Prólogo
Capítulo 1
Eu observava tudo no mais profundo silêncio enquanto sentia a raiva percorrer minhas veias como lava fervente; meus olhos permaneciam fixos na figura do “ilustre” diretor.
Reunidos ali, estavam os representantes dos times esportivos do colégio – desde os garotos do time de lacrosse até os reclusos membros do time de xadrez. Todos, sem exceção, fuzilavam o time masculino de natação. Por causa dos imbecis, o orçamento dos times foi reduzido a quase zero.
Direto e sem qualquer piedade, Mister Hopkins, o nosso “adorável” diretor, assumiu a responsabilidade pelo ato de vandalismo dos astros do colégio. A comoção por parte dos capitães dos clubes foi o suficiente para levá-lo a ser mais gentil, aplicando uma punição sobre os times de natação. Contive-me para não perder o controle. Teria uma conversa franca e sincera com o diretor. Não admitiria tal injustiça com as minhas garotas!
O almejado nacional estava ainda mais distante, porém, estava ao alcance das minhas mãos para fazê-lo pagar! Oh, sim! Não deixaria o dono dos olhos escapar ileso de destruir o objetivo da minha equipe! Minhas garotas não seriam prejudicadas por causa dos imbecis do time masculino. Eles experimentariam em suas peles as consequências de se meter com uma .
Eu suportava a presença irritante de por pura convivência, dois poderiam jogar o mesmo jogo! Ele não era muito esperto só pelo fato de me provocar. Suas armações de certo modo eram previsíveis, não menos irritantes, mas eu conseguia suportá-lo devido ao fato de que logo me formaria e não o teria em meu campo de visão. No entanto, o que eles haviam aprontado tinha ultrapassado todos os limites! Era baixo demais até mesmo para .
“A escolha para quem iria as nacionais era clara e tão certa como o nascer do sol: Mister Hopkins escolheria os bastardos responsáveis pelo ato de vandalismo.”
Estavam sentados naquela arquibancada apenas os times de natação e alguns garotos do time de futebol. O resto dos times foi liberado, desse modo, as regras de como funcionaria a partir de agora era proclamada com bastante ênfase e diligência: um ônibus para transportar ambas equipes, as competições, amistosos e campeonatos estavam agendados para o mesmo período... As farpas eram trocadas em palavrões e ofensas em um tom que o diretor não pudesse ouvir.
Prossegui com o meu silêncio, porque abordaria aquele impassível diretor no momento certo! Sabia exatamente onde pressioná-lo para atender minhas exigências. Havia segredos demais naquela cidade, e todos sabiam que um segredo não permanecia encoberto por muito tempo.
— No que está pensando, love? — a voz que eu mais odiava soou atrás de mim. O hálito quente chocou-se contra o meu pescoço; o odor enjoativo e o tom de voz entregavam o responsável pela origem dos meus problemas.
— Na forma mais lenta de aniquilar a trupe de imbecis — virei-me para . O sorriso mordaz e zombeteiro permeava seus lábios; seus braços encontravam-se cruzados diante seu torso bem definido, fruto dos anos na natação.
— Você pode ter o que quiser apenas sorrindo, love — se inclinou em minha direção com seu charme natural, que me causava repulsa. Aquele brilho de desafio me fazia cerrar os pulsos de modo a não desferir socos contra aquela face exultante.
— Não preciso disso! Ao contrário de você, sou inteligente o suficiente em evitar escândalos.
Revirei os olhos diante à falsa demonstração de “ferimento” que minhas palavras lhe causaram.
— Não fala nesse tom frio comigo, baby, você sabe que me ama — ele esbarrou em meus ombros ao passar por mim, seguindo em direção ao seu fã-clube pessoal.
— Claro, amo o quanto seu amigão encolhe na água — pisquei para ele, antes de seguir para fora das arquibancadas. Pude ouvir as gargalhadas do nosso público enquanto eu descia as escadas. Precisava alcançar Mister Hopkins antes que ele entrasse em seu amado escritório.
— Me ame menos, ! — gritou do alto das arquibancadas com uma postura relaxada. Seus olhos me diziam que ele retribuiria o que havia feito.
— Impossível! — virei brevemente minha cabeça sobre meus ombros. — Não se pode diminuir uma emoção inexistente — dirigi-lhe os dois dedos do meio, antes de seguir em direção à sala do diretor.
Ao longe, ainda conseguia ouvir o som das gargalhadas.
Meu par de All Star ecoava no piso de cerâmica enquanto eu praticamente corria pelos corredores. Alto demais, irritantemente chamativos. Alunos inteligentes demais desviavam do meu caminho, enquanto os acéfalos atrapalhavam minha trajetória até a bendita sala. E, é claro, havia o grupo dos detestáveis, meu karma pessoal: os populares.
Não era que eu não me encaixava nessa categoria, apenas não tinha interesse e esforço para ficar apenas na superfície da realidade. Seus interesses rasos e futilidade me causavam enojo! Eu não tinha tempo a perder. Havia duas coisas importantes em minha vida: faculdade e o time de natação. Não havia tempo para comparecer às festas, casos de uma noite ou qualquer outra coisa que ocupasse meu precioso tempo.
Ao passar por Stacy, Astrid e Ana Beth, ouvi-as soltar comentários audíveis em depreciação. Sorri para elas de modo angelical, antes de agradecer-lhes com ironia e sarcasmo presentes em cada sílaba proferida por meus lábios.
— Obrigada pelos elogios. É uma pena que eu não tenha tempo. Boa aula, vadias! — mandei um beijo no ar enquanto piscava um olho com um sorriso angelical, contrastando com o tom de voz usado. Afastei-me, revirando os olhos.
Minha irmã mais velha conhecia a família de Astrid, a rainha das vacas do colégio. Astrid era a típica líder de torcida com alguma DST, no entanto, com um abismo pelo meu odioso rival: . Sua atração por ele e ódio por minha figura demonstravam sua falta de neurônios.
No colégio D’Antelli, os nadadores eram os favoritos, e não os comumente jogadores de futebol. A população feminina se derretia pela pele descoberta dos garotos da natação; as competições era uma zona de piranhas.
Ao atingir, enfim, a porta do diretor, constatei que ele não estava lá. A porta estava trancada, e a secretaria, vazia. Afastei-me e fui em direção ao terraço do prédio, tomando as escadarias do lado leste. Precisava respirar antes de encarar a senhorita Oliver. A professora de química era muito fácil de se dobrar, caía facilmente no papo furado do time masculino de natação, os imbecis que pareciam estar todos na minha grade de horários. Não havia uma aula em que pelo menos um membro dessa odiosa equipe não estivesse presente.
Ao chegar no último degrau, abri as portas de ferro e encontrei Becky e Roman dividindo um baseado, apoiados na caixa d’água do colégio, relaxados e desalinhados. Becky estava apoiada nas pernas de Roman enquanto encarava o céu.
— Vocês dois deveriam parar de ser tão óbvios — recriminei-os por estarem tão à mostra.
— E você deveria aprender a se soltar mais, senhora Certinha — Becky soltou a frase antes de tragar mais de seu baseado.
— Ela tem as notas perfeitas, comanda o time feminino de natação, se candidatou à Ivy League... Ela não vai se soltar, baby — Roman riu, imaginando alguma versão mais tendenciosa minha.
— Cala boca, Roman — revirei os olhos, dirigindo-me à mureta e apoiando meu tronco enquanto absorvia a brisa fresca, bem longe do odor pungente de maconha.
— Dia ruim? — Becky questionou alto o suficiente para que eu pudesse ouvi-la.
— Semanas ruins, você quis dizer, Becky — Roman disse e calou-se em seguida, após eu fuzilá-lo com um olhar desagradável.
— Terei longos meses pela frente, Becky — dei de ombros, olhando em seguida para o meu relógio. Tinha ainda mais cinco minutos antes de me dirigir à aula da senhorita Oliver.
— Soube que ele destruiu uma propriedade e o colégio assumiu a responsabilidade. — Roman comentou casualmente.
— Você estava lá, bastardo! — Becky ralhou com seu namorado enquanto desferia tapas em seu braço, o que não afetou muito a figura de Roman.
— Por causa daquele imbecil e sua falta de neurônios, o time feminino tem poucas chances de conseguir o auxílio do colégio para chegar ao nacional — fuzilei Roman com raiva. Por causa daquela festa idiota, minhas garotas teriam de suportar os imbecis do time masculino.
— Ainda bem que não me chamo ! — Roman riu, descrente. — Ele está tão ferrado!
— Pode apostar nisso!
Capítulo 2
A frustração pelas medidas impostas por Mister Hopkins e a falta de bom senso pela trupe de imbecis que ocuparam a minha manhã tornaram meu humor intragável, fazendo meu sangue ferver e descontar de modo involuntário a raiva naquelas que não possuíam culpa alguma. Jane Valentine estava com a respiração acelerada, demonstrando seu cansaço e fadiga – algo que evidenciava que ela não estava bem. Meu olhar deslocou-se entre o cronômetro e as anotações em minhas mãos, antes de lhe dar uma explicação.
— A torção de seu músculo está te atrasando. Cinco décimos — expliquei minha ordem repentina.
— Desculpa, — Jane içou-se para fora da piscina e encarou a água com desgosto, evitando, assim, o meu olhar.
— Não precisa se desculpar. Você não é culpada pelo meu mau humor — direcionei-lhe um olhar afetuoso antes de seguir caminhando pela borda da piscina.
— Não se cobre tanto, — ouvi Jane comentar. Embora seu tom demonstrasse solidariedade, havia também uma decepção tácita consigo mesma, devido ao fato de não estar em boa forma como almejava.
Dei-lhe um aceno antes de prosseguir avaliando o desempenho de Sam e Betsy. Ambas utilizavam do nado borboleta como o estilo principal, embora fossem exímias nadadoras em nado de costas. Os movimentos delas eram fluídos; as braçadas eram precisas e cortavam a água sem muito esforço. O subir e descer do corpo, impulsionando-as, eram certeiros, tornando o tempo delas ótimo. No entanto, para chegar ao nacional, estava fora do ideal.
Eu montaria uma rotina de treinos em solo antes de seguir para os da água. A respiração e o condicionamento haviam decaído graças aos feriados prolongados dos quais havíamos retornado há duas semanas, mas parecia que fazia poucos dias de acordo com os resultados nos treinos. O inverno logo se aproximaria, e então haveria as festas de fim de ano...
O desastre para qualquer equipe!
Anotei algumas considerações sobre quais exercícios aeróbicos e outros de fortalecimento da musculatura, tudo de acordo com os pontos principais que deveriam ser melhorados de cada nadadora. Precisava manter as garotas numa rotina, caso contrário, o nacional seria apenas um conto de fadas inatingível!
A equipe feminina do colégio D’Antelli havia evoluído muito! Estávamos entre as melhores equipes do condado. Éramos respeitadas. Já havíamos competido com outros colégios em amistosos e alguns campeonatos, porém, não tínhamos conseguido chegar ao nacional. Nas eliminatórias antes das semifinais, enfrentávamos o Colégio Boulevard. A equipe feminina e masculina de natação possuía uma equipe nível Olimpíadas. Por estarmos no mesmo estado, éramos obrigados a competir, e o melhor representava o estado no nacional. Como consequência da falta de investimento no time feminino e a desvalorização, acabávamos perdendo a vaga para a equipe do Boulevard.
Estava tão focada em minhas anotações quando, de repente, senti meus pés serem tirados do chão, e em segundos estava na água. Minha prancheta com todo o trabalho do mês estava no fundo da piscina. Mergulhei, recolhendo-os após submergir. Meus olhos fuzilavam – minha pedra no sapato, a variável desastrosa que causou o problema central da minha equipe poder competir.
O maior boçal sobre a face da Terra!
Coloquei a prancheta e os papéis encharcados sobre ao piso antes de me içar para fora da piscina. Meu alvo estava a poucos metros de mim; atrás dele havia todo o time masculino. Todos, sem exceções, já estavam preparados para entrar na água.
— Isso foi pelo que falou mais cedo, love — meneou a cabeça com um sorriso odioso em seus lábios.
— O mundo não dá voltas, , ele capota! — pronunciei cada palavra pausadamente, antes de ver Verônica despejar corante na água.
— Estarei aguardando pacientemente — ele se pronunciou antes de me dar as costas e seguir com os garotos até o outro lado, iniciando, assim, o treino deles.
— O que vai fazer a respeito, ? — Jass questionou ao meu lado, segurando as minhas coisas.
— Garotas, todas para o chuveiro! — senhorita Moretz, nossa treinadora, surgiu e nos expulsou para o vestiário.
— Farei pagar caro! — cuspi as palavras antes de seguir para o vestiário.
— !
— !
— !
As garotas surgiram atrás de mim no vestiário; a impaciência e inquietação eram expressadas no tom de suas vozes. Todas cruzavam os braços em frente ao tronco, e os olhos delas me observavam com curiosidade.
— Verônica colocou corante na água, mas não vamos fazer só isso! — sorri de forma angelical. Enquanto isso, um plano surgia em minha mente.
— Não é só isso! — Jass sorriu empolgada ao perceber o brilho em meu olhar.
— Vão para o chuveiro e chequem o shampoo e produtos de higiene antes de usá-los. Não queremos repetir o desastre azul — ordenei, seguindo para o meu armário. Então, vi que minhas roupas haviam sumido. — Eu vou matar o ! — esbravejei.
— ? — Sam me questionou, confusa.
— Os imbecis pegaram as nossas roupas! — Violet guinchou furiosa ao abrir seu armário.
— Vou assassinar aqueles babacas! — Felícia exclamou, fechando a porta do armário num estrondo.
— Algumas de vocês têm uma tesoura? — questionei, pegando a chave do vestiário masculino debaixo do banco, o local em que eu a escondia.
— Eu tenho duas! — Denise estendeu-as em minha direção.
— Ótimo! Agora vamos dar a volta por fora e dar um jeito nas roupas deles — sorri, abrindo a porta de emergência, que dava para o lado externo do ginásio de natação.
Demos a volta pelo lado externo até chegarmos à porta de emergência do vestiário masculino. Betsy e Sam me ajudaram a pegar as roupas dos garotos. Então, as levamos para o vestiário feminino, tomamos um banho e reorganizamos as peças, transformando-as em roupas completamente diferentes do que eram: calças em saias e shorts, camisas em vestidos, camisetas rasgadas para um estilo detonado...
Donatella e Jasmine eram fãs de moda, então não foi um desafio tão grande vestir o time e utilizá-los como modelos para suas novas criações.
Saímos do vestiário com as cuecas dos imbecis em nossas mãos, e, a cada mural ou quadro de aviso avistado, uma a uma ia sendo fixada. Kendra lançou para todos os alunos do colégio a dúvida de quem pertencia cada uma delas.
havia declarado guerra. Se era o que ele queria, assim seria!
Como esperado, as mensagens haviam se espalhado feito fogo em pólvora. O mistério das cuecas pregadas nos quadros de avisos por todo colégio estava divertindo os alunos. Era realmente engraçado ver suas reações diante o que havíamos feito. A equipe masculina de natação havia misteriosamente sumido. As aulas prosseguiam sem que qualquer um dos imbecis marcassem presença, e em muito tempo pude desfrutar de um pouco de paz.
Enquanto anotava as informações proferidas pela senhorita Zimmer, senti meu celular vibrar em minha mesa. Discretamente o desliguei e o joguei em minha bolsa – não perderia qualquer milésimo de tempo com distrações extras, além de fazer aprender a nunca mais se meter comigo! Minha mão movia-se de acordo com as palavras ditas pela professora de matemática; suas explicações sempre eram úteis e aplicáveis em mais de um contexto. Senhorita Zimmer possuía o talento de transformar uma equação complicada em algo fácil, simples de se resolver; muitas de suas dicas eu usava nas disciplinas de física e química.
Com o objetivo de atingir as melhores faculdades, eu mantinha minhas notas impecáveis. Era necessário abdicar de noites divertidas ao lado das garotas para madrugadas enfurnada em pilhas de anotações. Nessas noites, separava meu tempo para duas coisas: a equipe de natação e a faculdade. Estudava todos os pontos que podia evoluir, quais necessitavam de maior atenção... Era um processo realmente exaustivo, no entanto, valia cada segundo gasto! As ideias e soluções sempre rendiam uma evolução na equipe e no meu desempenho acadêmico.
Após a professora encerrar a aula com alguns exercícios para o dia seguinte, ela me chamou até sua mesa.
— Eu sei que está focada em passar nos exames das principais faculdades, — ela iniciou, sentando-se confortavelmente em sua cadeira.
— De fato — concordei, ajeitando meu rabo de cavalo. Senti-o frouxo, então apenas separei o cabelo em dois antes de firmar.
— Você precisa relaxar mais, querida. Está desperdiçando uma fase realmente importante — senhorita Zimmer se inclinou para frente com o cenho franzido.
— Queira me desculpar, senhorita Zimmer, eu realmente entendo seu ponto de vista. De verdade! No entanto, é o que eu quero! A faculdade sempre foi meu sonho. A natação é divertida, tenho ótimas amigas por causa disso, mas meu futuro vem primeiro! — tratei de ser o mais objetiva possível, mas buscando expressar-me de modo educado.
Eu adorava aquela professora!
— Realmente me intriga que existam jovens como você, querida — ela se levantou com um olhar agradável em sua face.
— Não dizem que somos o futuro da nação? — brinquei meio descontraída, arrancando um sorriso tímido de minha professora.
— De fato, querida!
Capítulo 3
— Será que essa colegial precisa de uma repaginação no guarda-roupa? — falei entre risos, divertindo-me às custas de .
— Você passou dos limites, ! — ele cuspiu as palavras num tom controlado, tentando não transparecer sua raiva.
— Claro, assim como você e seus seguidores roubando nossas roupas! — revirei os olhos, porém, ainda rindo dele.
— Tem como parar de rir por um minuto e levar isso a sério? — exclamou, claramente sem paciência.
— Com você vestido dessa forma?! Impossível! — sequei o canto dos olhos, ainda rindo. Discretamente peguei meu celular e, então, tirei uma foto dele.
— O que pensa que está fazendo? — ele deu um passo, avançando em minha direção de modo ofensivo.
— Recordação desse momento único! — guardei rapidamente meu celular em minha bolsa.
— Eu tenho sido cavalheiro até agora, — passou a mão pelo seu cabelo, tentando se acalmar enquanto respirava fundo.
— Seu exemplo de conduta seria honrado na era vitoriana... — rolei os olhos, dando-lhe as costas e seguindo em direção ao meu carro.
— Onde pensa que está indo? — ele se apressou em me acompanhar.
— Não que seja da sua conta, mas estou indo para casa. Algo que você deveria ter feito, não acha? — apoiei-me na porta do meu carro, pronunciando cada palavra com certa irritação.
— Onde estão minhas roupas? — colocou seus braços ao lado do meu corpo, tentando causar qualquer reação em mim.
De modo displicente, ergui meu joelho, atingindo o meio de suas pernas, exatamente em suas partes íntimas.
— Não pense que só por ser a merda de um babaca, figurinha favorita do nosso “amável” diretor, possui o direito de ousar me intimidar — agachei-me em sua frente, segurando o maxilar dele e o olhando em seus olhos. Cada palavra dita era exprimida com repulsa. — Lembre-se bem de hoje. Você no chão com essas roupas ridículas e eu o deixando com o ego ferido.
— Você não sabe com quem está lidando, — ouvi a voz furiosa de soar em minhas costas.
— Você que não sabe com quem foi se meter, ! — dei-lhe um aceno antes de entrar em meu carro e deixar o estacionamento.
Pelo retrovisor, pude vê-lo encarar as lanternas de meu carro. Seu olhar era indecifrável, porém, seus punhos cerrados me diziam o suficiente. Gargalhando, deixei o colégio para trás enquanto dirigia pelas ruas da pacata cidade de Fygrets. As ruas pelas quais eu seguia ladeavam os penhascos, onde as águas do pacífico se chocavam.
Estacionei o carro em frente à humilde fazenda em que vivia. Meus pais distribuíam leite diretamente para os habitantes locais. Meus três irmãos mais velhos trabalhavam dia e noite ao lado de meus pais, e minha irmã mais velha foi esperta o suficiente para se mudar para a capital. Não era uma vida cheia de luxo, porém, era agradável. Eu tinha uma família maravilhosa – claro que, como toda família, havia as diferenças, mas elas eram superadas pelo amor sentido uns pelos outros. O vínculo falava mais alto e isso bastava!
Desci do carro, trancando-o após recolher meu material. Avistei Garrett e Héctor no meio do campo de centeio, então acenei para eles antes de seguir para a frente da casa. Subi os degraus da varanda antes de abrir a porta.
— Estou em casa! — gritei, anunciando minha chegada.
— Estou na cozinha! — mamãe gritou, indicando o local em que estava.
Dirigi-me até lá, brincando com Duque e Trex, nossos cachorros, pelo caminho. Ao adentrar pela porta da cozinha, fui atingida pelo aroma delicioso da refeição que minha mãe preparava.
— Como foi a aula, querida? — ela perguntou, olhando sobre seu ombro.
— Nada fora do comum — dei de ombros, apoiando-me num dos armários.
— Seus dias nunca são comuns, querida. A prova disso é exatamente essa roupa estranha que está vestindo — comentou com um olhar divertido.
— pregou uma peça na minha equipe, mas, no fim, ele acabou sofrendo as consequências — sorri, dando de ombros referente ao que havia dito.
— Vocês dois ainda vão acabar se matando...
— Ou casando — meu pai acabou surgindo no recinto, completando a frase de minha mãe.
Dei-lhes um olhar de completo choque com o absurdo proferido por eles. As expressões leves nas faces de ambos só confirmavam sobre a crença deles sobre o que haviam dito. Eles realmente pensavam isso sobre essa relação de ódio entre e eu.
— Claro! Tudo o que eu quero é acabar ao lado de um boçal! — revirei os olhos, indignada.
