Finalizada em: 06/03/2021

Capítulo Único

Playlist recomenda para a leitura da fanfic AQUI .

Mais escuro do que o oceano, mais profundo do que o mar
Você tem tudo, você tem o que eu preciso
Me toque, você está elétrico, querido
Me mova, me tire desse lugar
Me mova para o ritmo, me mostre o que é preciso
Electric
— Alina Baraz


O trânsito de pessoas na saída do metrô me deixava ansiosa, porque em meu relógio de pulso eu conseguia ver que estava mais do que atrasada para chegar ao estúdio, o que era completamente inadmissível. Então, ao sair da estação, eu tratei de caminhar rápido por entre as pessoas que ocupavam aquela calçada da Avenida Paulista. Era um trabalho muito importante e eu não podia perder um minuto qualquer, ser irresponsável era algo que não deveria me estampar.
A caminhada, que normalmente levaria vinte minutos, durou quinze. Quando entrei no prédio, recebi o sorriso do porteiro Jorge — como sempre tão simpático e solícito comigo. Ele se apressou a chamar o elevador e me deu uma piscadela, o que eu entendi ser o aviso que precisava: "eles já chegaram". Jorge sabia o que eu fazia ali desde o início da semana, e parecia torcer muito para mim. Era um senhor de idade que muito me lembrava meu falecido pai, portanto, nossa amizade cresceu de uma forma natural, mesmo em poucos dias.
Quando estava dentro do elevador, respirei aliviada, apenas três minutos atrasada do horário combinado com a assessoria coreana. Mas a preocupação de me questionarem o porquê do atraso me fez voltar a respirar descompassadamente. Eu não podia simplesmente dizer que havia esquecido de colocar o despertador e, como consequência, perdi meu ônibus para a estação. Se atrasar por esquecer um compromisso é como dizer "eu não estou nem aí". E eu não podia dizer isso para um grupo de coreanos, seria uma tremenda falta de respeito.
Ao sair do elevador no vigésimo andar, aproveitei para olhar do espelho do hall e ajeitar meu cabelo bagunçado. Era a primeira vez que encontraria com os meus contratantes e precisava estar pelo menos apresentável. Fui contratada para dançar no lugar de uma dançarina, que teve problemas físicos, do septeto sul-coreano que está em ascensão, o BTS, e fazia alguns dias que já ia para o estúdio ensaiar as coreografias, a fim de estar preparada para quando eles chegassem. E eu estava bem quanto à coreografia, havia coisa de um ou três passos que ainda tinha certa dificuldade — o que o dia ensaiando pessoalmente com o grupo e seu coreógrafo poderia me ajudar.
Caminhei o curto espaço no hall até a porta do estúdio que estava sendo alugado para o ensaio. Consegui ouvir o som abafado de risadas misturado com uma música, essa eu reconheci a melodia e era Blood Sweat & Tears — a minha favorita até então. Não que eu fosse fã do BTS ou os conhecesse antes de a companhia ser contatada, eu precisei pesquisar para conhecer mais sobre eles e consequentemente ouvir as músicas diariamente me fez gostar de algumas. E cantarolando eu levei minha mão até a maçaneta e abri a porta, rezando para que meu coreógrafo e chefe não me matasse pelos minutos atrasada, somente para ter diversos pares de olhos asiáticos em minha direção, me encarando como se eu fosse um alienígena. E entre eles eu não conseguia encontrar Alex, meu chefe.
— Ehrm... Olá... — pronunciei em inglês, sabendo que muito provavelmente eles não compreendiam português e eu muito menos falava coreano. Também curvei meu corpo levemente para frente, segurando na alça de minha mala transversal pelo meu peito. Isso era uma demonstração de respeito, até onde eu sabia.
— Me desculpem pelo atraso, tive problemas na estação de metrô e acabei perdendo alguns minutos. — disparei a falar, ainda em inglês.
Logo meus olhos capturaram o grupo parado em um canto. Eu não sabia o nome de todos, apenas Taehyung, o V — já que minha melhor amiga me convenceu de ele ser o mais bonito e compatível comigo quando decidimos pesquisar sobre a boyband. Diferentemente do que parecia pelas fotos, TV e afins, todos eram mais altos que eu e o menos pálido deles parecia com um poste, além de ser o único a parecer me compreender. Talvez seja um exagero meu, mas tendo a altura de 1,56 m qualquer um se torna uma muralha do meu lado. E tão rápido quanto os alcancei com o olhar, um rapaz se aproximou de mim sorrindo simples e se curvando assim como eu tinha feito. Ele parecia ser simpático e me tapou a visão do restante com sua figura esguia.
— Olá, , certo? — acenei positivamente, me concentrando em nossa conversa. — Eu compreendo o atraso, chegamos agora também, não faz muito tempo. — novamente outro sorriso. — Eu sou Jay, estou acompanhando os garotos aqui na América do Sul. Seja bem-vinda ao nosso trabalho.
— Ah, muito prazer, Jay! — estendi minha mão, esperando que ele a apertasse e ele o fez levemente.
— Pode colocar suas coisas ali do lado, vamos enturmar você e começar o ensaio. Nossa agenda é bem apertada, amanhã já temos o primeiro show. — Jay disparou para me situar.
— Ok.
Respondi simples e segui para o armário na lateral da porta de entrada, próximo de onde os meninos do grupo estavam. Senti um olhar atento em cima de mim e pelo canto de olho confirmei ser do mais alto. Sorri um pouco tímida e terminei de tentar colocar minha mala na cabine, com certa dificuldade pelo tamanho — como se eu quisesse colocar São Paulo em alguma cidade do interior. Mas tive um problema na tentativa, além de não entrar, ela abriu e algumas coisas caíram. Eu não tinha fechado o zíper.
— Deixa eu te ajudar.
Olhei para a direção da voz grossa e era a dele. Tive de erguer meu rosto para o encarar e seu sorriso ladino e simpático que me foi lançado fez com que eu tivesse aquele rubor. O olhar dele era intimidador, mas não de uma forma machista, na verdade, carregava uma tensão. E eu gostaria de não ser a louca que estava pensando coisa demais.
Suas mãos foram até a mala, ainda sem quebrar o contato visual, e ele a segurou firme, colocando-a para dentro sem muita dificuldade. Eu aproveitei para abaixar rapidamente e pegar as duas bolsinhas que haviam caído, ruborizando mais ao ver que uma delas era a de utensílios íntimos e sua transparência deixava a visão perfeita dos meus absorventes internos. Coloquei tudo de qualquer jeito dentro da bolsa e fechei o zíper, então ele fechou a porta e chaveou para que não abrisse.
— Pronto. — pronunciou em um inglês de sotaque perfeito.
— O-obrigada.
Gaguejei, é claro que eu iria gaguejar. A cada segundo ao lado dele e tão próxima não tinha como permanecer intacta, aquela tensão, mesmo que não fosse compartilhada, me atingiu profundamente. Todos os detalhes em seu rosto se tornaram perceptíveis e eu seria louca se não estivesse afetada com tanta harmonia em traços físicos de uma pessoa, era tanta simetria que mesmo procurando com uma lupa, não me surpreenderia em não encontrar um simples defeito qualquer. Principalmente aquele sorriso, com aquelas covinhas que devem ter sido planejadas cirurgicamente para vidrar qualquer um.
estava errada, V não era o membro do BTS que mais combinava comigo. E os segundos que pareceram durar uma eternidade ali me permitiram ter todo o vislumbre.
— Pessoal, vamos nos posicionar, por gentileza.
Ouvi a voz de Jay e tentei me recompor, o outro apenas me sorriu mais e se afastou. Respirei fundo e fui para o centro da sala, afirmando mais meu rabo de cavalo. Parei com as mãos na cintura para ouvir o que ele tinha a dizer e o grupo se aproximou, parando ao meu lado em sequência para formar um círculo em volta de Jay. Obviamente que fiquei de frente para o meu mais novo membro favorito, que logo eu saberia o nome. Ele estava com os braços cruzados na altura de seu peito e me pegou no flagra o olhando de baixo para cima, sorrindo ladino quando me viu corar. Ele estava compartilhando da mesma tensão ou apenas se divertindo com o fato de eu ser nem um pouco discreta na forma como o escaneava?
— Quero que conheçam, , ela irá substituir Ahri nos dois shows aqui no Brasil. — Jay disse primeiro em inglês e, em seguida, coreano, capturando minha atenção novamente. Entendi que ele usaria desse método para se comunicar comigo e com os outros, tanto os membros do grupo quanto os dançarinos que estavam no background. Sorri e acenei para eles.
— Pode se apresentar, .
— Ahm, olá novamente. Eu sou , mas podem me chamar de . — ouvi Jay pronunciar em coreano na minha pausa e continuei: — Tenho dezenove e sou dançarina a cerca de dez anos, comecei bem nova. Já me apresentei com alguns artistas brasileiros pela companhia e vocês serão meus primeiros internacionais. — ri fraco, ouvindo V dizer um "que legal". — Bom, obrigada pela oportunidade e eu mal posso esperar para estar no palco com vocês.
— Meninos? — Jay cruzou os braços e olhou de um a um.
— Eu começo. — O mais sorridente deles foi o primeiro, tentei lembrar seu nome, mas foi em vão. Seu inglês era bem divertido e ele parecia ser dedicado a tentar o que sabia do idioma. — Eu sou J-Hope. E é um prazer te receber em nosso palco.
Sorri para o primeiro a se apresentar. Em seguida, foi o que estava ao lado dele, o de rosto angelical.
— Jimin — disse simples e sorridente. — Bem-vinda, .
Outro sorriso, para o terceiro vir. Este tinha um rosto mais jovial dentre todos e um sorrisinho que lembrava muito com um coelho, além de parecer bem tímido.
— Jungkook. Mas pode me chamar de JK ou Kook. — seu olhar mirava tudo, menos a mim diretamente.
Sorri pela terceira vez. Então o quarto também se apresentou, ele estava entre Jungkook e V.
— Jin. — Ele disse apenas o nome, mas seu sorriso era tão perfeitamente acolhedor que isso foi suficiente.
O quinto estava ao lado de V e ele tinha a pele tão pálida que parecia um floco de neve. Além de emanar uma calmaria até pela forma como movia seu olhar.
— Yoongi, mas me chame de Suga. — Sua voz saiu um pouco grossa e seu sorriso foi de lábios fechados, mas mesmo assim me senti acolhida também por ele.
E então foi a vez de V, ele tinha o olhar caído de uma forma extremamente diferente de qualquer outra pessoa. Não era como se você conseguisse chegar em algum lugar e dizer que viu alguém parecido com ele. E seu sorriso fofo contrastava contrariamente ao olhar de entoação sensual.
— Taehyung, mas pode me chamar de V. — e a voz era grossa.
O sétimo e último foi ele. Seus braços caíram na lateral de seu corpo e o olhar direcionado a mim parecia me penetrar e encontrar o mais profundo do meu íntimo. O cheiro de seu perfume, que eu havia sentido no momento anterior em que estivemos bem próximos, voltou para minhas narinas, vidrando aquela tensão que eu estava sentindo. Me lembro de ter lido que por serem de um país conservador, seus comportamentos eram extremamente diferentes e muito mais respeitosos em comparação ao não conservador ocidente. Mas isso estava caindo por terra naquela troca de olhares, porque em nenhum lugar do mundo a forma como ele me olhava quando se direcionava a mim era respeitosa ou de comportamento conservador. Pelo contrário. E eu apostaria qualquer coisa para quem dissesse que eu não estava louca ou criando aquilo do zero em minha mente.
— Eu sou Kim Namjoon, conhecido como RM. — a forma como ele deu entonação para seu nome completo me fez gravar cada sílaba. — Sou o líder desse grupo e na maioria das vezes o tradutor de inglês. — riu fraco e novamente as covinhas apareceram. — Seja bem-vinda e espero que tenhamos uma boa primeira vez sua em um palco com artistas internacionais. — E o fato dele ser o único a discursar mais do que uma frase gravada em inglês me fez travar em cada sonoridade saindo por seus lábios.
"Boa primeira vez", isso ecoou em minha mente com tantas segundas intenções que se ele pudesse ler meus pensamentos provavelmente eu seria demitida no mesmo instante.
Apenas agradeci e aceitei as instruções de Jay enquanto me alongava. Vez ou outra durante esses poucos minutos eu espiei as laterais, encontrando o olhar atento de RM em cima de mim e quando ele percebia ter sido flagrado, sorria de uma forma que eu poderia julgar "sacana", novamente me convencendo de que ele estava ou adorando implantar esse joguinho, ou rindo de como eu ficava envergonhada quando o olhava e o via me olhando.
Fomos para o centro da sala e cada um tomou sua posição para a primeira música que seria ensaiada. Como nessa faixa da setlist não teria presença de mulheres, eu apenas observei. Do meu canto na sala, ouvindo atentamente a melodia e vendo, em meio ao silêncio para evitar a desconcentração, aproveitei para reproduzir alguns dos passos que achei incríveis para acrescentar em algum momento de minha vida — lembrando, claro, de perguntar posteriormente o nome de quem havia criado aquela música para os créditos necessários. Mais duas vieram em sequência até que fui inserida para dançar.
Para ser honesta, eu tive certa dificuldade de acertar alguns passos junto com eles. Quando treinamos por conta própria, sem captar a real movimentação do passo, de forma mais original, a interpretação pode ser diferente. Acaba que o nosso corpo transmite aquilo que sentimos da música e para um trabalho mais profissional como esse, era necessário que meu corpo entendesse a originalidade do que não foi criado por mim. Felizmente os meus anos de prática me ajudaram e o que facilitou também foi a ajuda que tive, hora de Jay, hora dos outros dançarinos e até mesmo de J-Hope e Jimin, que eu descobri serem os dançarinos principais — o primeiro sendo um tipo de dançarino líder.
E assim como essa interpretação pessoal dos movimentos não passou despercebida por J-Hope, eu não deixei de notar os olhares de Namjoon, que continuaram a me cobrir ainda mais quando o seu amigo passou a me ajudar diretamente, depois de me pedir educadamente "licença" para se aproximar e tocar em meu corpo. Eu me concentrei apenas em aprender devidamente o que tinha de ser feito. Por mais que a dança fosse uma das minhas grandes paixões, eu estava trabalhando e o dinheiro que receberia era de extrema importância. Nem por um fio eu podia deixar que algo que eu, muito provavelmente, estava criando com a parte da minha mente que era comandada por um tipo de diabinho interior me atrapalhasse. O aluguel não se pagaria sozinho e nem minhas aulas de canto e piano.
A hora não pareceu demorar a passar, mas também não foi como se tivesse andado como se estivesse em uma Ferrari num autódromo livre de radar. Havia passado tranquilamente, mesmo que eu não tivesse sentido. Quando Jay teve a confirmação do BTS que eu estava pronta e que eles também não precisavam mais, fomos liberados. A maioria dos dançarinos se despediu e partiu para a saída, alguns deles totalmente gentis comigo e demonstrando o esforço para que eu me sentisse à vontade, já a outra parte parecia entender que eu não existia ali. Os sete principais corpos daquela sala se jogaram no chão, parecendo extremamente exaustos. Eu apenas me sentei próximo aos armários e apreciei o tanto de água que ainda restava em minha garrafinha, fazendo o mesmo que Jin e enxugando meu rosto com a minha toalha. Quando as respirações começaram a voltar para o compasso natural, eles se sentaram e, virando-se para mim, Suga foi o primeiro a dizer, me surpreendendo:
— Se algum dos nossos dançarinos te deixar desconfortável, pode falar com Jay, eles não são pagos para discriminar ninguém por diferença de nacionalidades. — piscou de um olho só, apoiando o corpo apenas com os braços e suas mãos espalmadas no chão.
Eu compreendi sua frase bem colocada em inglês, apesar de um pouco surpresa por ele dizer tão bem, mas levei um tempo para entender o que estava querendo com aquele conselho. Apenas assenti positivamente.
— Você dança muito bem, . — desta vez meus olhos seguiram em direção à outra voz, a de RM. Seu tom era suave e parecia bem comigo quando queria puxar papo. Eu apenas sorri, fechando minha garrafinha. — Fez alguma aula, alguma coisa do tipo? — completou, recebendo olhares de Jungkook e Jimin.
— Meus pais eram músicos, cresci no meio disso. A paixão por música, teatro e dança veio de forma natural. — respondi um pouco nostálgica.
Jimin disse algo, olhando diretamente para RM, mas em coreano. Ele me encarou enquanto ouvia o que lhe era dito e eu pude notar sua mandíbula rígida. Em seguida, o líder deles traduziu para mim:
— Jimin disse que você é muito boa, principalmente em compreender o passo em junção da música. — sorriu minimamente, se levantando e ajeitando sua roupa.
— Obrigada. — olhei direto para Jimin e abri um sorriso agradecida.
Ele apenas acenou positivamente, mostrando compreender o que eu havia dito. O silêncio retornou entre nós, sem Namjoon para traduzir, não haveria conversa e, aparentemente, o homem não queria mais conversar.


