Última atualização: 1º/04/2024

Capítulo 1

nunca fora do tipo que acreditava em coincidências; destino. Ela não fazia ideia de que uma noite, um único ocorrido, iria acarretar numa mudança perpétua em sua vida.
Quem poderia, certo?
Ninguém nunca está esperando por nenhum tipo de jogada do universo. Simplesmente acontece, e quando se está no meio desse jogo, é difícil se recordar de quando ou como foi inserido nele.
Numa noite de quarta-feira, uma brisa gelada tomava conta de toda Los Angeles.
A garota de cabelos castanho-claro, e que encontravam sua pele na altura dos ombros, estava postada em frente à cafeteria onde trabalhava – seus olhos estavam atentos, a pele clara, coberta de roupa, arrepiada.
Conferia com frequência o relógio pequeno no pulso, afinal, sua amiga havia prometido lhe buscar, mas depois de uma longa espera, estava começando a duvidar disso.
Depois de tentativas falhas, precisamente dez ligações, preparou-se para começar a caminhar na calçada quando uma buzina incomum – exageradamente alta – chamou sua atenção. Ao erguer o queixo, se deparou com uma caminhonete azul, não conhecia o motorista, mas – sua queridíssima amiga – estava no banco do carona, acenando para ela pela janela.
!
Sua primeira reação fora achar aquilo estranho, mas suas expressões faciais rapidamente suavizaram e ela atravessou a rua depois de um carro passar; não seria a coisa mais estranha ou irritante que a fizera presenciar. Apesar de qualquer coisa, ainda era a sua melhor amiga e nela confiava de olhos fechados – por isso não hesitou quando a ruiva indicou que ela entrasse no banco de trás da caminhonete.
— O que houve dessa vez? — ela se colocou entre os dois bancos, elevando o olhar para o homem que tinha as mãos no volante; ele parecia amigável, para variar. Seus traços a fizeram observar seu rosto por mais segundos do que deveria, antes de voltar a atenção para a amiga. — Eu posso conhecer você a minha vida toda, mas sempre tem mais alguém para me apresentar.
— Não seja ridícula. — retrucou, mas tinha um sorrisinho nos lábios. — Esse é o Kim. Eu o conheço há pouco tempo, mas ele me salvou hoje. Minha moto deu ruim. — ela apontou para trás e pôde ver a moto conhecida repousada logo atrás de si, na caminhonete. — Ele diz que vai levar para um cara de confiança. E eu combinei de vir pegar você... então vai com a gente. Não é?
— Você nem perguntou se ela quer. — Kim se pronunciou pela primeira vez, e pelo tom, parecia muito mais íntimo do que um conhecido para ; seus dedos passaram pelos fios curtos e iluminados de loiro.
— Ela não tem nada para fazer. Iríamos sair para beber. Podemos fazer isso depois de deixar a moto... nós três.
deu um pequeno sorriso, acabando por cruzar os braços abaixo dos seios e apenas afirmar levemente com a cabeça; poderia não ser um plano desde o início, mas não foi difícil entender que tudo o que aconteceu com a moto poderia ter acarretado numa situação perfeita para lhe apresentar o novo candidato a namorado.
Não tinha qualquer pretensão em recusar o convite, por isso apenas relaxou no banco de trás enquanto olhava pela janela e vez ou outra péssima atenção na conversa nos bancos da frente; sua atenção fora tomada mais uma vez quando percebeu estarem entrando em uma parte da cidade mais afastada do que costumava ir.
Abriu mais dois botões da camisa branca que usava; estava vestida como costumava trabalhar, se não fosse pela calça jeans escura. Os tênis claros estavam sujos e seu corpo clamava por um banho – ela se considerava uma completa bagunça àquela hora da noite. Havia aceitado o convite de sua amiga para sair depois de muito tempo sem fazer qualquer programa como aquele. Simplesmente estava cansada demais para qualquer coisa que não fosse ir diretamente para seu apartamento e acabar apagando no sofá ao tentar assistir qualquer filme furreca na televisão.
— Ele ainda está aqui. — o homem ao volante denunciou quando o veículo parou de frente para o que parecia uma garagem; não parecia, a loira constatou que era ao sair do carro e analisar o local.
A porta da garagem estava erguida e demorou alguns segundos para passar os olhos por todo o local e perceber se tratar de uma oficina. Bagunçada, mas ainda era uma oficina.
Ela não prestou atenção no barulho que estava ouvindo de primeira, e sim nas diversas motos e peças espalhadas. falou qualquer coisa ao seu lado, mas ela ainda tinha os olhos cravados naquele lugar que, por algum motivo, havia cativado toda a sua atenção.
Até que finalmente parou o olhar no homem sentado de costas para eles; ele usava uma regata preta justa, um dos braços fechado pelas tatuagens estava evidente. Kim chamou, atrapalhou o que ele fazia ao tocar em seu ombro, então o barulho parou – foi quando ela percebeu que ele estava soldando alguma coisa.
Ao se virar, ainda sentado, expôs a calça jeans clara, os pés descalços e o rosto coberto pelo capacete protetor para fazer aquilo.
— O que está fazendo aqui? — sua voz saiu abafada pelo capacete grande e Kim apenas soltou uma risada bem-humorada, apesar do tom rude do homem desconhecido. — Não estou aceitando mais nada hoje. Liga da próxima vez.
— Qual é, irmão? É a moto da minha garota. Faz esse favor para mim. Não é nada demais, provavelmente.
Enquanto Kim apontava para a moto na caminhonete, sequer prestou atenção no que o loiro falava – “minha garota” deveria ser motivo para tirar sarro de mais tarde – seus olhos estavam focados nas tatuagens expostas e em como aquela regata apertada caía bem no homem desconhecido, em uma expectativa desesperada de ver o seu rosto. E estava certa ao pensar que não se decepcionaria; ela reparou na mão dele, igualmente tatuada e com alguns anéis, quando ele a ergueu e subiu o capacete.
Aqueles olhos a estavam encarando.
Era como ser pega em flagrante; os olhos dele eram duas esferas escuras, impossíveis de serem esquecidas. Em seu lábio inferior, o piercing fora agraciado por um movimento de sua língua dentre os lábios — ela se amaldiçoou por estar mal-arrumada. Mas isso faria mesmo diferença?
— Tudo bem. — ele respondeu a Kim, e deixou de olhá-la apenas quando se ergueu da cadeira e ela percebeu serem quase da mesma altura; ambos bem mais altos que ela.
Eles passaram pelas mulheres paradas, olhando-os interagirem, e se resolveram ao descer a moto do da caminhonete. O desconhecido já estava sem o capacete por completo a esse momento, evidenciando mais piercings na orelha e um cabelo escuro e mais comprido. A definição de desejo de qualquer mulher, pelo menos foi o que passou pela cabeça da morena naquele momento.
— Eu vou olhar amanhã. Já estava terminando por hoje. Não vou demorar... porque você pediu. — ele puxou um pano sujo de cima de uma das mesas de madeira, limpando seus dedos manchados. Havia um sorrisinho zombeteiro em seus lábios, evidenciando que deveriam ser amigos — Não vai me apresentar as duas? Estou começando a ficar constrangido.
— Aham. — Kim rolou os olhos nas órbitas, e então sua mão foi parar na cintura de ; percebeu aquela atitude como possessiva. O outro apresentava uma ameaça, talvez? — Essa é . Amiga dela, . Meninas... esse é o Jungkook. Não cheguem muito perto, ele pode morder.
— Morde mesmo?
Houve um segundo de silêncio e demorou aquele tempo para perceber que aquelas palavras haviam saído da sua boca; não teve qualquer controle entre os pensamentos e o que saíra por entre seus lábios.
Não... ela não era aquele tipo de pessoa. Sentiu-se ridícula enquanto as bochechas queimavam, e então forçou um pequeno sorriso para fazer parecer parte de uma brincadeira sem graça.
Um sorriso apareceu nos lábios de Jungkook, mas o dele não parecia tão sem graça quanto o dela.
— Você é rápida. Estou impressionado. — ele continuou com aquela expressão, estava claramente se divertindo às custas dela. — A conversa foi ótima. Agora, preciso que vocês todos vão embora. Estou fechando.
— A gente estava indo beber. Não quer ir junto? — dessa vez, o convite partiu de .
O moreno movimentou os ombros, e então seu olhar se cruzou com o da morena mais uma vez. Ele balançou a cabeça em negativo, e ela se sentiu ainda mais atingida pelo deslize, pelo fato de não ter lhe afetado e que agora ela parecia somente uma boba.
— Eu te ligo amanhã. — ele direcionou a fala ao amigo, então deu as costas para os três e voltou a se concentrar em suas coisas.
Eles retornaram para a caminhonete, nem mesmo entendeu como conseguia mover suas pernas normalmente. No interior do veículo, ela não ousou olhar naquela direção novamente, mas outra coisa acabou em seu campo de visão quando Kim movimentou o carro.
Seu corpo inteiro congelou com a moto parada do lado de fora; a moto do dono da garagem. Era grande, inteiramente preta e bem cuidada. Acima do seu banco, um capacete — o capacete vermelho com desenhos de chamas laranjas que havia ficado em sua mente por tanto tempo. Ela conhecia bem aquele capacete e quando seu tronco se movimentou, virando a cabeça para olhar mais uma vez, somente pela certeza do que via, já tinham se afastado.