— Diante tamanha intensidade do que sente pelo pobre garoto, é impossível não pensar a respeito — meu pai falou calmamente, fazendo com que minha mãe risse discretamente.
— Como você pode desejar que sua filha fique ao lado de um garoto que roubou as roupas dela? — olhei-o completamente surpresa.
— E você me apareceu vestida assim, tenho certeza que ensinou a ele bons modos! Eu sei que criei bem a minha menina! — ele beijou o topo de meus cabelos.
— Você sabe que seu pai está certo! — minha mãe arqueou uma sobrancelha ao ser questionada pelo meu olhar.
— Vocês são impossíveis! — acabei rindo antes de seguir em direção às escadas, que me levariam ao segundo andar.
— Também te amamos! — ouvi o grito de meu pai soar pela casa enquanto eu subia as escadas.
Dirigi-me até o meu quarto e ali me despi antes de seguir até o banheiro. O dia havia sido longo e eu precisava me livrar dos vestígios dele, recuperar minhas energias e então, por fim, dormir.
— Não se provoca um sem estar preparado para as consequências!
Capítulo 4
Tão natural como respirar, era nadar para mim.
Sem esforço, eu movimentava-me no lago acima do oceano, que ficava dentro das terras da minha família. Apreciava o início da manhã com um mergulho. Com o inverno se aproximando e o fim da colheita, logo se tornaria impossível nadar ali. Com uma última volta, subi para a margem, deitando-me contra a relva ainda molhada com o orvalho da madrugada. O céu já estava em um tom puro de azul e nenhuma nuvem podia ser avistada. Respirei fundo, absorvendo os odores e fragrâncias do oceano, e daquele recanto silencioso que era o pequeno bosque que separava as terras de arado do precipício rochoso sobre o qual o lago era formado.
Levantei-me, após passar alguns minutos de olhos fechados sem pensar em nada; enrolei-me no roupão previamente preparado e segui para o celeiro.
Devido a alguns acidentes com os animais, dos quais meus irmãos e meu pai acabavam sujos, minha mãe obrigou meu pai e avô a construírem um banheiro – ou no celeiro ou em uma pequena cabana – para que pudessem se limpar sem precisar atravessar o bosque para chegar ao lago. O fato era que ele havia se tornado útil para mim, devido à minha rotina de toda manhã nadar no lago.
Após o banho, coloquei roupas mais quentes e segui para casa, que estava movimentada mediante o fato de que todos acordavam cedo. Passei pela cozinha e roubei um bolinho das mãos do meu irmão antes de subir correndo as escadas em direção ao meu quarto. Meus pais e meus outros dois irmãos mais velhos apenas riram da cena.
A manhã havia decorrido de modo assustadoramente calmo; as figuras ilustres da trupe de imbecis não haviam dado o ar da graça, e isso me deixou completamente desconfiada. Evitei a piscina, procurando iniciar a rotina em solo que havia refeito na noite passada.
Embora soubesse que a equipe masculina levaria de dois a cinco dias para retornarem, nada os impedia de executar alguma vingança contra as minhas garotas. Era uma armação atrás da outra – ficar em alerta era o melhor a se fazer. E embora a pele dos garotos demorasse a perder o tom alaranjado, eu duvidava que o diretor permitisse que toda a equipe perdesse mais de cinco dias de aulas, devido aos feriados de fim de ano em três semanas.
Sendo assim, levei as garotas no período da tarde para se alongarem e correrem em torno de toda a área do colégio.
Não foi até a metade do terceiro dia sem que e sua trupe de imbecis retornassem ao colégio que o capitão da equipe masculina iniciasse, assim, a sua armação.
Eu estava presa numa reunião com outros capitães dos clubes daquela instituição quando fui chamada pelo “adorável” diretor. Como filho de uma das pessoas mais poderosa daquela cidade, iniciou sua jogada com algumas punições do diretor para a equipe feminina. Porém, até aquele instante, estava tudo bem. Era algo esperado solicitar apoio de sua mãe; era o que sabia fazer de melhor! Filho único e o orgulho da cidade, não sabia o que era realmente valioso, muito menos conhecia o que era mérito próprio.
Não foi até o horário da saída no dia seguinte que seu verdadeiro plano tomou forma. Sua jogada começou com apenas algo comum... Seu verdadeiro proposito estava em me humilhar.
Ao ligar o carro, o interior foi preenchido por uma explosão de cores – os imbecis haviam sabotado meu carro! Saí do automóvel para, então, escorregar, caindo contra o chão de concreto. Parecia que o colégio inteiro assistia o que foi armado contra mim.
Levantei-me com cautela, notando o grupo das minhas garotas se aproximarem correndo. Dei-lhes um aceno para não virem em minha direção.
Faria pagar por aquele ato!
O meu reflexo era um desastre completo. Soltei o meu cabelo, arrumando-o, e com um doce sorriso, virei-me para o público:
— Vocês não são muito inteligentes, seguindo fielmente as ações de — balancei a cabeça num aceno decepcionado, enquanto minha voz soava incrivelmente doce. — Quanto ao responsável disso... — apontei para o carro e minhas roupas. — Eu o farei pagar, mas quanto às fotografias e aos vídeos desse ocorrido... — adotei uma postura relaxada enquanto permanecia com uma expressão doce. — Vocês sabem que as coisas não acabam bem para aqueles que ficam no meu caminho — dei-lhes uma piscadela e mandei beijinhos antes de caminhar na outra direção, discando o número de Becky.
Enquanto passava por eles, um caminho era aberto: minha “guerra” com o capitão da equipe masculina de natação era algo que todos tinham conhecimento. Nossas armações consistiam em atos desastrosos e um problema gigante, caso nossos pais se envolvessem. Era um acordo tácito – não colocávamos nossos velhos nisso e prosseguiríamos com o próximo movimento.
Eu sorria por todos pelos quais passava enquanto indicava para não tirarem fotos. Meus olhos caçavam Becky e Roman, eles eram uma dupla dinâmica. Encontrei-os logo atrás do prédio de química; ambas figuras possuíam um cigarro em seus lábios. Assim que me aproximei, Roman se engasgou com a fumaça de seu cigarro enquanto Becky deixava o seu cair.
— . Sim, ele teve a audácia de realizar isso — respondi as indagações presentes nos olhares de meus amigos. — Quando eu te ligar, atenda!
— O que você vai fazer estando assim? — Becky me questionou após o choque.
— Ela vai ensinar boas maneiras ao — Roman gargalhou, jogando-me as suas chaves. Parecia burro, mas o problema dele era ser um desgraçado espertalhão. — Mande um “olá” por mim — ele gargalhou ao me ver dar as costas a eles.
— ! — Becky gritou meu nome, alcançando-me.
— Eu não vou fazer nada... — respondi o olhar preocupado presente na face de minha amiga.
— Ainda — Roman murmurou antes de tragar seu cigarro.
Becky e eu o olhamos com repreensão. Ele deu de ombros antes de voltar para seu cigarro com um riso em seus lábios. O olhar de Becky voltou-se para mim enquanto uma linha de tensão se formava em seus lábios. Ela estava preocupada, embora não fosse necessário.
— Vocês estão indo cada vez mais longe com isso, — murmurou, cansada. Seu braço estendeu até minha face, limpando-a com cuidado.
— Segunda lei de Newton — afastei-a com cuidado e um sorriso tranquilo antes de correr em direção à moto de Roman estacionada a poucos quilômetros dali.
Não se provoca um sem estar preparado para as consequências!
Capítulo 5
Não foi até o instante em que meu celular começou a tocar que reparei no outro aparelho vibrando... A tela exibia milhares de mensagens da vítima da vez de . Sorri ao ler as mensagens após estacionar em um mercado, de modo que conseguisse verificar o que continha nele. Porém, antes disso, mandei uma mensagem para todos os contatos dele com o endereço de Yvan, como se estivesse os convidando para uma festa.
conhecia aquele colégio inteiro. Até o instante em que se desse conta do desaparecimento de seu carro, teria que lidar com a multidão no quintal de Yvan.
Fiz um backup geral, enviando-o para um e-mail que pouco utilizava, apagando-o logo após o envio. Retornei ao colégio e estacionei no local em que havia deixado Roman e Becky. Joguei as chaves da moto para Roman assim que desci do carro com um sorriso brincalhão. Ele começou a rir, desacreditado, enquanto Becky se apoiava contra o prédio às suas costas.
— Como? — ele ria ao balbuciar. — Você acabou de sair daqui.
— é óbvio demais, não há nada que eu não saiba sobre aquele babaca — respondi-o enquanto empurrava a porta de emergência do prédio de química. O alarme não disparou porque o diretor ainda estava na instituição. Eu conhecia os horários de Mister Hopkins.
— Não faça nada que vá se arrepender depois, — Becky me alertou antes que eu entrasse no prédio.
— Ele pediu por isso — respondi-a, então segui para as escadas.
Subi os dois lances antes de entrar na sala onde eram guardadas as substâncias químicas para os experimentos na aula. Abri um sorriso ao constatar que a porta estava destrancada. De fato, a senhora Rouver era uma senhora de idade e andava esquecendo as coisas com frequência. Observei atentamente os tubos e selecionei dois líquidos que, juntos, causariam uma explosão – as aulas de química sempre eram úteis em casos assim. Segui ao depósito no subsolo, repus os tubos que tirei da sala e fechei a porta do prédio em seguida.
— O que você pretende fazer? — Becky analisou o que eu segurava.
— Pensei que já haviam partido — desconversei, guardando os recipientes em minha bolsa antes de entrar no carro outra vez.
— Obrigado por não bater a moto desta vez! — Roman gritou assim que saí dali.
Procurei a área longe das câmeras e ali estacionei o carro de após dirigir por meia hora. Aquele lugar era um ponto deserto, e perfeito para explodir um automóvel. Misturei os líquidos, coloquei o tubo dentro do carro e comecei a correr.
Com aquela aparência, eu não seria reconhecida. A cidade inteira conhecia minha imagem de garota perfeita, e apenas os alunos e professores do Colégio D'Antelli sabiam sobre a rixa que e eu tínhamos. A gargalhada que saía dos meus lábios atrapalhava meus passos, e, embora a explosão a abafasse, forcei-me a ir o mais rápido que podia, deixando o carro em chamas para trás.
Atingi a área traseira do colégio, segui para o complexo de esportes e passei a pista de atletismo antes de atingir o lado externo do vestiário feminino. Por ser a capitã, eu carregava as chaves comigo. Destranquei a porta.
Por todo o trajeto até ali, evitei a área de câmeras. saberia que tinha sido eu, e isto bastava. Caso minha imagem fosse pega pelas câmeras, a mamãezinha dele se envolveria, e isso geraria uma dor de cabeça!
Retirei minha roupa após trancar ambas as portas, depois deixei a muda de roupa de emergência debaixo dos meus olhos. A água lavava aquele arco-íris que me atingiu no instante em que liguei meu carro. Após lavada, passei no armário de Verônica, peguei o corante usado por ela e segui para o vestiário masculino. Deixei a sacola com minhas roupas sujas no banco enquanto seguia para a área de banho, colocando o corante no shampoo dos rapazes e nas loções que já eram azuis. Verônica havia utilizado um corante diferente que estava na minha sacola.
Após feito isso, deixei o celular de dentro de seu armário, como se ele tivesse esquecido ali.
Depois de tudo isso, liguei para meu irmão mais velho, passando pelas câmeras frontais da instituição. Elas seriam a testemunha de que fui tomar um banho após o espetáculo daquele dia. A ligação confirmaria minha carona para casa, deixando a hipótese de eu ter pegado o carro de algo improvável.
Meu irmão atendeu no terceiro toque e, após uma longa explicação, ele aceitou me buscar.
Enquanto não chegava, acenei para Mister Hopkins quando ele passou por mim em seu caminho para casa. Ele olhou para a sujeira ao redor do meu carro com desagrado e murmurou o nome de com desgosto enquanto massageava as têmporas.
Não muito depois disso, meu irmão surgiu com o caminhão de entregas. Ele engatou meu carro na traseira assim que me observou. Com um aceno, indicou o banco do carona e se dirigiu até o carro do diretor. Liguei o rádio para ignorar a conversa do lado de fora. Héctor era um homem de poucas palavras, mas exprimia com maestria seus pensamentos. Desse modo, recostei-me no banco enquanto aguardava o retorno do meu irmão.
— Vocês dois deveriam escolher suas ações, — Héctor se pronunciou assim que adentrou o automóvel.
— que começa, eu só o lembro de seu lugar — respondi-o com cuidado.
Héctor era pacífico, embora me repreendesse com seriedade. Porém, era Garrett quem eu evitava provocar... Ele era conhecido por seu temperamento explosivo.
— Não entendo como papai é tão calmo a seu respeito. Logo serei eu o de cabelos brancos, caso essa birra entre e você prossiga — ele deu-me uma piscadela enquanto bagunçava os meus cabelos.
— Sou a filha mais responsável, todos sabem disso — dei-lhe uma cotovelada de brincadeir enquanto começava a cantar, em seguida, a banda favorita de meu irmão que soava no rádio.
— Você não tem jeito mesmo! — ele riu, acompanhando-me em seguida.
Roman e Becky me esperavam do lado externo do colégio – estranhei tal ação. Naquele instante, eles estariam no terraço relaxando antes do primeiro horário.
A face de Becky demonstrava certa preocupação.
Aproximei-me após desejar “bom dia” ao Garrett. Meu irmão havia se voluntariado a me levar para o colégio antes de realizar as obrigações do dia.
— Recomendaria evitar os corredores principais... — Roman comentou com um sorriso zombeteiro nos lábios.
— Quão ruim está a situação? — provoquei-o enquanto seguia com eles pelo portão.
— A mãe de Yvan ficou furiosa com nosso querido capitão, então ambos Yvan e estão te caçando logo cedo — Becky suspirou, cansada, ao notar que tanto Roman quanto eu não estávamos levando a situação a sério.
— Relaxa, Bexy. faz a jogada dele e a só devolve o movimento — Roman beijou a testa de Becky de modo a distraí-la. Ele me deu uma piscadela enquanto apontava sutilmente à minha esquerda.
— Para todos os efeitos, vocês não estão envolvidos — mandei um beijo para Becky antes de seguir para o lado apontado por Roman.
— Terei rugas cedo demais por sua causa, ! — Becky apontou para mim com “seriedade”.
— Eu também te amo, Bexy — utilizei um tom jocoso ao pronunciar o apelido de Roman para minha amiga. Supostamente era romântico; porém, soava incrivelmente engraçado para meus ouvidos.
Ao me afastar deles, senti meu pulso sendo segurado. Como Roman havia previamente me avisado, levava-me pelos corredores com a face inexpressiva.
— Bons modos nunca foram o seu forte — comentei ao soltar meu braço.
— A sutileza lhe cai bem — Yvan surgiu do alto das escadarias da entrada do prédio secundário.
— Vamos lá, garotos, eu não tenho o dia todo — abri um sorriso doce ao notar a área em que estávamos. Ambos me posicionaram para ficar sobre o foco das três câmeras.
— Sabemos que você é a responsável por trás dos atos de ontem — Yvan elevou sua voz, estufando seu peitoral de modo presunçoso.
— Agora seu subordinado fala por você? — arqueei uma sobrancelha ao olhar para enquanto apontava para Yvan. — Olha, eu não faço ideia do que está me culpando, mas chega a ser uma implicância sem sentido — dei umas palmadinhas no ombro esquerdo de Yvan ao passar por ele.
— Onde está meu telefone? — me questionou após alguns minutos.
— É claro que ela o destruiu... — Yvan foi interrompido por algo.
Virei-me, encontrando a mão de sobre um dos ombros de Yvan. me olhava com uma mensagem clara de aviso. O sorriso que despontou em meus lábios era verdadeiro – estava me divertindo com a situação.
— É uma cidade pequena, — comentei com casualidade, não deixando nada ser revelado. — E sabe o problema de cidades como a nossa? — continuei a me afastar, parando próximo à porta que me levaria às escadarias, por sua vez, próximas da sala em que estava ocorrendo o meu primeiro horário de aula. — Segredos — dei-lhe uma piscadela antes de passar pela porta, ouvindo às minhas costas um xingamento proferido num tom baixo.
O problema daquela cidade era possuir segredos demais. O problema de era estar em mais de um deles... E sabia que eu conhecia todos eles!
Capítulo 6
Outras equipes haviam cessado os treinos e atividades esportivas, tudo em prol dos feriados que se aproximavam, enquanto meu treinamento seguia cada vez mais rígido. A rotina consistia em exercícios de resistência fora da água. Eu havia pedido orientações aos técnicos da equipe masculina de atletismo e a técnica da equipe feminina de vôlei.
O ar frio do outono estava mudando para o tom característico do inverno. Portanto, eu buscava soluções que não afetariam a saúde das minhas atletas. Dedicava-me noites a fim de garantir o bem estar de todas; eu as conhecia, não eram apenas um meio para um fim... Cada uma das integrantes do time era importante para mim. Ao avaliá-las, eu buscava orientá-las para atingirem o melhor delas mesmas. A rigidez era utilizada como meio para garantir a ordem, porque minhas garotas poderiam ultrapassar alguns limites por metas absurdas.
— ? — Verônica surgiu no meu campo de visão. Estava sentada na sala da nossa técnica; meus olhos, anteriormente, analisavam os dados coletados do último mês. — As atividades já acabaram, logo será o horário de fechar o colégio.
— Eu perdi a noção do tempo — pisquei os olhos, esticando-me, alongando os músculos adormecidos.
— Bem que imaginamos! — Diana surgiu na porta com um sorriso compreensivo. — Você está se cobrando demais.
— E por se preocupar tanto com a equipe... — Verônica iniciou a frase com um tom brincalhão.
— Hoje jantaremos no restaurante de família da Jass — Diana completou com uma piscadela.
— Não aceitaremos um “não”! — Verônica reforçou enquanto alcançava meu casaco.
— O que eu não faço por vocês?! — abri um sorriso enquanto buscava minha bolsa.
— Você é nossa capitã, mas ainda é uma colegial! — Diana retirou as chaves das minhas mãos, trancando ela mesma o escritório da nossa técnica.
— Você precisa se divertir mais, — Verônica me deu uma piscadela sugestiva enquanto sorria maldosamente.
— Vejo que nossa estimada capitã foi vencida! — Betsy comemorou no meio do estacionamento.
— Não a provoque ainda! — Jane a repreendeu, tentando segurar o riso.
— Vencida?! ? — meu irmão mais velho surgiu pela entrada do colégio com um sorriso zombeteiro nos lábios.
Sam e Jass foram as mais expressivas em demonstrar o interesse no meu irmão.
— Não enche, Garrett! — olhei-o com falsa indignação.
— Olha só que irmãzinha petulante eu tenho! — ele riu, andando em minha direção com um olhar de quem estava tramando algo.
— Não ouse! — afastei-me, jogando minha bolsa para uma das garotas enquanto analisava meu irmão.
— Eu não farei nada! — ele sorriu, oferecendo-me sua expressão mais angelical. — Prometo! — fez um “X” sobre seu peito esquerdo como um juramento.
— Garry, não... — ri enquanto testava meus pés, preparando-me para correr.
— Não o quê? — ele sorriu de lado antes de começar a me perseguir.
Meu irmão mais velho me forçou a correr entre os carros das garotas que ainda estavam estacionados; ele passava sem nenhuma vergonha dentro deles para me alcançar – eu sabia que ele me venceria! Garrett fez parte da equipe de futebol desde o primário. Ele era um atleta por natureza, e sua resistência era muito mais alta que a minha por auxiliar diariamente na fazenda da nossa família.
Em dado momento, enquanto eu fugia dele, Garrett me agarrou, lançou-me sobre seus ombros e me deixou de ponta-cabeça enquanto corria comigo. Era impossível não rir, a cena por si só era hilária.
— Tinham de ser os — a voz profundamente irritada do diretor surgiu de repente, colocando o estacionamento num estado de silêncio.
Garrett me colocou no chão, porém, com um ar provocativo. Aproximou-se do diretor, abraçando e o tirando do chão facilmente. Virei a face, buscando abafar o riso diante à careta que tomou a face do diretor, que era um misto entre pura indignação, irritação e surpresa.
— Você precisava se alimentar direito, Mister Hopkins. Desse jeito, como poderá perseguir os pobres coitados dos estudantes? — Garrett utilizou um tom de repreensão enquanto sinalizava para as garotas entrarem nos carros.
— Vejo que continua o mesmo de sempre... — Mister Hopkins se limitou a ajustar as roupas, espanando uma poeira invisível de seus trajes. — O que está fazendo aqui após as aulas?
— Vim buscar minha adorável irmã, já que o carro dela foi danificado por um certo aluno de sua instituição — meu irmão utilizou seu tom sério enquanto mantinha a face numa expressão relaxada. — Mantenha-o na linha, o senhor me conhece... Acidentes acontecem o tempo todo! — o sarcasmo permeado pelo tom brincalhão atingiu de modo certeiro o alvo. Garrett era conhecido por suas armações ao longo dos anos em que estudou no colégio D’Antelli.
Meu irmão me levou ao carro de Jane, abriu a porta e sinalizou para que eu entrasse. Então, abaixou, dando um beijo em minha fronte.
— Eu falo com nossos pais para que você possa passar a noite fora — ele piscou um olho para Jane antes de fechar a porta.
— Eu sou perfeitamente capaz de fazer isso! — respondi-o com irritação.
— Não posso mais cuidar da minha irmãzinha? — ele se apoiou na janela aberta do carro.
— Você sabe que se não parar com isso logo...
Garrett me interrompeu:
— Nem ouse terminar, sua pestinha! Eu conheço bem a irmã que eu possuo — riu enquanto se afastava. O olhar de carinho me deixou com ambas bochechas vermelhas. — Não faço nada do que eu faria! — falou alto, com um sorriso torto.
