para ver quem começava algum jogo no videogame primeiro. Jovens. - Você dirige. - Entreguei a chave do carro quando passei por ela. A geladeira lotada de cerveja seria minha válvula de escape para conseguir passar a tarde naquela casa.
Peguei uma cerveja na geladeira e segui para a área de serviço da casa, que ficava ao lado da cozinha. Me sentei no balcão, onde ficavam as máquinas de lavar embutidas, com a minha cerveja em mãos. Procurei na minha bolsa, achando, por sorte, minha carteira de cigarro. Ninguém entraria ali, então aquele era o meu momento de paz antes de voltar para o jardim e ter que bancar a filha querida e simpática justamente para o . Abri a janela, para que o cheiro da nicotina não ficasse tão impregnado naquela parte, acendendo o cigarro e sentindo meu corpo relaxar após dar a primeira tragada. Meu celular vibrou, mostrando na tela o nome de Gerard, o qual eu não queria ver tão cedo na minha frente. Ótimo, esse final de semana estava sendo mais surpreendente do que eu esperava. Ignorei a chamada, voltando a beber minha cerveja em paz, mas não por muito tempo, já que senti alguém me observando. Juro, se não fosse tão humilhante, eu deitaria naquele chão agora e choraria em posição fetal. Eu só queria aproveitar a visita do meu pai, como nos velhos tempos. Mas parecia que ele tinha péssimo gosto para convidados.
- O que está fazendo aqui? - Perguntei ainda sem olhá-lo. continuou parado na parede que separava os dois cômodos.
- Por que fez aquilo?
- Perguntei primeiro. O que está fazendo aqui?
- Foda-se se você perguntou primeiro, por que raios fingiu que não me conhece? - Deus, o que eu tinha feito de errado nessa vida pra merecer um carma desses?
- Meu pai sempre falou muito bem da sua família, além do seu tio e ele serem sócios no escritório. Você deve saber essa parte. É mais fácil e menos desgostoso pro meu pai se eu fingir que não te conheço do que falar “ei, pai, sabe esse cara aqui na sua frente? Ele age feito um babaca todos os dias, fazendo questão de tornar meus dias ainda mais difíceis. Mas tudo bem se vocês são amigos, eu realmente não me importo”. - As palavras escaparam da minha boca mais rápido do que eu imaginava ser possível. – Agora, me diz o que está fazendo aqui. - Ele saiu do lado da parede, dessa vez, parando na minha frente encostando no armário das roupas.
- Bem, como você sabe, minha família também gosta muito da sua. Eu me mudei recentemente pra esse bairro, e seu pai fez questão de me convidar para o churrasco.
- Espera aí, você mora nesse bairro? Eu moro no outro lado da cidade quase, você sabe. São quase quarenta minutos até aqui.
- Mas são quinze até o escritório. - Tomei um grande gole de cerveja dessa vez, sem acreditar no que eu estava ouvindo. Era, praticamente, uma viagem até aquele bairro. Ele sabia disso, e por isso fez questão que eu fosse sua motorista particular. Desgraçado.
- Eu juro que quando essa aposta acabar, eu não quero te ver nunca mais na minha frente, ou serei capaz de cometer um homicídio doloso. - Meu celular voltou a tocar, me fazendo sentir ainda mais raiva ao ver o nome de Gerard novamente. Não sendo o suficiente ele ter ligado naquele hora inoportuna, esticou o pescoço conseguindo ver o nome do dito cujo na tela.
- Por acaso é o Gerard que eu estou pensando? - Ele quase arrancou o celular da minha mão.
- Não.
- Resposta errada. Então quer dizer que você curte caras mais velhos, hum? Mas ele não é velho demais? - Quando senti o seu perfume, percebi o quão próximos nós estávamos, me fazendo observar o que ele estava vestindo. Assim como eu, era totalmente diferente do que costumamos usar no dia-a-dia. Um camisa de manga curta num tom de azul claro com os quatro primeiros botões abertos, deixando à mostra uma parte do seu peito e uma bermuda jeans num tom de bege terminando com um tênis esportivo. Não estava feio, de jeito nenhum, mas digamos que a calça social valorizava muito mais seus músculos, principalmente sua bunda.
- Ele é um grande imbecil. Na verdade, todos os homens daquele escritório são. Grande erro ter aceitado sair com ele. - Deixei escapar, já sabendo que teria uma piada pronta na ponta da língua.
- Você é esperta, tenho certeza de que vai resolver isso logo. - Ele entregou meu celular. - Se te alegra um pouco, eu tenho um compromisso daqui a pouco. Então estou indo embora. Foi um prazer te conhecer, . - Confesso que tive receio dele tentar me beijar de novo quando senti seu rosto próximo do meu. Mas diferente de ontem, eu estava pronta pra lhe dar um chute no meio do saco caso tentasse qualquer coisa. Contudo, o máximo que ele fez foi me dar um beijo na bochecha próximo demais da minha boca, se retirando do cômodo em seguida.
- Não posso dizer o mesmo, . - Acendi mais um cigarro, agradecendo aos deuses por não haver nenhuma interrupção dessa vez. Mais alguns minutos ali escondida, tentando tirar o cheiro do cigarro, o que era quase impossível, e voltei para o jardim.

- O que vocês duas acham de dormirem aqui? - Meu pai sentou no sofá, ficando no meio, entre eu e , quando todas as visitas já tinham ido embora.
- Ótima ideia.
- Podemos pedir pizza? - Minha irmã era uma criança quando o assunto era comida. O paladar infantil dela não deixava negar.
- Se tiver calabresa eu topo.
- Escolham os sabores, e a gente liga pra lá.
Passar o final de semana na casa do meu pai era quase como fazer uma viagem no tempo. Ainda que eu e tivéssemos seis anos de diferença, ela seria pra sempre minha melhor amiga. As inevitáveis brigas para escolher um lanche ou até mesmo um filme sempre aconteciam. Não importa nossa idade, era um ritual, e elas precisavam acontecer. No final, meu pai acabava decidindo por nós duas, ele fazia pipoca e nos juntávamos no chão da sala para assistir. Desde que minha mãe morreu, dois anos atrás, quando perdeu a luta para o câncer, eu sabia que meu pai tinha mudado algumas coisas na casa e passava mais tempo no serviço. Não o julgava, se ele se sentia melhor assim, então respeitava a escolha dele. Era por isso que eu gostava tanto daqueles momentos em família, a gente nunca sabe o que vai acontecer no outro dia ou se ainda vamos poder nos encontrar com quem amamos. Então, toda e qualquer oportunidade de passar o tempo ao lado deles, eu aproveitava o máximo.
- Eu amo vocês. - Estava deitada no sofá vendo os créditos do filme subirem, meu pai estava quase dormindo no outro sofá e vendo alguma coisa no seu celular.
- Ih, tá sentimental, é?
- Cala a boca, sua ridícula. - Taquei uma almofada, acertando-a em sua cabeça.
- Parem de brigar. Eu amo vocês duas, mas agora eu vou dormir. Arrumem essa bagunça. - Depois de dar um beijo de boa noite em nós duas, meu pai subiu para o quarto dele. Eu e juntamos a caixa de pizza da mesa de centro e os copos, levando-os para a cozinha.
- Então, o que rolou entre você e aquele deus grego?
- Fala baixo. Não aconteceu nada.
- Claro, , eu nasci ontem.
- Eu juro que não aconteceu nada. Só ficamos conversando, ele inconveniente como sempre.
- E você e Gerard?
- Ah, não me fale desse traste. Eu só queria saber que pecado eu cometi pra ter esses dois no meu pé.
- , olhe pra você. É linda, inteligente, independente. Nenhum homem resiste.
- Eu só quero um pouco de paz na minha vida. Mas quanto mais eu rezo, mais assombração me aparece.
- Se essa assombração que você tanto fala se chama , é uma assombração muito gostosa, hein.- Fui obrigada a rir do comentário da minha irmã. - Ah, antes que eu esqueça, ele tá feito um cachorrinho por você. Então, aproveita e tira uma lasquinha.
- Ok, chega. Vamos dormir. - Terminei de lavar a louça e nos dirigimos para o quarto de hóspedes. Era o meu antigo quarto, agora reformado com duas camas de solteiro, algumas das nossas bugigangas e um roupeiro com algumas coisas reservas para esse tipo de ocasião. Tomei um banho rápido, vesti meu pijama e me deitei na cama. Esperei fazer o mesmo e apagar a luz, o que rapidamente me fez pegar no sono.