Cheguei exausta em casa. O trânsito de pessoas no caminho ao metrô, o trânsito de pessoas no metrô, o trânsito de carros e pessoas na saída do metrô e mais o ônibus por quarenta minutos até meu condomínio em São Bernardo, no ABC paulista, era de chorar. Mas mais um dia havia se passado e eu estava viva, empregada e, desta vez, mais ansiosa. No dia seguinte eu teria a disposição de um motorista para me levar até o hotel em que ficaria hospedada em São Paulo para ser mais prática a minha locomoção até o Citibank Hall, onde eles fariam o show. Ou seja, eu poderia dormir até mais tarde e estar bem descansada para desenvolver bem o meu trabalho. Ao rodar a chave na maçaneta pude ouvir o som do latido agudo de Legolas, o poodle de minha amiga e companheira de moradia. Ele sempre me recebia com alegria, e naquele dia não foi diferente. Mal coloquei minha bolsa em cima do sofá e precisei pegá-lo no colo, sendo surpreendida por Lucas saindo do banheiro enrolado na toalha. Reviro meus olhos e, em seguida, lanço-lhe um sorrisinho sem graça, mais uma vez o peguete indeciso de estava ali tentando a convencer de algo. Respirei fundo e devolvi o poodle ao chão, pegando minha bolsa e indo direto para meu quarto — tentando ignorar as risadinhas que vinham do quarto ao lado.
Me joguei na cama depois de deixar a bolsa no chão e passei a refletir o dia que tive, encarando o teto do quarto iluminado apenas pelo meu abajur. Em minha mente veio o sorriso alinhado e complementado por covinhas extremamente sexy de Kim Namjoon. Eu não conseguia parar de pensar nele, mesmo que isso soasse como eu estar mais iludida que a Alice indo ao País das Maravilhas duas vezes. E o pior eram os suspiros incontáveis que estavam saindo de mim, me fazendo parecer uma adolescente de quatorze anos no corpo de vinte.
Ótimo, eu estava igual a minha prima, criando paixão platônica por garotos que encontrava no ônibus. Pelo menos eram garotos ao alcance dela e não como eu, criando algo em minha cabeça por um cara que talvez nem em minha mão pegaria — e ainda por cima era o que eles chamam de idol.
Não contei o tempo que demorei perdida no meu próprio universo paralelo, apenas voltei à realidade quando ouvi bater na porta e entrar em seguida, se jogando ao meu lado com o seu sorriso mais iludido que o meu, mesmo eu parecendo a Alice pensando no coreano.
— Jubileu está diferente. — Ela disse fechando os olhos. — Não reclamou de Lucas sair do banheiro de toalha e nem foi falar comigo quando chegou. — listou abrindo apenas uma pálpebra para me analisar. — Que sorriso é esse, ? — abriu o outro olho também.
— Meu dia foi bom hoje. Parecia estar no Museu do Louvre. — respondi virando meu rosto para a encarar.
— Sua safada! — riu e se sentou. — Pode me contar tudo, eles são lindos pessoalmente também? Como é o V? O sorriso do J-Hope?
— Ai, calma! Quanta pergunta. — me ajeitei na cama para tirar os sapatos, sentindo meu corpo dolorido. — Vou tomar banho primeiro.
Me levantei sendo atingida pelo meu próprio travesseiro. ria me chamando de chata enquanto eu pegava meus itens individuais para banho em meu guarda-roupa. A deixei falando sozinha no quarto e fui para o banheiro, me despi prazerosamente e ansiosa para entrar embaixo da água morna. Tomar banho era meu momento favorito, onde eu podia sentir minha própria paz interior.
Tentei evitar fechar os olhos enquanto sentia a água correr pelo meu corpo, o rosto de Namjoon me invadia todas as vezes que minhas pálpebras se fechavam e aquilo começou a me incomodar. Meu foco precisava ser outro, não podia correr o risco de me vidrar no homem em cima do palco e acabar errando algo. Principalmente por ser meu primeiro trabalho com artistas de fora, e se eu fosse bem, conseguisse me destacar, poderia ser convidada a continuar com eles — podemos contar com a sorte pelo menos uma vez na vida, certo?
Ouvi a campainha tocar pouco antes de desligar o chuveiro e revirei os olhos, pensando que poderia ser Lucas novamente. Não que eu não quisesse minha amiga sendo feliz ou achasse ruim que ela transasse com ele na própria casa, o real problema era como o dito cujo podia ser tão canalha quanto bonito. Era uma relação nem um pouco recíproca. se doava ao máximo para um cara que só queria a foder casualmente. E isso me deixava enraivecida.
Enrolei meu cabelo molhado na toalha e com a outra maior sequei meu corpo e me cobri, calçando meu chinelo antes de sair. Ao abrir a porta dei de cara com toda pálida, prestes a bater na madeira que nos separava. Olhei para ela confusa e ela me encarava com os olhos arregalados. Por instinto mirei a sala, me assustando ao ver a figura de um homem alto virado de costas para nós, encarando o horizonte pela porta da sacada. Ele estava de roupa totalmente social e demorou para que meu cérebro ligasse aquela silhueta ao nome que vagava em minha mente.
— Não. — sussurrei para que concordou positivamente, respondendo o contrário.
— Sim. E você vai me contar tudo depois. — disse de forma acusatória, mais baixo que eu.
— Tá bom, tá bom... Só aguenta aí que eu vou trocar-
— Você tem visita, !
Minha vontade era pegar e colocá-la fechada no armário. Sabia que iria anunciar que eu estava ali, só para me punir por não ter lhe dito qualquer coisa assim que cheguei. Sabe-se lá o que estava sendo plantado na cabeça dela ao ver Namjoon ali, na nossa sala. Nem eu mesma sabia o que pensar e quando ele se virou, ao ouvir meu apelido, eu não soube reagir por segundos que pareciam durar horas.
— Eu vou colocar uma roupa e já volto. — disse em inglês para ele, entrando em meu quarto sem esperar uma resposta.
Levei um tempo encostada na porta, tentando levar a quantia fundamental de oxigênio para meu cérebro não parar de funcionar. Uma clara tentativa de evitar a tela azul. Devagar, minha respiração foi se regulando próximo ao normal e eu me desloquei para me trocar, tentando não demorar, mas ao mesmo tempo indecisa do que vestir.
Optei por uma calça pantalona preta, camiseta regata e um bom chinelo, não tive tempo de pensar em algo deslumbrante para desfilar dentro da minha própria casa. Penteei o cabelo rápido e passei algum perfume antes de sair. O apartamento não era enorme, pelo contrário, a entrada dava direto na sala que era dividida por um balcão com a cozinha, os dois quartos da casa tinham o banheiro no meio formando um pequeno hall. Nada muito espaçado, não tinha nem como brincar de se esconder naquele lugar — um fato infeliz, já que eu podia ouvir os momentos de libertinagem entre e Lucas.
Parei atrás do sofá e ele ainda continuava virado para a sacada, encarando a vista noturna dos prédios pichados e casas no típico cenário suburbano. Contei até cem mais de duas vezes, sentindo o olhar de em cima de mim, querendo que eu anunciasse minha presença, mas eu não consegui. Havia algo me travando e não era a vergonha pelo meu lado tímido, ia um pouco além, porque meu corpo estava petrificado ali, porém vibrava como se ele fosse um imã e eu o metal. Na minha segunda camada de consciência eu só conseguia sentir a sensação do dia que passei na presença dele e como me senti com seus olhares. Eu não podia estar sendo tão ingênua, podia?
estava fazendo algo na pia, talvez o nosso jantar, enquanto me encarava pelo vão que tinha na parede por nosso ambiente ser estilo americano, tendo um balcão que separava a cozinha da sala. Por mímica me mandava dar o primeiro passo e avisar o homem que eu já estava ali, mas eu estava travada pensando o que podia ter levado ele até a sala de minha casa. O princípio seria de que para estar ali ele devia ter um bom motivo, ainda mais se for parar para pensar como conseguiu o meu endereço e saiu da grande São Paulo para vir até mim, em um ponto quase esquecido no ABC. Eu realmente devia ter feito algo muito incurável para um artista internacionalmente famoso, coreano e na véspera de um grande show, ter ido até mim. Sua chegada “tão rápida” era explicável por com certeza ter usado um carro particular, o que reduzia em mais de uma hora o trajeto que fiz.
Então comecei a cavar em minha memória durante aqueles poucos segundos, mas nenhum motivo era aparentemente bom o suficiente. Até que, em uma última troca de olhar com , observei em cima da mesa de centro da sala minha bolsinha de utensílios íntimos — com toda sua transparência dando o vislumbre dos itens dentro dela, como meu absorvente interno. Claro, eu com certeza tinha deixado isso para trás quando saí atrasada daquele prédio. Suspirei e limpei a garganta, chamando sua atenção.
— Ei! — ele se virou em minha direção, sorrindo e curvando-se rapidamente. Repito o gesto. — Você sabe que não precisa fazer isso toda vez que me encontrar, não sabe? — questionou gentilmente.
— Acho que me acostumei... — respondi baixinho. — Desculpa te fazer esperar, cheguei há pouco tempo e fui tomar banho. Aconteceu alguma coisa? — resolvi ir direto ao ponto, o vendo endurecer novamente seu rosto, saindo do modo gentil e descontraído de seu cumprimento.
Por Atena! Covinhas deveria ser um crime. Covinhas naquele rosto, com aqueles lábios pressionados sem intenção alguma, entretanto, tentadores, deveria ser um crime contra o pudor. E minha imaginação devagar ia se abrindo, descobrindo locais não explorados, simplesmente por aquele mínimo movimento corporal dele — que parecia ser um tipo de mania, tão comum para ele, mas não para mim e meu cérebro libertino.
— Tudo bem, eu preciso pedir desculpas pela inconveniência. — suspirou. — É que você deixou sua bolsa de... Bom, você deixou no armário e eu achei que seria de bom tom trazer para você. — diz apontando para o objeto em cima da mesinha.
Eu só consigo encarar o absorvente interno gritando ali enquanto faço perguntas em minha cabeça.
Primeira pergunta: por que a formalidade enquanto me encara como se eu fosse fugir a qualquer momento, sem escrúpulos? Inclusive, fora o dia todo assim e agora em minha frente a única semelhança de comportamento é seu corpo rígido, porque de resto parece estar extremamente tenso, como se minha presença fosse um campo minado.
Segunda pergunta: ele ficou me observando enquanto pegava minhas coisas de costas para todo mundo? E o que observou? Prestou atenção que eu não tinha colocado dentro da bolsa maior, então por que não me disse na hora?
Terceira pergunta: como conseguiu meu endereço? Podia ter guardado para alguém me entregar no outro dia, certo?
— Obrigada. — é o que consigo dizer.
— Não tem o que agradecer.
E o silêncio que veio a seguir foi suficiente para que eu sentisse minhas bochechas queimarem e meu coração tomar um solavanco, acelerando de uma maneira repentina. Eu não era uma garota inexperiente, mesmo com apenas dezenove anos já tinha tido minhas experiências por aí e podia dizer com propriedade que durante o tempo em que nos encaramos sem dizer nada, o que não deve ter sido por mais de um minuto, durou mais de um século pela sensação causada com a tensão que pairava ali. O susto que meu corpo levou quando um barulho veio da cozinha me fez acordar daquele transe. Encaramos em sincronia, ela apenas pediu desculpas por mímica e então ele se mexeu inquieto no lugar. Típico quando alguém quer dizer algo, mas desiste. Não que eu fosse especialista em análise corporal, mas qualquer um com um mínimo de vivência saberia dizer o mesmo sobre outra pessoa. Então ele apenas estalou sua língua no céu da boca e sorriu minimamente, levando as mãos aos bolsos.
— Eu... Preciso ir. Nos vemos amanhã?
Apenas concordei positivamente e o agradeci. Ele se despediu de com um aceno, recebendo o sorriso simpático tão comum de minha amiga e então caminhamos para a porta. Do lado de fora, no corredor, havia seguranças. Eram homens de preto, com acessos em seus ouvidos e sérios. Além de ser um bando de brutamontes. Tentei evitar que minha boca se abrisse em espanto, seria óbvio que um artista internacional sairia com aquele bando de gente o escoltando.
Depois de fechar a porta, me escorei na madeira, escorregando até o chão. Sempre quis fazer algo assim como nos filmes, naquele momento entendendo que não era meramente uma representação dramática e sim pela fraqueza causada no corpo em situações de grande tensão. Eu estava tensa, confusa demais e um pouco ofegante com a enxurrada de pensamentos que meu humilde cérebro produziu enquanto aquele homem estava em minha frente, de forma tão inocente, embora sua expressão corporal me afirmasse outra coisa.
— Você pode começar a me contar. Quero tudo. Em detalhes.
Olhei para a direção da voz, vendo a figura de parar em minha frente com sua mão estendida. A segurei e senti a realidade bater como uma onda do mar na bunda, me tirando do estado entorpecido. O que eu tinha para contar? Quais eram os detalhes? Eu não saberia responder.