— Eu tenho mais neurônios que você e Hector juntos! — gritei assim que Jane passou por ele com o carro.
— Também te amo, peste! — ele gritou, balançando a cabeça negativamente enquanto ria.
As garotas foram inteligentes o suficiente para se manterem quietas até o instante em que adentramos o restaurante da família de Jass...
— Vocês não conseguem disfarçar o claro interesse naquele acéfalo! — comentei, sentando-me no canto próximo à janela.
— Seus irmãos não são ruins de se admirar, — Valentine comentou descaradamente enquanto se sentava em minha frente.
— Vocês não convivem diariamente com eles, essa ilusão ia ruir rapidinho — respondi-a, rindo da expressão de Jass.
— Você menospreza a sua própria genética, capitã! — Sam comentou em um tom de ofensa.
— Seus irmãos não nada mal, ! — Jass deu algumas risadinhas.
— Ao invés de estarem falando deles, por que não me respondem quando surgiu esse súbito interesse naqueles dois? — questionei-as, utilizando o mesmo tom de capitã dos treinos.
— Estamos fora daquele colégio, . Relaxa um pouco, okay?! — Betsy jogou a bolinha de guardanapo que ela fez.
— Isso, viemos até aqui para que você possa relaxar! — Jass prontamente concordou.
— E o que as madames desejam? — o pai de Base surgiu, surpreendendo-nos.
— O que você tiver de melhor! — Verônica prontamente respondeu, descarada.
— Verônica! — Jass a olhou, abismada.
— Não tem problema! Está tudo bem, princesa — ele piscou para a filha enquanto anotava os pedidos feito em meio ao caos, quando todas resolveram falar o que queriam. — E você, o que vai querer, querida? — o pai de Jass indagou-me após anotar tudo.
— Eu não tenho algo em mente — respondi distraidamente.
— ! — minhas garotas me repreenderam em uníssono.
— Hey! — olhei para elas sem entender.
— Posso surpreendê-la com uma das nossas especiarias? — ele me perguntou com um sorriso amigável.
— Confio na sua escolha — ofereci-lhe um sorriso educado.
— Sintam-se à vontade para pedirem o que quiser — ele nos ofereceu um sorriso alegre antes de se afastar.
— Acho que nossa capitã está travada no quesito de diversão... — Diana utilizou um tom provocativo.
— De fato! Que saudades da velha ... — Sam lamentou dramaticamente.
— Ela era tão divertida... — Betsy até suspirou, encarando-me com decepção.
— Cuidado com o que desejam! — utilizei um tom calmo, solicitando um suco ao garçom que estava passando por nossa mesa.
A noite, a partir dali, foi uma confusão. Como estávamos num canto reservado do estabelecimento, isso as deixou empolgadas, o que levou a uma corrente crescente de imprudência... De fato, foi divertido, porém, devíamos ter incomodado aqueles que desejavam uma noite tranquila.
Capítulo 7
Dei às garotas uma folga do treino, com a condição de que elas praticassem alguma atividade produtiva no lugar – o que eu duvidada que ocorreria! Tomei um banho para relaxar os músculos e, assim que as aulas se encerraram, mandei uma mensagem aos meus irmãos para que surgissem mais tarde por ali, pois treinaria sozinha naquela tarde.
Após devidamente alongada, segui para a área das piscinas, onde se encontrava no mais reconfortante silêncio. Posicionei-me na plataforma utilizada para saltar na água. Toquei-a com as mãos, arrumando corretamente minha postura e pés, de modo que eu pudesse me lançar com o melhor impulso. Respirei fundo, absorvendo o odor do cloro de piscina e algo único daquele ambiente. Enfim fechei os olhos e, quando os abri, vislumbrei o campeonato que ocorreria na metade de janeiro.
Em minha mente, eu não estava mais no Colégio D’Antelli, na arena utilizada para o treino das equipes de natação. Eu me encontrava no ginásio da cidade vizinha utilizado para competições escolares e universitárias, além do uso para a população. Ouvindo uma corneta imaginária, lancei-me em direção à água. Meu corpo absorveu o impacto enquanto eu buscava tomar impulso antes de começar a dar braçadas. Então, entre elas, eu tomava fôlego, atingindo a água da maneira que já estava familiarizada...
Meus músculos estavam cansados após nadar por horas. Havia me levado até o limite, praticando os diferentes estilos: peito, costas, livre e o borboleta. O fato era que eu poderia competir em qualquer um deles, no entanto, como um capricho, competia apenas pelo nado borboleta.
Lancei-me novamente na água e mergulhei em direção ao fundo da piscina, passando por baixo das divisórias das raias, contendo a respiração pelo maior tempo que conseguia. Caso sentisse a necessidade de ar, subia à superfície e retornava ao fundo. Pratiquei isso por algum tempo. Quando me cansei, relaxei meu corpo e boiei pela piscina, de olhos fechados, sentido a temperatura da água e suas leves ondulações.
O silêncio me acalmava, silenciando qualquer pensamento inútil...
Porém, inesperadamente, algo bruscamente fez sua entrada naquele recanto de paz. Meu corpo foi repentinamente tirado da água, e uma voz que não ouvia há algum tempo irrompeu pelo ginásio:
— Vamos, ! Você não pode ter se afogado! — o tom de preocupação me surpreendeu.
— Obviamente que não! — afastei-o abruptamente, sentando-me. Meus olhos encontraram o alívio nos orbes de . — O que o levou a concluir tal estupidez? — indaguei-o, extremamente zangada por ser interrompida.
— Você estava há minutos sem se mexer — ele não ofereceu maiores explicações; seus olhos percorreram minha face numa análise silenciosa.
— ! — respirei fundo e massageei minhas têmporas, controlando meu temperamento. — Por que estava me observando durante esse tempo? — questionei-o num tom mais calmo, porém, ainda agressivo.
— Apenas verificando — se levantou sem oferecer mais detalhes.
— Desde quando se importa com minha condição?! — questionei-o, confusa, enquanto me levantava também.
— E desde quando o que eu falo tem algum valor? — ele me respondeu com um sorriso sarcástico em seus lábios.
— Não possui! — fui categórica em confirmar, assegurando tal fato. — O problema é que está agindo de modo atípico. Se está armando algo, que seja direto — aproximei-me dele enquanto exprimia meus pensamentos.
— Você não está preparada para tal coisa, love — abriu um sorriso como tivesse contado um segredo que apenas ele poderia entender. — Você não é tão esperta como pensa ser! — piscou um olho para mim, em seu modo conquistador barato.
— Do que você tem tanta confiança?! — empurrei-o contra a parede ao lado das portas duplas, que dariam para o lado externo do ginásio. — Você é muito presunçoso, egocêntrico e insuportavelmente irritante, e muito idiota em provocar aquela que está em pose de seus maiores segredos — abri um sorriso provocativo enquanto uma de minhas mãos segurava seu maxilar. Meus olhos estavam fixos no olhar furioso de . — O gato comeu a sua língua? — provoquei-o após alguns minutos de silêncio.
Antes que eu pudesse reagir, senti a frieza da parede contra minhas costas úmidas. segurava minhas duas mãos acima da minha cabeça apenas com uma de suas mãos. Uma de suas pernas estava me segurando no lugar, de modo que eu não pudesse lhe dar uma joelhada – o que eu faria, caso conseguisse!
— Estou sendo paciente e piedoso, love. Você sabe que passou dos limites com sua última jogada — um tom que eu nunca ouvi utilizar permeou sua voz, de modo firme, causando-me arrepios. — Vamos prosseguir nossa disputa ridícula enquanto você mantém essa boquinha atrevida fechada a respeito de assuntos que não lhe diz respeito! — a respiração quente de tocou a base de meu ouvido, após ele sussurrar suas palavras em um tom baixo, porém sério.
— Nunca ouvi tanta besteira em minha vida! — cuspi as palavras, furiosa. Eu me movia tentando me soltar das garras de . — Você consegue se superar! É um poeta calado!
— Como eu disse... — ele levou seu indicador e polegar aos meus lábios, o que eu respondi a tentar mordê-los. — Mantenha essa boca atrevida em silêncio, eu não lhe darei outra chance! — me soltou, afastando-se com um sorriso de diversão em seus lábios.
Antes de desaparecer, ele deixou seu olhar recair por minha figura como um trunfo. Fechei meus punhos, enquanto a inspiração e expirava várias vezes, de modo a não cometer nenhum crime.
Eu acabaria com !
Capítulo 8
Hector me esperava no estacionamento com a caminhonete de entrega, adentrei-a em silêncio.
Em minha mente, os momentos ocorridos na área da piscina se repetiam num loop perturbador, enquanto a irritação tornava meu humor intragável naquele momento.
Meu irmão foi perspicaz em se manter em silêncio, no lugar de me questionar, ele apenas aumentou o rádio. Era por ações como essas que preferia a companhia de Hector a Garret; amava-os demais, porém, Garret era persistente demais... Ele não me deixaria em paz até que obtivesse as respostas que desejava.
Deixei minha mochila no quarto, enquanto pegava minha roupa de banho seguindo para o lago. As roupas permaneceram no celeiro, enquanto prossegui meu caminho pelo bosque; assim que atingi a área do lago, pude respirar mais calma, eu me sentia em paz ali.
Sentei-me próxima à margem que era limitada por uma faixa de grama separando o penhasco do lago; os ventos ali estavam mais frios devido ao oceano abaixo. Aquela imensidão azul engolia aos poucos os raios do pôr-do-sol.
Estava mais calma do que anteriormente, porém, os eventos de horas atrás ainda me perturbavam. Estava frustrada por não ter paralisado diante o último olhar de . Ele escondia algo muito maior do que havia descoberto.
Deitei-me sobre a grama, elevando meu olhar para o céu, o qual possuía tons de púrpura, um laranja suave e faixas de um vermelho meio rosado.
— O que eu ainda não percebi? — Questionei-me em voz alta, o som das ondas contra as rochas abaixo foi a única resposta que obtive.
Fechei meus olhos, inspirando e expirando repetidas vezes, esvaziando minha mente de pensamentos inúteis.
— Espero que não esteja planejando entrar no lago.
Uma voz grave e levemente provocativa me fez abrir os olhos; a figura alta e robusta de meu pai estava a poucos passos de distância, seus olhos possuíam um olhar misto entre a preocupação paternal e uma curiosidade.
— Hoje não. — Respondi-o, sentando-me.
Ele se aproximou e se sentou ao meu lado.
— O que está lhe perturbando, querida? — Meu pai me questionou num tom calmo, enquanto me abraçava de lado.
— Nada do qual lhe deva se preocupar. — Pousei minha cabeça em seu ombro, enquanto suspirava cansada.
— É meu dever como pai se preocupar! — Ele se virou para mim com uma mão sobre seu coração, enquanto dizia as palavras num tom dramático, arrancando-me uma risada. — Aí está o sorriso que eu amo, você anda muito séria, querida.
— Desculpe por preocupá-lo; estou com minha mente focada nas competições que ocorrerão no próximo mês... — deitei-me sobre sua perna, esticando minhas pernas sobre a grama. — E toda a questão sobre o clube de natação e o orçamento reduzido por conta daqueles bastardos. — Resmunguei em um tom baixo.
— parece ser a fonte de seu estresse. — Meu pai me lançou um olhar questionador.
— Ele é mais como uma dor de cabeça da qual que não consigo me livrar. — Respondi-o, buscando tranquilizá-lo.
— Vocês dois são como faces opostas de uma mesma moeda. — Meu pai riu, levantando-se em seguida. — Venha, vamos retornar antes que sua mãe mande Garret atrás de nós. — Ele me estendeu a mão.
— Não queremos uma furiosa por nos atrasar para o jantar. — Abracei a cintura de meu pai, enquanto gargalhávamos de volta para a casa.
— Irritá-la é uma péssima ideia! — Ele reafirmou, enquanto atravessávamos o curto bosque que separava o lago do celeiro. — Não é algo racional fazer isso tendo-a como a responsável por sua comida!
— Terei isso em mente. — Concordei.
Adentramos a casa entre risadas. Meu pai era fácil de se conversar, ele me arrancava risos facilmente. Quando precisava ser rígido assim, ele era; um homem que eu respeitava sem comparação.
Admirava a relação de meus pais, minha mãe era uma mulher amável, mas essa não era sua única face! Ela era dona de uma personalidade forte, com um temperamento difícil, o qual todos os filhos haviam herdado — salvo minha irmã alguns anos mais nova que Hector. Meu pai era completamente apaixonado por minha mãe, cada olhar, gesto, palavra era permeado pelo amor... Ele era aquele que cedia quando discutiam, seu lado bem-humorado dobrava minha mãe.
— Mamãe estava prestes a me mandar atrás de vocês. — Garret surgiu das escadas com um olhar de diversão.
— Se está tão disposto após o trabalho que tivemos, ficará responsável pela louça do jantar. — Meu pai bagunçou o cabelo de Garret ao passar por ele.
Embora meu irmão fosse um homem adulto, era como se ele o enxergasse como uma criança.
— Hey! Por que estou sendo punido? — Ele resmungou, enquanto seguia pela mesma direção que meu pai havia tomado.
Observei-os, rindo silenciosamente; nada como a vida cotidiana em meu lar para me fazer relaxar.
— Olha só quem ficou de bom humor... — Hector surgiu o meu lado, colocando seu braço sobre meus ombros, os cabelos úmidos e o odor de loção pós-barba indicavam que ele havia acabado de sair do banho.
— A mamãe vai nos punir se não nos sentarmos logo! — Desconversei, enquanto seguia em direção à sala de jantar.
— Se estiver a incomodando muito, Garret irá em seu auxílio. — Hector zombou, tomando o lugar à minha frente.
— Por que eu deveria ir, se você quem sugeriu tal ideia? — Garret rebateu, servindo-se.
— Como se eu precisasse de auxílio! — Fuzilei meus irmãos com o olhar, enquanto colocava a comida em meu prato.
— Sobre o que vocês estão discutindo? — Mamãe nos olhou com diversão, sentando-se ao lado de nosso pai.
— Algo sobre proteger nossa filha caçula. — Meu pai comentou com diversão, servindo minha mãe, antes de ele colocar comida para si mesmo.
— Protegê-la? Do que exatamente? — Minha mãe ofereceu um sorriso amável ao meu pai, antes de nos olhar com curiosidade.
— Nada, não dê ouvidos às bobagens que eles estão dizendo. — Ao notar que Hector se preparava para comentar uma gracinha, chutei-o por baixo da mesa, vendo seu cenho franzir.
— Está tudo bem com você, irmãozinho? — Garret zombou de Hector, sabendo o que eu havia lhe feito.
Pisei em seu pé ao lembrá-lo de ficar quieto.
— Comportem-se. — Meu pai nos repreendeu, antes de retornar a comer sua refeição.
— Crianças... — mamãe riu, antes de voltar para o seu próprio prato.
Logo após o jantar Garret, Hector e eu ficamos responsáveis pela limpeza. O que era para ter terminado de modo rápido, acabou se estendendo. Garret e Hector iniciaram suas provocações para cima de mim, o que gerou uma confusão naquela cozinha.
Ao repousar minha cabeça sobre o travesseiro, suspirei feliz, minha família era a melhor coisa que eu possuía; adormeci com um sorriso tranquilo nos lábios, embarcando num sono sem sonhos.
Capítulo 9
Minha respiração estava descompassada, enquanto me apoiava contra os joelhos. Naquela manhã de natal, havia escapado dos preparativos furtivamente. Hector e Garret me fariam pagar por ter os deixado, eu não conseguia ficar parada; as piscinas estavam fora de questão e o lago era algo completamente inviável...
Meus músculos ardiam, após os quilômetros percorridos. À minha frente, o extenso oceano de casas se estendia até o limiar entre a faixa de areia da costa do litoral. Era uma bela cidade, apesar de possuir pessoas desagradáveis.
Encontrava-me na colina do outro lado da cidade. Ali do topo, eu podia ver a fazenda dos meus pais. Meu celular havia ficado em casa, usava meu iPod para ouvir músicas. A brisa invernal refrescava meu corpo aquecido.
O colégio havia entrado em recesso devido aos feriados, com tempo de sobra, escapando dos meus irmãos mais velhos, levava as garotas do time para corridas ao ar livre e as fazia praticar algum exercício; com exceção à Valentine, minhas meninas estavam tendo uma dose extra de práticas, devido as condições físicas delas.
Ao longo daquelas semanas pré-preparatórias, fazia tudo o que estava ao meu alcance para desenvolver a performance delas. Na semana seguinte, as levaria ao local em que ocorreria as preparatórias antes dos torneios. Seria uma semana de classificações “esportivas” que não possuíam peso na classificação, só então viria os torneios municipais e regionais; o estadual ocorreria entre o fim de fevereiro e a metade de março viria o nacional, entre eles havia os torneios das cidades, nos quais ocorriam a temporada de “acidentes”.
— Entre as pessoas que esperava encontrar neste dia, , você seria a última em minha lista. — O tom arrogante, com um toque de presunção e excentricidade. “despejou” suas palavras, enquanto caminhava parando à minha frente.
Suas vestimentas eram finas e elegantes, denunciando sua fuga seja lá o lugar em que esteve anteriormente.
— Como se eu pretendesse o encontrar além do tempo em que tenho de suportar sua presença. — Rolei os olhos, levantando-me e espanando as folhas que haviam aderido minha roupa.
— Já disseram que suas palavras ácidas são um charme a parte? — riu com o que parecia... alívio?! Sua postura relaxada me deixava em alerta.
— Sim, ouço elogios como esse de sua boca em todas as vezes que nos reencontramos. — Comentei desinteressada, começando a me alongar. Com o corpo mais frio, teria de alongar para retomar à corrida. — Bela roupa, pinguim, atrás de uma princesa perdida? — Provoquei-o, encaixando os fones em minhas orelhas, mantendo a música desligada.
— E a boquinha atrevida de minha ataca outra vez! — me respondeu com sarcasmo, seus pés o moveram em minha direção, enquanto eu me afastava.
— O princeso não acha que vou deixar o incidente da piscina em branco? — Minha fala o parou, havia uma diversão em seus olhos, ao mesmo tempo que surgia um sorriso travesso em seus lábios.
— Faça o seu pior, , e eu te mostrarei como a realeza joga! — retrucou com o mesmo tom.
— Aproveite o feriado enquanto pode, majestade. — A ironia ácida escapava de meus lábios, enquanto voltava pelo caminho que havia tomado até ali.
— Eu mal posso esperar pelo seu movimento... e é “vossa majestade”, , dessa vez deixarei passar! — Ele gritou e como resposta, ergui minhas mãos, mostrando-lhe os dedos do meio.
Apertei o play de uma playlist aleatória e ignorei fosse lá seus últimos palavrões.
Capítulo 10
Não possuía o mínimo controle para encarar meus pais, mudando a rota e possuindo algum tempo antes das obrigações que não poderia escapar. Tomei a direção da casa de Roman, Becky estaria na casa de seu namorado e o arrastaria para jantar em sua casa naquele feriado.
Abri o portão destrancado, subindo os poucos degraus da entrada, antes de empurrar a porta; ouvindo o baque surdo no chão de madeira, encarei as figuras seminuas de meus amigos. Gargalhando, passei por eles, seguindo em direção à cozinha, na qual me servi com alguns copos de água.
Ao retornar à sala, eles haviam recolocado suas vestes.
— Malditamente imprevisível como sempre. — Becky fuzilou-me com seus olhos cinzas.
— Um charme, eu sei! — Pisquei um olho, pegando o controle da TV, colocando em um programa qualquer. — Vocês não trancam a porta, a culpa não é minha! — Dei de ombros, pegando o pacote de salgadinho.
— Você não deveria estar auxiliando sua mãe? — Roman dirigiu seu humor intragável em um tom ácido.
— E vocês não deveriam estar preocupados com outra coisa, além de fornicar? — Rebati, levando o salgadinho aos meus lábios sem me importar. — Não desejo ser titia tããoo cedo.
— Eu não sei onde estava com a cabeça, quando resolvi ser sua amiga! — Becky se levantou, roubando o pacote das minhas mãos.
— Hey! Eu ainda não terminei de comer! — Puxei-o das mãos dela, o que gerou um “cabo-de-guerra” com a embalagem do salgadinho.
Estávamos tão focadas em ficar nisso, que nos assustamos com o telefone da casa de Roman. Uma chuva de batatas chips cobriu o chão, enquanto o namorado da minha melhor amiga me encarava nenhum pouco amigável.
— Atenda a droga do telefone, ! — Roman resmungou, massageando as têmporas.
— E por que eu deveria fazer isso? — Questionei-o, cruzando os braços.
— Porque te conhecendo bem, você escapou sem qualquer meio de comunicação e um dos seus irmãos está na linha! — Roman me respondeu “pacientemente”.
Acabei rindo de sua insatisfação e me movi pela sala, atendi-o ouvindo o tom grave de Garret proferindo palavrões, antes de se acalmar.
— Deixe-me adivinhar: você queimou os acompanhamentos outra vez. — Comentei com humor.
— Mamãe vai te servir como prato principal se não voltar para casa. — Pelo tom de voz de Garret, dava para notar o quanto ele estava se segurando para não vir me buscar ele mesmo.
Se Garret havia perdido o controle, eu imaginava como estaria Hector... teria que dormir com um olho aberto!
— Chego em meia hora. — Desliguei a chamada antes que ele pudesse despejar mais uma onda de maldições. — Vocês não querem jantar lá em casa? — Retornei à sala, notando que Becky havia recolhido a sujeira.
— Três s extremamente imprevisíveis num mesmo lugar... não me parece prudente estar no meio disso. — A diversão brilhava nos olhos de Roman.
— Vou me lembrar disso quando eu pegar sua moto emprestada! — Apontei para ele, enquanto passava pelo casal. — Tenham um feliz natal!
— Nós também te amamos, ! — Becky riu, despedindo-se.