Flashback – Semanas atrás
— Me solta!
Ela tentava se soltar das mãos daquele homem nojento, que dizia coisas sujas enquanto usava de sua maior força para arrastá-la pela calçada.
Nada havia contribuído para sua sorte naquele dia; tudo a levou a estar tão tarde da noite seguindo por aquele rumo conhecido. Mas ela sabia quem era aquele homem; ele costumava a assediar com frequência na cafeteria e aquilo acarretou em sua proibição de estar no local, o que deixou o homem furioso. Passou na cabeça da morena que ela realmente estava em maus lençóis, sua tentativa falha de chutar entre as pernas do homem asqueroso fez com que ele a empurrasse no chão e ela caiu sentada.
— Você vai pagar por isso, sua puta!
Ela ergueu o braço para o rosto, esperando qualquer golpe, mas não aconteceu. O corpo do homem caiu na frente dela, e quando olhou para cima, viu aquela figura que ficaria cravada em sua mente por muito tempo.
Ele vestia uma roupa inteiramente preta, tênis cinza e jaqueta de couro. Abria e fechava a mão, coberta por luva, depois de acertar o soco que fizera o homem cair desacordado; usou daquela mesma mão para lhe auxiliar a levantar, e então se deu conta de que sua cabeça estava escondida por um capacete – um capacete vermelho e desenhado com chamas laranja.
— Obrigada. Eu... você... — as mãos dela tremiam, o nervosismo do que estava acontecendo antes do terceiro chegar ainda lhe assolando. Ele apenas tocou em sua mão, apertando-a em um movimento suave.
— Está tudo bem. — foi a única coisa que ela ouviu dele. Uma voz rouca e abafada, até ele se afastar e mexer no telefone.
Não demorou para um carro característico da polícia aparecer, e foi quando percebeu que o homem misterioso que havia lhe salvado não estava mais em sua presença. Havia passado todo o tempo encarando o pervertido desacordado no chão, temendo que ele acordasse.
Naquela noite, foi para a delegacia, na esperança de resolver aquele assunto de uma vez por todas, mas o que mais martelava sua mente era o seu salvador, que nem mesmo havia lhe mostrado o rosto.


?
A voz de a trouxe de volta para a realidade; a morena piscou diversas vezes, erguendo o queixo e assistindo a ruiva lhe encarando de maneira furtiva, do banco da frente.
sorriu para a amiga, apesar de estar apertando os dedos com força sobre o colo. Ela não estava louca; não mesmo. Era ele. Reconheceria aquele capacete em qualquer lugar.
— O que foi?
— Brooks ou Hot Pants? — eram as opções favoritas de bares movimentados que gostava de frequentar.
— Brooks.
Ela respondeu a primeira opção sem pensar muito, agradecendo mentalmente quando a amiga deixou de a olhar e soltou o ar com força; o quão pequeno o mundo poderia ser?