Capítulo 2 - Segunda-feira

O relógio despertou uma hora mais cedo do que eu estava acostumada, isso quer dizer que às cinco e meia da manhã eu estava em pé. Me arrependendo e amaldiçoando até o último minuto por ter aceitado aquela aposta. E o pior, ter perdido. Eu podia estar dormindo por mais uma hora na minha cama quente e confortável. Mas enfim, só cinco dias e eu ficava livre dele. Tomei um banho demorado, me vesti e desci para tomar café. Passei um café bem forte e amargo, para acordar de vez, ou eu poderia muito bem dormir em pé a qualquer momento do dia. O que seria desastroso, já que eu tinha um cliente para visitar logo no início da manhã. Quando percebi, meu relógio já marcava sete horas, então peguei minha bolsa, a pasta com alguns documentos e saí de casa. Olhei em meu celular o endereço de . Quando ele me enviou por mensagem na noite passada, coloquei no GPS e fui rezando o caminho inteiro para que ele estivesse pronto. Mas é claro que ele não estaria, por que raios ele faria algo para me agradar ou me deixar minimamente feliz? Impossível.
A vontade que eu tinha era de chutar aquela porta e arrancar de lá pelos cabelos. Mas, ao contrário disso, mantive meu autocontrole e apertei a campainha como uma pessoa civilizada. Não tive resposta, apertei de novo, de novo e de novo. Até que ela se abriu, mostrando um descabelado, sem camisa e com cara de sono bem na minha frente.
- Merda. - Deixou a porta aberta para que eu entrasse.
- Quinze minutos.
- Bom dia pra você também.
- Se fosse um bom dia, eu não estaria olhando pra sua cara logo cedo. - Resmunguei baixo quando seguiu para o andar de cima da casa. O ambiente arrumado não combinava muito com a personalidade de , mas os livros e discos de vinil foram o que me chamaram a atenção na estante da sala. Alguns clássicos como Elvis Presley, Beatles, Rolling Stones, Bon Jovi, AC/DC todos estampavam a estante ao lado dos livros de direito, políticas e alguns romances água com açúcar, o que me deixava surpresa por vê-los ali.
- Vamos. - Ele apareceu não mais de dez minutos depois. Devidamente arrumado, nem parecia que tinha pulado da cama por minha causa.
- AI MEU DEUS! Você lê 50 tons de cinza. - Acabei gritando quando encontrei o livro na estante. Como se não bastasse, ele tinha os três livros.
- Eu não leio. Minha irmã deixou esses livros aqui. Podemos ir? Já é quase oito horas.
- Tá com pressa agora? Quando eu cheguei aqui não parecia.
- Puta merda, . Quando você quer, consegue ser mais insuportável que eu.
- É bom provar do próprio veneno, né? - Passei em sua frente, saindo da casa, entrei no carro antes mesmo dele fechar a porta de entrada. Pelo menos assim ele ficou quieto o pequeno trajeto até o escritório. Às oito horas em ponto eu estacionei em frente ao escritório, mas eu não ficaria ali. Tinha marcado com meu cliente às oito e meia, então estava torcendo para que o trânsito não estivesse mais caótico que normal, para que eu conseguisse chegar no horário marcado.
- Você não vai descer?
- Não, tenho reunião com um cliente.
- Ok, eu saio às dezoito.
- Como se eu não soubesse. Vou estar aqui, se é isso que você quer saber.
- Eu sei que vai. - saiu do meu carro, entrando no prédio, e eu pude então seguir para o endereço que eu já sabia de cor.
A reunião demorou mais do que eu esperava, o que me fez reagendar a reunião da tarde e voltar ainda mais tarde para o escritório. Já passava das seis quando entrei no prédio e caminhei em direção à minha sala, torcendo para os documentos que eu solicitei a Judite estarem prontos e corretos na minha mesa. Eu não sentia mais meus pés, e a semana mal havia começado.
- Está atrasada. - É claro que ele estaria ali.
- Eu sei. Mas você me fez esperar hoje de manhã. Então estamos quites. - Dei de ombros, servi um pouco de café antes de olhar os documentos separados na minha mesa. Guardei dentro da pasta após verificar se todos estavam corretos. - Vamos, já terminei aqui.
O dia tinha sido longo e estressante, então minha última tarefa do dia seria deixar em casa, conforme o combinado, e eu poderia finalmente descansar. Eu precisava correr com alguns processos, além de participar de algumas audiências já agendadas naquela semana. Demandando mais trabalho e parte do meu tempo de descanso também. O que resultava em mais trabalho quando eu chegava em casa para conseguir dar conta de tudo.
- . - Escutei Gerard me chamar, boa coisa não era àquela hora da noite. - Você está com o caso do Sanchez, não?
- Sim. Por quê?
- Quero te pedir pra não fazer a acusação. - Eu sabia que Gerard não valia nada, mas o que ele estava fazendo era sujo e baixo demais.
- Que pena, mas não vai rolar. Seu cliente está errado, tão errado que até você sabe disso. Faça a sua defesa, e eu farei a minha. Não vou deixar meu cliente perder o que é dele por direito por um capricho seu. Se era só isso que você tinha pra falar comigo, perdeu o seu tempo.
- O que você quer pra não fazer isso? - Parei no meio do corredor sem acreditar no que estava ouvindo.
- Quero que você e o seu cliente vão se ferrar. Você mais ainda só pelo mau caratismo mesmo, nada pessoal. - estava parado ao lado do elevador, o qual já se encontrava no nosso andar. O olhar duro poderia fazer Gerard virar poeira se dali saíssem raios laser. Pensando por esse lado, até que não seria uma má ideia.
Quando as portas de ferro se fecharam, consegui relaxar um pouco, nem percebendo quão tensa eu havia ficado com aquela pequena conversa com Gerard. Era tudo que eu precisava mesmo para terminar aquela segunda-feira.
- Que péssima escolha, .
- Me arrependo a cada dia. - Por fim, comecei a rir, tentando me controlar acabei prendendo a gargalhada que queria sair. Numa tentativa completamente falha, já que a vontade só aumentava. Me apoiei na parede do elevador e soltei por fim o riso. A vontade de arrastar a cara de Gerard no asfalto só aumentava. Então, antes que eu apertasse o botão para parar o elevador e voltasse até o quinto andar para fazer isso, o que me restava era rir do absurdo que tinha acabado de acontecer.
- Eu vou acabar com ele amanhã.
- Pela primeira vez, eu concordo com você. - , que até então estava quieto, se pronunciou. Por pouco tempo apenas, logo voltamos a ficar em silêncio, e pra ser sincera, foi bem agradável.
Sentia que minha cabeça podia explodir a qualquer momento. As provocações de já eram quase nulas, para um primeiro dia eu achei bem esquisito. Mas talvez eu estivesse distraída com o cansaço do dia e a raiva súbita do fim do expediente para perceber. Nesse momento, eu só queria ter um piloto automático para deixar meu carro fazer o trajeto até a casa do ser ao meu lado sozinho, mas infelizmente eu teria que dirigir por mais uns cinquenta minutos até estar na minha casa. Contudo, o trajeto foi calmo e mais rápido do que eu esperava. Quando abri a porta de casa, o cheiro da lasanha de frango que só a sabia fazer já tinha dominado todo o ambiente, me deixando um pouquinho feliz.
- Por favor, abra aquela garrafa de vinho, e eu já desço pra acabar com essa lasanha. - Gritei para na cozinha, já subindo as escadas o mais rápido possível. Entrei direto no banheiro para tomar um banho quente, tirar o sapato de salto e a roupa apertada no meu corpo o dia todo. Depois de uns quinze minutos, mais ou menos, encontrei com minha irmã ainda na cozinha. Uma taça de vinho estava servida em cima da mesa, tomei um longo gole, saboreando aquele gosto adocicado.
- Pelo jeito, teve um dia longo e cansativo, estou errada?
- Nem um pouco. Ainda quase matei o Gerard por ter me pedido para desistir do meu cliente de amanhã. Ainda bem que voltei pra terapia, sabe. Caso contrário, eu acredito que teria cometido um crime de ódio.
- Não vale a pena gastar teu réu primário com ele.
- Não vale mesmo. - Dei uma garfada na lasanha e fui ao céu e voltei. - Meu deus, isso tá uma delícia. Sério, pode morar pra sempre aqui.
- Interesseira. - me deu um tapa de leve no braço. - Agora eu vou dormir, maninha, o dia foi longo pra mim também. Boa noite. - Se despediu com um beijo na minha bochecha, se retirando do cômodo logo após.
Eu fiquei ali na cozinha saboreando a comida e o vinho. Sinceramente, não tinha coisa melhor. Às vezes eu achava que era algum tipo de bruxa ou coisa do tipo, ela sempre sabia quando meu dia tinha sido uma grande bosta. Isso resultava em muitas comidas e bebidas gostosas feitas por ela, ou não. Às vezes era só comida comprada mesmo, mas ainda assim ela sempre pedia as nossas favoritas. Ainda assim, era só eu abrir a porta de casa e sentir o aroma da janta que minha mente esvaziava, todas as minhas preocupações do dia sumiam e o coração voltava a ficar quentinho por saber que, de alguma forma, nós cuidamos uma da outra de formas diferentes. Eu não sei como, mas somente ela tinha esse poder. Eu amava essa sensação, confesso. Antes de dormir, resolvi assistir qualquer coisa que passava na televisão, apenas para me distrair um pouco. Às vezes um besteirol caía bem.