Fechei a porta, torcendo para que Hector não estivesse por perto. Eu teria que lidar com três s irritados, sendo um deles o responsável pela refeição de todos.
— Que meu pai esteja de bom humor! — Implorei a ninguém em especifico antes de correr, literalmente, contra o tempo.
Capítulo 11
Meus calcanhares impulsionavam minhas panturrilhas, enquanto tentava chegar o mais rápido que poderia em casa. Naquele instante, odiava o fato de estar sem meu carro e ter quatro possíveis furiosos.
Contendo um suspiro e mantendo a respiração ritmada, prossegui minha corrida até a encosta íngreme na qual estava localizada a propriedade da minha família — o que eu não esperava surgir uma caminhonete familiar em meu campo de visão e a figura de Kayron. O sorriso de diversão brilhou em sua face ao reduzir a velocidade, olhei-o desacreditada, enquanto prosseguia correndo.
— Veja se não é a pequena encrencada outra vez.
Eu poderia imaginar mil formas de torturar meu amado irmão mais velho.
— Garret queimou os legumes, mamãe deve estar soltando fogo pelas ventas e você ainda tem a ousadia de provocar quem já está ferrada até a décima descendência, conhecendo Hector e seus métodos de nos ensinar boas lições!
Parei de correr, apoiando minhas mãos sobre os joelhos, enquanto recuperava o fôlego.
— Deveria tomar cuidado com o que fala, pentelha! — Kayron gargalhou, estacionando seu automóvel ao meu lado. — Venha, entra logo, antes que eu mude de ideia. — Ele abriu a porta do lado do passageiro com um ar de diversão estampado em sua face.
— Você sabe que assim que chegarmos em casa, nossos irmãos vão te considerar um traidor. — Lembrei-o, sentando-me sobre o banco, deixando um suspiro de cansaço escapar de meus lábios.
— Você pensa muito pouco a respeito de nós, pentelha... — Kayron falou de modo dramático, enquanto bagunçava meus cabelos sem dó, levando-nos para casa.
— Tudo o que eu sei, aprendi com vocês! — Voltei meu olhar para o espelho retrovisor, arrumando minha aparência.
— Não sei se levo isso como uma ofensa ou um elogio. — Kayron riu, ligando o rádio, enquanto cantarolava a canção natalina desafinado.
Rolei os olhos diante tanto drama, mudei a estação do rádio, ignorando as reclamações de Kayron. Um clássico dos anos 80 embalou todo o trajeto até a colina, meu irmão não reclamou muito mais.
Com mais alguns rock clássicos e algumas piadinhas sobre o quão ferrada eu estava, chegamos em casa. A figura de meu pai nos aguardava na porta de entrada, seu semblante era uma fachada de irritação, enquanto a diversão brilhava em seus olhos.
— A mamãe está uma fera! — Com seus braços em meus ombros, Kayron adentrou a casa, enquanto ainda fazia piada sobre minha situação.
O clima de diversão, apesar da minha situação, desvaneceu no instante que um par de olhos s e finas, mas elegantes vestes, surgiu em meu campo de visão ao lado das figuras de Garret e Hector.
O que eu imaginava era brincadeira de criança diante minha situação atual!
— Eu estou completamente ferrada! — Fechei meus olhos, ocultando o desespero.
Ao abrir eles novamente, segui em direção ao meu avô, sendo parado pela figura de... minha irmã!!!!
— É falta de delicadeza ignorar sua irmã, pentelha! — Cecília me repreendeu, prendendo-me em seu abraço de mamãe-urso.
— Eu não consigo respirar! — Dramaticamente a lembrei de sua força exagerada ao demonstrar afeto.
— Papai está fingindo estar furioso com você por causa da mamãe, Garry e Hector estão armando algo contra você, pentelha... — o sorriso deslumbrante de minha irmã escondia o olhar afiado e perscrutador dela sob a face angelical. — Não sei o que eles estão planejando, mas não saia do meu lado durante toda a noite.
— Eu te amo tanto, embora saiba que essa sua ajuda não vem de graça! — Sussurrei de acordo com seu conselho. — O que você vai querer desta vez? — Indaguei-a, ainda mantendo o abraço, escondendo minha fala do restante de minha família.
— O que as duas estão armando? — Kayron surgiu, abraçando nós duas.
— A mesma pergunta vale para você, traidor! — Cecília arqueou sua sobrancelha, cutucando-o, sem deixar a astúcia desvanecer em seu olhar.
— Não posso me juntar ao lado vencedor, de qualquer maneira, mamãe está atrás de você, . — O sorriso de diversão retornou aos lábios de Kayron, enquanto indicava a cozinha.
— Que os céus me ajudem! — Suspirei derrotada, enquanto evitava uma certa figura.
Eu sabia que aquilo tinha a mão de Kayron envolvida, mas eu não poderia imaginar a proporção!
Capítulo 12
Eu me lembrava da vez em que meu irmão mais velho havia levado sua namorada atual para casa durante a primavera de meus seis anos. Ao conviver com quatro irmãos mais velhos, dentre eles três homens, eu havia aprendido a usar as situações provocadas por eles ao meu favor. Era claro que uma criança de seis anos não deveria flagrar o filho mais velho com a namorada em amassos quentes na sagrada cozinha de nossa mãe, mas Kayron e Garret não eram os membros mais puritanos da família . Portanto, fazer com que Kayron me devesse favores foi fácil demais, bastava um olhar e ele sabia que eu o deduraria, se não conseguisse o que eu queria. Obviamente, nossos pais nos puniram mais tarde após descobrir tudo, mas, ali, naquele ano, havia aprendido a dobrar o membro mais inflexível dentre meus irmãos — era chamada de ardilosa, por saber exatamente aonde atacá-los quando provocada, afinal, sendo a caçula, não poderia me dar o luxo de ser utilizada como a “faz tudo” deles.
Após o incidente com Kayron, Garret, Hector e Cecília mantiveram suas atenções redobradas sobre mim; apenas me divertia com a atenção extra, havia uma grande diferença de idade entre nós e ter a oportunidade de integrar as atividades do dia de meus irmãos, além de incrível, foi fantástico! Aprendia sobre eles, aproximava-me e possuíamos competições saudáveis, e havia tratos e segredos em que eu facilitava fugas e escondia algumas coisas aqui e ali de nossos pais por eles. Se eu sabia me defender, era principalmente por causa dos ensinamentos deles.
No entanto, mesmo sabendo o quão nós, os , poderíamos ser um “tanto” imprevisíveis, jamais imaginaria que a figura de Kayron, o meu irmão mais velho, dentre todos os irmãos, poderia estar, entre tantas mulheres da cidade, quanto do país, com a mãe da minha dor de cabeça constante, a pedra do meu sapato, a variável inexplicável da minha vida, o meu rival em armações e companheiro de clube: !
Como eu havia chegado a tal conclusão? A pulseira de cordas pretas e couro, que havia visto ele trançando no mês anterior, estava descansando no pulso esquerdo da senhora . Ao indagar para qual mulher ele estava pensando em presentear, Kayron me respondeu seriamente: “a mulher para a qual desejo apresentar aos nossos pais como minha futura esposa”. Obviamente, não havia acreditado em suas palavras devido ao seu histórico de galinha — eu já havia visto meu irmão com mais mulheres do que as constelações que podiam ser vistas à noite de nossa fazenda.
Minha mãe me recebeu com repreensões em sua cozinha, enquanto a mãe de parecia estar se esforçando em evitar olhar a cena. Mantive meu semblante preso na máscara de arrependimento, enquanto divagava em minhas memórias... mamãe saberia que não havia muito o que pudesse mudar minhas atitudes, ainda era jovem e tendenciosa ao desastre, mas o suficientemente mais responsável que Garret ou Hector.
— Sinto muito, mãe. — Comentei, enquanto erguia meu olhar lentamente, observando uma rápida expressão de surpresa na face da senhora .
— Não importa o quanto eu lhe repreenda, sei que fará tudo outra vez na primeira oportunidade. — A voz de minha mãe suavizou, enquanto segurava um sorriso. — Vá se arrumar para o jantar!
— Você é a melhor mãe que eu poderia ter! — Comentei num tom de brincadeira, arrancando um riso rápido, enquanto o sorriso teimoso dela despontava em seus lábios.
— Ande! Depressa, antes que eu mude de ideia! — Ela tentou, em vão, parecer brava.
— Claro, claro! Tudo o que a senhora mandar! — Pisquei um olho para ela, antes de correr para fora da cozinha.
Enquanto saía rapidamente, tive o azar de esbarrar em ao lado dos meus dois irmãos mais velhos. Kayron passou por mim, rindo, enquanto balançava negativamente a cabeça. Meu pai conversava com meus avós maternos, enquanto meu avô paterno parecia distraído com as coisas que Cecília lhe dizia.
— Eu tive o suficiente por hoje! — Escapei das mãos de Garret, enquanto me observava enigmático.
— Pirralha, você me deve sua vida inteira em favores devido aos desastres de hoje causado por você! — Garret seguia para me cercar pela direita, enquanto Hector ria, bloqueando meu caminho.
— Estamos sempre devendo favores uns aos outros, Garry! — Revirei os olhos, movendo indiretamente o trio para as escadas.
— Nãna-nina-não! — Hector estalou a língua no céu da boca, indicando que eu não escaparia facilmente deles. — Não importa o que a Cecília lhe prometeu, você não tem como escapar da gente, pentelha!
— Ugh! Eu odeio vocês! — Empurrei Hector, passando por ele, enquanto ouvia apenas o fantasma de um sussurro vindo de .
Meus pés estacaram no degrau, enquanto me virava para a figura posicionada, arrogante, enquanto compartilhava algo com os meus irmãos.
— Devo lhe lembrar de que não é muito inteligente falar bobagens aos dois idiotas ao seu lado?
— Não fala assim comigo, love! Você sabe que eu não resisto a essa mente ardilosa. — O sorriso desdenhoso surgiu preguiçosamente nos lábios de .
— Não seja tão má com o nosso futuro cunhado, pirralha! — Garret provocou, passando seu braço sobre os ombros de .
Ele estava rindo da minha expressão enojada.
— Eu guardaria esse riso, , porque você sabe que quem mexe com fogo, acaba se queimando. — Sendo direta indiretamente, deixei uma piscadela, contando exatamente o que era preciso para calar .
Afinal, estar em posse de seus maiores segredos me dava certa vantagem.
Subindo as escadas, eu pude ouvir meus irmãos perguntar ao ao que estava me referindo.
Sendo cuidadosa, tranquei a porta de meu quarto e apoiei a cadeira que usava para estudar sob o trinco, de forma a impedir que invadissem meu quarto, enquanto estivesse no banho. Já nas janelas, utilizei das tranças extras que papai havia instalado, devido ao nível de peças que meus irmãos pregavam em mim.
Capítulo 13
Levei mais tempo do que esperava para me arrumar. Ao descer para o primeiro andar, encontrei toda minha família reunida, incluindo desde tios a tias, que havia visto apenas uma vez em toda minha vida. A seriedade da comemoração natalina indicava que algo maior estava por vir, eu poderia dizer com apenas uma rápida olhada em Kayron para colocá-lo como o principal responsável sob a minha suspeita.
Todos os estavam ali. As crianças corriam de um lado para o outro, os mais velhos jogavam uns dos muitos jogos de cartas, enquanto riam, outros estavam entretidos com a televisão, embora meus irmãos estivessem alugando a figura deslocada de .
Não muito tempo após eu descer as escadas, minha mãe chamou a atenção de todos, pedindo para que se sentassem. As crianças foram colocadas numa mesa adjacente, já que a sala de jantar foi tomada por toda a família .
Sentando exatamente entre meu pai e Cecília, procurei ignorar a atmosfera atípica daquele feriado, enquanto fingia que os estavam presentes. Meu plano era seguir com isso, enquanto estivessem sob o teto de meu lar, porém, a figura de Kayron se levantou e o pigarrear, antes de um discurso, cortando a conversa animada, fez com o que meu plano de negar a existência dos esmorecesse e a certeza do desastre que se seguiria, prosseguiu.
Observando meu irmão, a forma séria e me lembrando da conversa no último mês, eu soube exatamente o que aconteceria. Sobre os inúmeros pares de olhos , um desacreditado e crianças alheias ao que estava acontecendo, o anúncio do casamento foi realizado.
— Quando foi que você a pediu em casamento? — A voz cortante de silenciou o coro de parabenização e brincadeiras à parte sobre a nova integrante da família.
— E isso importa?! — Rebati a indagação de , incapaz de conter meu impulso.
A forma como ele havia se dirigido a Kayron parecia como se não o achasse digno de sua mãe.
— O que você tem a ver com isso, ? — me respondeu sem qualquer paciência, sua raiva e irritação estava presente em seu olhar.
— É ao meu irmão a quem você está se dirigindo como indigno desse casamento! — Fuzilei-o com o olhar.
Meus pais, por alguma razão desconhecida, assim como o restante, permaneceram em silêncio.
— Você está dizendo que minha mãe não é a digna nessa história? — A incredulidade estava evidente em seu olhar e expressão.
— Eu não disse isso! — Respondi-o contundente, enquanto segurava o sorriso de desdém.
— Não me venha com essa, , não é como se você estivesse feliz com a notícia desse casamento. — rebateu sarcasticamente, enquanto suas palavras afiadas surpreendiam os desavisados.
— Não importa se eu estou ou não feliz com a notícia, embora seja claro a minha aversão a ideia de você integrar minha família. — Respondi-o, movendo minha face em nojo, sentindo horror à ideia de se tornar o afilhado de Kayron.
Somente essa ideia me dava arrepios os quais não conseguia disfarçar.
— Essa discussão confusa acaba agora. — Minha mãe se levantou com o tom de voz firme, silenciando até mesmo as crianças, que haviam se agitado com a confusão na mesa dos adultos.
— Vamos voltar para a ceia e celebrar o anúncio. — Meu pai se levantou, apoiando a decisão de minha mãe.
se levantou, deixando o recinto. Ele não iria longe, porque não conhecia a propriedade, então voltei minha atenção aos pratos preparados com cuidado pela minha mãe. A Senhora , que num futuro não muito distante se tornaria uma , levantou-se com a intenção de ir atrás de seu filho. Vendo o quão desastroso isso poderia se tornar e estragar o preparo cuidadoso da ceia de Natal que minha mãe trabalhou duro, levantei-me espantada com minha atitude e balbuciei alguma coisa coerente e razoável o bastante para mantê-la sentada à mesa.
Capítulo 14
Recebendo um olhar de agradecimento de meu irmão mais velho, deixei a sala de jantar estalando dois tapas na nuca de Hector e Garret, que foram incapazes de manter calado. Sorrindo tranquilamente para meus pais uma última vez, saí pela porta dos fundos, sabendo que não se manteria dentro da casa por se sentir sufocado. Conhecia demais aquele boçal, mas naquele usaria meus bons modos, mesmo que à contra gosto, para achar e levá-lo de volta a mesa de jantar.
A luz amarelada do lado de fora da casa não iluminava muito o terreno da fazenda e, embora o prateado do luar fosse uma lanterna natural, ainda estava escuro o suficiente para um desconhecido se perder facilmente da propriedade.
Por me aventurar demais entre as plantações e as árvores do bosque pela madrugada, não era difícil me mover tranquilamente pelo lugar em que cresci. Passei pelo curral e verifiquei os animais, principalmente as vacas, evitando o celeiro, onde eu tinha 98% de certeza em que estaria. Andando sem qualquer presa pela fazenda, “investiguei” os locais antes de seguir para o celeiro.
Sentado no alto de uma viga do que era uma espécie de sótão, estava a figura nem um pouco receptiva de .
— Não acha que está muito velho para interferir nas decisões com quem sua mãe se relaciona? — Provoquei-o num tom de voz normal, já que o celeiro ficava um pouco distante da casa.
— Não me enche, ! — me respondeu sem qualquer educação, o que me fez rir, enquanto a careta em sua face ficasse ainda pior. — Qual é a porra da graça, garota? — Ele me perguntou sem um pingo de paciência, o que me fez rir ainda mais dele.
— O fato de você não saber torna tudo ainda mais engraçado! — Respondi-o sem qualquer receio, apoiando-me contra a pilha de feno, subindo no trator de meu pai para me sentar confortavelmente.
— Eu ainda me pergunto por que me dou o trabalho de procurar te entender! — comentou exasperado, voltando sua face para o outro lado.
— Não é como se você precisasse disso, ... Por que se dar o trabalho? — Indaguei-o apenas para prosseguir a provocação.
Meus pés estavam sobre o volante do trator, enquanto minhas mãos estavam atrás da cabeça, apoiando confortavelmente.
— Nem mesmo eu entendo por que me dou o trabalho de fazer isso! — Ele me respondeu com o humor ácido, o que provocou mais um riso suave por meus lábios.
De fato, era divertido vê-lo irritado e esse talvez fosse um ou o único motivo pelo qual prosseguia a nossa rivalidade sem sentido.
— Pare de rir de mim, !
— Uau! Quanta determinação em mostrar sua seriedade! — A ironia brincava em meus lábios, assim como o provocava sobre ele me chamar tantas vezes pelo nome naquela noite, sem que notasse nenhuma vez.
— Cala a boca, porra! — E num salto, caiu sobre a pilha de feno, amortecendo sua queda.
Sim, eu já havia feito isso inúmeras vezes com meus irmãos, eu sabia que ele não se machucaria, mas por estar com a preocupação sobre as competições em duas semanas e os longos monólogos que se sucederiam, caso ele se ferisse, pulei assustada sobre o banco do trator seguindo até para verificar seu estado.
— Tira a porra das suas mãos de mim! — me empurrou quase imediatamente, após eu me aproximar dele, o que me levou a cair duas pilhas abaixo.
A surpresa das ações quase me fez cair de encontro ao chão abaixo.
Meu olhar logo encontrou o furioso leito de . Meus lábios abriram um sorriso cruel e antes que ele pudesse se mover, minhas pernas o haviam alcançado, assim como a corda que ficava pendurada num dos ganchos da entrada. Sem qualquer dificuldade, havia o silenciado e o amarrado, enquanto o arrastava pelas portas traseiras do celeiro, obrigando-o a se arrastar atrás de mim.
Havia sido criada ali, conhecia muitas formas de amarrar um animal, de modo a impedir que ele assim fugisse. E como sabia que detestava animais, morrendo de medo ridiculamente de porcos, levei-o em direção à baia, no qual a criação de porcos do meu avô ficava presa. Poderia ter levado ele até o curral, já que detestava cavalos também, mas a irritação pelo ato dele havia me estressado.
Arrancando a faixa de sua boca, vi-o olhar com repugnância e certo medo para os porcos. Coloquei as botas de borracha em meus pés, enquanto nos levava para dentro do lugar. Era para ter sido apenas a cair na lama e sujeira daqueles animais, mas, no último minuto, ele me puxou e ambos fomos ao chão.
Os porcos de meus avô eram dóceis comigo, o ajudava e conversava vezes demais com os animais da fazenda, principalmente os porcos e as vacas.
— AAAAAAAH! — se debatia, movendo-se como uma minhoca.
Eu até tentei segurar o riso, eu sabia que não demoraria para meus pais e família virão atrás de nós, mas a cena diante de mim era hilária demais.
Ainda rindo, passada a raiva dos atos anteriores do babaca a minha frente, desamarrei-o, vendo-o quase saltar sobre a cerca para fugir dos animais.
Balançando a cabeça negativamente, enquanto ria, passei a mão em alguns dos bichinhos, enquanto saía do espaço. Limpando minhas mãos nas calças, observei correr em direção à entrada traseira da minha casa e, para prevenir um desastre, saí atrás dele.
Capítulo 15
Antes mesmo que chegasse na porta, segurei um de seus braços, puxando-o para trás, o que levou a uma terceira queda dupla entre nós, mas, desta vez, ele caiu sobre mim e o odor “agradável” invadiu meu olfato, antes que eu pudesse reparar no olhar e posição em que nos encontrávamos.
— No celeiro há um banheiro do qual você definitivamente precisa! — Levantei-me, indicando o lugar em que há poucos minutos havia deixado, antes da situação dos porcos.
— E por que eu deveria confiar em você agora? — me indagou, ainda sentado no chão.
— Porque você está cheirando à merda de porco. — Respondi o óbvio, não me preocupando com a questão de confiança.
— Eu odeio você um pouco mais hoje! — Ele me respondeu, levantando-se no processo.
Apesar de não ter sido nem um pouco agressivo em sua resposta, ele riu ao passar por mim.
Dei-lhe um olhar espantado pela atitude e não pelas palavras das quais já detinha conhecimento. Mostrei-lhe a instalação, arranjando algumas roupas de serviço de um dos meus irmãos que estavam utilizáveis, antes de deixá-lo sozinho, após eu mesma pegar alguns produtos de higiene pessoal.
Sem ter como usar o banheiro do celeiro, segui para o bosque, atravessei-o sem qualquer receio. Em minhas mãos, estava uma sacola com as roupas que costumava deixar no celeiro para vestir após o treino matinal no lago. Retirei minhas peças de roupas sujas, deixando sobre a ponte antes do lago, mergulhei uma vez, retirando a parte mais grossa da camada de sujeira, enquanto tentava não pensar que estava nua a alguns metros de casa. Puxei os produtos até a borda, esfregando minha pele com cada um deles, em busca de me livrar do mau cheiro da merda e lama dos porcos.
Não fazia ideia de quantas vezes havia esfregado o meu corpo com o sabonete e a buchinha vegetal, mas em dado momento, ouvi alguns xingamentos e resmungos proferidos pela pessoa que não esperava que localizasse o meu refúgio. Os sons de passos logo silenciaram às minhas costas e como estava mais próxima da margem, a água atingia um pouco acima dos meus quadris, deixando meu tronco desnudo à vista.
Mergulhando até o centro do lago, acostumada a profundidade e a temperatura após algum tempo, virei minha face, encontrando o olhar enigmático de sobre minha figura.