Capítulo 2

O barulho da porta contra o chão reverberou pelo ambiente silencioso da garagem, pouco antes dele começar a se movimentar e tentar, de alguma forma, arrumar a sua própria bagunça; ele não tinha costume de fazer aquilo, afinal. Não com frequência, pelo menos.
Estava agitado, depois de vê-la. A soma dos cabelos que tomavam conta dos seus pensamentos, seus sonhos – o que ela pensaria se soubesse as imagens que ele já havia criado dela em sua mente suja e peculiar? De certo, não pensaria boa coisa.
Jungkook nunca fora alguém difícil de entender: vivia do modo como queria, não tinha filtros ou vontade alguma de agradar qualquer pessoa ao seu redor. Levava a vida de acordo com seus desejos, priorizava o que era bom para si, nada mais que isso. No entanto... isso não funcionou muito bem quando teve de tomar a decisão que o levou a se mudar para Los Angeles. Mesmo anos depois, não era como se tudo para trás tivesse sido apagado; ele até que gostaria que fosse assim.
Apagou as luzes de sua oficina, usando da porta pequena para se colocar para dentro da casa, a que estava morando desde que chegara à cidade e onde a garagem era constituída por sua oficina, que tomava grande parte do seu tempo.
Caminhou pela sala de estar, tirando a camiseta preta do corpo e jogando por sobre a mesinha de centro, logo antes de ir em direção à geladeira, no cômodo logo ao lado, e voltar, repousando seu corpo de maneira desleixada sobre o sofá com a cerveja gelada por entre os dedos, o líquido descendo rápido por sua garganta enquanto ele encarava um ponto qualquer na parede.
Ter visto a garota minutos atrás mexeu com ele de uma forma que não poderia explicar, como ela poderia ter ido parar ali? Como seu amigo ousava levar ela diretamente até ele?
Kim Namjoon não fazia ideia, claro, mesmo assim ele culpou o amigo em seus pensamentos. Então, sua mente começou a traçar o caminho de como havia acabado daquele jeito.
Ah, claro. A noite em que a conheceu.
Lembrava-se perfeitamente de parar o trajeto que fazia com a sua moto ao passar por aquele ponto de ônibus e assistir um homem mais velho claramente tocando uma mulher à força. Para ele, não havia a possibilidade de assistir uma cena como aquela e simplesmente agir de forma omissa; ele nocauteou o homem, vendo ele cair, e então colocou os olhos naquela garota.
Estava linda, apesar da expressão apavorada. O peito subia e descia, as bochechas estavam coradas e o cabelo estava bagunçado, com o vento levando os cachos para um lado e para o outro. Ela não o olhou, como poderia? Ele estava usando seu capacete e não o tirou, preferia assim. Não estava sem seus planos acabar sendo o herói da noite, por isso estacionou a moto no beco e ali ficou, apenas observando até o momento em que a garota saísse com a polícia depois dele mesmo ter ligado – ela sequer percebeu isso, estava em choque. E por mais que ele tenha pensado nela depois daquela noite, com a rotina, caiu em esquecimento.
Até o dia em que parou no lugar onde ela trabalhava.
Ele colocou um pé para dentro da cafeteria, e então a reconheceu em questão de um segundo. Sentou-se mais para o fundo do estabelecimento, fora atendido por outra garçonete. A morena sequer o percebeu, olhou em sua direção... nada. Estava muito ocupada, alheia em seu trabalho e mundo pessoal para perceber até mesmo que ele estava a observando a muito tempo.
Depois daquele dia, ele tentou – se houvesse mesmo um Deus tomando conta dos pensamentos das pessoas, saberia o quanto ele tentou –, mas não conseguia segurar o impulso de ir até a frente daquela cafeteria, perto do horário em que começavam as atividades. Parava do outro lado da rua e ficava apenas de olho nela. Como se portava, o sorriso que tinha sempre no rosto. Tão bonito, intocado – ele sempre pensava nisso em relação a ela. Parecia a personificação de um anjo. Por esse mesmo motivo que, ainda que aquele interesse estranhamente intenso estivesse lhe corroendo, nem mesmo passou pela cabeça dele se aproximar dela. Gostava de olhá-la de longe, apenas.
— Maldito Nanjoom. — sua voz saiu rouca e arrastada enquanto ele erguia a mão livre e passava pelo rosto com certa força.
Esperava que a parede que havia erguido ao redor de si mesmo fosse o suficiente para manter ela longe, porque tinha a sensação de que não seria a última vez a bater de frente com . Mas ele também não tinha tempo para ficar ali sentado, pensando sobre o assunto. Quando se ergueu, foi rápido em se arrumar para ir até o galpão que frequentava uma ou duas vezes por semana – ganhar dinheiro com lutas ilegais era fácil. Para além disso, encarava como uma terapia que acabava gerando lucro para si.
Do outro lado da cidade, poucas horas depois, se colocava para dentro de seu apartamento, jogando sua bolsa e sapatos ao lado da porta e, em seguida, seu corpo sobre o sofá; sentia-se frustrada.
A noite fora agradável, Kim Nanjoom parecia melhor do que qualquer outro com quem se relacionava, e por isso estava feliz pela amiga. Mesmo assim, esperou que a recusa do convite feito a Jungkook fosse apenas parte do seu “charme”. Descobriu que estava errada quando ele, de fato, não apareceu para beber com eles.
Mesmo cansada, continuou refletindo sobre aquele capacete. Levantou-se do sofá e caminhou em direção ao cômodo ao lado de seu quarto, reservado aos seus passatempos favoritos: ela amava tirar fotos e desenhar. E um dos desenhos pendurados na parede, há semanas, era daquele capacete. Encarou o papel por longos segundos, começando a colocar limites em si mesma, ainda em silencio. A atitude do homem para com ela não era de como se a conhecesse, e não havia apenas uma pessoa com aquele capacete no mundo. Deveria deixar aquela história de lado, antes de enlouquecesse – tentou se convencer de que não passava de uma mera coincidência e foi se preparar para dormir.
Funcionou, pelos próximos dias.
Enquanto estava coberta de tarefas, não pensou tanto assim no sono daqueles olhos escuros ou naquele corpo convidativo.
O fim de semana passou rápido – estava com sua moto, o que indicava que o conserto havia sido feito. Tivera alguns momentos de descanso e a semana começou com um trabalho no casamento de um conhecido; o dinheiro que ganhou pelas fotos não era muita coisa, mas a ajudava a se manter. Ultimamente, desde que havia desistido de investir em seu dom – juntamente com seu diploma da faculdade – com desenhos para levar a vida, seu desejo era somente não acabar se afundando em dívidas.
— Fala. — a morena colocou a chamada no viva-voz quando atendeu, pousando o celular sobre a mesa enquanto abria a sacola com suas compras de mercado; não teria atendido se não fosse o nome de na tela.
Como você está, gatinha?
riu baixo, balançando a cabeça em negativo enquanto abria uma das caixas pequenas de suco e levava até os lábios. Sabia que quando a amiga falava daquele jeito, estava cheia de intenções.
— Qual a proposta da vez?
Como você é chata. Não me deixa nem fazer as preliminares. — a ruiva riu do outro lado da linha. — Você disse que está de folga amanhã. Então, a sua noite de hoje está livre para se tornar muito divertida.