Capítulo 3 - Terça-feira

Eu podia sentir a adrenalina correndo pelas minhas veias naquela manhã. Assim como o meu bom humor, o dia parecia cooperar para tudo dar certo. O início do dia ensolarado só poderia ser um bom sinal. Já estava pronta para o meu primeiro compromisso, teria o maior prazer do mundo em vencer Gerard no tribunal. Além do absurdo que ele havia me pedido na noite passada, só comprovaria que ele estava sempre defendendo as pessoas erradas. Não sabia como eu tinha conseguido me envolver com ele, mas me sentia aliviada por ter caído fora quando deu tempo. Quem lesse meus pensamentos nesse exato momento poderia até me achar arrogante de certa forma, mas eu precisava muito vencer esse desgraçado no tribunal hoje.
- Por favor, , me ajuda. Só hoje, vai. - Disse a mim mesma, torcendo para que pelo menos hoje ele já estivesse pronto, e então daria tempo de chegar no tribunal mais cedo. Ainda que a sessão só estivesse marcada para começar às nove horas, eu gostava de chegar um pouco mais cedo e conversar com meu cliente. Passar as instruções finais, para que não houvesse nenhum tipo de imprevisto. Mas eu estava errada. Mais uma vez, bati algumas vezes na porta e não obtive sucesso. Céus, o que custava ele ficar pronto no horário combinado?
Dessa vez a porta estava destrancada. O que me deixou um pouco alarmada. Será que tinha acontecido alguma coisa? Será que ele estava vivo?
- ? Vamos logo, eu não posso me atrasar hoje. - Gritei no meio da sala, mesmo sem obter resposta. - Mas que saco. Eu tô indo embora em cinco minutos!
- Bu! - Me virei tão rápido com o susto que acertei seu nariz com um soco. - MAS QUE PORRA, !
- CARALHO, ! - tapei minha boca com a mão de susto e para não rir logo da cara de dor que ele fez. - Me desculpe. Eu juro que não foi por querer. Eu me assustei.
- Claro, por que toda vez que a gente se assusta a gente acerta um soco na cara dos outros, não é mesmo?
- Ah claro, por que é super normal chegar da sua casa e você assustar as pessoas e elas reagirem da melhor forma, não é mesmo? Poupa meu tempo, .
- Eu vou pegar um gelo e a gente pode sair, antes que você invente de me matar aqui dentro.
- Nesse caso, eu gosto da ideia de te matar. Mas infelizmente vou me atrasar se você continuar tirando pedrinha por pedrinha. - Peguei a forma de gelo de sua mão, uma sacola e virei a forma para baixo, de forma que mais pedras de gelo caíssem ao mesmo tempo. Fiz um nó na ponta da sacola entregando a mesma para colocar no nariz. - Senta aqui rapidinho. - Ele fez, mesmo desconfiado.
- Vai me matar mesmo? - Revirei os olhos, com a vontade ainda maior de pegar a faca de cima da mesa e fazer dele picadinho.
- Vai doer um pouco, mas vai resolver o problema. - Antes que ele pudesse piscar, coloquei seu nariz de volta no lugar, quase recebendo um murro na minha cara.
- Inferno, !
- Para de drama, vamos logo. - Arrumei sua gravata, que estava torta - não, não me pergunte por que raios eu fiz aquilo - Fingi que era apenas a minha neurose por coisas fora do lugar falando mais alto e saí logo daquela casa. Pelo menos o soco serviu para ir o caminho todo quieto, soltando apenas alguns gemidos rouco de dor. Quando paramos num sinal fechado, olhei de relance para ver se ele já tinha parado de gemer. Mas acabei me perdendo um pouco com a visão que tive, ainda que engraçada. estava relaxado no banco ao meu lado, de olhos fechados e a boca entreaberta. Era uma visão e tanto, visto que ele mantém sempre a mesma cara de durão. Escutei alguns carros buzinando quando o sinal abriu, e eu não percebi. Voltei a atenção para a estrada, não demorando muito mais para chegar no escritório. Meus dedos pareciam ter vida própria, quando mesmo com o carro parado eles não paravam de tamborilar no volante.
- … - segurou minha mão, de forma que ela finalmente parou quieta. - Vai dar tudo certo. Acabe com o Gerard.
- Eu vou.
- Eu sei. - Tão rápido quanto um piscar de olhos senti seus lábios nos meus. Mas no momento que senti, quando abri os olhos eles não estavam mais lá. Me deixando surpresa, pois não tinha malícia no olhar pela primeira vez, e eu queria beijá-lo de novo. Mas durou pouco tempo, quando desviei meus olhos de sua boca e encarei seus olhos, o sorriso ladino começava a surgir em seu rosto.
- Sai do meu carro antes que eu entorte teu nariz de novo. - A sua gargalhada alta fez uma onda de arrepios passar pelo o meu corpo todo. Tentei ignorar logo aquilo e segui rumo ao tribunal.


Estava encostada no lado de fora do meu carro, apenas esperando sair logo do escritório. O expediente já havia chegado ao fim, então, como minhas coisas estavam organizadas, resolvi descer e esperar ele na rua mesmo, enquanto terminava de fumar. Mandei uma mensagem para avisando que chegaria mais tarde, assim ela não precisava me esperar acordada. Queria visitar um lugar antes.
- Parabéns. - Escutei quando parou ao meu lado. - Ouvi boatos que Gerard chegou furioso.
- Isso porque você não o viu no tribunal. Tenho certeza de que se ele pudesse, teria me matado.
- Ele é fraco, apresenta argumentos inválidos e não prepara o cliente dele. As informações se divergem na hora do depoimento. Triste. - Concordei com a cabeça. - Tá com pressa?
- Não. - Vi ele pegar um cigarro no bolso da calça e acender. O diabo querendo brincar com a minha cara àquela hora da noite, porque - ironicamente ou não - só Deus sabe o quanto ele ficou ainda mais sexy fumando. Era um péssimo hábito, eu sei. Eu também tinha. Mas tive que acender mais um antes de enlouquecer.
- Seu pai me chamou pra ir à casa dele amanhã. Uma reunião com o meu tio.
- Hum. - traguei mais uma vez, soltando a fumaça para o lado contrário do qual ele estava. – Então, ele tá aprontando alguma coisa. Porque me chamou pra ir lá também.
- Com certeza.
- O seu nariz tá doendo ainda?
- Não muito, tomei um remédio quando cheguei.
- Que bom.
- Você não vai pedir desculpas?
- Não. Você me assustou, e eu só reagi.
- Mas reagiu com um soco.
- E daí, a culpa é sua que me assustou. Não vou pedir desculpas, já falei. - Tirei o blazer que estava usando, coloquei no banco de trás do carro e tirei o grampo que prendia meus cabelos, deixando-os cair pelos meus ombros. Talvez eu devesse cortar logo.
- Wow, eu acho que estou vendo outra na minha frente.
- Hã? - Ele colocou meu cabelo para atrás da orelha, tirou os óculos de grau do meu rosto e me fitou sério.
- Acho que tá na hora. - Tirei sua mão do meu rosto e entrei no carro. Eu tinha que parar de ter esses ataques toda vez que ele encostava em mim. Mas era mais forte que eu, e eu ainda não sabia lidar com isso. Para de ser ridícula , você tem 28 anos. Era o tipo de coisa que falaria pra mim se estivesse junto comigo.