— O que você está fazendo aqui? — Gritei furiosa com a invasão do meu lugar escondido do mundo e ao mesmo tempo furiosa com a situação embaraçosa na qual me encontrava.
— Eu...eu... — ele abria a boca e a fechava, enquanto parecia não saber o que me diria.
— Somente desapareça da minha vista, ! — Bradei no meio do lago, ouvindo as ondas se chocarem contra as rochas abaixo.
— A água não está fria? — parecia finalmente falar uma frase completa outra vez.
— Como poderia não estar?! — Levei minhas mãos à minha cabeça, respirando fundo, tentando manter algum autocontrole.
A água escondia meu corpo dos olhos s de .
— Por que me deixou usar o banheiro primeiro se havia apenas um? — Ele me questionou.
Como estava evitando olhá-lo, não fazia ideia de qual expressão havia em sua face.
— Porque queria me livrar de você de uma vez. — Respondi-o com o primeiro pensamento que surgiu em minha mente.
— Isso não faz sentido... — a voz dele esmoreceu como se ele estivesse pensando alto, ao invés de me responder qualquer coisa que possuísse coerência.
— E tomar banho num lago próximo ao oceano no inverno tem algum sentido! — Rolei os olhos, aproximando-me da ponte e esticando meus braços em direção à sacola com as minhas roupas.
— Qual o sentido de você tomar um banho para apenas molhar suas vestes?! — me indagou, retirando a sacola de meu alcance.
Agarrei a viga, escondendo meu tronco nela.
— Mas que merda você quer ao ter sua presença aqui, enquanto eu estou nua na porra deste lago?! — Rebati, olhando-o furiosamente.
— Aí está a love que eu amo provocar todos os dias. — sorriu com uma expressão suave, deixando a sacola sobre o leito mais próximo de mim.
— Volte para a porra da minha casa para que eu possa me vestir! — Não me movi um único músculo, fuzilando-o com o olhar.
— Não posso voltar, eu me perdi umas três vezes tentando sair daquele bosque, antes que eu pudesse chegar aqui. — Ele me respondeu tranquilamente, aproximando-se da borda do penhasco.
— Basta seguir em linha reta sem qualquer curva ou atalho, não tem como errar! — Fui clara em minhas intenções, desejava que ele desaparecesse do meu campo de visão.
apenas riu, sentando-se de costas para o lago, como se indicasse que não iria a lugar algum sem que eu o acompanhasse. Esbravejei por mais alguns minutos, antes de suspirar pesadamente. Meus olhos estavam atentos a , eu não confiava nele.
Capítulo 16
— Dentro da sacola há um conjunto de biquíni, lance na água para que eu possa vesti-lo. — Após pensar por algum tempo, pronunciei-me, lembrando da roupa de banho que usava todas as manhãs.
Pego de surpresa pelo meu pedido, me observou de modo a tentar compreender o que eu estava lhe pedindo.
— Eu vou congelar aqui e a culpa vai ser sua! — Ao lembrá-lo do frio, ele se levantou rapidamente, seguindo até a sacola. Suas mãos vasculharam-na até encontrar o que havia pedido.
Ele se locomoveu até aonde eu me encontrava, entregando a roupa de banho em minhas mãos. Seguindo até próximo da borda, ele se sentou, deixando as pernas balançarem no vazio.
Nadando até o meio do lago outra vez, vesti a parte de cima, antes de colocar a calcinha do biquíni. Ao correr até o leito tremendo de frio, senti o solo escorregar abaixo dos meus pés — após ter nadado em direção ao leito do lago, havia em esquecido solo escorregadio envolta dele. O solo não atingiu meu corpo, mas, sim, um corpo quente me amparou. Do ângulo em que me encontrava, os olhos assustadoramente s me encaravam com cuidado.
— Você conhece esse lugar melhor do que eu e, ainda assim, quase sofre uma queda. — Embora me segurasse com cuidado, suas palavras não refletiam sua ação.
— E quem será o culpado pela noite de Natal mais desastrosa?! — Firmei-me, empurrando-o para o lado, colocando as roupas às pressas. Meus dentes batiam naquele instante.
— Havia me esquecido de que era Natal... — a voz quase inaudível de me fez desviar a atenção da calça na qual enfiava um pé de cada vez.
— Como no mundo você se esqueceu?! — Revirei os olhos, terminando de me vestir, jogando a jaqueta grossa distante da margem em meus ombros, sentindo minha temperatura subir alguns graus.
— Você me faz perder a noção do tempo, . — A voz de mal era um sussurro e, sinceramente, duvidava do que estava ouvindo.
Acreditando que as palavras de não passavam de um delírio após o banho no lago congelante, juntei as roupas sujas que estavam acima da ponte sem dizer qualquer palavra a . Tendo as sacolas contendo as vestes fedorentas em uma mão e os produtos de higiene pessoal em outra, segui em direção ao bosque, ainda sem ter dito qualquer palavra e não lhe dei qualquer olhar.
Apenas o som de passos às minhas costas informava que me seguia. Ele passou por mim ao atingirmos o celeiro. Indiferente à sua presença, continuei meu caminho, atingindo a lata de lixo, na qual, vez ou outra, meu pai, irmãos e avô descartavam suas roupas e lixo; joguei a sacola ali, antes de prosseguir meu caminho em direção ao banheiro, pegando a escova para arrumar os fios molhados.
Ignorando os acontecimentos daquela noite, desejei um “feliz natal” à minha família, antes de seguir para o meu quarto com as palavras que jurava serem fruto de um delírio em minha mente.
Capítulo 17
O suor frio escorria pela minha têmpora, calafrios tomavam meu corpo, enquanto minha garganta estava seca. Levantei-me com dificuldade, parecia que tinha perdido minhas forças. Enquanto me colocava de pé, acabei caindo com um estrondo próximo à porta do quarto. O relógio marcava alguma coisa, enquanto minha visão embaçada me impedia de identificar as horas. Limpei o suor com a mão esquerda, suspirando. O mergulho no lago congelante havia resultado em meu estado atual.
— Maldito ! — Minha voz mal passava de um sussurro fraco e, no entanto, parecia que havia sido ouvida por alguém.
Uma figura alta se encontrava recostada no umbral da porta de meu quarto e era o dono do riso a pouco ouvido. Sua face era encoberta pela escuridão da noite, mas não era preciso da luz para que eu o reconhecesse.
— Você não pode me culpar por tudo, love. — comentou com humor, enquanto se colocava no mesmo nível que o meu.
— O que raios você ainda está fazendo em minha casa?! — Respondi-o exasperada, os olhos s eram iluminados pelo fraco brilho da lua, que adentrava o cômodo pela fresta da cortina.
— Sua família é muito receptiva e calorosa, como deve saber. — Ele me respondeu, colocando seus braços envolta de mim, içando-me do chão com suavidade.
— O que você está fazendo? — Indaguei entre o horror e a surpresa com o ato de .
Ele apenas sorriu com diversão, colocando-me sobre o colchão.
— Apesar de agir feito cão e gato, eu sou humano, love. — Ele comentou calmamente, seguindo em direção à porta. — Chamarei sua mãe para cuidar de você.
— Não! — Respondi-o automaticamente, vendo a confusão tomar o olhar dele. — Chame Hector, ele saberá o que fazer.
— Posso saber o porquê de ser o Hector? — A voz de Kayron surpreendeu a ambos.
— Merda! — Cobri minha face com minhas mãos, suspirando.
A situação piorava cada vez mais...
— Por que tem que ser o Hector, pirralha? — A voz de Garret soou uma oitava mais alta que a de Kayron.
Eu estava ferrada quando melhorasse, muito ferrada! Eu amava meus irmãos mais velhos, mas todos eles eram competitivos quanto a qualquer coisa, meus pais frequentemente contavam como Garret, Kayron, Cecília e Hector brigavam para cuidar de mim quando era apenas um bebê. Eles eram muito iguais ao sentirem ciúmes um do outro.
— Eu não estou entendendo o que você está fazendo no quarto da nossa irmãzinha, . — Cecília parecia estar desconfiada.
— Eu apenas estou tentando evitar que nossos pais acordem, então, por favor, não vamos iniciar uma confusão! — Exclamei, porém, um ataque de tosse iniciou e eu me concentrei em apenas tentar pará-lo.
— Vocês deveriam parar com isso! — A voz calma e suave de Hector surgiu, ele me entregou um copo com água, enquanto colocava uma jarra em cima da cômoda ao lado da minha cama. — Kayron, verifique se nossos pais acordaram. Cecília arrume o banho para a . Garret, tire daqui. — Hector delegou as tarefas, enquanto checava a minha temperatura sem olhar para eles uma única vez.
Entreguei a ele o copo vazio, antes de deitar contra o travesseiro. Eu sabia que ele estava me observando com cuidado, enquanto ouvia os resmungos dos meus três irmãos mais velhos seguindo contra a vontade as ordens de Hector.
— Você está febril, o que a levou se aventurar naquele lago? — Hector questionou num tom de repreensão.
— Houve um acidente com os porcos... — respondi-o reticente, não lhe dando muitos detalhes.
— ! — Ele reprovou meu comportamento, o que me fez a soltar um riso fraco entre toses.
— Vamos, pirralha, eu cuidarei de você agora, enquanto Hector prepara seu remédio. — Cecília surgiu, expulsando Hector do cômodo.
— Não pense que vai sair ilesa disso! — Hector me avisou, antes de fechar a porta.
— O que você aprontou dessa vez, pestinha? — Cecília me perguntou sorrindo, enquanto me ajudava a me despir.
— Você não vai gostar da resposta... — respondi-a com certa diversão.
— Seja mais prudente da próxima vez ou vai acabar nos deixando de cabelo branco antes da hora. — Ela riu baixo com receio de acordar nossos pais.
Capítulo 18
A febre persistiu durante todo o feriado, deixando-me na cama por duas semanas, enquanto a matriarca da família cuidava de mim e repreendia meus quatro irmãos por terem encoberto mais uma das minhas façanhas.
Kayron e Garret eram os visitantes mais frequentes ao meu quarto, eles sempre checavam se eu precisava de algo, tentando, de alguma forma, elevarem seus status no quesito de irmão favorito. Eu os amava! E sabia que havia tido sorte em ter uma família tão acolhedora e amorosa, embora todos possuíssem um temperamento e gênios difíceis de lidar.
Comparado a outras famílias, os eram únicos em seu modo de ser e unidos, apesar de tudo.
🏆💙🏆
Após curada da gripe, eu tive de lidar com as consequências, ajudava em todas as tarefas domésticas e tinha que realizar um favor ou outro aos meus irmãos, enquanto treinava a equipe feminina, já que as competições se iniciariam em três dias. havia desaparecido da minha vista desde o momento em que me colocou na cama, eu realmente não sabia como lidaria com ele a partir de agora.
🏆💙🏆
— Senhorita !
— !
— !
A voz áspera e mal-humorada de mister Hopkins chamou a minha atenção. Estava em sua sala para checar os últimos detalhes sobre os campeonatos, horários e os hotéis em que ficariam ambas as equipes.
Um baixo riso soou à minha esquerda, no qual estava a figura de . Mister Hopkins o censurou com um olhar, antes de prosseguir seu discurso sobre como deveríamos nos portar e informando os últimos ajustes nos itinerários das equipes.
— Espero que não tenhamos nenhuma confusão com ambas as equipes ou suspenderei ambos atletas e terei que tomar medidas mais rígidas. — Mister Hopkins avisou, antes de nos dispensar.
Com um aceno, deixamos a sala do diretor. Minha mente estava focada na planilha mental, checando se havia cumprido com o que eu queria antes da competição, até que se pronunciasse... é claro!
— Não se esforce demais hoje! — A acidez em sua voz me lembrou de algo que estava esquecendo.
Olhei-o sem entender, confusa em compreender sobre o que ele estava se referindo.
— Hoje não haverá nenhum treino, . — Respondi-o sem qualquer emoção aparente.
— Você realmente esqueceu. — Ele riu sem qualquer traço de humor, em seus olhos havia algo enigmático.
— Estou focada demais nas competições para desperdiçar meu tempo com futilidades. — Rolei os olhos, antes de seguir para longe dele.
Eu não olhei para trás uma única vez, eu não sabia a que ele estava se referindo e não entendia como seriam as coisas com a mãe dele se casando com Kayron. Eu estava apenas buscando me concentrar para que essa confusão de fatores não afetasse meu desempenho e a minha equipe nas competições que se iniciariam.
Quando estava quase no estacionamento, um clique soou na minha mente, meus pés estacaram no lugar, enquanto a clareza tomava meus pensamentos.
— Porra!!! — Eu quase gritei, enquanto voltava correndo para o ginásio de natação.
Meus tênis ecoavam pelo piso dos corredores, atingi as quadras esportivas notando que as equipes de vôlei, futebol, basquete e atletismo seguiam treinos firmes e rigorosos ao passar por eles. Quando, enfim, cheguei à entrada do ginásio de natação, havia pessoas que não faziam parte da equipe de natação — o fã clube de estava em peso sentadas perto da equipe masculina.
— , direto para o vestiário! — A voz da técnica ecoou pelo lugar.
Respirei fundo, contendo a irritação.
Seguindo em direção ao vestiário, pude ouvir fragmentos de sussurros e conversas indiscretas, enquanto sentia o olhar de em minha nuca.
Capítulo 19
Havia uma tradição no clube de natação: os capitães das equipes competiam pelo título de presidente do clube a cada três meses, alternando a hierarquia de poder a cada estação. havia me perdido a última competição na tentativa de manter o título, no entanto, havia o vencido na temporada antes da finalização das competições municipais, que classificavam as escolas antes dos torneios e competições do início do ano.
Como havia corrido até o ginásio, estava aquecida. Entrei no vestiário, conferindo minhas roupas de banho, antes de vesti-las corretamente. Prendi o meu cabelo, antes de colocar a touca para, então, me alongar, enquanto a técnica repassava suas orientações.
Eu a respeitava na maior parte do tempo, porém, o trabalho dela era apenas aprovar a rotina de treinos e assinar os papéis de autorização para que a equipe pudesse continuar a competir; um representante legal, na maior parte do tempo, porque o trabalho real de treinar a equipe recaía sobre os meus ombros. Sempre conferia o progresso e os aspectos necessários de cada garota do time, além de identificar possíveis lesões e estar atenta a problemas emocionais.
Portanto, naquele instante, a técnica estava falando sozinha. Meus ouvidos não absorviam nenhuma palavra que ela proferia, meus olhos mal a enxergavam, enquanto, em minha mente, passava as performances de . Conhecia o estilo e como ele nadava, infelizmente, o conhecia melhor do que admitiria, porque, embora negasse e jamais assumisse em voz alta, eu admirava o modo como ele nadava.
Era fascinante vê-lo nadar com seriedade e, embora o odiasse sempre que o assistia em uma competição, encontrava-me sem palavras para explicar a sensação de vê-lo na água... era surreal, porque o estilo que ele competia levava a quem assistia pensar que era fácil de tão suave e ágil que era dentro da água. Um predador sedutor, alguém que te prendia a atenção apenas ao assisti-lo. Não era sem razão que ele colecionava troféus e medalhas, embora eu mesma tivesse as minhas.
Era claro que fazia parte da equipe de natação do Colégio D'antelli, porém, competia desde muito nova, já havia chegado em competições nacionais, porém, antes de começar o ensino médio, havia dado uma pausa na natação, a qual durou três anos. Eu precisei daquele período para descobrir o que eu queria da vida, minhas metas e objetivos. Assim, retornei às competições quando iniciei o ensino médio, conciliando as obrigações escolares com a minha paixão pela natação.
Não seguiria carreira no esporte, porém, já havia encontrado o que eu almejava e ainda que não possuísse a seriedade de prosseguir como nadadora profissional, eu tratava a equipe com importância e lealdade; havia levado a equipe no segundo ano às semifinais, porém, por falta de preparo, havíamos perdido, então esse era o ano de vencer!
Havia preparado a equipe o ano anterior após a derrota, analisado e treinado, até retirar o melhor delas! Em três dias eu veria as minhas meninas iniciarem o caminho dos sonhos, porque embora não soubesse tudo, eu havia visto cada batalha que elas haviam travado para chegarem até ali.
Diante esses pensamentos, eu me levantei com um sorriso, deixando o banco do vestiário após o alongamento e segui em direção às piscinas. Ambos os técnicos das equipes estavam posicionados ao lado das plataformas de salto; as conversas e sussurros haviam silenciado, enquanto a seriedade tomava a face das equipes. era o único que destoava, em sua face havia um humor sarcástico, enquanto seus olhos avaliavam a minha postura.
— Eu não vou ser derrotado por você outra vez, . — subiu na plataforma, colocando os óculos de natação, antes de se posicionar corretamente.
— Veremos! — Respondi-o com acidez.
Originalmente, competia com ele utilizando o nado borboleta ou de peito — com maior frequência, o borboleta —, porém, naquele dia, decidi optar pelo nado livre. Era um estilo que utilizei apenas durante a infância, antes de me ausentar do esporte.
Utilizei os anos afastada para encontrar respostas e melhorei meu desempenho nos outros três estilos; tendo competido em medley’s solos e em equipe, raramente utilizava o nado livre. Embora este fosse a minha melhor arma!
Antes que o apito soasse, arrumei minha postura, quase sorrindo ao sentir meus músculos preparados para o uso.
mal sabia o que iria enfrentar!
Capítulo 20
Saltar foi a parte mais fácil. Permaneci debaixo d’água por um tempo que me pareceu longo demais, mas que eu sabia que era apenas a minha perspectiva. Eu realmente não enxergava quando competíamos, eu amava estar na água, que o dar as braçadas era tão natural quanto respirar.
Movi meu corpo de modo fluído, chegando ao outro lado da piscina antes de completar as duas voltas obrigatórias — já que, com o passar dos anos, durante as competições entre os capitães, haviam passado dos 100 metros para os 200; aumentando a resistência e eficácia do pilar das duas equipes. Uma estratégia que cumpria com o propósito que eu buscava!
Meus braços atingiram a superfície, enquanto mexia minhas pernas e pés em sincronia, minha cabeça subia e descia a cada nova respiração, enquanto meu corpo se movia pela água. Então bati a mão, segurando a barra de ferro, erguendo minha cabeça, antes de ver o resultado. Minha face encontrou os rostos assustados de ambos os técnicos. Havia o mais profundo silêncio, antes que um irritado batesse sua mão contra a borda da piscina.
Os olhos de todos estavam sobre nós dois.
— Por que você não avisou que era um monstro debaixo da água?! — Havia uma raiva e frustração incandescente nas orbes s de .
— Sobre o que você está falando? — Indaguei-o sem entender o motivo da agitação dele.
— Não faz duas semanas que você estava doente, ! Porra! — Ele tirou a touca de banho, dando um soco frustrado na água.
— Seja mais claro, ... — revirei os olhos, encarando-o sem qualquer medo ou receio por estarmos diante tantas pessoas.
— Você superou o meu melhor tempo com folga, ! Você tem ideia do que isso quer dizer? — Ele riu sem qualquer traço de humor. — Você está apenas zombando do esforço de todos, ao se limitar a usar o nado borboleta. Você é a porra de um talento inato na água! — Ele me encarou ainda irritado.
— O seu melhor tempo?! — Repeti a sentença, surpresa.
Eu encarei a equipe feminina, vendo-as sorrir e gritar animadas por eu ter vencido .
— Você me escutou perfeitamente. — se içou para fora da piscina. — Fique com o título de presidente, mas se for para chegar nos nacionais, não se sabote no nado borboleta.
Sem mais nenhum comentário, ele seguiu em direção ao vestiário masculino. Eu ainda estava surpresa com o que havia acontecido.
Saí da água com a minha cabeça repleta de caos, enquanto as garotas me indagavam e questionavam, enquanto parabenizavam minha vitória. Meus lábios se moviam, enquanto minha mente mal conseguia acompanhar a enxurrada de palavras.
O restante do dia se passou num borrão, em que meu corpo estava presente, enquanto minha mente ainda se encontrava presa naquele instante na piscina.
Quanto havia evoluído? E até que nível conseguiria chegar?
Capítulo 21
Havia muitas coisas que eu não poderia explicar ou compreender acontecendo em minha vida. A principal delas era o porquê de continuar sempre sendo a pedra no meu sapato, como sua existência sempre me atrapalhava. Ele seria um assim que sua mãe se casasse com Kayron, meu "adorável" irmão mais velho. E talvez por ambos sermos tão diferentes e ao mesmo tempo faces de uma mesma moeda, que a droga do destino continuava a forçá-lo goela abaixo, obrigando-me a coexistir com ele e reconhecer tal presença irritante.
Aquele boçal surgiu próximo à uma da manhã na propriedade da minha família. O fato de sua mãe estar com meu irmão não era algo que eu devesse gastar meu tempo pensando a respeito, havia as competições estaduais e o nacional, além dos amistosos que ambas as equipes competiriam antes do nacional — todos os classificados da região fariam revezamentos sem qualquer premiação e era justamente isso que mais me preocupava. O pesadelo dos amistosos estava nas misteriosas lesões dos atletas e eu me mantinha atenta à todas as meninas da equipe. Eu sabia me cuidar bem, havia garantido que as desavisadas ou ainda as mais ousadas em procurar me tirar do cenário das competições, fossem devidamente punidas.
Eu não falharia na busca por justiça!
Todos os competidores sabiam que eu jogava limpo, mas se ousassem boicotar minha equipe, eles experimentariam seus piores pesadelos. O Colégio Boulevard poderia chegar aos nacionais, mas não foi apenas uma vez que os ensinei a se manter longe das minhas garotas, reconheceria se jogassem limpo. Valentine ainda não estava em sua melhor forma desde seu embate com as garotas do Boulevard, somente ela saiu ferida de todo time, mas garanti que as responsáveis pelo seu estado sofressem as consequências.