— Talvez. — pegou o celular, tirando do modo de viva-voz e deixando o aparelho contra a orelha, os passos a levando para seu quarto. — O que está planejando?
Kim disse que me levaria em um lugar interessante, mas não é um programa a dois.
— Que tipo de lugar?
Eu não sei ao certo. Mas ele não é o tipo de cara que decepciona, acho que já percebeu isso. — houve uma pequena pausa. — Talvez aquele amigo gostoso dele esteja lá também. Não é?
parou de andar quando estava ao lado da cama, estreitando os olhos sozinha no cômodo. Não era muito difícil entender que estava querendo jogar ela para cima do homem; fazia isso sempre que arrumava algum namorado por aí. Era o mesmo ciclo, todas as vezes.
— Você está tentando bancar o cupido de novo? Isso só faz eu querer não ir, você sabe.
Não, não! Desculpa, , não é isso. Foi só um comentário. Eu juro. — a morena foi obrigada a rir novamente. — Vamos, por favor. Eu quero muito que esteja comigo. Se for ruim, você pode me levar embora.
O suspiro que ela soltou foi audível, os dedos colocaram os fios de cabelo para trás enquanto ela olhava pela janela. Um céu estrelado, convidando-a a sair. Estava pensando em apenas descansar e comer qualquer coisa por aquela noite, mas não era tão mal assim sair com sua amiga.
Depois de aceitar o convite, rumou ao banheiro para o banho demorado que antecedeu a sua arrumação; tênis escuros, um vestido branco, com flores azuis por todo o tecido, que marcava bem sua cintura e batia acima do meio de suas coxas. Seus fios de cabelo estavam arrumados e soltos, chegou a passar o batom vermelho que mais gostava nos lábios enquanto tentava se convencer de que tudo aquilo não era pela possibilidade de ver Jungkook mais uma vez. E dessa vez, ela estaria preparada.
Pouco tempo depois, o carro de Kim parou em frente ao seu prédio e ela encontrou com os dois dentro do veículo, colocando-se em meio a conversa deles enquanto rumavam para o local que o homem ao volante descreveu como “interessante”. Aquilo deveria ser preocupante, mas ninguém pensou sobre isso.
Quando o carro parou numa rua estreita, pôde avistar a entrada de uma galpão todo pintado de preto por fora. E, por sinal, estava cheio. Homens e mulheres bebendo, falando alto. De fato, parecia um lugar animado, para dizer o mínimo, mas ela não demorou a se sentir muito arrumada para o local.
— Vamos. — Kim deu um sorriso, enlaçando o pescoço de com um dos braços, e a morena seguiu logo atrás deles.
O loiro trocou rápidas palavras com o segurança na entrada, logo antes de ser permitido que eles entrassem; lá dentro era altamente iluminado, ao mesmo tempo que sufocante pela quantidade de pessoas e barulhos ao mesmo tempo. Bem no centro do galpão extenso, havia aquele ringue protegido por grades ao seu redor, e dois homens pareciam lutar por suas vidas enquanto arrancavam sangue um do outro.
— Eles ganham uma bolada. — o loiro falava com sua amiga, e ela apenas escutava a interação entre os dois quando se sentou ao lado da ruiva, perto do ringue. — Dependendo da luta, podem ganhar até dez mil dólares.
— Não brinca?! — retrucava, parecendo realmente impressionada com o ambiente.
não poderia partilhar da mesma opinião, olhava para os lados de forma frenética, temendo ser atacada por qualquer desconhecido a qualquer momento. Haviam garrafas de bebidas vazias pelo chão, embalagens de comidas; o lugar por inteiro se caracterizava numa bagunça. E julgando o que Nanjoom falava com a namorada logo ao seu lado, aquele lugar não deveria ser o tipo de estabelecimento que estava em dia com seus impostos... ou até mesmo tinha autorização para existir.
— Ele vai entrar agora. — agitou o cotovelo contra a amiga, querendo a sua atenção.
A morena ergueu o queixo, vendo o homem que perdera a última luta sendo arrastado pelo chão do ringue e colocado para fora de um modo grosseiro. Piscou diversas vezes, sentindo a ansiedade em seu peito incomodá-la.
Não houve qualquer anúncio de quem iria estar ali, eles simplesmente entraram. Primeiro, um homem de cabelos claros, era alto e forte, mas nada além do que o esperado para alguém com coragem para subir ali. E quando o seu oponente apareceu, o coração de deu aquele salto capaz de ser sentido contra o peito a ponto de doer; era ele.
Jungkook estava esfregando as mãos, os dedos enfaixados por talas brancas. Usava uma calça de moletom escura e seu tronco estava exposto; ela demorou os olhos em seu corpo naquele ângulo, somente para perceber que ele estava a olhando lá de cima quando seus olhos finalmente chegaram no rosto do homem.
— Acaba com ele! — Nanjoom urrou e então ela piscou os olhos algumas vezes, ainda atônita com aquele olhar; por mais que estivesse logo ao lado de seu amigo, não esperava ser notada com tanta facilidade.
Desviou o olhar dele, e olhando rapidamente para os próprios tênis, ouviu o barulho da sirene que indicava o início da luta; ela não entendeu como acabou tão rápido. Não conseguiu manter a atenção em tudo, sempre que o punho ou algum pé do loiro estava prestes a atingir Jungkook, ela desviava o olhar, simplesmente não suportando assistir aquilo. Mas quando o loiro foi ao chão, com uma fissura no nariz que jorrava sangue, os dois ao seu lado se ergueram das cadeiras e começaram a pular e gritar pela vitória do outro; ela se perguntou como havia parado ali.
— Será que ele está bem? — fora a única coisa que saiu por seus lábios quando se ergueu, assistindo Jungkook descer do ringue e caminhar calmamente para um corredor do outro lado do galpão. — Para onde ele está indo?
— Tem uns quartos lá atrás. — Kim leva o olhar para a morena, dando um pequeno sorriso de lado. — Vamos lá, ver ele.
Ele guiou as duas por entre as pessoas, levando-as para o outro lado, até estarem de frente para uma porta cinza. Bateu com dois dedos somente uma vez, empurrando a mesma para abrir e assistindo o homem de costas, de frente para um espelho vertical.
— Olha ele aí, o nosso Rocky Balboa da Coreia. — a risada do loiro era divertida e sonora. — Vem, amor. Vamos pegar uma bebidas. — ele pisca quando pega pela mão, levando-a consigo pelo caminho que fizeram.
olhou para os dois se afastarem, amaldiçoando-os em seu pensamento. Quando tornou a olhar para o homem dentro do quarto, ele continuava limpando o rosto com alguma coisa, de costas para ela. Tê-lo conhecido dias atrás não os tornava íntimos, muito longe disso, então ela não sabia nem mesmo como falar com ele.
— Vai ficar aí parada olhando ou vai entrar logo? — a voz dele se fez presente e ele a olhou pelo espelho, fazendo com que um arrepio subisse pela espinha da garota de modo ligeiro.
— Você sempre é grosso assim? — colocou-se para dentro do quarto, olhando os detalhes do cômodo rapidamente antes de voltar para ele, que virava o corpo na direção dela. — Pensei que fosse mecânico.
— Suas pernas são muito bonitas. — ele ignorou qualquer coisa que ela tenha falado, descendo os olhos do rosto delineado da garota para as coxas expostas. Ela abriu a boca, parecendo indignada, mas não expressou qualquer coisa em palavras. — Eu faço muitas coisas, se isso for sanar algum tipo de curiosidade sua. Aliás... esse lugar aqui não é para você. Está vestida feito uma princesinha, vão te comer viva.