O barulho do mar com o vento me acalmava de certa forma, eu sempre amei praia desde pequena. Além dali ter sido onde eu construí as melhores memórias com a minha mãe. A brisa leve batendo em meu rosto, balançando meus cabelos, me deixava em paz comigo mesma, e também me ajudava a colocar os pensamentos em ordem, eu estava precisando disso ultimamente. Não sei por qual razão naquele dia eu sentia que podia explodir a qualquer momento, uma angústia me consumindo de forma avassaladora. Eu precisava de ar.
Por muito tempo, ignorei toda a sobrecarga que eu mesma colocava em cima de mim, me sabotando quase todas as vezes. Apenas para deixar claro que eu conseguia dar conta de tudo e de todos. A verdade é que há muito tempo eu não cuidava de mim. Tive um ou dois namorados mais por falta de tempo mesmo. Ou eu fingia que era por isso. Mais uma vez me sabotando sem perceber. Fiquei próxima do mar, apenas com os pés na beira da água. Um arrepio gostoso passou pelo meu corpo. Me senti livre e leve naquele momento. Morar em Santa Mônica tinha suas vantagens.
- Mãe, onde quer que você esteja, por favor, me manda um sinal de que eu estou no caminho certo.
- , o que está fazendo aqui?
- Pensando? - Ok, o sinal foi mais explícito do que eu esperava. Valeu mesmo, mãe.
- Tá tudo bem?
- Sim. Eu acho. - Dei de ombros, voltando minha atenção ao mar.
- Pensando sobre o quê?
- Vai me deixar em paz se eu falar?
- Não, mas quero saber mesmo assim. - Ele estava um pouco atrás de mim. Apenas de bermuda e tênis de corrida. A carinha é linda, pena que não vale nada.
- Pensando em tudo. Na minha vida, no trabalho, na nossa aposta. - Me sentei na areia, mais afastada do mar e ele sentou-se ao meu lado.
- Por que aqui na praia?
- Porque é um dos meus lugares favoritos.
- O que te faz pensar na nossa aposta?
- Você tem quantos anos, ?
- 33. Por quê?
- Porque parece uma criança estacionada na fase dos porquês.
- Eu ia dizer que você não é tão insuportável assim, mas acabei de mudar de ideia.
- Não posso dizer o mesmo. Eu achei que você era mais insuportável do que eu imaginava, mas não é.
- Isso quer dizer que você não me odeia.
- Tanto faz, mas também não gosto de você.
- Discordo. Se não gostasse não estaria falando da sua vida.
- Não falei da minha vida, falei o que eu estava pensando.
- Você é uma pessoa legal. Eu nunca achei que pudesse dizer isso.
- Por quê?
- Porque você me odeia.
- Eu juro que vai ser a última vez que vamos entrar nesse assunto - Comecei a enumerar todos os pontos para a gente ter chegado aonde chegamos e, consequentemente, nessa aposta - Primeiro: você me convidou pra sair, e eu disse educadamente que não. Depois disso, você começou a fazer da minha vida um inferno. Segundo: Eu tinha acabado de sair de um relacionamento bosta. A última coisa que eu queria era me envolver com alguém. Terceiro e último: Eu não te odeio, porque odiar é uma palavra muito forte. Mas eu também não gosto de você e todas suas atitudes fez com que chegássemos a esse ponto. Está claro agora? - Mãe, se o sinal que você mandou era esse, eu sinto muito em decepcioná-la. Mas não vai dar certo, não tem como dar certo.
- Eu adoro quando você fica nervosa, sabia?
- Não estou nervosa. Só me irrita um pouco falar a mesma coisa mil vezes e você não entender. Ou fazer que não entende.
- Sabe o que eu acho que você precisa mesmo? - Ele perguntou olhando em minha direção, mas entendi que era uma pergunta retórica, então deixei que continuasse. - Me dar uns beijos e esquecer dessa preocupação toda, talvez um pouco mais que isso... - ele segurou o riso esperando minha reação.
- Ah, vai se foder, . Você é mesmo um puta convencido. - Dei risada, pois era a única reação possível diante de tamanho absurdo.
- Eu sei que você quer, . - ele disse baixo perto do meu ouvido passando o nariz de leve pelo meu pescoço, o que fez todo meu corpo arrepiar.
- Eu quero, é? Como sabe? - Levantei seu rosto com o dedo para encará-lo.
- Sua boca me diz uma coisa, mas seu corpo diz outra. - ele deslizou a ponta dos dedos levemente pelo meu braço, me fazendo arrepiar mais ainda. Mordi o lábio inferior tentando me conter, mas foda-se.
- É, talvez eu precise mesmo… vamos ver. - O agarrei pela nuca colando nossos lábios. Ele pareceu um pouco surpreso no começo, mas no mesmo instante passou a retribuir o beijo. Era um beijo intenso, expressando toda a tensão sexual contida nesses últimos dias. passou um de seus braços pela minha cintura me puxando para sentar em seu colo, entrelacei as duas mãos nos cabelo curtos, intensificando ainda mais o beijo. Talvez ele tivesse mesmo razão, eu não sabia o quanto queria aquilo até começar. Suas mãos realizaram pelas minhas coxas apertando-as com uma certa força, o que me fez soltar um suspiro pesado. Mordi seu lábio inferior o olhando, sorri de lado e levantei.
- Já te deixei em casa hoje, e a aposta deixa claro que é ida e volta do trabalho. - Passei as mãos pelas pernas, limpando a areia enquanto ele me olhava com aquela cara de bobo de quem não estava entendendo nada. - Não estamos no trabalho, então até amanhã. - Caminhei até o meu carro, deixando-o sentado na areia. Eu queria muito terminar o que havíamos começado. Ah como eu queria... Mas nada era mais gratificante do que aquela cara dele tentando entender e aceitar que não seria dessa vez que ele levaria o troféu.

Capítulo 4 - Quarta-feira

- , acorda. Vai se atrasar. - Escutei gritar no lado de fora do meu quarto.
- Eu já estou acordada. Tô terminando de me arrumar. - Ela abriu a porta, entrando feito um furacão no meu quarto. - Bom dia pra você também, .
- Eu to tão nervosa! - Ela caminhava de um lado para o outro no meu quarto. Sinal de que ela estava realmente nervosa.
- Primeiro, tu senta e te acalma. Vai chegar lá tremendo mais que um pinscher, capaz até de passar mal só de nervosismo. - Terminei de me arrumar o mais rápido que eu consegui, fiz um café forte pra mim e um chá de camomila para . Caso contrário, ela enlouqueceria. Enviei uma mensagem para , quase implorando para ele estar pronto no horário combinado, já que eu passaria lá mais cedo. Largaria na faculdade e depois iria para o escritório. O único dia que os deuses ouviram as minhas preces, pois assim que estacionei o carro na calçada, já estava milagrosamente pronto.
- Bom dia.
- Bom dia. - Respondi. parecia distraída ou nervosa demais para responder. Não conseguia prestar atenção em nada que acontecia ao seu redor.
- O que a tem? - Ele perguntou baixinho, apenas para que eu escutasse.
- Uma prova final na faculdade.
- Ela vai se sair bem.
- Tô tentando falar isso pra ela desde que ela acordou. Mas a bichinha tá tão nervosa que não consegue prestar atenção em nada.
- ? Chegamos. - Ela olhou em direção ao portão da faculdade, mas isso pareceu assustá-la ainda mais. Era uma das poucas vezes que eu via minha irmã assim. Ela dificilmente ficava nervosa com algo, principalmente com algo da área dela e que ela dominava.
- E se eu não passar? - Tirei o cinto e saí do carro, sentando ao seu lado no banco de trás.
- , olha pra mim. - Segurei seu rosto delicadamente, de forma que ela me encarasse nos olhos. - Eu sei que hoje é um dia especial pra nós. Mas lembre-se de todo o seu esforço para chegar até aqui. Já teve coisas mais difíceis, e você conseguiu. Agora você vai entrar por aquele portão, vai sentar a bunda na cadeira e fazer o que for pedido, seja lá o que seja, porque eu não entendo nada. Mas você vai arrasar. E se não passar, tá tudo bem. Eu tô aqui e vou estar aqui sempre. Eu te amo.
- Ok, eu sou uma . Eu vou conseguir. - Ela respirou fundo, pegou sua bolsa e saiu do carro. Mas voltou no meio do caminho. Eu já estava de volta ao meu posto de motorista. - Por favor, beija esse homem lindo logo. - Eu. vou. matar. a. .
- Olha só, tem um coração! Ah, eu concordo com a sua irmã. - Ignorei seu comentário. Fingindo prestar atenção na rua. - Falando sério agora. Sua mãe está orgulhosa de você, independente de onde ela esteja. - Apertei o volante com mais força. Eu não imaginava como ele sabia sobre a minha mãe, porque eu não havia falado com ninguém do escritório sobre isso. Mas então lembrei que ele também era amigo do meu pai, e isso pode ter escapado em alguma conversa. Suas palavras, de fato, me pegaram desprevenida. O que acabou me deixando sem respostas, então só mordi meu lábio em nervosismo.
Estacionei o carro na garagem do prédio, mas não fiz menção de sair. Ainda tinha quinze minutos antes de começar o expediente. Só queria ficar alguns minutos sozinha, entendeu e saiu do carro. Sem falar nada, sem provocação ou besteira. Apenas entendeu que aquele não era o momento para brincadeira. Mandei uma mensagem para meu pai e avisando que encontraria com eles no horário do almoço. Eu odiava passar o dia sozinha, em especial aquele, o qual indicava que minha mãe tinha partido há exatos três anos. Respirei fundo, entrando no escritório para trabalhar.


Almoçar com a e o nosso pai era sempre muito agradável. Um pouco nostálgico, mas eles sempre tentavam ao máximo deixar o clima descontraído. Além de estar mais feliz por ter ido bem na prova, deixando-a mais alegre e falante. Ela com certeza tinha puxado o nosso pai. Aquele lá, quando começava a falar, não parava mais, ela era igualzinha. Peguei meu casaco e a minha bolsa em cima da cadeira, pronta pra sair da minha sala quando abri encontrei com parado na frente da mesma, com o braço esticado pronto para bater na porta.
- Vamos?
- Claro. - Ele balançou a cabeça concordando. Parecia que tínhamos assinado um tratado de paz, pois não tínhamos nos estapeado ainda naquele dia. Na verdade, estava sendo ótimo levantar a bandeira branca, nem que fosse por algumas horas.