Eu sei que alguns famosos não são tão claros com seu público como parece; a carreira como dançarina e atriz de algumas peças de teatro me rendeu o conhecimento um pouco menos raso desse mundo do show business. Porém, me surpreendeu depois do show, quando fui abordada por Jimin, que tagarelava um pouco embolado em inglês e eufórico. Por um momento, eu me questionei se Namjoon não era o único a falar o idioma perfeitamente, mas a dúvida foi logo cessada quando, além dele, Hoseok e Jungkook apareceram no mesmo entusiasmo falando o idioma. Logo, pude concluir mais um caso de script moldado para os fãs. Mas eu não iria entrar nesse mérito, já estava gostando deles como pessoas para questionar qualquer padrão — até porque isso não me cabia, eles seguiam o que quisessem e fosse imposto pela gestão.
Eles estavam muito animados com o show que haviam feito — e, realmente, o público brasileiro era muito único, não havia um artista que não se apaixonasse pela multidão inquieta e que, muitas vezes, cantava mais alto que os próprios artistas no palco e suas vozes ecoando pelos alto falantes. Tentei me esquivar daquela roda deles, precisava chegar ao meu local para trocar de roupa e pegar meu rumo para casa, era aquilo, segundo show feito com sucesso e meu trabalho com eles havia terminado por ali. Mas estava difícil, e por misturarem coreano com inglês e a euforia, eu só sabia sorrir e me sentir perdida.
Acho que era o meu padrão ao lado deles, me sentir perdida e confusa, além de totalmente atraída por cada movimento de Namjoon — como se ele fosse um encantador e eu a suave serpente hipnotizada por seus movimentos.
— Queremos que você vá conosco para nossa comemoração no hotel, .
Ouvi Jungkook dizer, antes de passar o braço por cima dos meus ombros e sorrir simpático, mostrando os seus dentinhos que lembravam muito um coelho. Jungkook era adorável, um recém-adulto no corpo de uma criança tentada, que vivia tocando o terror em Jin. Pelo o tempo que estive com eles e vi, pude concluir.
Tentei sair do meu estado de inércia e sorri para responder ao garoto da minha idade.
— Não sei se é uma boa ideia, Jungkook. — menti. Obviamente eu queria ir para o hotel com eles, com Namjoon.
— Mas isso não é um convite com opção para negar. — rebateu rindo fraco. Disse algo para Jin em seguida, em coreano, para depois completar: — Você vai e ponto final. Damos um jeito de ir para casa depois, sã e salva.
— Quem?
Olhei para trás, sentindo a presença do corpo de Namjoon próximo ao meu. Ele estava descontraído, diferente da forma como me encarava ou agia comigo desde que havia saído da sala de meu apartamento — eu ainda não tinha conseguido questionar nada a ele, preferi varrer qualquer ilusão que estava tentando criar. Quais eram as chances, afinal?
. Ela vai com a gente para o hotel. Tem soju suficiente para todos. — Jungkook o respondeu e sob o olhar de seu líder, tirou o braço de meus ombros, suspirando. — Se estiver tudo bem para você, claro.
Mais uma situação que eu não entendi, mas que senti a tensão. Era uma sensação comum para eles compartilhar de tensão em momentos simples como aquele?
Se fosse, eu acho que não me acostumaria caso convivesse mais com eles.
— Qual é, Nam, último dia que estaremos com e ela precisa provar soju. — desta vez foi Hoseok quem tentou o convencer. Ele me encarou, como se eu fosse uma estranha. Diferente do frio no estômago que eu senti.
— Você não pode passar por essa vida sem provar soju. — disse por fim, arrancando um suspiro aliviado dos amigos e deixando um tremendo ponto de interrogação em mim.
— O que é soju?
Riram. Eles riram da minha pergunta, como se eu fosse uma burra. Mas sem problemas, quando perguntassem o que era pinga eu também iria dar uma tremenda gargalhada. A risada de Namjoon passou a ser o foco naquele momento, mais uma vez me convencendo de que estava errada quando disse que eu combinaria mais com Kim Taehyung. Bom, ela havia errado apenas o Kim.
Nos trocamos e fomos todos na mesma van para o hotel. Eu era a única dançarina indo para o after com eles e o seleto grupo de staffs não pareceu muito se importar, pelo contrário, pareciam querer com que eu me sentisse bem entre eles.
O quarto em que eles estavam era enorme e um pouco bagunçado, além de ter um frigobar lotado do tal de soju.
Eu me sentei no primeiro espaço livre que vi, coincidentemente — ou não — recebendo a presença de Namjoon ao meu lado, sentando-se tão perto que eu podia sentir a temperatura de sua pele. Eu estava com uma regata e ele de camiseta com mangas curtas, a parte exposta de seu braço estava morna e roçar o meu braço no seu pareceu ser uma resposta ao imã que eu acreditava que ele era.
— Isso aqui é soju, . — Hoseok se sentou do meu outro lado, entregando uma garrafa verde aberta.
— Relaxa, não colocamos nada em sua bebida. — Namjoon sussurrou em meu ouvido, seu hálito quente me causando um arrepio. O olhei rapidamente e então peguei a garrafa. O gosto da bebida era um pouco estranho. Nada muito parecido com algo que já tomei de tradicional no Brasil, lembrava bem levemente o sabor do saquê, mas nada muito evidente. E era ruim, até demais. Tanto que minha careta foi nitidamente expressiva o suficiente para que eles entendessem que eu não tinha gostado.
E a expressão de todos foi semelhante: decepção.
— Eu achei que teríamos uma noite de muito soju. — Hoseok disse, sua voz um pouco baixa.
— Mas vocês podem ter ainda, só que eu vou beber água se necessário. Desde que não seja esse negócio, por mim tudo bem. — respondi passando a mão na boca.
Então a mão pesada de Namjoon pousou em minha coxa, de forma suave e cuidadosa. Eu o encarei, sentindo aquela corrente elétrica passando por toda a extensão de meu corpo. Mantive meu olhar preso no dele, desviando para seus lábios ao reparar o quão próximos estávamos. E eu senti que aquilo poderia ser perigoso para a minha mente tão trabalhadora que ainda divagava em momentos como aquele para longe, chegando em locais que demandavam uma extrema urgência por um homem que eu ao menos sabia informações sem terem sido fornecidas pelo Wikipédia.
Mais uma vez me senti um personagem mais evoluído que a Alice, ela foi duas vezes para o País das Maravilhas, eu, no caso, já tinha residência fixa lá. E nesse ritmo, eu logo seria a presidente do lugar.
— Não, vamos pedir algo para você beber. Algo que você goste. — Sua voz estava rouca, desta vez não em meu ouvido, seu hálito fresco e morno foi direto para meus lábios. Tive de contraí-los, tentando não fazer parecer que ele estava me afetando daquela forma.
— Então eu aceito cerveja, — sorri, me virando para a direção dos outros meninos.
— Aí você falou a língua de Kim Namjoon. — Jungkook respondeu, levantando-se. — Quantas e qual eu peço?
— Depende, você bebe bastante, ?
— Pede uma quantia razoável, não quero dar trabalho e sair do meu estado sóbrio — fui simples na resposta, até porque estava concentrada em como o meu nome saiu por seus lábios. Era sexy. A forma como as covinhas dele, atrevidas, saíam quando ele dizia meu nome, era sexy.
— Pede vinte long necks de Heineken, Kook. — Ele pediu.
Me concentrei em levantar e perguntar sobre o banheiro, talvez jogar uma água fria em minha nuca e pulsos ajudasse de alguma forma.
— Onde fica o banheiro? — perguntei me levantando e ajeitando meu cabelo. — Só seguir nesse pequeno hall, é a porta do meio. — Hoseok apontou e eu compreendi.
— Eu te acompanho.
Olhei para baixo, vendo a figura larga e alta de Namjoon se erguer em minha frente e apenas dei de ombros. Decepcionada, claro. A ideia de ir ao banheiro era para me livrar dos pensamentos sórdidos que estava tendo com ele, naquele clima todo que minha mente estava criando, não para que ele fosse junto e complicasse mais o meu lado. Mas ele também não tinha como saber e talvez estivesse apenas sendo educado demais comigo, preocupado com meu bem-estar.
Mas qual o ponto em se sentir desconfortável por ir ao banheiro sozinha?
— Preciso trocar de camiseta mesmo. — parecendo ler minha mente ele completou sua fala.
É, realmente, a Alice perdeu feio para mim.
Alô, Cartoleiro? Me espera com o chá, hoje temos reunião de condomínio.
Caminhei em silêncio atrás dele, reparando que Yoongi havia lançado um olhar entediado em nossa direção, mas soltando um suspiro pesado. Não liguei para isso, reparei nos últimos três dias de convivência que aquilo era ele quase cem por cento do tempo. Quase como se sua existência fosse um tédio — e como poderia ser?
O quarto deles era mesmo enorme, no modelo apartamento, melhor dizendo. Tinha o primeiro ambiente, que era como uma sala com um pequeno espaço de cozinha básica, um hall com dois quartos de porta uma de frente para a outra e o banheiro no meio dividindo. E naquele ambiente todo tinha roupas espalhadas, acredito até ter visto algumas cuecas por ali também. Mas o que esperar se era um quarto dividido por sete homens que não tinham tempo nem para respirar direito? E talvez o serviço de quarto deles tivesse sido suspenso, não era muito confiável, dá para compreender.
Namjoon me deu passagem e então coloquei a mão na maçaneta, sentindo que estava sendo observada por ele. Decidida a entrar logo no banheiro e me livrar da minha própria ilusão, senti sua mão em cima da minha, assim como seu corpo bem colado ao meu — tão próxima desse jeito não tinha como não dizer que ele conseguiria servir de cobertor para mim com aquele tamanho, e devo mencionar que não deveria estar tão rigoroso com seus treinos na academia; era sua anatomia mesmo, ombros largos, tronco da mesma medida e as pernas compridas, que o deixavam alto, e suas mãos grandes, de dedos também longos. Havia sido moldado por algum deus desconhecido, que de tanto sucesso em seu trabalho fora guardado em algum lugar muito seguro para que tivesse problemas com plágios e sua forma roubada.
Seria um crime colocar mais homens como Kim Namjoon no mundo. Crime pelo composto de ser um item de boa imaginação para aqueles que o encarassem. E eu seria a primeira condenada.
Sua mão foi firme ao me ajudar a virar a maçaneta, mas o empurrão que levei pelo seu corpo indo na direção para entrar no banheiro não fora nada delicado. E quando estávamos dentro daquele metro quadrado, ele fechou a porta com muita rapidez, parecendo um homem muito experiente em fechar portas com agilidade. Me perguntei o que mais as suas mãos poderiam fazer daquela mesma forma ágil. Porém, quando ele se virou para mim, todo e qualquer outro pensamento que não fosse o ali e naquele momento, se esvaiu; ele estava muito próximo e respirava ofegante. Seus olhos haviam assumido uma cor escura, como se ele estivesse dado lugar a um alter ego.
E eu queria que aquilo não fosse um sonho, mandando para a merda qualquer vontade anterior de usar a água fria como um escape.
— Você pode sair, se quiser. Caso não o faça, irei te beijar e se você pedir... — ditou com sua voz baixa. — Apenas se pedir, nós vamos foder nesse banheiro.
Apenas cinco segundos não eram suficientes para eu pensar direito naquela proposta, mas eu podia trabalhar com isso em minha mente enquanto o encarava, vendo-o esperar por uma resposta. E só precisava me organizar depois de ouvir ele sendo tão explícito daquela forma.
Um: assenti positivamente, entendendo o que ele tinha dito.
Dois: pensei prós e contras, não pensando muito na verdade.
Três: não nos conhecíamos.
Quatro: sempre quis fazer sexo com um desconhecido.
Cinco: eu não o veria novamente.
Seis, o segundo extra: era meu momento de viver a realidade da Alice.
No final da minha contagem, ele não hesitou, conforme eu o olhava fixamente. Morder meu lábio e ficar ali foi a resposta suficiente para que Namjoon passasse uma mão por minha cintura e a outra indo para meus cabelos, agarrando-os violentamente de forma sexual. A mão em minha cintura foi para me levar até o balcão da pia, enquanto seus lábios estavam contra os meus de forma urgente. E ainda bem que ele havia me colocado sentada ali para se encaixar entre minhas pernas, porque eu senti elas fraquejarem quando sua língua esteve me invadindo, encontrando com a minha em um encaixe perfeitamente delineado, algo que eu nunca tinha vivido antes. Droga!, o beijo era bom, era delicioso e eu não queria que parasse, pelo contrário, o meu objetivo havia se tornado o mais.
Espalmei minhas mãos em seu peito, sentindo o delineado de seus músculos crescentes, logo imaginando como seria tocar em sua pele por baixo de todo aquele tecido. Deslizei meus dedos devagar para a barra de sua camisa, mas ele foi rápido e prendeu meus braços atrás de meu corpo com apenas a mão que estava em minha cintura. Soltei um gemido de repreensão, eu queria tocá-lo, eu precisava sentir seu corpo com meus dedos. Ficar o olhando por aqueles dias havia mexido demais com meu consciente para que eu me contentasse apenas com um beijo, sem poder senti-lo. Ofegantes, nos afastamos. Ele soltou minhas mãos devagar, mas continuou segurando meus cabelos. Seu olhar estava fixo nos meus e seus lábios um pouco inchados pela intensidade que tinha sido aquele beijo, a visão perfeitamente tentadora que o meu eu precisava naquele momento para se manter firme no propósito de aceitar aquela loucura toda: transar com uma celebridade internacional, que na verdade era um desconhecido para mim, no banheiro de seu quarto de hotel enquanto seus outros seis amigos estavam no outro ambiente, bebendo aquela bebida horrível que tinha um nome parecido com soja.
Limpei a garganta e, ainda sustentando o olhar dele, levei minhas mãos para seu peito novamente, o vendo fechar os olhos devagar, sentindo o meu toque. Fiz o caminho para baixo com a ponta dos meus dedos, adentrando o tecido de sua camiseta e sentindo a sua pele lisa e fresca por baixo daquele pano, ele estava com o abdome tenso. Eu causava aquela sensação nele? Não estava sendo uma alucinação todo aquele clima de tensão entre a gente nos últimos três dias? Se a resposta fosse sim, eu deveria aproveitar o tesão correspondido então.
— Eu quero mais. — minha voz saiu um pouco falhada e ele abriu os olhos para me encarar com sua mandíbula enrijecida.
— O que você está fazendo comigo?
Eu não tive tempo para responder, suas duas mãos seguraram meu rosto na altura da mandíbula, para que ele puxasse para mais um beijo. Desta vez mais intenso, mais preciso e muito invasivo. Era o mais que eu estava querendo e que bom que eu havia me aberto para aquela possibilidade e não teria de parar mais uma vez na cama, sozinha, sonhando como poderia ter sido se eu fosse uma das favoritas do divino.
— Fodam-se as regras.
E mais uma vez ele disse para o nada, separando nossos lábios e tirando sua camisa. Eu não pude dizer nada porque logo que o pedaço de roupa encontrou o chão, seus lábios já estavam contra os meus novamente, tomando conta para que nenhum segundo fosse desperdiçado. Minhas mãos passeavam pelo corpo dele, agora seminu, esperando para conseguir alcançar toda sua extensão e poder sentir cada uma delas. Ainda sem separar nossos lábios, ele buscou a alça da minha camiseta, abaixando ela para em seguida tirar meus seios para fora da casca do sutiã, sem delicadeza alguma, sem preceitos, apenas movido pelo desejo que tinha. Suas mãos passaram a ser delicadamente vorazes quando eu estive com essa parte íntima exposta, sabendo como tocar e fazendo com que o meu tesão aumentasse, principalmente ao sentir seus lábios passando por meu pescoço.
Estávamos em um banheiro, eu não esperava que fosse ser um super sexo, daqueles que você grava cada movimento na memória como único. Mas a forma como o nosso desejo pareceu ser tão mútuo e maior que aquele lugar me permitiu aproveitar como teria de ser, e esse pensamento me deixou mais ávida por senti-lo dentro de mim. Eu já não sabia mais me controlar, tanto que meus dedos desceram por conta própria para a barra de seu jeans, e como se estivéssemos em uma sintonia perfeita, ele compreendeu.
Namjoon me tirou do balcão da pia num movimento brusco e abriu a minha calça jeans primeiro, me virando e a jogando para longe depois de me ajudar a tirá-la. Curvou meu corpo para frente e eu senti meu peito chocar com o mármore gelado, embora não fosse o suficiente para atrapalhar aquele anseio. Senti minha calcinha ser puxada e então eu estava exposta para ele. Seus dedos passaram por minha região íntima lentamente, fazendo movimentos circulares no lugar certo para estimular aquele prazer que eu já estava sentindo desde o primeiro encontro de nossos lábios, e então senti eles serem colocados dentro de mim com uma maestria lírica. Eu com certeza cheguei a ouvir um canto do paraíso ao sentir seus dedos entrarem e saírem de mim, em seguida sendo atingida por um tapa em uma de minhas nádegas, tão forte que meu corpo deu um tranco para frente.
O primeiro pensamento seria sobre seus amigos estarem do lado de fora e ouvirem, mas eu estava inerte demais para aquilo, então ao invés de sentir vergonha, eu gemi e clamei por mais. Ele não me obedeceu, porém sua mão que não estava dentro de mim desta vez apertou a minha cintura de uma forma que deixaria marca, fazendo o mesmo em minha bunda logo em sequência. E eu queria mais, gemia por mais e seu nome em meus lábios era minha oração para que aquilo acontecesse.
Ele dizia coisas pesadas em inglês, mas a maioria das palavras que saíam de sua boca eram em coreano, só que eu estava preocupada com outra coisa naquele momento para ficar pensando se ele estava conjurando algo ou me chamando de vadia no idioma nativo. Seria bom se fosse a segunda opção, até porque eu estava mesmo me sentindo uma vadia.
Eu não vou saber dizer nem mesmo para mim como foi, mas eu estava tão fora de mim e ele foi tão ágil, que não deu tempo de sentir falta de algo me preenchendo, pois a surpresa gostosa que me atingiu quando ele me penetrou por fim, foi única. Ele era violento, mas parecia se controlar, como se ainda estivesse entendendo como eu gostava — um fofo em se importar com a parceira, mesmo que fosse uma foda de uma noite só. E esse seu modo violento era gostoso, novamente me fazendo ansiar por mais. Eu queria mais rápido, mais forte e intenso, pedi e ele o fez.
Meus cabelos estavam enrolados em sua mão, os tapas foram deveras necessários, pensei que teria sido mais fácil transar no primeiro ambiente, ir para o banheiro não foi a melhor das soluções no quesito privacidade. Só que naquele momento eu estava pouco me fodendo para aquilo, na verdade eu estava sendo fodida, mas não por essa situação, o que era um pouco diferente da linha de pensamento. Minhas pernas ficaram moles e eu senti meu corpo tomar o mesmo rumo, me deixando fraca, e quando senti o quente de seu líquido em mim, minha respiração terminou de atingir o nível mais baixo. Eu estava cansada com uma rapidinha em um banheiro, o pensamento de querer mais foi envolto da dúvida sobre o que ele seria capaz de fazer comigo em quatro paredes. Kim Namjoon tinha um potencial absurdo para me fazer ficar de quatro por sua foda.
estaria ferrada pelos próximos meses para se recuperar da decepção de ter que dizer tchau.
Quando ele se afastou, eu senti meu coração acelerar pedindo por mais, mas ele juntou nossas roupas e com um pouco de frieza, se voltou para mim.
— Se quiser tomar um banho, tem toalha limpa nesse armário e... — Namjoon me olhou quando nossos dedos se tocaram por eu pegar minha roupa de suas mãos. Meu coração agora batia forte pela vontade de ir embora, em três dias eu tinha visto muitas expressões dele, mas a de frieza que me lançava naquele momento parecia ser como uma faca afiada com um alto-falante dizendo “já te fodi, agora tchau”. — Pode dormir aqui se quiser, amanhã te chamo um Uber.
Sorriu, me deixando um beijo na testa, e terminou de se vestir, me deixando ali no banheiro sozinha e sem entender absolutamente nada do que estava passando em minha própria cabeça.
Em um momento ele me olhava como se fosse o suficiente para me fazer sumir dali. No outro, beijava minha testa com carinho, oferecendo a estadia por aquela noite. Os meus “divertidamente” não estavam sabendo como proceder a partir daquela sequência de fatos. E eu ainda teria de sair daquele banheiro e encarar os outros seis integrantes do BTS que, mais do que provavelmente, me ouviram gemer.
Ser levado pelo calor do momento é uma prova muito grande de controle para o ser humano. Eu havia acabado de reprovar e minha ressaca moral estava começando a despontar ali, pronta para fazer um carnaval no meu psicológico.