— Eu sei bem me cuidar! — ela fechou as mãos em punhos, sentindo-se irritada enquanto o encarava e podia ver que seu único ferimento se tratava de um corte pequeno no canto dos lábios. — Você nem me conhece. Por que se acha no direito de falar assim comigo?
— Estou apenas fazendo uma observação. — ele ergueu as sobrancelhas; em seguida, um sorriso apareceu naqueles lábios deliciosamente convidativos, um sorriso petulante.
Jungkook não sabia ao que dar atenção primeiro: aquela expressão irritada que lhe tornava apenas mais atraente, a curvatura dos seios do decote, os lábios avermelhados ou seus cachos bem arrumados. Além disso, o seu perfume doce acabou inundando o quarto pequeno desde que entrara ali; ele poderia atacar ela ali mesmo, e esse pensamento o perturbou.
— Então... . — ele pronunciou seu nome com uma voz arrastada, virando-se novamente para o espelho e continuando o trabalho de recolocar todos seus piercings, tinha o ritual de não lutar com nenhum deles para não ter danos maiores. — Gostou da luta? Olhando para você, não me parece o tipo de pessoa que aprecia assistir luta livre.
— Você está cheio de suposições sobre mim.
— Pode até ser, mas foi você que quis saber se eu mordia, no outro dia.
Ela abriu a boca mais uma vez, e balançou a cabeça, sendo obrigada a rir baixo de si mesma. Nem mesmo ela acreditava que aquilo tinha, de fato, acontecido. Preferia fingir que não.
— Eu já entendi você... É um engraçadinho. Mas não vou cair nas suas provocações. Que fique de aviso, se me olhar assim de novo ou falar das minhas pernas, eu vou ser pior do que aquele cara que você lutou lá em cima.
Jungkook soltou uma risada genuína, virando-se mais uma vez e a encarando com uma expressão bem-humorada, logo antes de resgatar uma camisa escura e ela assistiu seu abdômen se contrair enquanto ele estava a vestindo; era impossível não olhar para uma coisa como aquela.
— Você é adorável, . — ele passou a língua por entre os lábios, o cenho franzindo levemente pelo ferimento ali presente. — Eu acho que sua amiga te largou aqui, já teriam voltado se tivessem ido buscar alguma bebida.
Aquela fala fez um “click” na cabeça de . Imediatamente se direcionou para o corredor enquanto clicava no contato de e não obtinha sucesso em falar com a amiga.
Cretina, balançou a cabeça em negativo, sentindo vontade de colocar os dedos ao redor do pescoço da ruiva e não soltar mais. Se não bastasse o que ela fazia, agora tinha ajuda de Kim Nanjoom para bancar o cupido. Malditos!
— Ótimo. — colocou o celular na pequena bolsa em seu ombro, fazendo seus passos pelo corredor, em direção à saída.
— Onde está indo? — a voz de Jungkook se fez presente, segundos antes de ele segurar em seu antebraço, puxando-a na direção dele e a impedindo de continuar andando. — Eu te levo. Anda, vamos.
— Muito obrigada, mas eu recuso. — ela se soltou dele, desafiando-o com um olhar sério. — Você devia cuidar disso aí, está horrível.
— Para com isso. Eu te levo para casa. — ele fez menção de tocá-la novamente, e nesse momento recebeu um tapa estalado no rosto, que fez com que seu queixo fosse para o outro lado.
o encarou com os olhos levemente surpresos, chegando a pensar em pedir desculpas; mas não o fez, porque pensou que ele merecia. Jungkook permaneceu em silêncio durante alguns segundos, olhando para a parede até finalmente tornar a olhar para a garota dois palmos mais baixa que ele. Um sorrisinho começou a brotar nos lábios dele, o canto se erguendo e um riso divertido se formando.
— Mas que tapa forte. Já pensou em lutar aqui também?
— Muito engraçado. — ela cruzou os braços abaixo dos seios, desviando o olhar dele. — Você mereceu, não é para ficar colocando a mão em mim o tempo inteiro.
— Claro. Pode me dar quantos tapas quiser, mas eu vou te levar para casa. É perigoso, por aqui, essa hora da noite.
Ela afirmou com um movimento de sua cabeça, esperando alguns instantes enquanto ele pegava as próprias coisas dentro do quartinho e sentiu sua mão lhe guiando no alto de suas costas, andando ao lado dela por entre as pessoas até que estivessem fora do galpão. Mesmo que tenha afastado a mão, continuou andando ao lado dela até chegarem ao estacionamento no fim da rua. A garota nem mesmo pensou naquilo, mas quando chegaram ao lado da moto dele, Jungkook lhe estendeu a própria jaqueta, apontando com o queixo.
— Para colocar a na cintura. Você está de vestido.
— Ah... É verdade. — olhou para baixo, em seguida, aceitando a jaqueta e fazendo o que lhe dissera, para então sentir o capacete sendo colocado em sua cabeça sem aviso prévio. O homem parou à frente dela, ajustando a trava abaixo de seu queixo, e assim eles se olharam naquela posição: ele olhando para baixo e ela para cima, até resolver se pronunciar novamente. Ela estava usando o capacete em questão. — Você não tem outro?
— Não.
— Tem esse capacete há muito tempo?
— Desde sempre. Por quê?
Ficarem em silêncio novamente por alguns segundos, apenas trocando aquele olhar. Com a pouca iluminação, os olhos de Jungkook se tornavam ainda mais escuros, transformando-os em esferas enigmáticas e intensas enquanto ele lhe encarava com tanta vontade e curiosidade. Para ele, os olhos da garota brilhavam em sua direção sem qualquer auxílio; ela fazia aquilo sem nem mesmo perceber.
— Nada. — a voz da morena saiu calma e ele sorriu; ah, aquele sorriso. Ela nunca tinha visto um sorriso tão bonito em toda a sua vida.
— Vamos, esquentadinha.
Subiu na moto, esperando que ela fizesse o mesmo, e não demorou para saírem dali. Agarrando-se ao corpo forte dele, guiou-o falando perto de seu ouvido para onde deveria seguir.
Fora um momento confuso na mente de Jungkook, não estava acostumado a ter alguém em sua garupa por muito tempo, sobretudo lhe roubando o direito de usar seu capacete. Mas enquanto ela o segurava com os braços finos com tanta força, enquanto sentia o corpo dela contra o dele, não queria que acabasse, não queria chegar ao destino.
Mas aconteceu. Quando parou, usou de uma das mãos para auxiliá-la a descer e fez o mesmo em seguida, tirando o capacete dela e assistindo seus fios de cabelo se bagunçarem no processo. Ela os arrumou de forma instantânea, sorrindo leve para o homem à sua frente.
— Obrigada. Essa sua moto é enorme, mas não foi tão ruim assim. — colocou alguns fios rebeldes para trás da orelha, focando no ferimento do canto dos lábios dele mais uma vez. — Você... quer ajuda com isso?
— Não é nada. Não se preocupe. — ele a analisou, descendo os olhos para sua cintura, onde sua jaqueta estava enrolada. Não lhe disse nada, apenas soltou um suspiro sonoro e colocou o capacete nele mesmo. — Tenha uma boa noite, .
A morena sentiu como se ele a estivesse impulsionando a entrar, então, com um aceno de cabeça, despediu-se dele, olhando-a uma última vez antes de caminhar para a entrada do prédio. Jungkook a observou até o momento em que a perdeu de vista dentro do hall, um sorrisinho brincando nos lábios desenhados por ela ter continuado com sua jaqueta na cintura.