Quanto a , nosso relacionamento era exclusivamente uma rivalidade esportiva, eu o responderia na mesma intensidade que fosse provocada. Sua existência me tirava do sério? Absolutamente! Eu não compreendia como, mas ele parecia conhecer todas as coisas que me tirariam do sério. Quanto ao relacionamento do meu irmão mais velho, Kayron e senhorita , eles poderiam quebrar a cama e eu não gastaria um milésimo de segundo pensando nisso... mas ter a minha dor de cabeça pessoal com os faróis de seu novo carro — era óbvio que sua mãe lhe daria outro — direcionados para a minha janela em plena madrugada, antes da viagem para as competições estaduais, era demais!
As cortinas não impediam a luz, embora deixassem parcialmente o quarto escuro durante a manhã, mediante as luzes das lanternas do carro daquele boçal. O quarto estava claro demais para que eu conseguisse descansar para a viagem pela manhã até a cidade onde teríamos o dia para nos aquecermos, antes da fase inicial do Campeonato Estadual.
conhecia meus hábitos de forma irritante, assim como eu sabia tudo sobre ele — esse era um fato que eu detestava. Aquele ser irritante me ofereceu a droga de um remédio para dor de cabeça após me olhar de cima a baixo antes de um treino, quando o indaguei como ele sabia que eu estava com dor, deu ombros, antes de responder que uma semana antes das provas eu passaria horas em claro e estaria tomando meus remédios exatamente antes do treino, que era exatamente quando a dor surgiria. Ele conhecia os meus maus-hábitos.
Nos dias em que meu ciclo vinha, desaparecia do meu campo de visão, seus garotos ficavam em bons termos com as minhas meninas... nesses dias, meu rendimento estudantil era melhor e eu descansava, pois não havia nenhuma preocupação em meus pensamentos. O filho da mãe me conhecia bem!
Eu não me lembrava desde quando nos conhecíamos, eu só sabia que não éramos muito amigáveis um com o outro. Eu sabia nomear sem pestanejar o que ele gostava, seus maiores medos (estes foram descobertos com pequenos trotes feitos ao acaso), quando eu devia o pressionar ou quando devia recuar… a parte desagradável de ter meu rival nas palmas das mãos, era que ele me oferecia vantagens, isso desequilibrava os jogos e implicâncias, afinal, bastava eu soltar um de seus segredos que ele não revidaria. Esse, talvez, fosse o único motivo de permanecer em silêncio quanto ao que eu sabia, era fácil demais abrir vantagem.
era apenas uma sombra ofuscada pela luz de seus faróis, fechei a fresta que havia aberto para enxergar onde ele estava para então me agasalhar. Eu precisava dormir, porque havia técnicas, estratégias e observações a serem revistas, mas somente conseguiria isso após verificar o que ele queria.
Abri a porta, observando o corredor, caminhei nas pontas dos pés até o quarto de Hector... eu tinha mais ou menos uma ideia sobre o que fazer com , mas eu ia precisar de ajuda. Garry era muito impulsivo, ele tendia a coisas grandiosas e, nesse caso, eu precisaria de algo mais discreto, furtivo. Hector era a melhor escolha nessa situação! Seu quarto ficava no andar de baixo, o que tornava tudo mais conveniente, era claro que ele usufruiu disso muito bem. Hector era discreto, mas não santo.
Bati suavemente na porta do quarto dele, naquele instante, já havia calçado as botas que utilizava para realizar as tarefas da fazenda; meu irmão abriu uma fresta, espiando quem o estava incomodando.
— O que você está fazendo acordada a essa hora? — Ele resmungou, bocejando no final da sua frase.
Hector estava dormindo antes de eu o despertar.
— Amanhã você tem a viagem para as competições. — Seu tom havia adquirido a mesma entonação que o nosso pai utilizava para nos repreender.
— Eu preciso da sua ajuda. — Era apenas uma frase que derrubava a defesa de todos os meus irmãos, eu sabia que a mente deles os avisava de que deveriam negar, mas não havia uma vez que eles negassem um pedido.
Hector resmungou algo baixo demais, antes de indicar a porta do fundo, sinalizando para eu o encontrar do lado de fora.
Desapareci de sua vista rapidamente, tomei o cuidado de não fazer barulho, qualquer ruído descuidado poderia despertar a matriarca dos . O céu estava sem uma nuvem, permitindo a visão do manto estrelado, eu amava morar naquele lugar.
Respirei fundo, sentindo o perfume da maresia e natureza misturados em uma fragrância pertencente somente à minha casa. O som abafado da porta soou às minhas costas, Hector estava com os cabelos despenteados e a face visivelmente amassada devido ao sono. Contive a risada, o que meu irmão me deu um olhar nem um pouco amigável.
— O que você precisa desta vez, minha pestinha favorita? — Hector me olhou com diversão, o frio da madrugada parecia não o incomodar.
— Eu irei ver o que quer comigo, já que ele é incapaz de deixar todos dormirem em paz. — Bocejei cansada, eu realmente precisava dormir dada as circunstâncias. — Enquanto eu o levo para longe de seu carro, que está com as lanternas direcionadas para a janela do meu quarto, basta deixar o carro em um estado lamentável; não precisa ser algo tão dramático, não quero acordar nossos pais antes que possamos fugir de cena. — Pisquei para ele, Hector me deu um olhar de desconfiança.
— Repassando: você ficará sozinha com um garoto, que, primeiro: tem uma rivalidade gratuita com você; segundo: foi o responsável por suas advertências e penalidades sofridas pela equipe feminina; terceiro: ele é o responsável por seu carro ainda estar na oficina; e, por último: ele é um garoto, motivo o suficiente para não deixar vocês dois sozinhos. — Hector foi levantando seus dedos conforme enumerava as razões de não confrontar sozinha.
— Será apenas uma conversa, conseguirei tempo para você agir, enquanto o distraio. — Busquei passar confiança para ele, enquanto apresentava meu ponto de vista.
— Não é em você que eu não confio, é nele, . Eu te conheço bem o suficiente para dizer que sua competitividade com ele está ligada puramente ao esporte, já a dele, eu não diria que se trata disto. — Hector me disse com um tom preocupado, naquele instante, parecia que eu estava tendo uma conversa com meus pais.
— Você, papai e mamãe deveriam parar com essa conversa de que há sentimentos românticos envolvidos nessa competitividade, a existência de me irrita, assim como a minha deve ser para ele. — Respondi-o sem pestanejar, não duvidava do cuidado que meu irmão estava tendo comigo nem por um segundo, mas não acreditava que tinha sentimentos românticos por mim; a ideia de nós dois juntos me dava calafrios, era óbvio que isso se tratava de algo irreal, um absurdo!
— Quando você coloca algo em sua mente, é incapaz de ver o que está diante dos seus olhos, irmãzinha. — Hector balançou a cabeça, rendendo-se, ajustando sua postura.
Ele olhou em volta, verificando se mais alguém havia despertado.
— Todos herdamos a teimosia da mamãe. — Pisquei para ele, antes de detalhar o que eu precisava que ele fizesse.
Juntos, seguimos em direção ao curral dos animais com um balde. Hector juntou a mistura de feno e bosta de cavalo à água do balde. Soltando um cavalo, guiei-o até a frente da casa, permanecendo ainda nas sombras. Do ponto onde eu estava, conseguia ver , ele encarava fixamente a minha janela e em sua mão estava seu celular.
Falco era o nome do cavalo de Garret, meu irmão havia o treinado com assobios, o cavalo era bem adestrado e manso, o que tornava perfeito para o que eu precisava. Com um assobio, guiei Falco até a janela do carro de , eu não entendia o porquê, mas todos os animais assustavam .
Eu ouvi palavrões, enquanto uma porta foi aberta, segui na direção do som vendo se afastar de seu próprio veículo; passei por Falco, dando um cubo de açúcar a ele, e me aproximei de , levando-o dali. Na lateral oposta da casa, observei-o com atenção, havia olheiras debaixo de seus olhos s e tremia abaixo das minhas mãos.
Antes de analisá-lo, estava furiosa com o atrevimento de seus atos, porém, seguir com o plano era passar dos limites. Dei um assobio para Falco encontrar Hector, meu irmão entenderia que havia desistido.
Voltei minha atenção ao , após acompanhar Falco sair de cena. parecia não dormir por dias, sua tez havia perdido a cor e seus olhos pareciam não me enxergar de fato.
Eu havia passado dos limites...
Capítulo 22
— Está tudo bem, ele já foi embora. — Calmamente proferi cada palavra, segurei ambas as mãos de , tentando fazer com que ele olhasse para mim. — Hey, está tudo bem agora.
Aos poucos o foco foi tomando as íris ) de , eu me senti como uma babaca por utilizar seu medo ao meu favor. Respirei fundo, desviando do brilho intenso dos lumes dele e sem dizer nada, levei-o pela trilha que acabaria na praia abaixo do penhasco.
Quando criança, por ser muito energética, acabei encontrando sozinha o caminho em uma brincadeira de esconde-esconde, passei horas fazendo castelinhos de areia, juntando conchas, enquanto meus pais e irmãos estavam desesperados atrás do meu paradeiro. Antes dessa minha peripécia, eu já tinha visto meus irmãos tomarem a trilha, mas nunca havia passado por ela. Em dias mais quentes ou quando eu precisava pôr meus pensamentos em ordem, ia à praia pela trilha, independente da hora da noite, a lua iluminava todo o trajeto. Havia perdido a conta de quantas manhãs despertei com o som de quebrar das ondas e, felizmente, retornava antes que minha mãe notasse que eu havia passado a noite fora de casa.
— Pise onde eu pisar, não será um desafio para você, mas é sempre bom prevenir qualquer acidente eventual. — Avisei-o, enquanto passava por troncos e raízes.
permaneceu em silêncio, eu não sabia se era agradecida a isso ou achava perturbador ele não dizer nenhuma reclamação por conta da trilha. Ao fim, somente o som dos grilos e das ondas foram ouvidos, por algum motivo, não havia soltado minha mão; acreditando que ele estava evitando cair e eu conhecia bem o caminho, não dei muita relevância para isso.
— Você mora em um local cheio de passagens secretas para paraísos escondidos. — Foram as primeiras palavras que eu ouvi de assim que chegamos à praia.
A praia parecia reluzir com sua areia úmida banhada pelo luar prateado, o oceano se estendia em uma linha infinita com vários pontos de luz refletindo o céu estrelado. soltou minha mão assim que chegamos à praia, confirmando meu pensamento anterior.
— De fato, eu não poderia ser mais agraciada que isso. — Sorri, fechando os olhos por alguns momentos, sentindo o vento noturno sobre minha face. — O que você quer de mim, ? Você veio até a minha casa e não foi por sua mãe, pela manhã teremos a viagem para as competições estaduais. — Virei-me de modo a ficar de frente para ele.
— Eu não conseguia dormir… — ele deu de ombros, sentando-se sobre a areia, seus olhos s voltaram-se para o mar.
— E só porque não conseguia dormir, teve a brilhante ideia de que não me deixaria dormir também?! — Revirei os olhos, meu tom havia adquirido certa rispidez.
— Você continua sendo certeiro em me atingir todas as vezes, , você só não consegue enxergar as coisas diante os seus olhos. — riu de forma amarga, seus ombros estavam caídos, demonstrando uma fragilidade que eu nunca havia visto nele antes.
— Por quê…? — Eu não sabia formular uma pergunta em específico, a existência de era uma incógnita, assim como me irritava em tantos níveis, que não conseguia compreender ou expressar.
— Foi uma bela jogada ter utilizado meu medo de animais, embora eu não teria sido tão baixo. — Ele me deu um sorriso ácido.
— Eu admito que eu passei dos limites... dessa vez, apenas. — Sentei-me um pouco afastada, mas próxima o suficiente para distinguir os traços da face dele. — É por isso que eu te trouxe aqui, eu sei que gostaria daqui instantaneamente.
— Essa talvez seja a única vez que dirá desculpas em palavras claramente inapropriadas. O que te levou a concluir que eu gostaria daqui? — Ele apontou agora o cenário em si, seus olhos estavam sobre mim outra vez.
— Porque eu gostei daqui imediatamente, somos mais parecidos do que irei um dia admitir. — Respondi-o sem desviar daquelas lumes, parecia carregar um segredo que ele apenas sabia e isso ainda me tirava do sério, já que me instigava a querer descobrir.
gargalhou para o meu total espanto, sua risada ecoava pela praia deserta; por algum motivo, eu não achei o som dela detestável. Aos poucos, ele retomou seu estado que eu estava acostumada, o sorriso irritante naqueles lábios estava de volta ao jogo.
Revirei os olhos, voltando meu olhar para o mar, eu não entendia o alívio em meu peito por recuperar seu comportamento que eu estava habituada; no entanto, não daria muita atenção, senão teria pensamentos desnecessários.
— Em quais modalidades se classificou? — Ele indagou, quebrando o silêncio, eu sentia seu olhar sobre mim.
— Não pergunte quando já tem as respostas... — suspirei, massageando meus olhos.
Eu estava com sono e não havia dormido nem uma hora, quando ele apareceu para acabar com o meu descanso.
— Você ainda irá apostar no nado borboleta. — Não havia sido uma pergunta, parecia meio decepcionado pela minha decisão.
— Eu não preciso seguir os seus conselhos, eu sei o que estou fazendo. — Dei-lhe um olhar mal-humorado. — Há algo que eu desejo fazer esse ano no nacional, então não gaste seu tempo com atenção desnecessária, você tem problemas suficientes esse ano com a volta dos gêmeos ao cenário das competições estudantis. — Lembrei-o com seriedade.
Havia três nadadores que poderiam competir de igual para igual com , mas eram os gêmeos os verdadeiros problemas: e os gêmeos Nessbit eram rivais desde os campeonatos infantis. Devido a uma aventura em algum país que eles visitaram, ambos os idiotas saltaram de paraquedas para o mar, o resultado foram algumas lesões que reduziram significativamente o tempo deles nas competições. Esse ano, eles estavam mais afiados do que nunca, se quisesse manter seu histórico de vitórias consecutivas, o foco deveria ser seu melhor amigo.
— Você parece estar muito bem-informada quanto ao preparo deles. — A face dele escureceu e algo que eu não consegui identificar foi visto no olhar de .
— O inimigo de seu inimigo é seu amigo. — Pisquei para , que me olhou com ultraje, o que me levou a rir alto da careta que havia se formado em sua face.
— Eu não acredito que você citou Maquiavel para mim. — Ele prosseguiu, o que me fez rir ainda mais, no entanto, o olhar dele havia suavizado, era como se ele estivesse fingindo estar bravo para me fazer rir.
— Eu sou inteligente, você sabe. — Pisquei para ele.
— Nerd, você quis dizer. — Ele me "corrigiu" com o sorriso zombeteiro de sempre.
— Cala a boca! — Revirei os olhos, fosse lá o que havia o perturbado ao ponto de levar à minha casa, havia sido deixado de lado com o nosso diálogo sem sentido.
— Me ame menos, . — Ele piscou para mim, enquanto sorria.
Eu realmente não entendia nesses momentos, era como se se tornasse uma incógnita que eu não conseguia desvendar.
— Estou indo dormir, não se atrase para pegar o ônibus! — Levantei-me, espanando a areia da minha roupa. — Eu não vou ser punida por conta de seus atos outra vez!
— Você não foi àquela festa por ser careta demais. — Ele se levantou, repetindo meus movimentos, seu tom havia propositalmente provocativo.
— Responsável, não careta. — Corrigi-o sem me virar para ele, seguindo para a trilha que havia nos levado até ali. — Não que eu lhe deva satisfações, mas eu tinha um compromisso a qual eu deveria comparecer.
— E eu posso saber que compromisso era esse, minha adorável ? — O tom de zombaria permeava a voz de , ele estava cético ao que eu dizia.
— Não. Como eu disse anteriormente, não lhe devo satisfações. — Respondi-o, sendo direta.
Ele pareceu se perder em pensamentos, eu estava cansada demais e com sono o suficiente para não ligar para o silêncio; eu sabia que ele estava me seguindo devido ao som de seus passos atrás de mim. Sem me despedir, segui até a porta do fundo. Hector me esperava pacientemente.
— Quando voltar, iremos conversar sobre o que houve naquela praia. — Hector me falou num tom calmo, sem qualquer alteração que me preocupou, já que essa era a forma que nossa mãe utilizava para nos abordar. — Por agora, entre e vai dormir antes que nossos pais despertem! — Ele beijou o topo dos meus cabelos carinhosamente.
— Boa noite, maninho. — Sorri tranquilamente para ele, recebendo um sorriso de diversão em resposta.
O tempo que levei para tirar as botas, subir as escadas e pôr outro pijama em meu banheiro, escondendo as provas do meu tempo fora da casa, foi quando ouvi o som da voz de berrar no andar de baixo, despertando meus pais e a casa inteira.
— Merda, ! — Praguejei em um sussurro.
— Acho que nós criamos um monstrinho que anda aprontando muito ultimamente... — a figura que me disse tais palavras era ninguém menos que Garret, ele estava deitado preguiçosamente na minha cama.
Havia um sorriso felino em seus lábios, suspirei pesadamente.
— Agora deite aqui quietinha, antes que mamãe venha checar você. — Ele deu tapinhas no colchão. — Deixa que seu irmãozão te ajuda a escapar dessa. — Ele piscou para mim, enquanto eu tentava conter uma risada.
Obedeci, apesar da vontade de rir, e me juntei ao meu irmão, deitando sobre o seu peito, enquanto ele fingia estar dormindo devido ao som de passos se aproximando no corredor.
Capítulo 23
A matriarca abriu a porta num rompante, meus olhos nunca estiveram tão fechados quanto naquele instante.
— Quanto tempo ela está dormindo, Garry? — O tom utilizado por ela indicava que seria prudente Garret não me acobertar.
— Eu estive com ela a noite inteira, quando vim ver se ela havia pegado no sono, ainda estava debruçada sobre suas papeladas sobre o time. — Meu irmão não era a pessoa mais prudente, seu histórico meio que confirmava isso, Garret não havia parado de mexer em meu cabelo. — Ela não consegue pensar em outra coisa, senão nos nacionais, mãe, eu não saí do lado dela. — Garret utilizava aquele tom quando dizia apenas a verdade, mamãe conhecia Garry como ninguém, mas assim como eu, ela não esperava que ele fosse mentir tão descaradamente para ela.
— Garanta que ela não saia sem ter uma refeição adequada amanhã pela manhã, eu tenho que resolver essa bagunça. — Ela suspirou cansada, por hora, ela me deixaria escapar e só o divino sabia o que me aguardava após todas as competições.
Ouvi passos se aproximarem da minha cama, eu não movia nenhum um músculo com medo de revelar que estava desperta. Senti um aperto em minhas bochechas, que me fizeram abrir os olhos, assustada. Minha mãe exibiu o mesmo sorriso que dizia que eu estava muito encrencada, mas, ainda assim, havia uma diversão e humor em suas íris, que embora não concordasse com minhas atitudes, ela se divertia com elas.
— Hector mentiria melhor, minha menina... — ela riu, beijando o topo dos meus cabelos. — Quando as competições terminarem, você terá sua punição, até lá, minha filha: dê uma surra nessas nadadoras de meia-tigela e mostre do que um é feito! — Ela apertou uma última vez minhas bochechas, antes de se levantar. — Seu cesto de roupas sujas carrega o mesmo odor do carro desse garoto infeliz, se quer se safar de algo, elimine as provas. — Ela apontou para o cesto no banheiro.
Ela piscou, antes de segurá-lo.
— É um milagre que eu não esteja grisalha graças as peripécias de vocês, meus adoráveis pentelhos.
Assim que minha mãe saiu do meu quarto carregando meu cesto, ri ainda surpresa com o rumo que as coisas tomaram. Garret riu, mas assim que ouvimos passos próximos do quarto, fingimos estar dormindo. Ter conseguido dobrar a matriarca havia sido um milagre, agora haveria mais dois a se dobrar.
— Kayron, eu acabei de dar aquele carro ao meu filho e agora tenho que mandar para a concessionária para retirar outro! — A voz da mãe de soou em histeria, a raiva que ela sentia por mim era absurda.
— Zara, foi o seu filho que a provocou primeiro; eles são jovens e estão tensos por conta dos torneios de natação. — Eu nunca havia ouvido meu irmão utilizar um tom tão calmo; era a mesma tática que meu pai usava para acalmar nossa mãe.
— Não, Kayron! Não comece a defender sua irmã caçula agora, ela explodiu o carro anterior de meu filho. — A mãe de exclamou em resposta, sua insatisfação era explícita.
— Seu filho quase destruiu o dela também, a diferença é que não saímos comprando coisas desnecessárias para . — Meu irmão soou extremamente sério, ele não levantou nem uma oitava de seu tom, Kayron não precisou elevar sua voz para validar seu ponto de vista.
— Ela o persegue pessoalmente naquele colégio miserável. — Zara procurou qualquer brecha para não confirmar que meu irmão estava certo.
— Não é isso o que tenho visto e ouvido, Zara, seu filho não é o inocente que está tentando me convencer a acreditar. — Kayron respondeu firmemente, ouvi um ruído como se a maçaneta estivesse sendo girada. — é quem procura de todas as formas ter a atenção de , cada mínima reação, é causada para afastar seu filho e impor limites.
De uma vez, Kayron abriu a porta do meu quarto, assustando-me de modo que eu abrisse os olhos por conta disso. Zara, a mãe de , me lançou um olhar de extremamente desagradável, antes de sumir pelos corredores.
Kayron olhava para o chão, imaginava que em sua mente havia uma confusão de pensamentos.
— Neste exato instante eu passei de pessoa menos importante a mais odiada muito rápido. — Olhei para Kayron tranquilamente, eu realmente sentia muito pela confusão causada em seu relacionamento, mas não poderia deixar escapar alguma piadinha.
Minha frase fez surgir um sorrisinho de canto nos lábios do meu irmão mais velho.