Minha cabeça estava latejando. Ressaca era uma coisa com a qual eu ainda estava aprendendo a lidar, só que o que eu estava sentindo era uma coisa diferente. Era mais pesada e eu poderia dizer que tinha encontrando meu caminho para o inferno. O meu corpo doía e parecia ter sido enfiado em um forno de tão quente. Além de sentir algo pesado em minha de minhas pernas e costas, ainda de olhos fechados eu me encontrava com medo de abrir as pálpebras e descobrir que morri. Morrer deveria ser relativamente bom para o defunto em questão, não deveria? Portanto, se fosse mesmo, eu estava em uma experiência diferente e ruim.
Resolvi cessar minha luta interna e abri meus olhos, devagar me situando do que estava acontecendo.
Eu estava de bruços em cima do tapete felpudo. O peso em minhas costas era do braço de alguém e pela direção que eu consegui olhar, vi que em cima de minhas pernas estava o corpo de Jungkook. E com isso os flashes em minha memória foram liberados.
A primeira imagem era eu saindo do banheiro, cabelos presos por conta de ter suado e de banho tomado para tirar aquele cheiro de sexo. Segunda, Hoseok vinha em minha direção com uma garrafa de soju semiaberta. Eu estava irritada com algo criado em minha própria cabeça, então peguei a garrafa de sua mão e virei o líquido dela. Foi a primeira das muitas que vieram a seguir. Terceiro flash, muitas risadas, eu me dando muito bem com Jungkook e Jimin, eles dois tentando me ensinar coisas de seu país em um dialeto meio complicado pela ausência de algumas palavras no vocabulário inglês deles — mas com auxílio do Google. E por último, a imagem de Namjoon me beijando no hall novamente, em um momento que fui para o banheiro.
Eu ainda podia sentir o gosto e o seu toque, minhas mãos sendo colocadas acima da minha cabeça em um aperto forte. Eu podia sentir ainda como foi ter ele dentro de mim. Fiquei decepcionada ao ver que o braço em mim era de Jimin e não dele, então me recordei dele indo dormir antes de todos e nos deixando ali naquele ambiente cheio de bebida e conversas aleatórias. E como eu me senti, claro que tinha que vir aquela sensação novamente. Ri fraco, me desvencilhando do braço de Jimin e saindo de debaixo de Jungkook, me levantando. Estava me sentindo uma tola por ter criado todo aquele cenário em minha cabeça, mas não podia fazer muito também. Ser o one night stand de alguém nunca foi muito meu forte — por isso havia sido minha primeira vez, e como uma experiência para decisões futuras, eu a usaria negativamente.
Os dois não moveram um músculo sequer com a minha saída, deveriam estar mesmo cansados.
Olhei para o ambiente e vi o caos das milhares de garrafas de soju espalhadas por ali com as caixas de pizza que em algum momento da noite devoramos, algumas cervejas, doces e cobertores. Contei apenas quatro membros do BTS, contando com Jimin e Jungkook e quando Yoongi saiu do banheiro e parou no hall, me encarando apenas com uma toalha enrolada na cintura, eu me assustei.
— Desculpa, não queria te assustar. Na verdade, eu esqueci que estava aqui, desculpa. — disse pausadamente, cobrindo o tronco nu com a outra toalha em suas mãos.
— Tudo bem... — respondi sentindo uma pontada em minha cabeça e fiz uma careta.
— Eu acho que temos analgésicos ali no armário do banheiro, se quiser tomar... A primeira ressaca de soju a gente nunca esquece.
Ah, eu realmente não iria esquecer o que foi vivido naquela madrugada. Não só pelos acontecimentos, mas pela bebida ruim mesmo, que me deixou bêbada mais do que rápido.
— Obrigada, Suga. — agradeci e ele sorriu, entrando no quarto.
Entrei no banheiro para me recuperar e me concentrei apenas em ajeitar minha aparência para sair logo dali e ir embora. Devo ter demorado um tempo considerável, pois já conseguia ouvir uma movimentação do lado de fora e vozes grossas conversando em alto e bom tom. Suspirei e, ao abrir a porta, me deparei com alguns deles em pé e uma boa parcela da equipe ali, juntando as coisas para irem embora.
Então era aquilo: eles estavam indo embora e eu ficaria. Mas o que estava esperando? Que Namjoon declarasse seu interesse contínuo por mim? Que qualquer um deles me visse como uma amiga e quisessem manter o contato?
Alice realmente havia batido forte.
— Ei, ! — o sempre sorridente Hoseok se aproximou, ele estava vestido, devia ter tomado banho no outro banheiro. — Eu vou sentir sua falta, sabia? Não acho que vou encontrar alguém tão fácil de ensinar passos de dança assim como você.
— Também não acho que encontrarei um bom professor assim novamente. — fiz um bico demonstrando decepção.
— A gente pode manter contato, se você me prometer não espalhar o meu e-mail do Skype. — brincou.
— Se isso me render milhões, sinto muito desde já...
Hoseok riu e me deu um abraço não muito apertado.
— Vou terminar de juntar minhas coisas, não vá embora antes de me dizer tchau ou eu corto relações.
Assenti positivamente e ele se afastou, da porta ao meu lado saiu Seokjin segurando uma mala. Ele estava com uma aparência ótima e saudável, e eu me lembrei que havia ido dormir tão cedo quanto Namjoon. Recebi seu sorriso simples e ele apenas me deu as costas, seguindo para empilhar sua mala junto com as outras.
Suspirei tentando encontrar minhas coisas e quando menos esperei, vi Namjoon entrar pela porta do quarto, vestido inteiro de preto e com um boné que escondia parte do seu rosto. Ele estava perfeitamente esculpido com a camiseta preta básica por dentro da calça social também preta, fechada com um cinto preto de fivela prata e um tênis também preto.
Eu quem estava de luto pela partida deles e ele quem usava a cor.
Seu olhar me encontrou e eu automaticamente sorri com os lábios fechados. E para a minha surpresa ele fez o mesmo. Disse algo em coreano para a moça que ajudava Jin a organizar a ordem das malas na pilha e se aproximou de mim, me deixando um beijo na testa.
Me lembro de ter lido em algum lugar que beijo na testa é uma forma muito carinhosa de selar o outro. Eu estava odiando alimentar essa ideia em minha cabeça.
— Bom dia, senhorita . — ele disse se afastando. Agradeci mentalmente por ter encontrado uma escova de dentes descartável no banheiro novinha, no plástico, pois ele estava tão próximo que eu teria vergonha de abrir a boca para dizer qualquer A.
— Bom dia. — respondi baixo.
— Eu vou te levar para tomar café antes de ir embora, ok? A gente aproveita para conversar mais um pouco.
Assenti, um tanto hipnotizada naquele olhar novamente. Ele pegou em minha mão e me guiou para a saída do quarto. Ao contrário do que pensei, fomos para um outro quarto reservado e este tinha uma mesa enorme com muita comida e, além de nós dois, duas pessoas bem vestidas. Comecei a me sentir mal pela minha calça jeans, camisa regata e All Star. Eu não seria dificilmente rejeitada naquele hotel de elite. Sentei-me e me servi de um café e torradas apenas, meu estômago reclamaria de qualquer coisa que eu tentasse comer.
— Você precisa comer alguma fruta.
Olhei para o lado, vendo Namjoon me dizer autoritário.
— Não vou conseguir comer muita coisa... Esse tal de soju acabou comigo. — tentei rir fraco.
— Coma fruta, ajuda a melhorar. — empurrou um pote de salada de frutas em minha direção. — Confia em mim. — insistiu e eu apenas assenti.
— Então... Que horas é o voo de vocês?
Tentar puxar conversa nunca foi algo que eu soube fazer muito bem pela falta de delicadeza e meu estilo mais direto, eu não sabia fazer uma simples pergunta sobre o clima parecer mais natural e descontraída. Por isso, perguntar sobre o voo deles era mais fácil e soava mais natural, mais eu. E é claro que era um meio de chegar no “E aí, mano? Transamos rapidinho ontem, depois nos beijamos fervorosamente e ficou só nisso? Assim, só para eu saber”.
Nam sorriu de lado, mas não muito animado.
— Daqui algumas horas. — suspirou. — Você não gosta de comer? — frisou, me encarando. Eu não havia tocado em nenhum alimento.
— Eu realmente estou com meu estômago implorando para não comer nada. — tentei um sorriso amarelo para ele compreender.
— Tudo bem, mas tente comer alguma coisa depois. — suspirou e olhou para o lado, em seguida retornando seu olhar para mim. — Eu gostei de ontem.
— Ah... — minha boca se abriu em um formato de O. Não esperava também que ele fosse tocar no assunto, one night stand normalmente não entra nessas questões, ou entram?
— Eu não sou assim normalmente. — franzi o cenho. — Digo, me relacionar com pessoas que eu acabei de conhecer.
— Ah... entendi.
— Acho que agora é a parte da conversa que você diz se gostou ou não, pelo menos algo que se passe na sua cabeça, só para eu me sentir menos... Idiota? — riu anasalado. Ele estava nervoso?
Empurrei o pote da salada de frutas para frente, definitivamente sem vontade de ingerir nada.
— Foi uma boa primeira vez. — tentei usar de uma frase já dita por ele que havia me dado um certo guia para pensamentos impróprios no dia em que nos conhecemos. Ele pareceu compreender, talvez pelo sorriso de lado que pintou em meu rosto. Iniciaríamos um flerte? Ainda tinha tempo para aquilo?
— Você costuma guardar as coisas assim para usar depois contra as pessoas? — sorriu.
— Depende do impacto que o que foi dito tem em mim.
— E... Por que foi uma boa primeira vez? — a julgar pela sua mudança repentina de expressão, ele talvez tenha entendido errado o que eu disse.
— Eu nunca tinha transado com um desconhecido, num banheiro com outras pessoas do lado de fora ouvindo tudo e... Muito menos com um idol. — senti minhas bochechas corarem e mirei outro ponto para encarar.
— E o que você achou?
A pergunta dele parecia como um pedido para que eu dissesse ter amado. Mas eu não podia simplesmente dizer que estava apaixonada por nossa rapidinha naquele banheiro.
— Gostaria de repetir, não em um banheiro, claro. — suspirei.
Ele riu anasalado novamente, em seguida acenando para os outros dois naquela sala. Eu apenas segui os movimentos com meu olhar, vendo os dois sentarem junto com a gente, um deles com duas pastas em mãos.
, o que eu vou te dizer agora é de extrema delicadeza e eu espero que você não me entenda mal. — assenti, sentindo meu coração disparar. — Eu não posso me envolver de forma pública com ninguém, isso implica um trabalho muito difícil para conseguir conciliar a vida pessoal e carreira, além de cuidar da imagem dos dois âmbitos. Você compreende? — novamente assenti.
Uma parte de mim parecia entender que rumo aquilo estava tomando. Talvez eu tivesse de assinar um documento para a segurança dele, me comprometendo a não contar para ninguém que havíamos transado e tudo mais. E eu estava com aquele desespero interno, querendo que ele entendesse que eu não sou esse tipo de pessoa e que nunca usaria o nome dele para ganhar alguma coisa a mais na vida. Eu não seria cretina com nenhum deles, que me acolheram tão bem e ganharam uma parte de mim em um curto espaço de tempo.
Eu queria proteger o que havia acontecido entre mim e Namjoon, espalhar como fofoca seria totalmente o contrário disso.
— Mas eu quero você. — sua fala foi direta e objetiva, acertando uma parte em mim que vibrou. Eu queria sorrir. Ele me queria, queria mais de mim. — Eu quero ir para o “a mais” que podemos fazer juntos.
De alguma forma eu me senti incomodada com os outros dois ali, eles sabiam que havíamos transado então. E agora o sentimento era de vergonha, eu fui chamada apenas para servir como um sexo eventual de um ídolo coreano.
— Eu não poder me relacionar com alguém de forma pública não quer dizer que não posso viver coisas pessoais. — ele parecia ler bem minha feição e passou a ter cuidado como dizia. — Então os relacionamentos que tenho são limitados ao... — hesitou e eu o encarei, com meu olhar lhe pedindo para que fosse claro. — Às necessidades.
Ah, mesmo sendo pouco lenta, eu compreendo. Kim Namjoon contrata mulheres para o satisfazer por um tempo, para que suas fãs não venham a destruir um relacionamento, caso ele apresente um ao mundo. Ele tinha de seguir como um robô do que as pessoas queriam que ele fosse midiaticamente e isso incluía ter que contratar mulheres para o satisfazer.
E ele queria me contratar.
O mal de se iludir facilmente é esse. Eu criei expectativas de algo que não poderia ser real.
Realmente, quem vê cara, não vê coração.
— Este é um contrato, pedi para que fizessem em português. — me estendeu uma pasta. — Aí tem as cláusulas. Nós não teremos uma relação afetiva... Se você concordar.
Peguei a pasta e abri, apenas por curiosidade. Logo no cabeçalho vinha o detalhamento e eu me senti um pouco mais aliviada — não que fosse assinar aquilo ali, sem pensar direito sobre nada. A primeira linha detalhava a necessidade de um contrato para que ambas as partes não saíssem prejudicadas, não era algo envolvendo um cenário de Christian Grey, para meu breve alívio — ser chicoteada e todos os a mais do BDSM não me convinha.
Em resumo, eu seria a parceira sexual de Namjoon, segurada de que não correria riscos e nem ele. Mas sem relação afetiva, ele queria apenas sexo e eu não tinha consciência se queria o mesmo.