Capítulo 3

O dia seguinte amanheceu chuvoso.
Da janela do quarto, olhava para o céu escuro enquanto segurava uma xícara bem cheia de chocolate quente, com pequenos marshmallows boiando, do jeito que ela gostava.
Mesmo que fosse o dia de sua folga — geralmente passava aqueles dias deitada, colocando em dia as séries de TV que gostaria de ter mais tempo para assistir — não era um dia animado para ela. Era aquele que reservava, todos os meses, para fazer uma visita. Bom, mais de uma.
Quando seu celular apitou com a mensagem, saiu de perto da janela depois de um gole no líquido quente e foi até a mesa de cabeceira, resgatando o aparelho. Tratava-se de , confirmando a saída das duas. Depois de responder a amiga, caminhou até a poltrona postada ao lado de sua penteadeira, então os olhos focaram na jaqueta estendida ali; céus, aquilo havia a deixado perturbada grande parte da noite. Poderia ter certeza que em dado momento acabou enlouquecendo, o perfume forte que ficara emanando daquele pedaço de roupa tomou conta do cômodo com muita facilidade. Também se perguntou porque ele não havia se pronunciado, afinal, a garota havia cometido um deslize e somente se deu conta quando fora se despir para tomar banho.
Mesmo que uma parte dela lhe lembrasse de que ele era problema — uma hora sendo grosso e na outra preocupado com ela — a outra parte estava animada porque significava mais uma chance de ver Jungkook.
— Idiota. — murmurou para si mesma, desistindo de se sentar e se apressando para terminar o seu café da manhã. Pouco mais de uma hora depois, estava postada ao lado de no banco traseiro de um táxi. Nem mesmo se a ruiva quisesse, conseguiria obrigar a subir em sua moto naquele dia molhado.
— Obrigada, senhor. — depois de agradecer ao motorista e lhe estender duas notas, elas se colocaram para fora do veículo.
Por baixo de um guarda-chuva preto, com flores de cores distintas, caminharam pelo terreno vazio do maior cemitério da cidade; deveria ser o pior tipo de dia para ir até ali. Mesmo assim, ela não conseguia faltar um sequer. Simplesmente não poderia.
Com quase dez minutos de caminhada, paravam em frente à lápide que dizia “Bridget Addams”. Era a sua tia, a mulher que havia a criado desde seus nove anos de idade; enquanto desfrutava de seu vigésimo segundo ano de vida, a mulher estava morta há três.
A loira não disse nada, apenas agachou e colocou um punhado das flores abaixo do nome na lápide. Para , não havia mal algum em acompanhar a amiga; ela fazia isso todas as vezes, com prazer. Por terem crescido juntas, ambas conheciam as camadas das vidas uma da outra muito bem, como ninguém. Ela sabia que precisava daquilo, para poder se lembrar constantemente das pessoas que haviam a deixado.
— Vamos.
Não muito longe dali, pararam novamente de andar e a loira colocou o restante das flores abaixo de duas lápides, lado a lado. Helena e Bryan , os seus pais. Aquela área estava mais corroída pelo tempo do que a primeira, mesmo assim, ainda causava melancolia na loira.
Passaram mais tempo ali do que normalmente faziam, até ouvir um som conhecido, da amiga tentando retardar um choro mais intenso quando indicou que deveriam ir embora.
Como de costume, almoçaram juntas e passaram o restante do dia na companhia uma da outra, com o adicional de Namjoon, que havia se tornado parte do pacote que envolvia em sua vida.