— Você e ainda me darão muita dor de cabeça. — Kayron se sentou na ponta da minha cama, balançando a cabeça em negativa.
— Eu não gostaria de estar em sua pele nem por um momento, pestinha. — Garret riu, sentando-se. Seu sorriso de canto era sua marca registrada.
— É por isso que Hector é o melhor irmão entre vocês dois! — Cruzei meus braços, revirando os olhos, enquanto apoiava minhas costas na cabeceira da cama.
— Diga isso quando Cecília estiver por perto, duvido que terá uma noite de paz. — Hector anunciou sua presença pegando todos de surpresa, ele andou cheio de confiança até se sentar ao lado de Kayron, o qual lhe deu um tapa em suas costas. — Hey! Isso dói! — Hector praguejou, olhando com desagrado para Kayron.
Garret apenas riu.
— Isso é o que você ganha por ajudar com mais uma de suas armações. — Kayron revirou os olhos diante a expressão de Hector. — Não vá achando que você está imune aos meus punhos, Garry, Hector não é o único que se rende aos caprichos da nossa irmãzinha.
— Você deveria se incluir nessa lista, Kayron. — Olhei-o com indignação. — Não é justo você acusá-los de algo que você mesmo já fez. — Lembrei-o com apenas um olhar.
— Aí está o pequeno monstrinho que criamos! — Garret se expressou com gestos dramáticos, fazendo Hector e Kayron revirarem os olhos, antes de rirem rendidos.
— Parece que não há nada que nossa pequena pentelha peça, que possamos negar. — Hector concordou, trocando olhares com Garret e Kayron.
— Eu preciso que você seja uma boa garota com , . — Kayron ajustou sua postura, parecia que ele não desejava me dizer tais palavras, embora precisasse. — A mulher que será minha esposa acabou sendo a mãe de seu rival.
— Toda ação possui uma reação, eu não lhe prometerei nada, irmão. — Desviei meu olhar, eu desejava a felicidade dele, mas não prometeria algo que talvez não conseguisse cumprir. — Você é livre para escolher quem amar, mas isso não significa que tem o direito em me dizer como devo lidar com . — Discordei categoricamente. — Isso não seria justo.
— Ela está correta quanto a isso, irmão. — Hector colocou seu braço sobre os ombros de Kayron. — Quem você acha que ela se inspirou? Somos péssimas figuras de exemplo; cresceu com a gente aprontando uns com os outros. Você pode culpá-la por agir exatamente como você agiria na posição dela? — Garret se pronunciou em um tom mais sério, ele não estava errado em colocar Kayron contra a parede, embora ele tendesse ser mais brincalhão em momentos assim, deixando o ar mais responsável para Hector.
— Eu sei que não estou sendo justo, é só que…— Kayron se perdeu, enquanto procurava palavras que se encaixassem com seu pensamento.
— É porque você não sabe qual partido tomar, já que compreende os dois lados dessa confusão. — Hector sorriu tranquilamente, enquanto piscava para Kayron.
— Você não precisa se meter em confusão por minha causa. — Aproximei-me de Kayron, vendo os orbes dele se encherem com divertimento. — e eu provavelmente iremos causar muita confusão por causa dessa rivalidade que possuímos.
— Agora ela fala como uma verdadeira ! — Garret gargalhou, derrubando-me na cama, movendo-se de modo a me fazer cócegas, enquanto Hector e Kayron permaneceram apenas observando.
— Traidores! — Cuspi, enquanto tentava me libertar das mãos de Garret, o riso escapava, deixando-me sem forças.
Estávamos todos em bons termos, Garret e Hector haviam mediado fosse lá o que poderia ter se tornado essa situação. Kayron era o mais velho dentre nós, a pouca diferença de idade entre Hector, Garret e ele facilitava o convívio e embora isso os aproximasse, já foi motivo de intrigas tipicamente de irmãos. Cecília chegou na vida dos três apenas para ajudá-los a se meterem em mais confusão e após se casar e sair da cidade, o laço entre os meus três irmãos, que permaneceram na cidade, se fortificou.
— Tenho certeza de que a mãe de vocês os aconselhou em tudo, menos a causar mais estrago na situação caótica desta madrugada. — A voz calma, porém cansada, de meu pai silenciou a todos.
— Iremos dormir, pai. — O coro de crianças que foram pegas no flagra aprontando soou alto no silêncio que se instaurou com a presença dele.
— O sol nem nasceu para que a agitação começasse logo cedo. — Ele esfregou os olhos cansados. — Cada um arcará com as consequências dessa noite, mas, por hora, vamos descansar, eu não quero ter de retornar para tomar alguma atitude. — Nosso pai nos avisou com tranquilidade, antes de se despedir após um “boa noite”.
— Tudo bem, eu devo uma a cada um de vocês. — Olhei para cada um dos meus irmãos, rendida.
— Ela aprende rápido. — Garret comentou, colocando-se de pé.
— Agora se mandem! Eu tenho competições para me preocupar, espero que estejam lá no segundo dia do campeonato! — Deitei-me debaixo dos cobertores, enquanto os intimava a comparecer na competição.
— Veja só! Ela acha que pode nos expulsar dessa maneira e ainda exigir isso?! — Hector comentou com falsa indignação.
— Acho que não devemos comparecer devido a tal falta de respeito com seus adoráveis irmãos mais velhos. — Kayron comentou na maior cara de pau.
— Falte a competição para ver se não terão com o que se preocupar. — Respondi-os em aviso.
— Como se pudéssemos fazer tal coisa! — Kayron riu, abaixando-se de modo a me deixar um beijo no topo dos meus cabelos. — Durma bem e mostre a todos do que você é feita!
— Boa noite, minha pequena monstrinha! Eu sei que você vai chutar a bunda daquelas megeras nos torneios! — Garret seguiu o mesmo ato de Kayron, seu sorriso era de diversão e carinho.
— Você é quem faz o seu destino, boa sorte durante a competição. — Hector seguiu o exemplo dos dois, antes de pararem em frente à porta do meu quarto.
— Amo vocês, boa noite! — Saudei-os, antes de me virar fechando os olhos.
Adormecer foi questão instantânea, o sono realmente me acolheu rapidamente. Eu fui dormir tranquilamente graças aos meus irmãos mais velhos, era grata por tê-los sempre presentes em minha vida. Eu sabia que depois de meus pais, eles eram os meus maiores protetores; Cecília poderia não morar mais ali, mas sua presença era constante durante os feriados, afinal, a família vinha em primeiro lugar na casa dos .
Capítulo 24
Eu não me sentia preparada para despertar, o sono enevoava meu olhar, enquanto batia de modo aleatório contra a mesinha de cabeceira atrás do despertar. Eu havia dormido muito pouco graças aos eventos daquela madrugada, eu imaginava que todo e qualquer humor amigável que poderia ter por mim havia ido para o espaço após o que Hector fez ao seu carro.
Procurando deixar isso de lado, segui para o banheiro, um banho sempre me ajudava a clarear a mente e talvez levasse meu sono embora.
A tensão dentro da sala de jantar poderia ser cortada por uma faca, meus pais e irmãos tentavam ser os mais cordiais, embora o mau-humor dos permanecesse firme. Olhares desagradáveis, fuziladores, foi o que recebi assim que adentrei o ambiente. Minha família me saudou como de costume, devolvi-lhes o “bom dia” com um sorriso, resolvendo me sentar ao lado de meu pai, ficando de frente ao Garret e afastada da figura nem um pouco amigável de .
O som de xícaras, algumas conversas baixas e amistosas foram o plano de fundo daquele desjejum.
Após terminar de comer, segui para o meu quarto checando minha mala uma última vez, guardando minha planilha de estratégias em uma bolsa que seguiria comigo dentro do ônibus e, então, escovei os dentes antes de descer as escadas para encarar o desafio da vez: seguir para o colégio com um furioso.
Garret já estava com as chaves de seu caminhão de entregas em mãos quando atingi o último degrau.
— Tchau, papai, mamãe. — Abracei meus pais, sorrindo ao sentir eles beijarem cada uma das minhas bochechas.
— Eu tenho muito orgulho de você, faça o seu melhor, meu amor. — Meu pai sorriu, piscando para mim.
— Estaremos te assistindo, querida, entregue o seu melhor para não ter arrependimentos depois, mas saiba que sempre estaremos ao seu lado para apoiá-la. — Minha mãe me abraçou mais uma vez, antes que Hector me puxasse e me colocasse de ponta cabeça em seus ombros.
— Hey! Me coloca no chão!!! — Eu gritava, rindo, enquanto Hector seguia até o caminhão de Garret correndo comigo em seus ombros.
Eu conseguia ouvir minha família rir da cena cômica que se desenrolava, revirei os olhos, rendendo-me e gargalhando. A tensão que eu nem sabia que estava sentindo sumiu com a brincadeira de meu irmão; Hector me colocou no chão, bagunçando meus cabelos em seguida, e antes que eu pudesse lhe bater, ele me abraçou ainda rindo.
— Estamos orgulhosos da nossa pestinha, faça o que sabe fazer de melhor. — Ele sorriu, deixando Kayron se aproximar. — Não seja tão duro com ela. — Hector o avisou num tom baixo.
— Estamos em bons termos? — Indaguei receosa, a madrugada havia sido cheia de risos, mas ele ainda tinha uma mulher ao seu lado, a qual não era a minha maior fã ao seu lado.
— Sempre, pentelha! — Ele bagunçou meus cabelos igual a Hector rindo. — Eu sei que é uma nadadora por natureza, não se force além do seu limite, mas entregue o seu melhor. A sua família vai amá-la independentemente do resultado. — Ele me ergueu, girando-me, arrancando-me risos.
— Eu amo vocês, nos vemos logo! — Sorri para minha família, antes de adentrar o caminhão de Garret.
Garret já estava em seu lugar, ao lado dele estava , seu olhar estava em sua mãe. Inclinando-me em direção ao rádio, senti um tapa em minha cabeça, virei-me e vi Kayron rir.
— Vocês dois têm que se esforçar para serem, ao menos, bons colegas!
Quando eu ia dizer algo, Kayron me calou apenas com um olhar.
— Seremos parte da mesma família, quero vê-los sendo cordiais nos torneios!
— Até o torneio! — Despedi-me de Kayron antes que Garret desse a partida.
Capítulo 25
Houve um silêncio constrangedor, antes de Garret olhar-nos com certa graça, ele parecia morder o interior de sua bochecha evitando rir. Com um aceno, ele indicou o rádio, liguei, enfim, o som e o silêncio foi preenchido pelo som da melodia da música.
— Então vocês vão ficar ignorando a existência um do outro por mais quanto tempo? — Garret indagou com naturalidade, embora houvesse um sorriso ladino em sua face.
Meu irmão se divertia com aquela situação, embora seu olhar estivesse voltado para a rua, seu sorriso indicava que ele não pararia por ali.
— Vocês dividirão o mesmo ar por horas durante a viagem, esqueceram?
— Garry. — Usei um tom de aviso, o qual ele claramente ignorou.
— Vamos lá, pirralhos, vocês vão ter muita dor de cabeça um com o outro devido a esse casamento inesperado que virá. — Ele comentou com naturalidade, enquanto acompanhava a música batendo seus dedos no volante. — Ou aprendem a tolerar a existência um do outro, ou então viveremos pisando em ovos.
se preparou para dizer algo, o qual eu sabia que seria puramente desagradável devido ao vê-lo contrair sua mandíbula antes de expirar o ar calmamente. Para evitar um possível desastre — Garret era o menos paciente entre nós —, tampei a boca de com a palma da minha mão, o olhar de ultraje de gerou um ataque de risos em Garret, que estacionou o caminhão.
— O que foi isso agora? — Garret tentava dizer entre risos.
— Você não ia querer descobrir. — Limitei-me a dizer, enquanto limpava minha mão na calça.
— Você não tem o direito de decidir por mim, ! — estava se segurando, seus olhos brilhavam em pura raiva.
— Acredite ou não, eu sei exatamente o que escaparia dessa sua estúpida boca. — Virei-me de frente para , ignorando Garret que havia cessado o riso para prestar atenção no que dizíamos.
— E a sabe tudo ataca outra vez! — me respondeu sarcasticamente. — Eu não ligo para o que você e…
Interrompi-o novamente com minha mão, meu olhar estava carregado em irritação.
— Só cale a droga da sua boca, , neste automóvel você tem a pior combinação de que você desejaria provocar nesse instante. — Retirei minha mão da boca dele procurando por algo que pudesse limpá-la. — Eu estou fazendo isso para o seu próprio bem.
— Deixe ele terminar o que queria, irmã. — Garret se pronunciou, atraindo nossa atenção.
— Era de se esperar que fossem maldosamente parecidos! — devolveu a fala, como se ela fosse o que queria dizer em primeiro lugar.
— Você tem muito o que aprender ainda, garoto, começando com sua boca imprudente. — Garret respirou fundo, controlando seu temperamento difícil. — Ela te arruinará um dia. — Ele então ligou o caminhão, retornando ao trajeto inicial.
— Por que vocês sempre acham que têm razão em tudo? — retrucou, nem um pouco amigável.
— Cada ação há uma reação, , pensei que houvesse aprendido isso em física trimestre passado. — Provoquei-o, sorrindo cordialmente.
— Então me diga que reação seria proporcional ao que ocorreu durante a madrugada? — Ele me perguntou sem se importar com a presença de Garret.
Havia dois problemas na frase que ele citou: a primeira era que usou propositalmente a presença de Garret para me pressionar; a segunda era que Garret era o irmão mais protetor entre meus quatro irmãos mais velhos, ele superava Kayron e Cecília juntos!
Eu sentia o olhar de esguelha de meu irmão, chegava a queimar diante a intensidade.
— Você já está devolvendo a ação com sua atitude grosseira, desrespeito e certa zombaria em relação à minha família. — Sustentei o olhar de , evitando Garret.
— E a boca atrevida de Luv ataca outra vez! — me respondeu com um sorriso presunçoso, utilizado para provocar especialmente Garret.
Meu irmão estacionou seu caminhão na entrada do colégio, havia pouco fluxo de alunos devido ao horário, era cedo demais para se estar nas dependências daquele lugar.
Garret desceu do caminhão batendo a porta, o sorriso irritante que enfeitava os lábios de dizia que estava satisfeito com o rumo que a conversa havia tomado.
— Não pense que sairá ileso dessa, você não conhece aquele que acabou de provocar. — Dirigi-me ao , antes de deixá-lo sozinho.
Capítulo 26
— Garry — chamei meu irmão quando estávamos a poucos passos do ônibus. Parecia que ambas as equipes já haviam tomado seus lugares. Respirei fundo, tentando não imaginar o pior cenário que poderia enfrentar; corri até Garrett e parei em sua frente.
— Nem uma só palavra, pentelha! — ele me avisou. Sua voz estava branda, embora fosse perceptível que ele estava tentando se controlar.
— Hector esteve de olho em nós. Você acha mesmo que ele ia deixar ficar menos que a cinco passos de mim?! — arqueei minha sobrancelha, rindo da expressão na face de meu irmão.
— Aquele filho da mãe causou toda a confusão e você levou os créditos! — Garrett tentava manter a postura defensiva enquanto lutava contra um sorriso querendo despontar em sua boca.
— Bem, fui eu que pedi ajuda a ele, então é justo que eu leve a culpa — pisquei um olho para meu irmão, que acabou rindo. Ele passou as mãos pelos cabelos.
— Eu juro que dou uma lição naquele bastardo! — Garrett riu, nos levando até o ônibus. — Não pense que hoje será esquecido. Por hora vou relevar, já que minha pestinha favorita vai arrebentar com essas patricinhas enquanto vence elas em todas as etapas — ele ajudou o motorista a guardar minha bolsa, antes de me erguer em um abraço de urso.
— Vocês não vivem sem mim, irmãozinho! — comentei rindo enquanto permanecia no abraço dele. — Obrigada por todo o apoio. Não deixe a mamãe saber que vocês apostam em mim toda vez. Ela não faz ideia que meus adoráveis irmãos participam de um esquema de aposta em todos os campeonatos da caçula!
— Desde quando você tem conhecimento disso? — Garrett me soltou enquanto me olhava com curiosidade.
— Você subestima minha inteligência, Garrett — ri enquanto o via balançar a cabeça negativamente.
— Definitivamente criamos um monstrinho ao invés de uma princesa — ele me empurrou de lado enquanto ria da careta que se formou em minha face após sua fala.
— Cala a boca! — resmunguei, tentando não rir junto com ele.
— , , já para dentro do ônibus! — a treinadora surgiu de dentro do ônibus com sua caderneta, na qual deveria conter a lista de presença. — Que falta de responsabilidade por parte dos capitães! Vocês estão atrasados!
— Boa sorte, irmãzinha, você vai precisar — Garrett me abraçou uma última vez, me empurrando em direção à porta do ônibus.
Revirei meus olhos antes de entrar rindo enquanto me despedia de Garrett. já havia se sentado em seu lugar; o que eu não esperava era que o único banco livre naquele ônibus fosse justamente ao lado de .
— Isso só pode ser brincadeira! — suspirei, contendo um palavrão.
— É exatamente o que parece, Srta. . Quem chegou atrasado não tem direito de escolher seus próprios assentos — a treinadora surgiu às minhas costas após conversar com o motorista.
— Isso é um indicativo de desastre, treinadora! — tentei negociar enquanto se mantinha com a face inexpressiva encarando a janela. O filho da mãe havia pegado o assento da janela!
— , não vamos começar uma confusão, sim?! — ela apenas disse, tentando ao menos conter sua reprovação.
— Mas…
Fui interrompida por , que parecia mais atento à conversa do que transparecia.
— Serão apenas algumas horas, , pare de ser infantil — ele rolou os olhos, como se eu estivesse sendo inconveniente.
— Obrigada, . Agora se sente, — a treinadora voltou a indicar o assento. — Se seu rival não está implicando com isso, por que você está causando todo um problema?!
Me sentei a contragosto enquanto observava a treinadora repetir as informações que ela provavelmente já havia repassado às equipes antes que e eu chegássemos. Fingi prestar atenção no que ela dizia, já que o próprio Mister Hopkins havia informado a ambos os capitães antes da competição pelo título de presidente do clube de natação. A treinadora deixou o ônibus e seguiu até o carro do treinador da equipe masculina do nosso clube; a porta se fechou e o motor do ônibus foi ouvido.
Entre nossos assentos – o meu e o de – havia uma espécie de parede que separava o motorista de nós. Bem no centro dela havia uma porta que daria na cabine do motorista, onde ficava a porta para fora do ônibus. Estar sentada nos primeiros bancos não era o que me incomodava, ou estar ao lado do corredor… O que me perturbava era justamente estar muito tempo na presença de . Eu não entendia o que o Universo queria, pois tudo o que me ocorria sempre acarretava em passar um longo tempo com . Era como se eu estivesse sempre me afastando de meu rival e colega de clube. Uma força da natureza parecia me levar sempre até ele. Não importava o quanto eu o empurrasse para longe; sempre acharia uma forma de trazer sua figura irritante para perto.
Como eu o odeio!
Capítulo 27
— Você tem um gosto até que aceitável para músicas — nem se incomodou em esconder que olhava minha playlist enquanto eu estava atrás de algo para ouvir.
— Não estou com humor para suas gracinhas, — o olhei de um modo nem um pouco amigável.
— Estou tentando um acordo de trégua, já que teremos de suportar um ao outro pelos próximos dias — ele me respondeu em seu característico tom de voz.
— Teremos de nos tolerar por muito mais que isso, ou já se esqueceu que sua mãe se casará com o meu irmão?! — o lembrei, sem nem um pouco de ânimo.
— Você parece tão animada quanto eu com essa união — me respondeu em um tom claro de sátira.
— Isso não cabe a nós decidir. Ambos são adultos, ! — a impaciência banhava cada sílaba pronunciada. — E nem pense em comentar sobre esse casamento antes que eles assim o anunciem à nossa comunidade fofoqueira — meu olhar se tornou ameaçador. Eu não estava para brincadeiras.
— Você fica incrivelmente intragável com sono, Luv — me deu seu sorriso arrogante, como se me utilizasse para sua diversão pessoal.
— Cale-se, ! — rolei os olhos antes de clicar em uma faixa aleatória, me virando para o canto oposto a e enfim fechando os olhos.
— Você tem um gosto até que aceitável para músicas — nem se incomodou em esconder que olhava minha playlist enquanto eu estava atrás de algo para ouvir.
— Não estou com humor para suas gracinhas, — o olhei de um modo nem um pouco amigável.
— Estou tentando um acordo de trégua, já que teremos de suportar um ao outro pelos próximos dias — ele me respondeu em seu característico tom de voz.
— Teremos de nos tolerar por muito mais que isso, ou já se esqueceu que sua mãe se casará com o meu irmão?! — o lembrei, sem nem um pouco de ânimo.
— Você parece tão animada quanto eu com essa união — me respondeu em um tom claro de sátira.
— Isso não cabe a nós decidir. Ambos são adultos, ! — a impaciência banhava cada sílaba pronunciada. — E nem pense em comentar sobre esse casamento antes que eles assim o anunciem à nossa comunidade fofoqueira — meu olhar se tornou ameaçador. Eu não estava para brincadeiras.
— Você fica incrivelmente intragável com sono, Luv — me deu seu sorriso arrogante, como se me utilizasse para sua diversão pessoal.
— Cale-se, ! — rolei os olhos antes de clicar em uma faixa aleatória, me virando para o canto oposto a e enfim fechando os olhos.