Eu ainda sou o mesmo, o mesmo que sempre fui
O mesmo eu de antes está aqui
Mas essa mentira cresce mais e mais
Está ameaçando me engolir

BTS — Lie



Exausta, porém ansiosa. Aquele aeroporto estava tão cheio que eu não conseguia me situar para que lado seguir, mesmo com as placas em inglês me servindo bem como informação. Talvez meu estado de torpor por logo poder encontrar Namjoon estivesse me atrapalhando daquela forma, porque eu não estava conseguindo me concentrar e dentro do meu estômago parecia estar rolando o maior baile funk que colocaria qualquer um do Rio de Janeiro no chinelo. Era uma saudade misturada com a vontade de estar sem roupa e com ele novamente depois de dois meses de muitos processos burocráticos que nos separaram.
Meu celular, que estava funcionando com um sistema de roaming internacional, não parava de receber mensagens de minha mãe e , preocupadas com meu bem-estar, claro. Eu não havia detalhado para mamãe sobre o que de fato eu estava indo xeretar na Coreia do Sul, um país do qual eu sequer sabia como funcionava a política. Mas para eu tive de contar. Ela, a princípio, quis me matar por dizer que aceitaria aquela loucura de me mudar para o outro lado do mundo sozinha só para ser uma parceira sexual por contrato, embora seu mais íntimo quisesse que eu tivesse assinado o contrato assim que recebi. Ela seria meu contato de emergência, é claro.
Peguei minhas malas na esteira, ajeitando-as no carrinho e saindo do local de desembarque. Encontrei um espaço entre aquele caminho para parar um pouco e respirar, precisava deixar meu coração mais calmo para o que iria enfrentar dali em diante — e, claro, parar de tremer para compreender melhor da nova cultura na qual eu iria viver. Decidir aceitar os termos de Namjoon pode ter sido a maior loucura da minha vida, que eu cometi conscientemente, embora pudesse vir a ser uma aventura e tanto. Eu tinha um contrato assinado, com cláusulas que favoreciam os dois lados e de cunho verídico. Não tinha muito pelo o que reclamar naquele momento, eu podia tirar disso algo para mim também, Seul poderia me oferecer mais.
Voltei a caminhar e logo vi um rapaz parado com uma placa escrito meu nome e “Bem-vinda!” em português logo abaixo. Cheguei perto e me apresentei receosa, para somente descobrir que era um coreano com dupla nacionalidade, logo, sendo um conterrâneo que havia se mudado para seu país ascendente. Victor Hyro-ike seria meu motorista oficial, uma das regalias pelo contrato. Ele me guiou para fora do aeroporto, explicando que me levaria para o apartamento em que iria morar, numa zona mais afastada da cidade. Em nossa conversa durante o caminho descobri que ele tinha pouco mais de 27 anos e havia se mudado para Seul a poucos anos. Logo me senti mais acolhida, por ter algum brasileiro por perto com quem pudesse conversar vez ou outra — e principalmente por ser ele o meu motorista.
Nossa viagem durou algo em torno de quarenta minutos, o prédio era algo surreal pela sua arquitetura moderna. Quando estive discutindo sobre o contrato com o advogado cedido a mim, discordamos daquela parte em que eu moraria num apartamento dado para mim por Namjoon, uma casa simples em um bairro tranquilo para mim já estava bom. Porém não, o idol queria que fosse um lugar reservado e afastado para que não houvessem perigos, principalmente por eu ter de morar sozinha. O uso de um motorista eu até aceitei rapidamente, pois meu medo de dirigir falou mais alto.
A entrada era realmente muito reservada e a cobertura em que eu iria morar tinha seu próprio elevador privativo que saía em um pequeno hall, com a porta tendo um sistema de senha para entrar. Era algo como uma linha de alta de segurança e eu estava me sentindo um item de grande valor. Minhas malas foram carregadas por Victor e quando chegamos no hall, eu pude ver a porta aberta, logo sentindo meu coração bater mais forte e rápido do que o de costume.
Saí em sua frente, caminhando cautelosamente, e quando entrei naquele enorme apartamento fui recebida por seis criaturas animadas — a incluir o sempre entediado Yoongi. Eu realmente acreditava que os fãs deveriam mudar o rótulo dado ao segundo mais velho do grupo. A alegria com a qual fui recebida me fez sentir um quente no coração, algo como se fosse um aviso para eu não me preocupar porque eu estaria sim em casa.
— Você parece muito cansada, . — Jungkook foi o primeiro a relatar enquanto eu abraçava um por um.
— Realmente, a escala em Dubai foi um pouco longa demais... — comentei, não contendo o bocejo.
— Mas você continua ótima de qualquer forma. — Hoseok, como sempre, usando de palavras gentis.
— E como está se sentindo? Já teve alguma impressão da cidade?
— Olha, Suga, considerando que eu cheguei tem coisa de duas horas e não peguei muito trânsito, tudo em paz até agora. — me espreguicei. — Algo que eu precise saber?
— Você vai ter muito tempo para descobrir as peculiaridades da grande Seul. — Jimin riu.
— Jimin! Não sabe esconder o tom sorrateiro por um momento? — desta vez foi Jin quem riu.
Neste momento, meu olhar cruzou com o de Namjoon, que vinha de um outro cômodo. Ele sorriu para mim e pareceu hesitar antes de se aproximar mais, me abraçando tranquilamente e deixando um beijo em minha bochecha. Obviamente eu corei. Foram dois meses nos falando apenas por ligações de vídeo e mensagens, eu acabei por bagunçar toda a minha escala de sono para poder conversar com ele, que estava do outro lado do mundo e tinha um fuso diferente do meu. Então, estar ali de frente com ele novamente era, no mínimo, merecedor de uma bochecha queimando.
E convenhamos, eu não sabia exatamente como seria nosso cumprimento. Em resumo, um abraço e beijo na bochecha estavam de bom tamanho.
Eu não sabia até qual parágrafo os outros sabiam de toda a história e eu não queria perguntar, o receio da verdade era maior.
— Como foi sua viagem? — perguntou ao me soltar.
— Tranquila, a não contar pela parte em que nossa escala em Dubai teve atraso. — bocejei novamente.
— Acho que podemos deixar você descansar e voltar mais tarde com comida, o que acham? — Jungkook perguntou, olhando tanto para mim quanto para Nam.
— Você quer que eles voltem? — Ele sussurrou em meu ouvido e eu senti que os meninos não ouviram, ficando aliviada.
— Eu acho que pelo tanto que estou cansada, capaz de cair na cama depois de um bom banho e não sair de lá por no mínimo umas vinte horas de sono.
Eles riram, trocaram olhares e eu sabia que ninguém estava acreditando naquelas palavras. Nem eu estava.