Jungkook recebeu uma visita, enquanto os três estavam reunidos do outro lado da cidade.
Havia acordado tarde naquele dia, seu almoço fora improvisado com um macarrão instantâneo e ele percebeu como o tempo passava rápido enquanto sua cabeça estava nas nuvens; essas tinham nome e sobrenome, além de um sorriso lindo.
Perto das três da tarde, atentou-se à campainha da casa soando, mais de uma vez. Não se surpreendeu ao abrir a porta e assistir sua irmã do lado de fora, somente ela tocava aquela campainha repetidas vezes e de maneira tão petulante.
— E aí, maninho? — Soomin passou pelo irmão, segurando duas sacolas que cheiravam a comida fresca, e deixou os sapatos de lado antes de caminhar pela sala de estar do homem. Ele lhe lançou um olhar rápido antes de fechar a porta da frente, seguindo pelo mesmo caminho que a mais nova.
— Achei que íamos nos ver no fim de semana. Você deveria estar estudando, uma hora dessas.
— Não seja um chato. Por favor, só hoje. — ela abre uma das bolsas, postadas sobre a mesa de centro, e um sorriso se abre no rosto jovial quando mostra a garrafa de Soju.
Jungkook não resiste em sorrir para ela também; havia se acostumado a não ver a irmã com tanta frequência, afinal, faziam pouco mais de dois anos que se mudaram e suas vidas mudaram para aquilo. Mesmo assim, ficava feliz quando estava em sua presença, era como se, por algumas horas, nada tivesse mudado.
— Então... O Namjoon me contou sobre uma garota. — Soomin começa, como quem não quer nada, mexendo com a colher de metal o arroz acompanhado de kimchi.
— Sei. Vocês ficam se ligando para fazer fofoca da minha vida? Não devem ter mesmo coisa melhor para fazer. — ele se força a engolir o que tinha na boca, limpando os lábios com as costas da mão. — Eu já disse para ele que não é nada disso. Ela é... apenas uma garota. Nunca nem conversamos direito.
— Eu te conheço, Kookie. Você fez aquela cara. — a garota riu, divertida, enquanto continuava a comer.
O moreno uniu as sobrancelhas, olhando de lado para a irmã antes de encher a boca com mais comida; no mínimo, poderia dizer que estava irritado por todos parecerem estar interessados em sua vida pessoal. Ontem, fizeram aquilo de propósito para que os dois acabassem a noite juntos. O que queriam dizer com isso, afinal? Talvez Jeon estivesse ofendido por acharem que ele não conseguia conquistar sozinho. Se ele quisesse, já teria o feito a muitas semanas atrás — esse era o ponto. Ele não queria, desejava manter a garota longe.
— Para com isso, Soomin. Estou falando sério. Não quero ninguém enchendo a minha paciência. Essa garota... — ele deu uma breve pausa, um lampejo de sorriso no canto de seus lábios. — Não é qualquer uma e eu não tenho tempo para relações que durem mais de uma noite. Não tenho tempo, nem paciência.
— Você só está arranjando desculpas. Não! Você está se punindo. — ela tocou em seu ombro, tomando a atenção do irmão para o seu rosto. — O tempo já passou, irmão. Estamos aqui, bem longe. Nada de mal vai acontecer. Eu estou no meio do meu curso, logo vou estar trabalhando em tempo integral. Você não tem que viver só para mim. Deveria se permitir... quem sabe, voltar a dançar e...
— Já chega desse assunto.
Sua voz saiu mais rouca; arrastada. Suas expressões mudaram da água para o vinho quando se tornaram mais sérias do que deveriam e a mais nova conhecia bem aquilo, por isso se calou; pelo menos, por hora. Soomin sabia que o irmão não poderia fugir do assunto para sempre, assim como o próprio também tinha ciência disso.
Ela foi embora quando a chuva parou, era perto das seis da tarde; estava começando a escurecer por completo. Com um beijo na bochecha do irmão, ela se despediu e ele ficou de olho nela, postado na entrada da casa. Depois que ela saiu do seu campo de visão, ele resgatou todo o lixo que acabaram fazendo na sala, amarrando o saco preto e saiu novamente, encontrando as latas de lixo grande entre uma casa e outra.
No momento em que jogou a bolsa sobre uma pilha já existente, ouviu aquele pequeno som; parecia um pequeno choro sofrido. Não conseguindo ignorar, chutou algumas coisas que estavam no chão, seguindo aquele som, até colocar seus olhos na origem do barulho: um filhote de labrador. O cachorro ergueu o focinho em sua direção e Jungkook sentiu seu coração doer ao assistir o pequeno animal molhado e abandonado. Refletiu durante bons minutos, até se inclinar e o resgatar entre as duas mãos; não tinha como simplesmente ignorar aquilo.
Nos minutos seguintes, estava agachado ao lado da banheira branca, tendo certa dificuldade em terminar de lavar todo o pelo claro do filhote, que não conseguia ficar parado. O moreno verificou se ele tinha algum ferimento e depois de constatar que não, chegou à conclusão de que não passava de um bebê perdido da mãe e dos irmãos.
— Não vai se acostumando comigo. — comprimiu os lábios, sentindo os dentes nada afiados tentarem morder seus dedos. — Eu não consigo cuidar nem de mim, quem dirá de você. Vou ter que pensar em alguém que esteja querendo um cachorro.
Naquele momento, reviveu as palavras que sua irmã havia lhe dito, mais cedo. Então, o rosto de apareceu em sua mente e ele balançou suavemente a cabeça em negativo. Ela, definitivamente, parecia alguém boa para cuidar de algum filhote. Mas seria estranho, certo? Somente pensar nisso lhe causava aquele arrepio na nuca, a possibilidade de ir até ela, ainda mais com um cachorro que acabaria virando um presente; mas a garota estava com a sua jaqueta. Seria mesmo tão estranho assim?
— Ela vai achar que eu sou louco. Talvez eu seja, mesmo. — nem percebeu que estava falando com o filhote enquanto o secava na toalha. — Ela não deveria ficar aparecendo o tempo inteiro. Veio aqui, assistiu a minha luta ontem. Assim, se torna cada vez mais difícil não pensar nela. E ainda mais com aquele maldito vestido... que porra ela estava pensando, afinal?
Ergueu-se, andando de um lado para o outro enquanto o pequeno animal acompanhava seus movimentos, imitando-o com uma alegria indescritível.
Passou os dedos pelos cabelos, a cabeça queimando de tanto colocar o cérebro para trabalhar; não deveria ser tão complicado assim. Quem sabe, nem mesmo teria qualquer significado maior. Não tinha como saber; ela poderia aceitar o cachorro e não tornar aquilo uma grande questão.
— Que se foda.
Parou de andar, olhando para o chão e sorrindo de lado; nunca teve que passar por aquilo, pensar tanto em desculpas para ver alguém. Ele ainda ansiava descobrir o porquê daquela garota, dentre todas as outras, ser tão atrativa. Quem ela pensa que é, alugando aquela moradia na cabeça dele?
Batia sete da noite em ponto no relógio quando ele saiu de casa, com Namjoon em uma ligação e a outra mão segurando a caixa de papelão aberta, com um filhote eriçado. Ele não precisou de muito para o amigo lhe enviar o endereço da garota, assim como o número dela e a informação de que estava a caminho de casa naquele momento, sozinha. Aquela ansiedade começou a tomar o seu peito, e ele tentou se controlar enquanto subia em sua moto e deixava a caixa segura entre suas pernas — falhou miseravelmente em sua tentativa.
Quando estacionou, deixou a moto do outro lado da rua, atravessando até estar de frente para o prédio. Não pensou muito enquanto clicava no número da garota na tela, recém-adicionado, esperando que ela respondesse. Duas chamadas não atendidas.
— Droga.
Segurava o filhote em uma das mãos, fora da caixa, com facilidade. Esperou, imaginando qualquer coisa, inclusive o fato de ainda não ter chegado e que acabaria encontrando ele ali; não estava errado sobre aquilo. Mas não estava sozinha.
Um pouco mais à frente, assistiu a silhueta conhecida por ele apontando na esquina. Estava vestida com tênis, uma calça justa, que tinha parte escondida pelo casaco escuro, e seus fios de cabelo estavam soltos. Jungkook não se arrependeu por ter passado um tempo longo escolhendo uma roupa e se arrumando para que ela o visse. No entanto, seu sangue ferveu quando assistiu aquele homem caminhando ao lado da garota.
Ele já havia o visto antes, trabalhava na mesma cafeteria que ela. Só não sabia que poderiam ser íntimos a ponto de ir até em casa com ela; aquele homem estava sorrindo para . Jungkook quis saber o motivo, o conteúdo da conversa. Estavam saindo, era isso, afinal? Sua mente trabalhava com todos aqueles cenários terríveis. O homem se inclinou, quando pararam no sinal, que ficava um pouco mais à frente na calçada do prédio de , deixando um beijo na bochecha dela. O moreno assistia tudo aquilo com tanto desgosto que chegava a ser palpável.
— Até mais! — ele assistiu ela erguer a mão para o outro, despedindo-se depois que ele atravessou a rua na faixa. Assim como viu quando ela percebeu algo caído no chão. — Espera, a sua carteira!
Tudo aconteceu muito rápido; o homem desconhecido estava do outro lado da rua e com sua carteira na mão, deu um passo para fora da calçada, sem perceber que o sinal acima de sua cabeça abria e um carro vinha em sua direção, em alta velocidade.
Nem mesmo Jungkook entendeu como chegou tão rápido até ela, mas o fez. No mesmo passo em que protegeu o filhote com um braço, contra seu peito, ele segurou no casaco da garota com força, puxando-a da mesma forma contra o seu próprio corpo — a velocidade do carro deixando para trás apenas uma corrente de vento intensa enquanto ele ainda a segurava contra si.
— Você deveria tomar mais cuidado. — apesar da respiração ofegante, sua voz saiu calma quando ele se inclinou, aproximando-se do rosto da garota por trás. — Não vou estar sempre por perto para te salvar.