Se houve algum ruído durante a viagem? Eu não tinha a menor ideia! Durante todo o trajeto eu tinha garantido ao menos descansar e recuperar um pouco de energia, já que não pude dormir direito aquela noite. O problema foi quando despertei um pouco antes de atingirmos nosso destino final. Havia uma superfície macia abaixo da minha cabeça, um perfume claramente masculino, e algo cobria meus braços tal como um cobertor. Meus olhos demoraram a aceitar que minha cabeça repousava sobre o peito de , que o cobertor era nada mais que sua jaqueta sobre meus braços e por fim: ele havia se dado o direito de pegar um dos lados do meu fone, de modo a também ouvir música! Contive um grito, sufocando todos os palavrões que eu gostaria de proferir, mas os sussurros indicavam que a maior parte de ambas as equipes estavam dormindo me impediram; afinal, não gostaria que soubessem que eu havia adormecido em .
Ao levantar meu olhar, encontrei me olhando de forma divertida; seu sorriso petulante permanecia cravado em sua boca. Ele não retirou o fone mesmo que eu houvesse despertado, permanecia tranquilamente desfrutando da música como se fosse algo comum.
— Se eu descobrir que tiraram fotos de nós dois dessa forma, … meu irmão não será a sua maior preocupação! — me sentei ereta no banco enquanto entregava sua jaqueta a ele, buscando não elevar meu tom de voz de forma a não ser descoberta.
— Como se o fato de você dormir jogada em cima de mim fosse culpa minha! — ele me respondeu de forma ácida. — Eu não me gabaria disso, se é que é algo pelo qual eu possa me gabar! — me entregou o fone, me respondendo no mesmo tom que eu havia utilizado.
— Troglodita! — rebati, nem um pouco amigável.
— Controladora! — ele me respondeu, irritadiço.
— Filhinho da mamãe! — retruquei, deixando minha postura ereta.
— Mimada! Seus irmãos são piores que seus pais, ficam cedendo a todos os seus caprichos! — ele desdenhou, seus olhos esmeraldas brilhavam em sua irritação.
— Você é o claro exemplo de garoto mimado, ! Nem ouse comparar-nos dessa forma. Sua mãe cede a cada um de seus caprichos! — o respondi no mesmo tom; nossas vozes estavam aumentando o volume gradativamente.
— Você está jogando sujo, tal como utilizou o meu medo de animais contra mim — ele aproximou-se de forma que nossas faces ficaram a centímetros uma da outra.
— Uma vez, … — levantei o indicador, enumerando minha fala. — Apenas uma vez eu passei dos limites, o que não se compara ao número de vezes que você utilizou sua mãe para fazer com que Mister Hopkins me punisse! — o lembrei friamente, e piscou como se lembrasse de algo.
As palavras não ditas ecoaram no vazio, pois assim que o ônibus estacionou e foi nos dado a autorização de sair, eu simplesmente deixei para trás, sozinho num banco que jamais imaginei dividir com ele.
Capítulo 28
— Hoje é realmente o meu dia de sorte. Encontrá-la sempre é um deleite, minha admirável Sirena* — Apollo me manteve um tempo a mais em seus braços antes de me soltar.
— É de uma imensa falta de respeito não oferecer seus cumprimentos a mim também, Ardósia das Águas — Kalil se aproximou, se apoiando nos ombros de seu gêmeo.
Os gêmeos Nessbit me encaravam sem nenhum pudor. Eu os conhecia desde pequena, já que por muitos anos estive em competições; no entanto, eles haviam criado uma certa fixação sobre a minha figura. Seus interesses sempre foram claros, porém eu nunca os correspondi. Como atraído pela dupla do caos, Daniel Wright surgiu da entrada oeste, onde o ônibus do Colégio Boulevard havia estacionado alguns minutos atrás.
— Nessbit, — Daniel nos cumprimentou, sua voz impassível e com um quê de refinamento.
— Vocês três adoram me colocar em confusão — ajeitei minha bolsa em meu ombro, ignorando a quase imperceptível curvatura nos lábios de Daniel, como se ele estivesse se divertindo com a atenção que nós quatro atraíamos.
Daniel Wright era o capitão da equipe de natação masculina do Colégio Boulevard, um velho rival de . As famílias Wright e eram amigas tanto nos negócios quanto na vida cotidiana; por muitas vezes havia visto a figura de Daniel em nossa cidade. Já os gêmeos Nessbit eram rivais adquiridos por durante os torneios, com personalidades tanto semelhantes quanto diferentes. Havia um desgosto óbvio entre eles.
Eu sentia o olhar do meu próprio colégio sobre mim, mas um olhar que queimava mais entre eles era o de . Eu saberia identificá-lo mesmo de costas – a ironia de conhecê-lo tão bem. Ao mesmo tempo, havia nuances tão nebulosas que ele se tornava uma incógnita para mim.
— Você é uma figura notável. Pensei que já soubesse disso, Sirena?! — Apollo sorriu, piscando um dos seus olhos para mim.
— Não estou com humor para suas cantadas baratas, Apollo — o cortei de forma séria. Eu não estava em meus melhores humores.
— Qual foi a jogada da vez de ? — Daniel me indagou com tranquilidade e certa presunção.
Eu poderia detestar o meu rival natural, não suportar permanecer mais que alguns segundos no mesmo ambiente que . Porém, fora daquelas paredes de concreto que era o nosso colégio, eu dificilmente tolerava o desrespeito com algum dos meus colegas de equipe. Meu olhar endureceu, e todo e qualquer ar brincalhão escapou da face dos gêmeos. Kalil deu um passo para trás enquanto Apollo continha uma risada zombeteira em uma máscara defensiva.
— Você não é tão inteligente como diz ser, Wright — me virei para ele com um sorriso ácido em meus lábios. — Não vá achando que sabe alguma coisa sobre o meu parceiro de equipe. Acredite em mim, te comerá vivo nas competições.
Os gêmeos acabaram estourando em gargalhadas ácidas. A face de Daniel não alterou nem uma só ruga, porém seu olhar se tornou tão frio quanto o gelo. A rivalidade que os gêmeos possuíam com era brincadeira de criança se comparada com a de Daniel e ; aqueles dois eram rivais naturais criados pela familiaridade que um possuía do outro. Eu sabia que Daniel invejava o talento e dedicação ao esporte, mas o mesmo ocorria com . Eles possuíam os mesmos objetivos; por conta disso, o desgosto era mútuo.
— Não se esqueça de torcer por nós, Sirena — Kalil piscou para mim, sorrindo para o seu irmão como se compartilhassem um segredo.
— Sinto muito, estarei ocupada demais batendo meus próprios recordes — sorri como se estivesse lhes contando um segredo.
— Cuidado para não perder o seu trono, minha cara Rainha das Águas — Daniel me respondeu com o mais puro desprezo escapando em seu tom congelante.
— Não estou nem um pouco preocupada, Wright — meu olhar encontrou o de ; em seus olhos havia a mesma sombra indecifrável que eu não conseguia identificar. Ele desviou o olhar e voltou sua face para o grupo de garotas que o cercava enquanto em seus lábios surgia o típico sorriso galanteador. — Não sou estúpida e muito menos imprudente, estou sempre atenta às minhas adversárias — me espreguicei, deixando minha bolsa pender um pouco enquanto ouvia minha articulações estalarem. — Eu não as subestimo. Não teria qualquer graça vencer sem um pingo de desafio… Afinal, uma verdadeira competição só é divertida quando não se tem a vitória garantida! — me aproximei dos gêmeos, puxando as orelhas de ambos. — Espero ver vocês darem um pouco de trabalho para o galã ali. Me inspirem a ponto de me deixar com vontade de nadar! — me ergui na ponta dos pés, puxando a cabeça deles para baixo, de modo que eu pudesse olhá-los cara a cara. — É tão bom tê-los de volta! Senti falta de vocês dois, pequenos monstrinhos!
Saí rindo dali após ver os gêmeos – que não calavam a boca – chocados com minha atitude. Eles sempre me renderiam ótimas gargalhadas. Avistei os treinadores juntando os alunos enquanto procuravam com o olhar os desgarrados. Pisquei para Daniel antes de pegar minha bagagem no ônibus e seguir para perto da treinadora nem um pouco amistosa.
Eu sentia que, de alguma forma, aquelas competições me surpreenderiam.
Os dois últimos andares eram sempre os mais difíceis de se reservar. Geralmente, a equipe do Colégio Boulevard ficava com os três últimos, excluindo qualquer interação com os colégios. Eles eram os campeões majoritários. A equipe deles conquistava a maior parte dos troféus e medalhas, com a clara exceção das que e eu tomávamos deles. e eu poderíamos nos detestar, mas durante as competições, éramos um só pilar. Motivávamos nossos companheiros, mostrávamos que nosso colégio estava no mesmo nível que o Boulevard. Assim o Colégio D’Antelli se tornou o principal rival do Boulevard.
Do alto eu conseguia respirar com mais tranquilidade. Todos os nadadores conheciam o local tão bem quanto suas próprias escolas; sempre haveriam novatos e veteranos naquele torneio. O tempo de deixar as raias dentro das águas estava chegando. Eu esperava cumprir todas as minhas expectativas… Amava nadar. Amava a sensação do meu corpo atravessando de um lado para o outro, movimentando-se de forma rápida, lenta, ritmada, ou apenas estático. Eu não me importava se competia ou se apenas me deleitava em estar na água. Contanto que pudesse me mover da maneira que eu quisesse, estaria satisfeita. Dentro de piscinas, mares, rios e lagos me sentia livre como uma andorinha atravessando os céus em sua jornada migratória. Em minha vida havia fases: quando aprendi a nadar, quando venci meu primeiro medley, quando descobri que não me importava com competições e a minha atual – quando enfim descobri qual era o meu objetivo de vida!
Capítulo 29
Comecei muito nova a competir. Dois anos antes do ensino médio, resolvi dar um tempo das piscinas. Expandir horizontes, olhar para dentro de mim e procurar compreender quem eu era e o que desejava alcançar foi tudo ao que me dediquei. O início do ensino médio marcou meu retorno às piscinas, e meus anos afastada apenas melhoraram meu desempenho. Eu sabia do potencial que possuía, sabia que era um desperdício não me aventurar mais. No entanto, havia compreendido que eu tinha mais de um talento. Com a descoberta de novas paixões, as aspirações surgiram; novos sonhos e objetivos tomaram forma.
— Você está aqui.
Uma voz interrompeu minhas divagações, o tom usado beirava o alívio e a presunção. Meus olhos se fecharam enquanto sorvia o ar calmamente. Ele estava me testando da mesma forma que sua existência me provocava. carregava um sorriso irritante em seus lábios; seu olhar esquadrinhou-me da cabeça aos pés em uma rápida análise. Eu poderia dizer que ele investigava meu estado de humor, mas minha intuição dizia que era algo além.
— Você também está aqui — devolvi a sentença, voltando meu olhar para o horizonte.
A tarde inteira fora dedicada às minhas garotas. Com revisões estratégicas, análises minuciosas sobre o estado delas (físico e mental) e alguns exercícios leves para manter a rotina de treinos, eu as mandei para cama cedo naquela noite. Uma boa noite de sono renovaria as forças delas, assim como o ânimo. Dormir após as 22:00 era um péssimo hábito adquirido com os torneios e competições, e era justamente por isso que eu estava tão desperta.
— Imaginei que estaria longe das piscinas. Você se torna extremamente popular em ambientes como esse.
No tom de voz de era possível identificar duas emoções fortes: a presunção e o que eu estava tentando entender o porquê de ser expressa. Ciúmes!
— Os Nessbit! — contive o impulso de sorrir enquanto entendia a razão por trás do ciúmes de . — Você está incomodado pela presença dos gêmeos mais uma vez.
— Você é irritante, ! — me respondeu com a primeira coisa que passou por sua cabeça.
— O monstrinho verde te incomoda demais, não é mesmo ?! — rebati a sentença de , encarando seus olhos sem qualquer dúvida.
— O que está querendo dizer com isso, ? — percorreu a distância que nos separava com algumas passadas.
— Você está com medo de ser desbancado pelos gêmeos como meu verdadeiro rival — o provoquei, mantendo minha cabeça erguida em desafio.
— Eu não tenho medo de algo bobo, … — sorriu com plena certeza enquanto deslizava sua mão entre os seus fios de cabelo. — Você saberia se eu estivesse com medo ou ciúmes, nos conhecemos bem demais — ele prolongou as vogais, olhando dentro dos meus olhos; seu sorriso cínico permanecia fixado naqueles lábios.
— Eu detesto você! — o respondi, sustentando seu olhar inquisitivo.
— Eu sei — riu sem qualquer problema. — Eu sei cada mínima e irritante coisa sobre sua existência — se aproximou mais, encurtando o pouco espaço que ainda havia entre nós. — Mesmo que eu invada seu espaço pessoal, você não se renderá. Vai tentar me nocautear com uma joelhada esquerda…— ele segurou a base do meu joelho, evitando meu golpe. — Depois tentará me acertar com seu punho direito, para então acabar com seu punho esquerdo no meu abdômen.
O que ele dizia era exatamente o que eu estava fazendo.
— Exatamente como eu te disse. Eu sei cada mínima coisa sobre você.
— Sua arrogância um dia será sua ruína! — o respondi com seriedade enquanto o observava se colocar ao meu lado na amurada do terraço, enfim se afastando.
— Isso não poderia estar mais distante da realidade — ele gargalhou, para o meu total espanto. — Você não poderia estar mais distante da realidade!
— Fingirei que não ouvi suas palhaçadas de sempre! — revirei os olhos, seguindo em direção à porta de metal.
— Vamos lá, , eu sei que me ama! — gritou em um estado absurdo de bom humor.
— Ver você risonho me assusta até os ossos — o respondi de modo ríspido.
— Eu sei — ele soou um pouco desconfortável enquanto olhava para o horizonte. Sua figura parecia solitária naquele instante, como se houvesse um caos em sua mente.
— Não dê chances ao Wright, estou apostando em você. Vê se não me faz engolir as palavras ditas ao Príncipe de Gelo! — suspirei, cansada. Fechei meus olhos, massageando-os antes de voltar a encarar .
— Vocês dois são os únicos com apelidos que se encaixam com suas personalidades — ele sorriu em desafio, me provocando com seu tom sarcástico.
— Ciúmes? — o provoquei. deixou a amurada com passos firmes.
— Me ame menos, — ele voltou a repetir, parando a centímetros de mim antes de seguir seu caminho para fosse lá o quarto em que estava hospedado.
— Impossível amar menos alguém em que esse sentimento sequer exista na nossa relação.
Eu sabia que ele havia ouvido. Seus ombros tensionaram, embora seu sorriso presunçoso estivesse cravado naquela maldita boca!
Capítulo 30
Hora errada para se perder em pensamentos, ! Se concentre!
Meus olhos piscaram. Era como se eu houvesse despertado. À minha frente se estendia as piscinas e, por algum motivo, elas me pareceram menores naquele ano.
Era como se elas não fossem minhas rivais de fato.
Balancei minha cabeça, espantando o tolo pensamento. As arquibancadas ainda estavam vazias, já que o acesso ao público ainda não havia sido liberado. Observei toda a equipe do meu colégio; um teimoso sorriso tentava despontar em meus lábios contra minha vontade. Acompanhar o crescimento deles me enchia de orgulho, embora jamais admitiria isso em voz alta, justamente pelo enorme ego de .
— Todos para o vestiário! Mostrem para o quê vocês vieram — as vozes dos treinadores saíram sincronizadas.
O riso se espalhou facilmente, quebrando a tensão. As duas equipes já desconfiavam do quão próximos os dois treinadores eram. A sincronia deles só reforçaram as suspeitas.
— Okay, meninas, agora é hora de mostrar os resultados de todos os treinos! — a treinadora Moretz sorriu com confiança enquanto nos encaminhava para o vestiário.
— Esse ano essas competições são nossas! — Jass bradou com um sorriso largo.
— É tudo ou nada! — Valentine comentou em seguida, cheia de entusiasmo.
— Estou gostando de ver! Vamos manter esse ânimo durante esses três dias de competição! — a treinadora sorriu entusiasmada.
Enquanto as garotas conversavam trocando seus trajes, me mantive observando-as em silêncio. Naquele ano eu precisava de mais foco do que o normal. O peso de ser meu último ano competindo dava a tudo um ar mais sério. Gostaria de deixar um legado para minhas garotas, e não seriam todas que se formariam comigo. Havia muitas dentre elas que estavam estreando o campeonato. Após me vestir e conferir se meus pertences estavam corretamente guardados, retornei para o grupo de garotas.
— Fico feliz de vê-las entusiasmadas. Passamos pela primeira etapa e, agora, devemos encarar mais esse obstáculo. Pode parecer assustador, mas não deixem que o medo as impeça de conquistar o que vieram buscar! — meus olhos alternavam em cada uma delas, conferindo-as e passando-lhes um pouco de confiança. — Vocês deram o máximo durante os treinos. O tempo que gastaram em cada exercício, rotina e todo o trabalho duro não foi em vão. Divirtam-se nadando, que a vitória será uma consequência e não o alvo, porque vocês são excelentes independente do resultado de hoje, minhas meninas! — abri um largo sorriso antes de ser esmagada nos braços da minha equipe.
— A sabe bem como nos animar! — Felícia comentou, entusiasmada.
— O discurso do ano passado ainda me faz chorar! — Sam enxugou uma lágrima imaginária, fazendo todas rirem.
— Ela é a nossa capitã por um motivo, não é mesmo?! — Betsy riu, piscando para mim.
— Vocês são realmente únicas! Vamos fazer história! — bradei com um sorriso tranquilo em minha face. Minhas garotas riram, e juntas seguimos novamente para a área externa.
Os outros colégios já estavam em seus trajes de banho, a piscina e áreas mais afastadas estavam abarrotadas de estudantes. Grupos mistos se formavam após os alongamentos e havia um clima amigável entre eles que seria substituído assim que o acesso fosse liberado às piscinas.
O primeiro dia teria a disputa dos 100 e 200 metros individuais, tanto masculino quanto feminino, alternando entre as modalidades e estilos de nado. O segundo dia era dividido: pela manhã seriam as disputas em equipe no medley; no período da tarde seria o masculino; o terceiro dia seria apenas o medley individual. No primeiro período do dia seria disputada a equipe masculina, e à tarde, o feminino. Em cada um dos dias seriam exibidos os resultados, e cada fase era uma eliminatória para os Nacionais.
Eu havia me classificado nas categorias: 200m nado borboleta, 100m e 200m estilo livre e em ambos os medleys; duplicava minha classificação só alternando que ele havia se classificado nos 100m e 200m do borboleta e apenas nos 200m do estilo livre. Ele havia perdido para Daniel nos 100m do estilo livre no campeonato municipal. Como o Colégio Boulevard era um vizinho, encontrávamos eles em todas as etapas até o Nacional. Daniel e viviam competindo pelo primeiro lugar no pódio, embora Wright tivesse um desempenho melhor no nado de costas; ele escolhia o livre justamente para irritar . Apollo e Kalil eram monstros, tanto no estilo borboleta quanto em qualquer outro. Eram tão irritantemente bons que competiam entre si para ver qual dos dois levaria o primeiro lugar. e Daniel sofriam com esses dois nas categorias que participavam, justamente pelas raias deles ficarem uma ao lado da outra.
— Veja só se não é a .
Eu não sentia falta nenhuma da voz insuportavelmente enfadonha que soou às minhas costas, e ela pertencia à minha rival de anos. Trina Abranvick, assim como eu, cresceu dentro das competições de natação sendo assombrada pelo segundo lugar enquanto competisse na mesma categoria comigo. Ela teve seu momento quando me afastei e, assim como , parecia aspirar uma carreira profissional no esporte.
— Trina — a saudei sem mais delongas, fui breve em meu cumprimento.
— Ainda permanece uma garota de poucas palavras — ela me respondeu de forma áspera.
— Não seja tão amargurada, Trinazinha. Nossa Sirena não desperdiça suas palavras — Apollo surgiu enganchado seu braço no meu pescoço.
— Estava mesmo demorando para um de vocês surgirem — Trina o respondeu no mesmo tom rude.
— Deve ser difícil ficar sempre nas sombras — Kalil surgiu atrás dela, a girando antes de segurá-la em seus braços, impedindo-a de cair. — Você é tão linda apesar dessa sua boca desagradável, Trinazinha.
— Vocês dois não deveriam estar se preparando para suas respectivas eliminatórias? — os questionei e me desvencilhei dos braços de Apollo.
— Já aquecemos assim que o dia raiou. Estamos em nosso melhor, não se preocupe, Sirena! — Kalil sorriu travesso.
— Repugnantes — Trina comentou antes de nos dar as costas.
— Devo admitir que ela tem uma péssima personalidade, mas tem ótimos quadris — Apollo comentou sem qualquer discrição.
— Passam os anos e vocês ainda permanecem os mesmos! — balancei minha cabeça em negativa, contendo um riso.
— Assim como o nosso amor por você! — Kalil falou, dando de ombros. Seu olhar pousava em cada uma das garotas.
— Vocês não tomam jeito mesmo! — bati na cabeça de Kalil, recebendo um olhar sem qualquer remorso.
— Você não é tão santa como gosta de se exibir, Ardósia! — Apollo me repreendeu com um humor ácido beirando seu tom de voz. — Você se esqueceu do…
— Shhh! Existe hora e local para se falar sobre isso! — o interrompi, recebendo as gargalhadas de ambos como resposta.
Nossa conversa foi interrompida pelo som do público, que ia aos poucos se acomodando em seus assentos. Os gêmeos entraram no modo caçada, seus olhos percorriam a multidão de pessoas atrás de um alvo.
— Haverá tempo para prosseguir com isso. Vão se unir à equipe de vocês! — os empurrei, recebendo olhares atravessados.
Acabei rindo, o que me rendeu olhares ainda mais desagradáveis, e dei-lhes as costas antes de reunir minha equipe em ordem. Era necessário se alinhar antes da abertura oficial.
— Mais tarde te ensinaremos bons modos, . — Kalil riu no final da sua frase.
— Claro, como se pudessem! — devolvi a sentença, rindo da face de ambos os gêmeos.
Após todas as equipes organizadas, deu-se início às cerimônias que precediam a competição. A competição mal havia começado e eu já me sentia animada!