Talvez eu fosse mesmo sentir falta da comida brasileira. Talvez, não, com certeza eu sentiria falta de comer um arroz e feijão feito na hora com um ovinho frito e salada de alface. Mas eu podia me acostumar com a comida coreana, com um bowl de salada bimbibap — acredito que era esse o nome do que Namjoon pediu para nós dois comermos, visto que os meninos não demoraram a ir embora e já estava chegando a noite. Só não tenho tanta certeza sobre o uso do hashi, já que minha coordenação motora parecia ter uma boa e respeitosa tela azul quando se tratava de manusear os dois pauzinhos.
E isso era motivo de risadas para Kim Namjoon.
Estávamos na banheira da suíte, após uma maravilhosa ideia dele de usá-la para que eu relaxasse o corpo da longa viagem de avião, somada ao estresse de ter esperado mais de vinte e quatro horas para concluir a escala em Dubai. E ao contrário do que eu achei que seria, ele não estava sendo gentil comigo por apenas me amaciar para quando fossemos transar. Pelo contrário, estava fazendo real o que me disse sobre criarmos um laço de amizade em uma das chamadas que fizemos durante o tempo “separados”. Para ele, era importante que fôssemos amigos, para que a parceria sexual não se tornasse algo robotizado.
Pelo meu livre arbítrio, eu concordei, mesmo não sendo tão experiente — como dizia , eu era tapada —, poderia dizer que era bem óbvio o que ele havia comentado, nossa relação não seria apenas um one night stand como eu cheguei a pensar que seria, então a amizade deveria ser um ponto de partida muito valioso.
Claro que eu poderia lidar com isso, certo? Me limitar apenas ao objetivo de todo aquele acordo.
— Você treme toda vez que vai usar o hashi. — mais uma vez ele riu, tomando cuidado para não derrubar o suporte em que estava nossa comida, atravessado naquela banheira.
— Para de rir! — esbravejei. — Se você derrubar esse suporte na água, além de rir muito de você eu vou ficar extremamente brava.
— Brava, é?
— Sim... Você fala que eu sou esse desastre com o hashi, mas você é um desastre natural para tudo. Me surpreende não ter derrubado esse negócio ainda. — ri fraco, trocando os palitos de madeira por um garfo.
— É sorte sua, de principiante.
— Discordo. — digo com a boca cheia, engolindo para continuar. — Você conseguiu a proeza de derrubar o celular dentro do vaso quando estávamos em uma chamada de vídeo. — ele logo começou a rir. — Ou seja, me derrubou dentro do vaso! Onde tem sorte nisso, Kim Namjoon?! — me rendi e ri com ele.
A vibe que tinha entre a gente era uma coisa diferente, parecia que nos conhecíamos de outras vidas e tudo era feito com perfeita sincronia. A tensão era algo relativamente bom, porque soava como um carro chefe para ligar nossos corpos, nossas conversas, nossos desejos e anseios. Era como uma chama para aquela gasolina. Estar com ele era como estar com uma melhor versão de mim mesma, porque com Nam eu conseguia assimilar cada parte de mim, o que eu queria, o que eu não queria e o que efetivaria. Soava como se ele fosse aquela faísca para eu impulsionar o salto.
Eu estava começando a me conhecer mais desde o dia que transamos no banheiro do hotel.
Encarar ele ali, sentado em minha frente, em todo aquele contexto, me fez começar a questionar menos e aproveitar mais. Havia tomado uma decisão e teria de permanecer com ela, ao menos tentar. Não me pareceu algo absurdo, aliás.
— O que tanto você pensa? Posso oferecer um morango pelos pensamentos? — perguntou, me vendo um pouco absorta.
— Suas ofertas têm decaído... — ri fraco, mas aceitei o morango sendo levado para meus lábios. — Hum, eu acho que só pelo sabor docinho você ganha uns pontos a mais.
— Achei que morango era sua fruta favorita. — comentou casualmente.
— E é! — sorri por ele lembrar desse detalhe. — Mas e se eu estivesse pensando nos números da mega da virada dos Estados Unidos? Morangos não seria uma oferta boa o suficiente.
— Tem razão. — apontou para mim. — Mas você não está pensando na loteria americana. Estamos no final de maio ainda.
— Depende, se for no sentido literal, não. — peguei um morango e o admirei antes de levá-lo até a boca.
— Elabore.
— Eu posso dizer que ganhei na loteria antes da virada. — dei de ombros.
— Isso tem algo a ver com...
— Uma cobertura com todos os a mais, um motorista, cartão de crédito ilimitado e eu ter a liberdade de ir e vir... Isso me parece melhor que a loteria, não precisei apostar em números para isso. — tentei deixar a fala com o maior tom de humor possível, não queria que ele me entendesse mal, embora fosse um resumo bem real sobre aquilo tudo.
— É um ponto. — disse simples, dando de ombros.
Namjoon tirou o suporte com todo o cuidado do mundo, me deixando atenta — o seu poder de ser atrapalhado era algo inigualável, tudo o que tocava ou até mesmo olhava podia se destruir. Não seria nada legal no meio daquela conversa ele derrubar os restos de comida dentro da banheira.
Se aproximou de mim e inverteu nossos corpos, ficando sentado com suas costas na borda da banheira para me aninhar no meio de suas pernas. De forma tranquila, apoiou minha cabeça em seu ombro, passando os braços em volta de meu corpo em um abraço. Aquela sensação começou a soar como um aviso para as borboletas em meu estômago de que o funk pesado logo estaria liberado, além de reativar a Alice.
— Eu acho que quem ganhou na loteria fui eu. — disse em meu ouvido, descendo sua mão para a parte interna de minha coxa, a banheira que havia sido programada, então começou o processo de hidro e eu imediatamente senti meu corpo relaxar. — Não se trata só de mim ou de você, é uma relação entre duas pessoas adultas, . A gente só não vai se apaixonar ou viver um cotidiano afetivo.
Talvez fosse o efeito daquele momento relaxante, mas eu novamente me levei a pensar que conseguiria conviver com aquilo. Alice que desse um jeito de sumir e do baile funk das borboletas eu poderia me livrar com umas doses de banho frio no sentido figurado. Eu havia aceitado a proposta de forma consciente e não poderia cobrar Namjoon posteriormente, mesmo que momentos como aqueles na banheira fossem acontecer frequentemente.
Era sexo, apenas sexo, certo?


Dualidade é diferente de bipolaridade. Isso é algo que devemos ter em mente sempre quando vamos falar sobre como uma pessoa consegue assumir posturas diferentes em questões de segundos. E apesar de ter passado boa parte rindo, ouvindo Namjoon me contar sobre suas experiências aprendendo inglês com Friends, enquanto eu lhe dizia como não gostava da série, sua dualidade se fez presente ao finalmente cansarmos de ficar de molho dentro de água borbulhante.
Estava sendo levada no colo para o quarto e ria sem parar da forma como ele estava tentando não ser catastrófico e me derrubar. Era meio estranho como Namjoon conseguia ser delicado e bruto ao mesmo tempo, me viciando em seus toques a cada vez que os recebia.
— Pronto, agora chega de regalias, não? — disse me colocando na cama gentilmente.
— Eu achei que estava apenas começando. — murmurei, fazendo manha.
O tom já não era o mesmo usado enquanto estávamos na banheira. E eu, surpreendentemente, não sentia vergonha ou receio de estar com Namjoon no mesmo ambiente e sem roupa, pelo contrário, queria que isso fosse possível por mais tempo do que tínhamos. Talvez fosse a sensação de o conhecer por mais tempo que o real. Cresci com universos literários apontando o bom e velho clichê sobre interesses logo à primeira vista, claro que em cima de romances construídos de formas menos realistas, mas eu estava vivendo algo parecido. E quando se vive isso você consegue entender mais sobre como é algo tão de repente. Um olhar realmente pode dizer ou causar muitas coisas, das quais chega um momento que você não consegue e nem quer parar.
E deitada naquela cama, enrolada apenas com uma toalha em meu corpo e os cabelos completamente molhados, eu me sentia à vontade com ele. Namjoon sorria para mim enquanto vinha em minha direção, ficando por cima de meu corpo apoiado em seus braços, também enrolado por apenas uma toalha em sua cintura. Sua mão direita foi direto para o meu pescoço, nos entregando mais um encaixe perfeitamente gostoso.
— Nós vamos ser grandes parceiros, , pode ter certeza disso.
Não precisei proferir que concordava, meu olhar e sorriso diziam isso perfeitamente. Principalmente quando ele estava tão perto daquele jeito e eu com saudade de ter um contato maior do que seus lábios. Não acho que seria coerente dizer que entrei naquela onda por simplesmente querer a parte luxuosa, eu estava vidrada naquele homem e queria sim o mais dele.
— Pelo o que depender de mim, com certeza seremos, Namjoon.
Ele sorriu e, em seguida, selou nossos lábios.
A noite anterior foi resumida em muita pegação e algumas mãos bobas antes de eu acabar dormindo pesado.
Acordei no outro dia, encontrando na cabeceira da cama um bilhete escrito por ele, avisando que precisou ir antes que eu acordasse e que voltaria no final da tarde com algo para nosso jantar. O meu dia acabou por ser entediante até eu decidir desbravar o apartamento, me sentindo uma Dora Aventureira.
Era um andar só, tinha uma piscina na área externa com um espaço grande e bem moldado de churrasqueira. A decoração de tudo era bem minimalista, o que dava aquele ar de lugar limpo, arejado e bem iluminado. A vista que eu tinha daquele lugar era de tirar o fôlego, conseguia ver muito além dos prédios que pertenciam à grande Seul no horizonte. Mas o que acabou por me chamar atenção foi o quarto com instrumentos que encontrei.
O piano foi o meu maior vício durante a infância. Antes de meu pai falecer, eu sempre tocava com ele e o ajudava nas composições de suas músicas. Minha mãe me ensinou a cantar e o nosso clichê era passar as tardes de domingo com algum instrumento, criando música e aproveitando a companhia um do outro.
Passei a tarde tocando e muito nostálgica. A nostalgia sendo tanta, que acabei escrevendo uma letra falando sobre as covinhas de Namjoon, porque elas eram uma arma muito forte contra mim.
Quando a noite começou a chegar, ele não apareceu. Uma simples mensagem me informou que ficou preso na gravadora e não conseguiria ir me ver. Me lembrei que um de seus avisos prévios foi de que não teríamos sempre uma agenda.
Então me perguntei: eu teria de viver sempre à sua espera?