Já tinha tomado a quinta taça de vinho enquanto ouvia meu pai falar sem parar. Deus, quando ele começava a falar, você podia esquecer qualquer coisa, pois ele não parava mais. O homem não tinha freio. Eu já imaginava sobre o que era o assunto, e foi exatamente aquilo mesmo que ele conversou desde que chegamos. A mudança para a sua empresa. Há alguns meses, dois dos melhores empregados do meu pai tinham saído por motivos pessoais, desde então ele não encontrou ninguém a altura. Óbvio que ele ia querer que eu fosse trabalhar para ele. Já era de se esperar, ele queria isso desde que eu me formei, mas justamente para não misturar assuntos pessoais com a família, eu resolvi não ir. Pelo visto, agora eu não tinha tanta saída assim.
- Vocês já têm minha resposta. Agora, se me permitem, eu vou me retirar. Boa noite. - Eu estava cansada, aquela reunião não era tão necessária assim, pra falar a verdade. Mas acho que meu pai não quis fazer uma reunião no escritório dele, apenas para não ser tão formal.
- , mostre ao onde fica o quarto de hóspedes.
- Por quê? Ele mora aqui perto. - Lancei um olhar sugestivo para , recebendo um mal humorado do meu pai e outro malicioso de . Tava bom demais pra ser verdade.
- , por favor.
- Ok. - Resmunguei subindo as escadas, com ele em meu alcance.
Fechei a porta com força. Nós teríamos que dividir o mesmo quarto, porque o outro vazio certamente ficaria para o senhor Alexander.
- Por que não inventou nenhuma desculpa pra ir embora? Você mora aqui perto, não vejo necessidade de dormir aqui.
- Mas eu estou sem carro.
- Chame um táxi, um uber. Vai voando, te empresto a vassoura da cozinha.
- Hahá, como tá engraçadinha hoje. Acha mesmo que vou perder a oportunidade de dormir no mesmo quarto que você? Até porque hoje podemos terminar o que começamos na praia.
- Ah, vai se ferrar. - Peguei minha roupa e segui para o banheiro. Coloquei minha roupa ao lado da pia. Me despi e liguei o chuveiro. Eu amava aquela paz, o som da água caindo no meu corpo e o momento do dia que eu finalmente relaxava. Mas a paz parecia ter acabado no momento em que a porta foi aberta.
- O que você tá fazendo aqui? Não tá vendo que eu tô tomando banho? - Quase gritei, a tempo de lembrar que eu havia mentido e, na verdade, eu e éramos amigos. Amigos uma ova.
- Sim, estou vendo. A visão é ótima, aliás. - Eu estava de costas, torcendo para que somente a sombra do meu corpo fosse possível de ver com o vapor da água.
- , sai desse banheiro agora.
- Eu só estou mijando.
- Ah, claro, deu vontade de mijar logo agora.
- Pois é, eu não tenho controle sobre isso.
- Eu vou arrancar esse negócio que você chama de pênis e nunca mais vai te vontade de mijar na hora que eu tiver tomando banho.
- Ei, não demora. Também quero tomar banho. - Ele saiu como se nada tivesse acontecido. Eu estava atônita com tamanha a cara de pau dele, e de propósito demorei ainda mais no banho.
- Vai logo tomar banho, antes que eu te jogue pela sacada. E apaga a luz quando deitar. - Peguei meu celular, me jogando na cama em seguida. Havia algumas mensagens de , avisando que iria dormir no namorado. Droga, eu podia estar na minha casa sozinha essa hora. Mas eu tinha companhia para aquela noite. Infelizmente. Virei para o canto, me tapando com o edredom, quando escutei sair do banheiro. O cheiro do seu perfume exalava por todo quarto. A noite seria longa.
- … - Continuei quieta, fingindo estar dormindo. - eu sei que não está dormindo, então tente não roncar. Eu tenho sono leve.
- Vai se foder. - Ele apagou a luz por fim, deitando na cama ao lado da minha.
Eu já tinha me remexido várias e várias vezes, para todos os lados possíveis na cama e nada do sono aparecer. Olhei no meu celular e era quase duas da madrugada. Seriam necessárias várias xícaras de café no trabalho pra aguentar em pé o dia todo, mas o que eu queria mesmo é pegar no sono de uma vez.
- … - tinha a voz rouca e baixinha.
- O quê?
- Deita aqui.
- Não.
- , para de frescura. Você já se virou mil vezes nessa cama, é claro que não consegue dormir.
- Se encostar um dedo em mim, você sabe do que eu sou capaz. - Cedi o “convite”, sentindo o corpo quente de encostar no meu. Por que ele tava sem camisa mesmo? Só podia ser tortura. Eu podia odiar com todas as minhas forças, mas eu não podia ser hipócrita e dizer que ele não tinha um corpo bem definido. Deitamos um de frente pro outro, não tinha muito espaço, então eu conseguia sentir sua respiração bater no meu rosto.
- Posso te fazer uma pergunta?
- Uhum. - Resmunguei
- O que aconteceu com a sua mãe?
- Ela faleceu faz há exatamente três anos de leucemia, e mesmo com tratamento não resistiu.
- Eu sinto muito.
- Tudo bem. Mas eu acho que você sabe demais sobre mim. Me fala sobre você.
- O que quer saber?
- Sei lá, me fala sobre sua família. Seus pais ainda estão juntos?
- Sim, típica família feliz. - Ele riu baixo. - Desculpe desapontar você. - ele fez careta, me fazendo rir.
- Eu acho bonito família completa e feliz. Me faz acreditar que o amor pode ser possível, mesmo sendo muito difícil.
- Tão pessimista… - ele riu. - Enfim, tenho uma irmã mais nova que é médica, ou seja, não sou o orgulho da família. Mesmo minha mãe puxando meu saco às vezes. - ele deu de ombros me fazendo rir.
- Ah, sua irmã que deixou 50 tons de cinza lá na sua casa?
- Ela mesma. Aquele livro é péssimo, não sei como ela conseguiu ler aquilo, e são três.
- Então você leu?
- Só o primeiro.
- Estou surpresa. Quem diria, o senhor , tão temido pelos advogados do escritório, não é o orgulho da família e ainda lê livros eróticos! - Ele soltou um riso baixo, o acompanhei. - Mas não estou aqui pra te constranger. Isso você faz sozinho. Como é ter seus pais juntos há tanto tempo? - Mudei de assunto.
- Ah, sei lá, pra mim é normal, sabe, mas eu sei que dei sorte na vida. Mas sua família não fica atrás, eu vejo como você e a se dão bem. Não sou tão próximo assim da minha irmã, somos diferentes e ocupados demais.
- É, disso não posso reclamar mesmo. sempre foi minha melhor amiga, não tem nada que eu não possa contar pra ela.
- Contou da nossa aposta? - Ele me encarou. Tentei decifrar o que ele queria com aquela pergunta, mas não foi possível.
- Contei, não é nada demais. - Dei de ombros.
- E contou que me agarrou ontem na praia doidinha pra me dar uns beijos? - Ele disse com um sorriso de lado cutucando minha cintura.
- Ah claro, demorou pro velho e insuportável que eu conheço aparecer. - Dei risada e bati de leve no ombro dele. - Não, não contei. Ela foi dormir antes. - Pude sentir sua mão me puxando pela cintura, colando nossos corpos, enquanto ela subia pelas minhas costas, por cima da camiseta, num carinho gostoso. Ele não tinha malícia, por incrível que pareça. Mas eu me conhecia, e aí está o problema, nossos corpos não podiam ficar em contato por tanto tempo ou o meu corpo começaria a pegar fogo.
Eu queria ter mais autocontrole sobre o meu corpo, mas ele me deletava a cada toque de . Deixei me levar pelo seu cheiro e a vontade de ter sua boca colada na minha novamente. Estava se tornando um vício sentir o gosto do seu beijo, e o pior é que eu queria aquilo. Agora. Talvez fosse as várias taças de vinho falando mais alto, mas sinceramente não faria mais diferença a essa altura do campeonato. Grudei nossas bocas, sentindo apertar minha cintura com força, colando nossos corpos ainda mais. Como se isso fosse possível. Eu estava embriagada com o seu gosto, seu cheiro e seu toque. Não admitiria em voz alta, mas eu ansiava por aquilo desde o momento em que ele saiu do banheiro apenas de bermuda para dormir. Os cabelos bagunçados, deixando as gotas d'água caírem pelo seu corpo.
O ar já parecia ser insuficiente, mas eu não queria quebrar aquele beijo de jeito nenhum, também não. Quando me dei conta, sua boca já sugava meu pescoço e sua mão entrou por baixo da minha camiseta, me trazendo de volta à realidade.
- …- A respiração falha não negava o meu estado, mas eu precisava parar agora.
- , não… - Ele gemeu ainda dando atenção para o meu pescoço, quase descendo para o meu colo. O meu ponto fraco.
- É melhor não. - Segurei seu braço com força, ele entendeu e se deitou na cama ainda sem me encarar. Voltei a deitar rapidamente na minha cama, sem dizer uma palavra. Mas com vontade de não ter parado o que, mais uma vez, eu comecei.
- Boa noite, . - Não respondi, minha respiração falha denunciaria que eu não queria sequer ter parado.

Capítulo 5 - Quinta-feira

's Pov

Eu ainda encarava o teto do quarto, mesmo depois de dez minutos do celular ter despertado. Ao meu lado, dormia tranquilamente. De um jeito incrivelmente fofo e esquisito. A perna pra fora da coberta deixava à mostra sua tatuagem na panturrilha, a qual eu, até então, desconhecia. Os cabelos desgrenhados e a baba escorrendo no canto da boca até cair pelo travesseiro, a expressão suave em seu rosto a deixava ainda mais linda. Se ela soubesse que eu estava tendo essa visão, ela morreria de vergonha.
tinha virado meu mundo de cabeça para baixo. Poderia até ser exagero, mas ela me deixava louco. Não, eu nunca falaria isso a ela. Caso contrário, eu seria sua chacota para sempre. Nós tínhamos nossas desavenças, mas nada me impedia de admirá-la dormindo. Até porque eu não sabia quando isso aconteceria de novo. Era mais sorte que juízo.
A nossa aposta estava chegando ao fim. Apesar de ter levado um soco no nariz, eu estava gostando de passar mais tempo junto a ela. era imprevisível, decidida, carinhosa a sua maneira, amiga e leal. Eu sei, eu tô muito boiola pensando nela. Mas esses dias realmente têm me mostrado uma outra pessoa que eu ainda não conhecia. É como se a barreira que antes existia entre nós fosse se quebrando aos poucos, nos deixando mais vulneráveis um ao outro. Descobri coisas sobre sua família, sua mãe, sobre ela mesmo. Como, por exemplo, morder o lábio inferior quando ficava nervosa e sem resposta. Mas quando ela ficava feliz demais não conseguia disfarçar, só faltando saltitar de tanta felicidade. Às vezes ria de nervoso ou pra disfarçar quando estava triste, mesmo que não funcionasse. Eu não queria que aquela aposta acabasse. Eu também não queria ficar longe de .