Senti algo pesar ao meu lado no colchão. O perfume rapidamente invadiu minhas narinas e eu sabia que era ele. Abri meus olhos e encarei seu sorriso, porém mesmo que eu estivesse com saudade de vê-lo, passar mais de cinco dias presa em um apartamento à mercê de sua espera não me deixou tão animada com sua chegada. Eu tinha o direito de estar brava, não tinha?
Reparando minha feição não muito satisfeita, ele começou:
— Me desculpa, eu não achei que fosse demorar tanto tempo assim para resolver as coisas e... Desculpa. — suspirou. — Vou ter o final de semana inteiro para a gente.
Respirei fundo, sorrindo simples e me ajeitando na cama.
— Não tem problema, eu entendo. — passei as mãos no rosto, eu realmente compreendia.
Namjoon trabalhava bastante, era um idol e como todo e outro artista em atividade, precisava trabalhar muito para se manter no topo, em evidência. Eu teria de me acostumar com isso, ser mais companheira e exigir menos.
— O que você quer fazer hoje? — perguntei, me sentando na cama e puxando o edredom para meu colo, as janelas estavam abertas, eu não havia fechado, então podia vê-lo nitidamente. Minha pergunta pareceu pegá-lo de surpresa de alguma forma. Ele se jogou na cama, de barriga para cima e encarou o teto, esperei sua resposta por alguns segundos.
— Que tal se você me mostrar suas habilidades e cantar aquela música que escreveu?
— Mas o quê? — senti minhas bochechas corarem em confusão.
— Eu fui colocar o café da manhã na mesa e encontrei um papel... Dimple é um nome bem legal. E você compõe muito bem. — deu de ombros. — O que foi? Eu disse algo absurdo?
— Não... — me recompus. — Eu...
Deixei um espaço curto para pensar com exatidão no que dizer.
Organizando os pensamentos, temos primeiramente aquele que insiste em me deixar confusa, pela falta de experiência em relações que não envolviam algo mais afetivo. No contrato não tinha nada sobre como eu deveria agir quanto a isso, se poderia ou não viver minha vida normalmente e como o fazer sem colocar em risco a imagem dele. E também não estava muito claro sobre como eu deveria fazer isso, talvez fosse necessário que eu pedisse permissão e o avisasse sempre o que queria fazer? Não sei.
Em resumo, acho que posso colocar diretamente tudo à confusão sobre como agiríamos dali por diante. Eu não podia confundir as suas aberturas para amizade com algo a mais. Não mesmo. Pelo menos pela parte de Namjoon, não seria assim, e para eu poder continuar aquilo que começamos, realmente confundir as coisas era o não recomendado.
E talvez a minha ideia fosse realmente errada. O que eu estava esperando? Que desde o dia um faríamos sexo o dia todo, todo dia e nossa vida se resumiria a isso?
Então decidi colocar a Alice no modo de espera e andar no ritmo dele.
— Bom, eu vou escovar os dentes primeiro, lavar meu rosto e te encontro na cozinha para o café da manhã.
— Isso! Eu trouxe coisas mais brasileiras para você. — se levantou, me acompanhando. — Tem um lugar que vende aqui em Seul, mas é um pouco longe, então trouxe bastante para não faltar.
Sorri em resposta, entrando no banheiro e fechando a porta. Não demorei muito, não tendo a necessidade de me arrumar ou trocar o baby doll por alguma roupa casual, eu não iria para um lugar chique e as paredes do apartamento já estavam acostumadas em me ver naquele tipo de traje.
Entrei na cozinha vendo algumas coisas em cima do balcão e logo ao lado a mesa de café, tudo colocado em seu lugar calculadamente. Me sentei na cadeira de frente para ele e o vi guardar o celular imediatamente, tendo sua atenção para mim.
— Qual a nossa programação de hoje então? — ouvi sua voz e ergui o rosto, terminando de me servir com o chá.
— Achei que fosse você quem iria decidir o que faremos. — dei de ombros, levando o polegar nos lábios para limpar o pouco de geleia que havia ficado ali enquanto passava na torrada. Seus olhos estavam atentos em mim.
— Não, vamos fazer o que você quiser hoje. — Ele deve ter entendido minha surpresa, pois sorriu e apoiou os cotovelos na mesa, para colocar seu rosto entre suas palmas, ainda me encarando a cada movimento feito. — Não vamos viver somente em prol de sexo, . Não é como se eu fosse vir aqui só para transarmos e ir embora...
— Eu realmente não acho que entendi. — levei a torrada até os lábios e parei no meio do caminho, me sentindo corada com os seus olhos bem abertos em cima de mim. — O que foi?
— O que foi, o quê? — permaneceu com a mesma posição e ergueu suas sobrancelhas, sorrindo fraco.
Um detalhe, o mesmo de sempre. As covinhas, a mandíbula enrijecida. Eu captei bem o que estava se passando ali e talvez estivéssemos em sintonia. A voz de em minha mente insistindo para que eu fosse menos o eu de sempre e tentasse usar essa história para me descobrir e reinventar foi muito alta.
— Você, me olhando desse jeito... — dei de ombros, levando a torrada para a boca e finalmente a comendo.
Ele se movimentou minimamente e eu me senti um pouco orgulhosa, mesmo que dentro de mim o eu verdadeiro estivesse querendo rir e batendo na Alice sobre aquela cena com o tema “desde quando seduzimos um homem comendo uma torrada cheia de geleia?”.
— É que você faz isso comigo. — o tom baixo de sua voz me fez arrepiar.
— Isso o quê? — passei o polegar em volta dos lábios para limpar possíveis restos de torrada.
— Agora está fazendo de propósito. — riu. — Você me hipnotiza e eu sinto vontade de terminar com toda e qualquer distância existente entre nós.
Neste momento, eu recuei umas vinte casas das quais já havia andado nos últimos dois meses. Mesmo que estivéssemos apenas em contato on-line, conversávamos tranquilamente e eu não sentia essa vergonha toda havia um tempo. Era quase como um quente no corpo inteiro. Talvez o resultado do funk das borboletas?
Eu não podia cair nessa, uma armadilha própria.
— Eu sinto o mesmo. — sustentei seu olhar.
E nos encaramos por alguns segundos, até eu decidir me levantar e levar a xícara até a pia, dando a volta no balcão. Foi uma medida clara para ver se ele tomaria alguma atitude, afinal, depois do dia do hotel nunca mais havíamos feito nada. Eu realmente queria o mais que poderíamos ser que ele me disse.
De costas para ele, eu pude sentir seu corpo se aproximar e meu coração começou a bater mais forte, enquanto eu sentia aquele formigamento em minha região mais baixa. Sua mão foi direto em minha cintura e eu senti seus dedos por cima do tecido fino de cetim tocarem em mim, com apenas aquela peça de roupa impedindo nosso pele a pele. A sua outra mão foi para meu cabelo, afastando para um lado só, deixando uma parte do meu pescoço à mostra.
— Eu disse que vamos ter uma boa parceria. — seu hálito quente bateu em minha pele, antes de seus lábios tocarem com muito carinho aquela parte exposta. Arrepiei e hesitei. — Não mude seu perfume. — mais um beijo, dessa vez um pouco mais para cima. E eu aproveitei para tombar um pouco mais para o lado da minha cabeça. — Não mude seu shampoo.
Outro beijo, desta vez mais longo e com as duas mãos apertando meu quadril. Fechei meus olhos e suspirei, sentindo aquela tensão de sempre.
Me virei por fim, encontrando seus lábios com os meus e iniciando aquele beijo que, pelo menos da minha parte, tinha todo aquele quê de saudade. Uma saudade do que eu queria que tivesse sido mais, porque o que tivemos no banheiro do hotel foi muito para o que eu achei que seria, mas agora era pouco para o que poderia ter dali por diante. Mas também era um beijo em total sincronia, pelo desejo, pela tensão, tesão, por quase tudo.
Eu podia estar com a minha Alice ativa, mas não deixaria de viver aquela chance de estar com Namjoon, mesmo que fosse só por sexo.
Era uma primeira experiência, mas estava sendo com ele, então eu não me importaria de viver os seus termos.
Ele puxou minha perna direita pela coxa, e, me dando suporte, eu consegui rodear as duas em seu tronco, sendo colocada no balcão de granito naquela pequena ilha na cozinha. Haviam alguns itens ali que foram para o chão, mas nós não nos importamos. O beijo estava quente, em um ritmo lírico, e parecia que eu não precisava de nem um pouco de oxigênio desde que seus lábios estivessem colados aos meus. O mundo do lado de fora não importava.
Sem muito enrolar, eu já estava com as mãos na barra de sua camiseta, livrando ele daquela peça, enquanto ele fez o mesmo com a minha do baby doll, as duas peças indo para algum canto daquela cozinha. Uma de suas mãos foi para meu seio, enquanto seus lábios caminharam para meu pescoço e eu só me concentrava em querer pular todas aquelas etapas e sentir novamente como era tê-lo dentro de mim.
Desci minhas mãos para seu jeans e abri, colocando minha mão para dentro e sentindo sua rigidez. E contra a minha pele, ele gemeu tão gostoso que eu senti como se aquilo já fosse o suficiente para me dominar por completo.
Minha consciência sabe que venerar algo ou alguém não é saudável, mas eu não conseguia me sentir menos entregue e hipnotizada por ele. Eu queria que ele me mostrasse como eu estava certa sobre aquilo.
Eu não conseguia tirar a nossa proposta do mais da minha cabeça.
Quando senti sua mão puxando meu short, me ajudando a me livrar daquela peça, revelando já estar sem calcinha, eu percebi que ele sentia aquela mesma urgência de nos unirmos. E foi em uma sintonia incontestável, meu short e seu jeans com a cueca tomando um rumo qualquer ali no chão da cozinha, enquanto eu era preenchida por ele.
Sua mão estava firme em meu pescoço, me obrigando a encará-lo enquanto entrava e saía de mim, e eu sentia meu corpo entregue ser manipulado da forma como eu queria. Era bom, era algo que nenhum outro parceiro anterior poderia me dar mesmo com uma transa em uma cama queen e confortável. Tinha mais a ver com a pessoa que o ambiente, isso eu passei a compreender.
Entre apertos, beijos, arranhões, palavrões e gemidos, nós nos desfizemos em cima do granito frio. E quando eu tive meu orgasmo, aquele momento de prazer concluído, me desfiz em seus braços, deitando a cabeça em seu peito que subia e descia rápido pela sua respiração descompassada, enquanto os braços de Namjoon me rodeavam.
— Qual o problema de transar na cama? — perguntei, cortando o silêncio que ficou entre nós.
— Nenhum. — riu fraco. — Quer testar?
Ergui meu rosto, encarando seu sorriso sacana.
— Só se você me levar para lá no colo de novo, gosto de você concentrado para não cometer nenhum desastre.
— Vou começar a listar as suas peculiaridades também e usá-las contra você. — rebateu, me pegando no colo em seguida.
Eu não sabia muito sobre muitas coisas, mas, naquele momento, eu soube que Namjoon não estava mesmo mentindo: seríamos bons parceiros.


Música sempre foi algo que me fez sentir bem. Apesar do afastamento quando meu pai faleceu, eu ainda amava dedilhar cada nota que sabia no piano, tocar um violão e cantar músicas que compunha sem fim nenhum. E isso me permitiu uma boa aproximação com Suga, o que me salvou muitas vezes do tédio. Ele me permitia encontrá-lo vez ou outra na BigHit, em seu estúdio, quando não estava tão preocupado ou muito empenhado. Às vezes eu até ajudava e, do contrário que esperava, aproveitava meus ouvidos para desabafar sobre uma tal de Maya, que eu tinha uma leve impressão de ser famosa na Coreia.
E isso aconteceu a partir do dia que Nam teve a brilhante ideia de levar a letra de Dimple para os meninos verem. Ele me pediu e eu deixei porque não acreditei que fosse resultar em algo. Mas resultou, a música entrou em um álbum deles e por eu pedir muito, os créditos foram divididos entre Nam e os outros dois produtores — e estava tudo bem para mim, ele deu algumas alteradas legais no contexto e eu, de fato, preferia assim.
Ter Jungkook, Jimin, Jin e Taehyung cantando uma letra minha foi uma sensação muito boa.
Então com as idas mais frequentes à empresa, em dias que Namjoon não estivesse e muitas vezes escondida, porque de alguma forma ele não gostava que eu fosse lá, também criei um laço divertido com Hoseok. Com ele era a dança e também momentos para que ele praticasse o inglês que estava tentando aprender, principalmente depois de ter começado a se interessar pela famosa norte-americana Lou J. Era muito fofo ver ele tentando ser aberto com ela, que, por outro lado, não se importava em conversar com ele em coreano.
Eu ficava nesse meio, me divertindo com os dois falando sobre tudo e as duas figuras femininas em questão. E tinha esse padrão, o de não poder colocar elas em primeiro plano. O que me gerou a dúvida sobre Namjoon passar por algum conflito como aquele, porque eu tinha Yoongi em minha frente me dizendo que Steve Aoki havia gostado da demo de Dimple e que repassou, até que chegou em Will.I.Am, que queria me oferecer um contrato.
— Namjoon já sabe? — perguntei para Suga, me levantando da cadeira e colocando as mãos na cintura, ficando de costas para ele.
— Não ainda. Mas não achei que ele tivesse que saber antes de você e Steve falou comigo a pouco tempo. — disse casualmente.
— E o que você acha? — me virei, passando a deixar a animação me tomar.
— É uma oportunidade única, . — suspirou. — Debutar direto na América e com Will.I.Am sendo seu padrinho... Steve disse que também estará nesse processo e... É uma chance.
— Eu teria de ir para lá... Los Angeles, talvez.
— Qual o problema nisso? — se ajeitou na cadeira, ficando mais folgado. — Deixar o Namjoon? — fiquei em silêncio. Meu celular vibrou em cima da mesa e ele checou. — Mensagem dele.
Suspirei, com as mãos na cintura novamente, me sentindo um pouco perdida em meio a briga interna.
O celular vibrou mais uma vez.
Mais outra.
E de novo.
— Não vai responder? — Yoongi me perguntou. — Tem três perguntas de onde você está e por que está na BigHit.
Ótimo, fofocaram que estou aqui.
— Qual o problema em vir aqui? Eu nunca vou entender. — desta vez ele murmurou e eu o encarei séria, não era bem um momento para ser tão falante.
Eu estava nesse misto de não saber o que fazer com a insatisfação por Namjoon sempre pegar no meu pé por sair do apartamento sem avisar para onde ia.
— O problema não é eu vir aqui, o problema é eu sair daquela torre, Yoongi. — revirei os olhos me levantando e indo em direção à porta, abrindo-a e me deparando com Namjoon prestes a bater.
— O que você veio fazer aqui? Já não disse para avisar e evitar vir até a BigHit? — disparou sem rodeios. — Suga, eu já te falei para não ficar-
— Ficar o quê? Me chamando? — o cortei impaciente, ganhando sua atenção novamente. — Ele não me chama, Namjoon, eu venho por conta própria! — me virei e peguei minha bolsa no canto em que estava. — Obrigada, Yoon, eu irei pensar e te falo sobre isso depois. — disse ao hyung, como o chamavam, antes de sair.
Ouvi a porta atrás de mim bater e, em seguida, a voz de Namjoon me parou no corredor.
— Por favor, não se exalte... Eu só penso em como pode ser se começarem a gravar o seu rosto e tentarem descobrir quem você é. — me virei, o encarando. — É o meu medo, que te façam algum mal.
— Não, Namjoon! O seu medo não é por mim, é por você. — diminui o volume da voz, respirando fundo. — É a sua imagem e não a minha, eu já entendi essa parte e estou sendo egoísta.
, não é isso, eu não estou dizendo-
— Me diz uma coisa, quando Ahni te deixou você não relutou, mas e se eu quiser? — cruzei os braços.
Ele vacilou por meio segundo. Talvez estivesse procurando a melhor resposta para que eu não me sentisse mais patética.
— Eu não poderei te impedir. — deu de ombros. — Tá vendo? Você não luta por nada que não seja isso aqui. Até que ponto ser o RM está sendo compatível com o Namjoon? — disparei o acusando sem ao menos filtrar.
— Você quer ir embora? Porque se for isso, preciso pedir para que organizem isso e... — Namjoon passou a mão no rosto e me olhou cansado. — Quando você disse que aceitaria, , eu te deixei claro. É com o Namjoon que você está se relacionando, mas ele tem limitações por causa do RM. Mas se você não quiser mais, eu... Olha, me espera no meu estúdio e vamos para o apartamento juntos, lá conversamos melhor.
Conversamos não, transamos e terminamos em pizza, esse filme é bem comum.
Eu compreendia nossa situação de uma forma mais aberta. Talvez estava mesmo sendo a Alice de sempre, mas Namjoon estava escolhendo outra coisa, mesmo que quisesse me escolher. Ele já havia definido prioridades em sua vida muito antes do meu aparecimento e de vivermos uma realidade paralela àquela que lhe era permitido.
— Não precisa se preocupar. — disse olhando para baixo. — Eu vou à cafeteria que tem duas a quadras daqui e de lá peço para Victor me buscar.
— Tudo bem... Passo à noite para conversarmos e levo um jantar.
— Não. — disse imediatamente, dando um passo para trás. — Eu quero ficar sozinha hoje.
Em silêncio, ele assentiu e eu saí dali, cega para o caminho que fazia, mas ao chegar na cafeteria e ter meu pedido na mesa, me deixei deitar a cabeça naquele móvel e chorar antes de ligar para a minha mãe, ela seria a melhor pessoa para me dizer o que fazer.
Tudo o que fiz sentir foi aquele soco no estômago ao constatar que estava criando minha própria mentira, eu tinha aquele sentimento por Kim Namjoon e ele não poderia me corresponder.
O pior era saber que fui avisada sobre isso.