Povs off


Acordei me sentindo estranha naquela manhã. Já era quinta-feira e eu deveria ficar feliz não? Afinal, a aposta estava acabando, assim como essa semana longa. O barulho do chuveiro ligado indicação que ainda estava no banheiro. Ele tinha uma voz bonita, enquanto cantarolava alguma música abafada pelo barulho da água. Era difícil admitir, depois de tanto tempo, eu tinha gostado de passar aqueles dias com ele. Deixando de lado todas as provocações, até que não era tão ruim assim. Além do beijo ser maravilhoso. Ah, aquele beijo.
- Bom dia, flor do dia.
- Bom dia, parece que alguém acordou feliz hoje.
- É a aposta, está chegando ao fim. - Então ele estava feliz?
- Não achei que fosse ficar tão feliz. Tenho certeza que pediu pra eu ser sua motorista pra poder passar mais tempo comigo.
- Ah, verdade, é que eu mandei meu carro pro conserto e como você perdeu a aposta deu tudo certo.
- Você é ridículo. - Entrei no banheiro, dessa vez trancando a porta para não ser interrompida. É claro que tinha algo por trás. Nossa, que ódio.
Tomei meu banho rápido, me vesti no banheiro mesmo, e quando saí, ele já não estava mais no quarto. Ainda fiz questão de demorar mais no quarto, com a intenção de descer quando estivesse próximo do horário de sair. Eu sei, era infantil. Mas eu odiava fazer social logo pela manhã sem nenhuma gota de café no estômago. Desci logo, ao contrário do que eu queria, minha barriga não deixava que eu ficasse muito mais tempo ali. Quem ouvisse os roncos acharia que existia um monstro dentro de mim.
O caminho até o escritório foi normal, silencioso. Eu estava gostando daquele silêncio. Era quase como se nós dois tivéssemos nos acostumado um com o outro. Mas a minha alegria durou pouco quando eu entrei na minha sala e encontrei Gerard sentado na poltrona em frente à minha mesa.
- O que quer aqui?
- Você já foi mais educada, .
- Não tenho por que ser educada com você. Anda, fala logo.
- Até quando vai durar esse casinho ridículo entre você e o ?
- Você é tão ridículo, sabia?
- O escritório todo tá falando.
- Deixe que falem. Eu não me importo mesmo. Agora faz um favor pra nós dois? Some da minha vida. - Abri a porta de novo, apenas esperando que ele saísse.

Eu estava pronta para convidá-lo, dessa vez eu o surpreenderia. Tentando manter aceso o resquício de coragem existente em mim, parei em frente à porta com o letreiro em dourado indicando que era a sua realmente. Entretanto, antes que eu pudesse bater na porta, escutei duas vozes vindo dali de dentro, reconheci a de e em seguida a de Alexander. Não sabia o que ele estava fazendo ali, mas a conversa chamou mais minha atenção.
- Não vai mesmo chamá-la para sair? Você tá caidinho por ela.
- Não fala besteira.
- , não perde essa oportunidade. Ela é uma pessoa legal e dá pra ver no olhar de vocês dois que rola um clima. Talvez, até um sentimento.
- Um clima de ódio só se for. Ela é completamente maluca, ela me deu um soco no nariz. - Então era isso. Eu achei que dessa vez ele estava sendo uma pessoa diferente, mas pelo visto continuava o mesmo cafajeste de sempre. Já não me importava se tinha a porcaria de uma aposta para cumprir. Só queria sair dali o mais rápido possível. Eu sabia que ele nunca ia mudar, mas todas aquelas falsas esperanças foram o suficiente para eu me iludir e quebrar a cara. Dessa vez, eu nem tentei e já havia me decepcionado. A pior parte.
Girei meus calcanhares, voltando para a minha sala. Fiquei lá dentro o dia todo, focando no meu trabalho. Mesmo com aquelas palavras ainda ecoando pela minha cabeça. Eu só queria ir pra minha casa ficar sozinha. Me senti uma adolescente estúpida por acreditar que em algum momento ele mudaria.


- Tá tudo bem? Você tá quieta hoje. - Ele quebrou o silêncio. Apenas balancei a cabeça concordando.
Se eu abrisse a boca, coisas ruins poderiam sair dali ou eu simplesmente desabaria. Estacionei o carro na calçada, em frente à sua casa, esperando ele sair.
- Chegamos, . Você pode sair.
- , o que aconteceu?
- O que aconteceu? Eu sou completamente maluca, afinal eu te dei um soco no nariz. Foi exatamente isso que aconteceu.
-
- Não , eu não quero ouvir o que você tem pra dizer. Já escutei o suficiente. Sai do meu carro, essa merda de aposta acaba aqui e agora. - Não encarei seus olhos, eu sabia que eles iam me trair de alguma forma. Eu já estava controlando as lágrimas dos meus para não ser ainda mais humilhante, depois de acreditar que podia acontecer algo realmente bom de toda aquela brincadeira. Depois de alguns segundos, ele saiu do meu carro, mas de nada adiantou se o seu perfume amadeirado continuou impregnado no banco ao meu lado. Dirigi de volta pra casa, de certa forma aliviada. Mas o sentimento de solidão que me invadiu foi mil vezes pior.

Capítulo 6 - Sexta-feira

Era estranho voltar a fazer meu trajeto habitual, quando naquela semana eu tinha acordado mais cedo, dirigido mais que o normal e havia mais uma pessoa no carro todas as manhãs e finais de tarde. De certa forma, havia mudado minha rotina e o pior de tudo: eu tinha gostado. Mas eu tinha que me acostumar novamente. Eu definitivamente precisava de férias. De sair, viajar, ir para outro lugar que fosse capaz de me distrair e fazer esquecê-lo, nem que fosse por alguns dias. Não sabia em que momento eu havia me tornado tão sentimental, mas esse não era um dos melhores para voltar a demonstrar sentimentos. Deixá-los presos era a melhor escolha.
Peguei a caixa em cima da mesa e dei mais uma olhada na minha sala. É, aquela não era mais minha sala e não sei de quem seria a partir de agora. Mas sabia que tinha feito o meu trabalho da melhor maneira possível. Saí em direção ao estacionamento, onde restavam apenas poucos carros. Certamente de colegas que ficariam até mais tarde trabalhando naquela sexta. Ironicamente, o carro de estava estacionando ao lado do meu, ele também guardava seus pertences no porta-mala.
- , a gente pode conversar?
- É sobre trabalho?
- Não.
- Então não temos nada pra conversar. - Ignorei sua presença e sentei logo atrás do volante, disposta a sair dali o mais rápido possível.
Cheguei em casa e ela se encontrava silenciosa. Depois que e Chris engataram o namoro, ela passava mais tempo na casa dele do que na minha. Alguém tinha que aproveitar, não é mesmo? Tomei um banho demorado e fiz uma janta para mim acompanhada de uma garrafa de vinho e uma comédia água com açúcar. Derramei todas as lágrimas presas dentro de mim com a desculpa de que o filme tinha causado tudo aquilo. O álcool me fez dormir feito uma pedra. Agradeço imensamente por isso, pois foi o único momento que eu deitei a cabeça no travesseiro, esqueci todos os problemas e apaguei.


Um mês depois



Cheguei um pouco atrasada naquela manhã no escritório. Isso indicava que meu dia seria uma catástrofe, pois nem uma xícara de café eu tinha conseguido tomar antes de sair de casa. Dei bom dia para Jennifer, entrando em minha sala logo após. Eu tinha um processo longo ainda para ser lido, só de pensar eu começava a ficar triste. Porém, algo indicava que meu dia seria diferente quando eu entrei na sala e encontrei um copo de café com um bilhete em cima da minha mesa. Ele não tinha sido depositado ali há muito tempo, pois o café se encontrava quente.
Tenha um bom dia. Aliás, você está atrasada.
Era só isso que estava escrito no bilhete, sem nome ou qualquer outra identificação. Não era a primeira vez que eu recebia um café pela manhã ou no início da tarde, logo após o almoço. Também não havia descoberto ainda quem estava mandando, apesar de ter minhas dúvidas. O que me deixava ainda mais intrigada, pois eu já estava trabalhando no escritório há quase dois meses. Não que fosse um problema, na verdade, café era uma das minhas bebidas preferidas, então eu nunca recusaria. Entretanto, eu não poderia nem retribuir a gentileza, por simplesmente não saber quem estava fazendo aquilo.


Senti a brisa bater em meu rosto quando me apoiei no muro do terraço. Era o único lugar que sempre ficava vazio e eu conseguia fugir da turbulência na hora do almoço. Também era o único que eu conseguia fumar sem ter ninguém no meu pé falando dos malefícios da nicotina, como se eu não soubesse. A vista dali de cima era ainda mais bonita no final da tarde, quando dava pra enxergar todo o pôr do sol na praia. Mas me contive com a vista do início da tarde, ela era linda, de qualquer forma. Dei mais uma tragada no meu cigarro, pronta para pegar outro, quando o barulho da porta de ferro pesada ecoou pelo ambiente. Não me movi, ainda tinha tempo de sobra até voltar ao trabalho. Mas a brisa fez o favor de trazer seu perfume até mim. Droga, como eu havia sentido falta daquele cheiro. Ficamos em silêncio, mais por falta de coragem de acabar abrindo a boca e estragar o momento do que por falta de palavras. Afinal, palavras para serem ditas era o que não faltava.
- Como você está? - Ele foi o primeiro a quebrar o silêncio.
- Bem, e você? - Senti seu olhar me analisar, mesmo que eu não tivesse o olhado ainda.
- Bem também. - Deu de ombros. Quando encarei seus olhos, eles ainda eram os mesmos quase transparentes que eu tinha aprendido a gostar, principalmente quando olhava de perto e me perdia neles. Seu cabelo estava mais curto e num tom de mais escuro, combinando perfeitamente com a barba rala em seu rosto. - A gente precisa conversar?
- Eu sei. - Concordei com a cabeça, deixando que ele começasse.
- Eu não vou perguntar o que exatamente você ouviu aquele dia, porque agora não faz mais diferença. Mas posso dizer exatamente o que você não ouviu. - Ele pagou o cigarro, soltando a fumaça pra cima e voltou a me encarar. - Depois que o meu tio saiu da minha sala, a primeira coisa que eu consegui fazer foi ligar pra minha irmã. Eu não consegui mentir pra ela. É incrível como irmãs mais novas têm esse poder, né? Então, eu percebi que estava pronto pra te chamar pra sair de novo, mesmo se de novo você dissesse não. Porque a última coisa que eu queria era ficar longe de você. - Eu não esperava por aquelas palavras, mas eu também não estava esperando coisa alguma vindo dele.
- Deus, por que você me chamou de maluca? Eu tive vontade de quebrar seu nariz de novo. - Apaguei o resto de cigarro, o encarando.
- Eu adoro quando você fica nervosa. - passou o polegar pela minha bochecha, senti minha pele esquentar com o seu toque.
- Eu ia te chamar pra sair, mas aí… você sabe o resto.
- Desculpa por ter sido um babaca e ter demorado tanto tempo pra perceber isso. Eu realmente gostei de ter passado mais tempo com você.
- Eu também.
- A gente é rídiculo.
- Fale por você. - O som de sua gargalhada ecoou pelo local, me fazendo rir junto. A gente parecia dois adolescentes, tirando conclusões precipitadas. Mas dessa vez as paranoias pararam de rodar pela minha cabeça. Se tudo tivesse esclarecido antes...
- Então, temos um encontro? - Ele voltou a ficar sério. As mãos no bolso da calça e os olhos atentos esperando uma resposta minha.
- Temos um encontro. - Vi um sorriso surgir em seu rosto. Tenho certeza de que eu estava da mesma forma. Ele se afastou, pronto para sair do terraço.
- ! - Ele virou de frente para mim quando estava próximo da porta. - Obrigada pelo café.
Voltei para minha sala mais leve naquela tarde. Como se um peso tivesse saído das minhas costas e agora eu pudesse seguir com a minha vida. Era estranho pensar todo o efeito que ainda tinha sobre mim. Mais estranho ainda era o tempo que levou pra tudo isso acontecer. Apenas uma semana. Uma aposta. Contei toda a nossa conversa para por mensagem, recebendo uma enxurrada delas assim que minha irmã visualizou tudo que eu havia mandado.


[n/a: se quiser acompanhar música < a target="blank" href=https://www.youtube.com/watch?time_continue=1&v=e-9aaLDIb_Y&feature=emb_title >Peer Pressure - James Bay< /a>]



Me olhei mais uma vez no espelho, pensando se mudava ou não de roupa. me encarava sentada na cama.
- O que você acha? - Ela se levantou, caminhando até mim.
- Inspira e expira. - fiz o movimento junto com ela, me acalmando de certa forma. - Você tá linda.
- Eu tô nervosa.
- Jura? - me puxou pelos ombros para fora do quarto. - Olha o homão que vai ter babando em você a noite toda. Apenas aproveite.
- Ok. - Coloquei meu celular e o batom dentro da bolsa. Dei uma última olhada no espelho do corredor. Ok, eu estava satisfeita com o que estava olhando. Optei por vestir um vestido marrom curto de alças finas e com pequenos detalhes em branco, uma sandália bege de salto baixo e, por fim, deixei meu cabelo solto. Eu havia mudado no mês passado. Finalmente passado a tesoura nas pontas e pintado para um tom de cobre mais escuro. A campainha tocou, me deixando alarmada de novo.
- Como eu estou?
- Parecendo uma adolescente pro primeiro encontro. Vai logo. - Ela me deu um tapa na bunda, é isso mesmo? Abri a porta ignorando todos os avisos que minha irmã gritava atrás de mim. Ela mandou eu usar camisinha. Ela tava me zoando né? Não acredito que depois de grande eu vou ter que bater nessa garota.
- Oi. - Minhas pernas bambas demonstravam o quanto eu estava nervosa. Nesse caso tinha razão, eu estava parecendo uma adolescente.
- Ei, você está linda.
- Obrigada. Vamos?
- Vamos, claro.
- Se divirtam. Não façam nada que eu não faria. - Ela gritou da porta, aumentando minha vontade de cavar um buraco e me enterrar ali mesmo.
- A é sempre discreta, né? - Ele disse quando chegamos próximo do seu carro.
- Só quando ela quer. - Me acomodei no banco do carona. Era muito bom não ser a motorista da vez. - Ei, lembra a última e única vez que você me deu uma carona?
- Lembro. Acho que agora eu posso confessar uma coisa.
- Depende, eu ainda posso quebrar seu nariz.
- Eu ganhei a aposta de propósito.
- Acredite, eu sei. Você acha mesmo que eu não ia conseguir beber três shots de tequila?
- Não sei, não.
- Eu tinha acabado de tomar três litros de cerveja. Você me respeita, .
- Não está mais aqui quem falou. Chegamos. - Ele estacionou em frente Whisky a Go Go
- Eu adoro esse bar. Sempre tem música ao vivo.
O bar estava cheio, como era esperado, visto que estávamos no verão americano, e Santa Mônica ficava ainda mais lotada de turistas. Depois de esbarrar com algumas pessoas no bar, conseguimos uma mesa próxima da palco, onde uma banda local se apresentaria mais tarde. voltou com dois shots de tequila e uma cerveja em mãos. Meus olhos brilharam com as bebidas, principalmente quando ele me entregou a tequila e a cerveja.
- Pronta? - Estiquei meu shot na altura do seu, brindando em seguida.
- A nós.
- A nós.
Sair com , depois de todo o tempo em que ficamos afastados era uma caixinha de surpresas. Eu não sabia exatamente o que esperar dele. Mas eu também sabia que dessa vez era só nós dois, prontos para manter uma conversa adulta e sermos francos com nós mesmos. A banda que subiu ao palco, mais tarde naquela noite, tinha um som bacana. Alguns covers como The Doors, No Doubt, System of a Down, Led Zeppelin, KISS, Guns N' Roses, AC/DC e Linkin Park foram tocados. Então entendi por que havia escolhido aquele bar. O som era exatamente o estilo que ele curtia, mas o ambiente era totalmente o que eu gostava. Ou seja, agradava a nós dois.
- Eu já volto. - Depositou um selinho em meus lábios e saiu em direção ao palco. Vi quando ele falou com um cara que estava arrumando os instrumentos, ele ajudou a subir no palco e lhe entregou um violão. Meu deus!
- Boa noite. - As pessoas ao redor começaram a prestar atenção quando subiu no palco e a luz forte focou em nele. - Essa música é para uma pessoa muito especial. Eu sei que ela já me ouviu cantar antes, mas no chuveiro não conta, né? - Eu já começava a ficar nervosa, passei a minha mão suada no meu vestido, mesmo sabendo que não adiantaria de nada. Só o que me restava era esperar e ver o que ele estava aprontando. Os acordes Peer Pressure do James Bay começaram a ser dedilhados no violão, eu amava aquela música. parecia outra pessoa em cima daquele palco, poderia facilmente dizer que ele estava até um pouco tímido com tantos olhares em cima de si mesmo.
- Seven texts, 2 AM. Halfway dressed, all saying: Call me up. You can't sleep, you’re testing me. Bad but sweet, and I'm just tryna keep it together, oh. - Eu já tinha escutado ele cantar antes. Mas realmente, no chuveiro não conta. Ao vivo era bem melhor. As luzes se apagaram, deixando o público cantar junto com . Eu sabia que não estava diferente, nem tentava esconder o sorriso que invadiu meu rosto.
A performance de no palco parecia que ele já estava familiarizado com o ambiente. Eu estava amando ver aquele outro lado dele, até mesmo suas caretas enquanto cantava e sorria logo após. O público animado cantou o refrão mais alto, até eu entrei no clima. Podia ser a cerveja falando mais alto, mas podia ser a nova chance que eu estava me dando e nada mais importava.
- You're dancing around on my mind every second, I'm under control 'til you're in front of me. Maybe I'm scared, I don't care, I'm addicted. I'm in it. - Um arrepio passou pelo meu corpo ao ouvir a última parte da música enquanto ele olhava em minha direção. Era só mais um arrepio causado por ele naquela noite e ela mal havia começado. Enquanto isso as borboletas faziam a festa na minha barriga. Outra coisa que eu também não estava me importando em sentir. desceu do palco com um sorriso tímido, algumas pessoas o cumprimentaram, e eu podia sentir que ele não faria isso nunca mais na sua vida, já que seu rosto começava a ficar vermelho.
A primeira reação que eu tive foi beijá-lo quando senti seus braços na minha cintura. Sentir seu toque junto de seu beijo era quase como um calmante para o meu corpo. Não sabia o quanto tinha sentido falta disso até aquele momento. Entrelacei meus braços no seu pescoço e deixei fazer o resto. A melhor parte de tudo isso é que agora nós dois não precisávamos de uma desculpa para nos beijarmos.
- Então, como eu me saí? - perguntou quando encerramos o beijo, ainda que ele insistisse em beijar meu pescoço.
- Para um cantor, você é um ótimo advogado.
- Poxa, que pena. Eu tenho mais músicas pra você.
- E eu vou escutar na minha casa ou na sua?
- Na minha. Agora.
O barulho da porta batendo atrás de mim era o único som possível de escutar na casa, além dos nossos gemidos. Sim, havia muita pressa e desejo para que as nossas peças de roupas chegassem logo ao chão. Contudo, não queríamos nos desgrudar para que isso fosse possível. As minhas pernas envolta da cintura de , enquanto sua mão me segurava pelas coxas era a combinação perfeita para os nossos corpos permanecerem grudados. Ainda que eu estivesse tentando desabotoar sua camisa o mais rápido, não conseguia manter minhas mãos em um só lugar. Elas viajam entre seus cabelos, costas e nuca. Passava minhas unhas em toda a extensão de seu corpo, sentindo-o arrepiar. Não demorou para que a barra do meu vestido fosse subindo conforme as mãos de faziam o mesmo caminho. Antes que ele puxasse meu vestido pra cima, consegui abrir todos os botões de sua camisa e ela logo fez companhia a outra peça no chão. Não estava tão justo, visto que eu estava só de lingerie e ele ainda tinha mais duas peças da cintura pra baixo vestidas. Talvez a gente tenha tropeçado em algumas coisas no meio do caminho, talvez algumas estejam estivessem no nosso. Eu nunca saberia dizer ao certo. Mas tudo deixou de ter importância quando a porta de seu quarto foi aberta e eu senti o colchão bater em minhas costas.
- Você é a minha melhor aposta, . - Os olhos de percorreram toda extensão do meu corpo, assim como os meu fizeram o mesmo com o dele.
- Você é a minha aposta, . Para sempre. - A respiração ofegante era apenas um detalhe, porque queríamos e teríamos muito mais naquela noite. Na nossa noite.
Procurei mais uma vez por seus lábios com urgência. Eu poderia procurar mil vezes pelo seu beijo e me encontrar nele em todas as vezes. Eu também poderia deixar meu corpo explodir em êxtase com o seu toque e com cada sensação que ele causava em mim. Deixei todos os meus medos no passado, junto com as mágoas e ressentimentos. Eles não faziam mais parte da nova , porque a nova estava satisfeita demais com o que o destino havia reservado para ela. Então, aquele sinal que eu havia pedido alguns meses atrás na praia de Santa Mônica estava bem ali na minha frente. Agora, mais do que nunca, eu estava no caminho certo. Nossos corpos tornando-se um só era a única coisa certa. era a minha aposta daquela e de todas as noites que se seguiram.