Assinar o contrato que o advogado pessoal de Namjoon, contratado pela BigHit, me deu, foi algo não tão complicado. Eu fiz isso de forma consciente. E não me arrependia, não, isso nunca. Contudo, eu era outra pessoa naquela época. É incrível como mudamos da noite para o dia e realmente o que pensamos ontem pode não ser o mesmo de hoje. Mas o foco não deve ser a ingratidão, cuspir no prato que me foi servido, pelo total contrário.
Eu seria grata para o resto da minha vida pelas coisas que pude viver em quase um ano. Aprendi muito sobre uma cultura diferente, sobre pessoas e conviver com elas. Mas o principal foi aprender mais sobre mim, sobre quem eu sou e quem vou ser.
Também descobri mais sobre o que é de fato o amor. Ao contrário do que dizem, sim, ele pode doer; diferente da paixão, porque ela passa. Amar é difícil e precisa de coragem, porque você se entrega a isso e te expõe de formas muitas vezes incuráveis.
O amor é tudo, mas também pode ser nada. E para mim ele estava sendo um monte de malas separadas no canto da suíte do apartamento, enquanto eu estava no banco de trás do carro dirigido por Victor — o meu companheiro de sempre. Estava sendo aquela decisão firme de ir até a BigHit e dizer que eu iria embora no primeiro voo que pudesse dar início no meu retorno ao Ocidente. Para mim, naquele momento, o amor estava sendo a despedida.
Eu desci do carro e entrei o mais rápido possível, caminhei para dentro da empresa e mesmo sob olhares tortos, continuei até onde eu sabia ser o estúdio de Nam. Bati, decidida, sem hesitar, mas ele não abriu. Coloquei minha mão na maçaneta e, para a minha surpresa, estava aberta. Ao entrar, me deparei com sete pares de olhos em minha direção, todos se silenciando e curiosos pelo o motivo pelo qual eu estava ali.
Encarei apenas um deles, na esperança de que entendesse o sinal. Mas fui ignorada, vendo seu famoso jeito de enrijecer a mandíbula e colocar suas covinhas à mostra daquela forma tão sexy.
Como eu havia escrito uma vez: era um crime. E embora eu fosse fraca por aquilo, naquele momento, eu havia descoberto a parte em mim que tomava decisões e não olhava para trás.
Eu o encarei incisivamente desta vez.
Um a um os meninos foram deixando a sala, enquanto Namjoon continuava a amarrar os cadarços de seu tênis, obviamente que fazia aquilo de forma lenta, ele sabia muito bem sobre a existência da minha impaciência. E estava me punindo, mesmo que não estivéssemos com o ar sexual nos rodeando. Kim Namjoon estava me punindo por eu ter entrado na sua sala sem o mínimo de educação.
Mas não era como se eles soubessem sobre nós, sobre quem eu sou e todo o passo da história. Nem mesmo Jimin, o mais angelical, não tinha conhecimento sobre o que o líder do grupo fazia comigo e o porquê de ter me trazido do Brasil.
O olhar de Nam estava escuro e sua expressão não me dava nenhuma abertura de leitura. Ele estava impassível e se levantou indo até a porta, passando por trás de mim. E quando a fechou, com chave, eu entendi que em algum momento ele colocaria outro nível àquela conversa.
— Você sabe que não pode vir aqui sem me avisar, ... — iniciou com o tom ameno, e pela primeira vez desde que entrei ali, Namjoon me fez sentir sua tensão apenas pelo seu tom de voz e o timbre trêmulo ao dizer meu nome.
Ele sabia. Nam já tinha conhecimento sobre a proposta e o que de tão importante me motivou a não esperar que chegasse em meu apartamento para conversar.
— Eu não podia esperar e... — busquei o meu melhor para não ceder ao seu olhar que se tornara incisivo para mim, no famoso modo de inversão de mesas. — Eu imaginei que aqui não seria um lugar em que você vai me calar com um sexo estupidamente gostoso. — completei encolhendo os ombros.
Droga, ! Sempre vestindo sua capa de submissão.
Dizer que o ver soltar o ar de seus pulmões, que deixavam seu peito mais estufado, foi surpresa seria mentira. Mas algo na forma como ele me olhou, com uma dor de culpa e parecendo querer se distanciar de mim, com receio de ser o mal em pessoa, fez com que eu desse um passo à frente. O suficiente para começar a sentir as malditas borboletas dançando o funk em meu estômago.
— Você é livre, .
Tudo bem confessar que eu não queria ouvir um "pode ir" camuflado em qualquer sentença. E eu até acreditaria que era isso que Nam queria que eu levasse como resposta final, mas insisti, meu eu não estava ali o enfrentando para uma deixa simples e mediana. Eu queria que ele me provasse que ir embora seria errado, porque eu valia a pena seu esforço.
— Não é o que você quer dizer, eu sei. — abracei minha própria cintura, mais uma tentativa de desligar o funk em meu estômago.
— O que... — um suspiro e uma mão sendo passada pelos fios descoloridos e bem penteados. — Você não entende, , eu sou-
— Você é o líder de um grupo que tem a vida controlada por uma empresa que visa o lucro em cima do uso de cada um destes membros, que inclui você. O que faz de você obrigatoriamente o exemplo de membro para ser seguido. — tentei não soar entediada com a palavras do famoso discurso.
— Não é bem assim também.
— É exatamente assim, Joonie. — desta vez o tédio saiu em meu suspiro. — Só que agora o tempo começou a passar mais rápido e eu não tenho mais certeza se ainda estou nessa frequência.
— Você diz sobre permanecer com nosso contrato? — senti um certo pânico em seu olhar.
— E ainda existe um, Namjoon?
O olhar que me foi lançado respondia de forma simples. Tudo bem que talvez o efeito da dança explícita das borboletas em meu estômago poderia me causar essa distorção. Mas eu o vi perder mais um tom do brilho em seu olhar. Entretanto, seu silêncio realmente me deixou em uma dúvida incômoda.
Ah, Alice...
— Nam... — me aproximei mais, ficando a poucos centímetros de seu corpo alto. Ergo apenas o olhar, o vendo travar a mandíbula, deixando suas covinhas totalmente aparentes e rígidas, de novo. Seu olhar foi o único a se mover em direção ao meu, para baixo devido aos meus vários centímetros a menos. — A gente ainda vive em cima de um contrato? Fazemos sexo por um contrato? — pergunto definitivamente. — Eu... Eu ainda sou apenas uma parceira para você usar enquanto não tem sua liberdade da vida a dois?
A última pergunta saiu como um sopro de ar preso. O medo da resposta impulsionou cada palavra a sair, mas também me fazia estremecer apenas com o pensamento sobre a resposta.
— Você nunca foi apenas uma parceira, ! — sua voz firme me mostrava a honestidade, assim como amolecia minhas pernas. — Não seja tola. Não existe mais contrato, não existe mais sexo por sexo... Eu amo você, .
Me lembrava de ouvir ele dizer que me amava uma vez, mas havia muito soju envolvido. Por isso, ao ouvir tais palavras novamente, as lágrimas de decepção rolaram por minhas bochechas. Cada gota percorrendo um caminho sem a tendência de serem curadas, porque foi nesse momento que minha realidade bateu e a Alice foi embora.
Nunca passaríamos dessa parte dos dizeres. Em nossa realidade, aquilo tudo era uma mentira.
— A gente pode dar um jeito, não pode? — Você não sabe o que está me pedindo. — seus olhos foram fechados e novamente observei seu peito inflar do ar pesado.
— Eu não estou te pedindo nada, até porque isso te dá a margem de me pedir para desistir de algo que-
— Que você não deve recusar. — seu sorriso trazia a opacidade das suas palavras, novamente dizendo algo que não queria de fato.
— Nam...
Eu não tive tempo de pensar, apenas me dei conta de que deveria apreciar aquele momento assim que seu braço rodeou minha cintura e fez o curtíssimo espaço entre nós diminuir a zero. Seus lábios foram direto para os meus, o obrigando a se curvar para me alcançar devido meu déficit de altura. E o beijo que Namjoon iniciou foi o gás que as borboletas precisavam para retornar às suas atividades, me lançando um tremendo dedo enorme, como quem diz "dorme com essa, vadia".
E como eu iria dormir se aquilo era uma despedida?
Sem nenhuma exigência, Nam mudou o ritmo do beijo para algo que infundiu o tesão com toda aquela necessidade passional. A outra mão que não segurava em minha cintura e passeava por minha nuca, foi direto para minha coxa, o que me deu a ideia de que era a deixa para enlaçar minhas pernas em seu tronco. E assim o fiz, sendo segurada por seus braços. Com um beijo incessante, usando uma de minhas mãos para bagunçar os fios loiros completamente macios e a outra em seu ombro, fui levada até a parede mais próxima.
E, surpreendentemente, o ritmo dos nossos lábios era harmonioso. Havia todo o tesão comum, mas aquele toque passional não parecia querer ir embora.
Os lábios de Nam eram precisos como sempre e agora percorriam toda a extensão de meu pescoço, até chegar em minha clavícula e voltar para meus lábios, que haviam soltado um arfar com gemido. Sua mão segurando em minha cintura era firme e a outra passeava pelo meu rosto. Em um ato surpreendente, separando nossos rostos, Namjoon cessou o beijo com o polegar em minha bochecha, olhando em meus olhos.
Se alguém me perguntasse o que eu queria doze meses antes, eu diria com todas as palavras do mundo que "ser fodida por Kim Namjoon de todas as formas que me deixassem entregue ao toque e comando dele", além de uma bolsa da Prada, um Louboutin e, claro, conseguir essas duas últimas coisas com o suor do meu trabalho bem-sucedido. Mas o tempo passou, a que um dia se sentou de frente com Kim Namjoon, o RM do BTS, em uma sala de reuniões de um hotel cinco estrelas para discutir sobre cláusulas de um contrato que lhe serviria de porta para esse sentimento, não existe mais. E hoje se eu fosse questionada sobre o que queria, com toda certeza responderia que sair dessa mentira é o meu desejo natural.
Porque olhando os olhos de Kim Namjoon me encarando com toda aquela dor de saber que eu não estava mais entregue ao que ele me dava e que não era o único a oferecer, eu enxerguei a trama. Fui pega desprevenida em minha inocência, mas agora eu enxergo e compreendo, eu estive vivendo uma mentira por tempo suficiente.
E mesmo sendo contradição, as palavras dele me doeram.
— Eu quero fazer amor com você pela primeira e última vez, . Posso?
Doeu porque eu sabia que não era assim que eu queria que fosse; não era como eu ajustei meu sistema para entender as coisas. Eu não entraria naquela sala e saíria de mãos dadas com Namjoon. Ele não me levaria para sua, minha ou nossa casa em seu carro e colocaria sua mão carinhosamente em minha perna quando parasse no sinal vermelho. não seria uma mulher comprometida com o amor de sua vida. Porque eu caí em uma mentira. A minha própria mentira. O meu próprio conto de fadas padronizado.
E talvez ele pensava o mesmo, porque seu abraço ao receber meu silêncio como resposta foi a melhor mentira que eu nunca tive.




Fim, por hora.



Nota da autora: Olá!
Primeiramente, obrigada por ler e, se possível, não esqueça de comentar. É muito bom saber o que você achou da história.
Segundo, eu acho que você não deveria perder a chance de ler a “continuação” logo ali, em Tear. Comenta aqui e vai logo lá, vai que alguma coisa muda, huh?
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