Epílogo

Cinco anos depois


Pendurei o último quadro na estante. A foto retratava o dia em que começamos a aposta. Um de frente para o outro brindando o shot de tequila. Nem sabia que naquela noite, onde tudo começou, havia um fotógrafo. Joey acabou comentando com um tempo depois, e eu entrei em contato pedindo para que me mandasse a foto. Agora ela se encontrava na estante da nossa sala, da nossa casa. Porque agora é tudo sobre nós.
Eu não saberia dizer o quanto eu estava sendo sortudo por estar fazendo parte da vida de . Se alguém me dissesse que logo aquela mulher mudaria a minha vida e hoje estaríamos casados, eu com certeza diria que a pessoa estava enlouquecendo. Mas já faz um tempo que eu percebi que não havia outra pessoa no mundo a qual eu gostaria de acordar ao lado. O seu sorriso bobo, os pequenos olhos castanhos e suas mãos delicadas em mim eram as melhores coisa quando eu abria os meus olhos todas as manhãs. Nós ainda vivíamos como gato e rato, discordando de tudo que era possível. Mas no fim do dia ter seu corpo junto ao meu fazia eu amá-la ainda mais, apesar de todas as nossas diferenças. Eu ainda advogava, mas já havia largado a área jurídica há quatro anos, um pouco antes do nosso casamento. A gastronomia chamou muito mais sua atenção, além de ter se tornado uma terapia para ela. Chegar em casa e ver ensinando alguma receita nova para Lucy, nossa filha de três anos, e as duas sujas de farinha era o combustível ideal para aguentar mais um dia. Os dois sorrisos que eu mais amava no mundo.
- Papai! - Lucy correu em minha direção. Peguei-a no colo a girando no ar, do jeito que ela gostava.
- Oi, amor. - me abraçou pela cintura. Passei um braço pelo seu ombro, colando seu corpo ao meu. - Como foi seu dia?
- Bom, melhor agora que estou com as mulheres da minha vida. - Beijei-a com ternura, quase me perdendo naquela calmaria que sempre transbordava.
- Vamos tomar um banho mocinha e depois descemos pra jantar com o papai.
- Deixa que eu dou banho nela. Mas sem brinquedo dessa vez, abelhinha. - Subi para o quarto de Lucy, enquanto colocava a mesa para o jantar. A nossa filha estava crescendo rápido e começava a entrar na fase de querer comer sozinha. Então, normalmente era uma festa de comida para todo lado. Depois que consegui colocar Lucy para dormir, não sem antes contar uma história de super herói para ela, era sua temática favorita, deitei ao lado de , ela terminou de ler seu livro e colocou na cômoda ao lado da cama, se aninhando em meu peito.
- Amor...
- O que foi, babe?
- O que acha de aumentar a família?
- Acho uma ótima ideia. Lucy vive pedindo um irmãozinho. Por quê?
- Porque talvez ele já esteja no forninho. - Ela mordeu o lábio nervosa e me encarou.
- Não brinca comigo. - colocou minha mão em sua barriga. - Eu descobri no início da semana e não sabia como contar. - Eu mal podia esperar para passar toda a gestação ao lado de e aproveitar cada momento com ela. Às vezes eu ficava mais emotivo do que ela, que carregava uma criança em seu ventre. Mas só de imaginar que outro ser estava sendo criado e era fruto nosso, eu ficava ainda mais bobo e apaixonado. Olhei nos olhos de e ela ainda esperava uma resposta minha, mas minha resposta era uma só e ela sabia.
- A cada dia que passa eu tenho certeza de que sou o homem mais feliz do mundo. Você, a Lucy e agora essa sementinha que está a caminho me fazem querer ser uma pessoa melhor a cada dia. Eu te amo tanto, .
- Você é o melhor. O melhor pai, marido e amigo que eu poderia pedir. Eu te amo tanto, . Você é a melhor parte de mim.
Se me perguntassem se eu gostaria de mudar algo na minha vida, a minha resposta com certeza é não. Porque tudo que eu preciso está bem aqui do meu lado. é o meu tudo.


Fim.


Nota da autora: Eu de novo aqui hehehe. Aí eu tô muito apaixonada por esse final e espero que vocês estejam tanto quanto eu. e merecem todo o amor do mundo. Espero que vocês tenham gostado e se a resposta for sim pode deixar um comentário ali embaixo e fazer essa mera autora feliz. É isso, até a próxima :)




Outras Fanfics:
Em Andamento:
» Girl Next Door [Bandas - McFLY]
» Hiding[Restritas - LGBTQIA+]
» I’ll Stand By You[Bandas - McFLY]
» Last Mistake[Restritas - Originais]
» Threat Of Joy [Originais]
» Um novo começo [Originais]


Ficstapes:
» 05. Too Much To Ask [Ficstape Niall Horan: Flicker]
» 06. POV [Ficstape McFly: Radio:Active]
» 12. Nothing Else Matters [Ficstape Little Mix: Glory Days]
» 16. Hoax [Ficstape Taylor Swift: Folklore]


Finalizadas:
» I’m still In Love With You [Restritas - Originais - Shortfic]
» Close [Esportes - Fórmula 1 - Shortfic]
» We’ll All Be [Bandas - McFLY - Shortfic]

Qualquer erro nessa fanfic ou reclamações, somente no e-mail.


Caixinha de comentários: O Disqus está um pouco instável ultimamente e, às vezes, a caixinha de comentários pode não aparecer. Então, caso você queira deixar a autora feliz com um comentário, é só clicar AQUI.


comments powered by Disqus