Capítulo 4

O corpo de estava paralisado enquanto ela sentia o de Jungkook logo atrás do seu, assim como a mente tentava assimilar por completo o que ele havia dito com aquela voz; maldita voz deliciosa. Mesmo em uma situação desconcertante como aquela, para dizer o mínimo, não conseguia fugir daqueles pensamentos intrusivos sobre o homem.
Virou o queixo para o lado, encontrando o rosto dele mais próximo do que provavelmente deveria estar, uma de suas sobrancelhas se ergueu e Jungkook imitou o ato.
! Você está bem? — a voz do terceiro chamou a atenção dos dois. Henry havia atravessado a rua novamente e tinha uma expressão preocupada no rosto quando segurou na mão da garota, querendo sua atenção nele. O moreno, por outro lado, não havia soltado o casaco de , impossibilitando que ela se movesse entre os dois.
— Ela está ótima. Não viu que eu a salvei?
— Com licença. — raspou a garganta, por algum motivo incomodada com a esfera que aqueles dois começavam a criar ali. Em um movimento, deu um passo para o lado, livrando-se da mão do colega de trabalho e também do aperto de Jungkook, afastando-se dos dois. — Estou bem, Henry. Aqui está, sua carteira.
Estendeu o objeto para ele, naquele momento levando os olhos até Jungkook, assistindo-o de frente e sentindo o seu coração disparar. Estava perfeitamente lindo, como sempre. Seus fios de cabelo pareciam úmidos, mas estavam levemente bagunçados; os olhos dele estavam nela e a mesma teve a sensação de que ficaram muito tempo olhando um para o outro.
— Você está bem mesmo? — a voz do outro soou e ela balançou a cabeça em afirmação, dando um sorriso amarelo. — É que...
— Foi só um susto, não se preocupe. Está tarde, você deveria ir embora, mesmo. Vai.
Ela fez um movimento com as mãos, indicando que o colega de trabalho deveria voltar ao caminho que estava fazendo anteriormente. Henry, de certo modo contrariado, virou o rosto, assistindo o homem desconhecido para ele lhe encarar de forma intimidadora; pensando em perguntar sobre aquilo depois, apenas acenou com a cabeça para e tomou o seu rumo mais uma vez.
Depois que ele saiu do campo de visão, se virou para Jungkook mais uma vez, arrumando o cabelo para trás da orelha e sorrindo de forma mais leve.
— Obrigada. Mesmo. Poderia ter sido uma tragédia. Mas... — juntando as mãos na frente do corpo, ela iria perguntar o motivo de ele estar ali, tão longe do sentido de sua casa, então seus olhos desceram e finalmente percebeu o cachorro que ele segurava. — Ah, meu Deus! Ele é seu? Que coisa mais fofa!
Ela se esqueceu, momentaneamente, de perguntar qualquer coisa quando tornou a se aproximar dele sem pedir qualquer permissão, pegando o filhote em suas próprias mãos e o erguendo na altura do seu rosto. O pequeno animal lambeu a ponta do nariz dela, o que ocasionou um riso sonoro e sincero.
Jungkook observou aquele momento com total atenção, admirando o sorriso aberto dela e como seus olhos quase se fechavam por completo quando ria com tanta vontade; sentiu-se um idiota mais uma vez, sem qualquer motivo aparente. Era somente o que ela causava nele, aquele sentimento de que ficaria daquela maneira mesmo se ela resolvesse passar a noite inteira batendo nele.
— Ele gostou de você. Está roubando o coração do pobre do cachorro. — passou a língua sobre os lábios, apoiando as mãos nos quadris e desviando o olhar dela. — Não é meu. Achei ele por aí.
— É mesmo? Coitadinho. — ela continuou segurando o filhote, mas sua atenção voltava para o homem. — E você está longe de onde mora... veio pegar a sua jaqueta, não é? Eu deveria ter imaginado. Eu não sou do tipo de acreditar nessas coisas, mas você estava no lugar certo, na hora certa. Obrigada, mais uma vez.
— Não precisa ficar agradecendo, .
— Certo. — com um acenar da cabeça, ela olhou para a mesma direção que ele, podendo perceber a moto do homem estacionada do outro lado da rua. Não precisava nem mesmo perguntar, imaginava quem poderia ter passado o endereço dela. — Vem... é perigoso ficar aqui em baixo, vamos pegar a sua jaqueta.
Nem mesmo passou pela mente dele negar aquilo; qualquer desculpa para subir até o apartamento dela seria o suficiente. Se não fosse pelo cachorro, que fosse pela jaqueta que ele nem pretendia de fato pegar de volta.
Depois de adentrar o prédio, o caminho fora silencioso enquanto subiam as escadas até o quarto andar. colocou o filhote no chão para poder achar suas chaves na própria bolsa, e o animal disparou para o interior do apartamento quando ela abriu a porta.
— Fique à vontade. — jogou a bolsa em cima da poltrona, caminhando rápido pelo corredor até seu quarto.
Quando estava com a jaqueta dentre os dedos, na porta do cômodo, parou por alguns segundos para pensar que ele estava mesmo no apartamento dela, e estavam completamente sozinhos. Além disso, ele havia a deixado a salvo daquele acidente... bom, era a segunda vez que ele livrava ela de alguma coisa terrível, mesmo que a primeira não tenha sido mencionada até então.
Quando encontrou Henry, uma ou duas horas mais cedo naquela noite, estava caminhando sozinha para sua casa. Ela não tinha tanta vontade assim de estar com qualquer companhia depois de um dia inteiro ao lado de e Namjoon. Mas Henry era sempre tão educado com ela, não se sentiu no direito de negar a ele quando se ofereceu para acompanhá-la até em casa. No entanto, naquele momento, seu coração batia rápido e sua respiração estava forte. Diferente dos outros, ela não queria que Jungkook fosse embora.
— Peguei sua jaqueta. — sua voz se fez presente quando retornou à sala, então o viu de costas para ela, olhando para a prateleira de porta-retratos ao lado da televisão. — Está bisbilhotando?
— Não. Você me convidou para entrar, não foi? — ele a olhou por cima do ombro, com aquele sorrisinho no canto dos lábios. Ela sorriu de volta, nem mesmo percebendo o que estava fazendo. Dobrou a jaqueta, colocando-a sobre a mesinha de centro e então cruzou os braços abaixo dos seios, sabendo que, provavelmente, não haveria outra oportunidade tão boa quanto aquela.
— Era você, não é? Naquele dia... que deu um soco naquele homem e chamou a polícia. Eu sei porque me lembro do seu capacete.
Jungkook se virou para ela, estreitando os olhos enquanto a analisava com atenção; deveria ser por isso que ela agiu tão estranho naquele dia, quando se viram na oficina. Ergueu uma das mãos, passando a ponta do dedão pelo maxilar enquanto se aproximava dela, parando a sua frente.
— Era eu, sim.
— Por que... — ela soltou os braços ao lado do corpo, inquieta. — Por que nunca falou nada?
— Você nunca perguntou.
Ela abriu e fechou a boca várias vezes, não conseguindo formular nada depois dele responder daquela maneira tão desleixada, com aquela expressão despreocupada no rosto; como se não fosse nada.
— Então, se eu não perguntasse, você nunca tocaria no assunto. Por que foi embora sem falar nada depois de chamar a polícia?
— Eu não queria me envolver em nada. Fiz o que tinha de ser feito... não havia necessidade de me mostrar. O cara foi pego, não é? Isso que importa.
O moreno se inclinou, pegando a jaqueta em cima da mesa e assistindo o filhote entre eles, girando à procura do próprio rabo. Então, depois dos acontecimentos, recordou-se do que havia ido até ali para fazer; afinal, qual era mesmo o objetivo? Ele queria mesmo qualquer desculpa para ver ela, conversar. Olhando-a agora, tocando naquele assunto e o questionando por suas atitudes, talvez fosse um sinal para dar um passo atrás novamente.
— Você deveria ficar com ele. Precisa de um lar... e você tem cara de quem cuidaria bem de um cachorro.
— Sério? — olhou para baixo, confusa. — Vai deixar comigo o cachorro que você encontrou?
— Por que não? É falta de educação negar um presente.
Qualquer coisa que ela poderia ter retrucado fora interrompida pelo toque do celular dele. Assim que pediu licença com o olhar, caminhou para perto da janela e ela não prestou atenção nas poucas palavras que ele trocou com a pessoa na chamada, estava agachada brincando com seu mais novo bichinho de estimação.
— Eu tenho que ir, agora. — passou por ela, deixando-a atordoada enquanto ele caminhava até a porta, mas parou seus movimentos quando estava prestes a sair. — Claro... estava quase esquecendo. Agora, você tem uma dívida em dobro comigo. Eu vou te ligar, já fique sabendo, por isso, me atenda. Vou cobrar por ter salvado a sua pele duas vezes.
Jungkook se inclinou, colocando seus tênis de volta e a morena ainda olhava, com os lábios entreabertos, em direção à porta mesmo depois de ser fechada e ela se encontrar sozinha novamente. Mesmo com aquelas palavras, ela sabia, em seu interior, que ele não queria dizer nada daquilo como punição. Ela enxergava como se ele estivesse sempre em um tipo de dualidade; entre a brutalidade e a ternura.
— Inacreditável. — sentou-se no chão, sorrindo aberto ao olhar o cachorro entre as suas pernas. — Quem dá um cachorro antes mesmo de um beijo? Ele é estranho. Mas tudo bem. Eu vou te chamar de... — pensou por alguns instantes, até chegar na conclusão perfeita. — Cookie. É, esse vai ser o seu nome. Vamos ter que comprar uma caminha para você, e comida, claro.
O restante da noite passou voando, ela até mesmo arrumou alguns cobertores para o filhote no chão, mas quando ele começou a chorar no meio da noite, acabou ganhando um lugar ao lado da garota na cama de casal.
Na manhã seguinte, ela acordou mais cedo que de costume com o barulho do celular; amaldiçoou a si mesma por não ter tirado o som antes de dormir, enquanto se mexia no colchão à procura do aparelho, até o encontrar e, apenas com um dos olhos abertos, ler a mensagem do número desconhecido.

“Não esqueça da sua dívida.”
“Salva o meu número.”

demorou alguns segundos para processar o que estava escrito e quando aconteceu, um sorriso enorme apareceu em seus lábios e qualquer resquício de sono sumiu enquanto ela fazia o que a mensagem dizia e aquela ansiedade, misturada com alegria, enchia seu peito.
Com tempo, resolveu tomar café em casa e preparou a comida e água de Cookie nos recipientes comprados na noite passada; sentada em seu sofá, ela comia cereal mergulhado em uma quantidade exagerada de leite enquanto assistia ao noticiário.

“O corpo de uma jovem foi encontrado essa manhã, na praia de Santa Mônica. Ainda não há informações de sua identidade, o assassino impossibilitou a dedução visual ao deixar o rosto da vítima completamente desfigurado.”

Uma expressão de incômodo apareceu no rosto de enquanto ela assistia as imagens dos policiais andando pela areia da praia de Santa Mônica; coisas do tipo sempre aconteciam por Los Angeles, era rotina ter notícias sobre barbaridades nas redondezas, por isso, mesmo que aquilo causasse incômodo, não era de qualquer estranheza.
— Fica bem até eu voltar, okay? Não vou demorar muito.
Foram suas palavras para o filhote antes de deixá-lo no quarto com água e comida para o dia; temia o que aquele pequeno poderia acabar causando, sozinho e solto no apartamento inteiro.
Quando chegou à cafeteria onde trabalhava, o primeiro rosto que lhe sorriu fora Henry, o qual ela retribuiu com gosto; mas ele não era o motivo daquele sorriso, de qualquer forma. Logo, o dia começava, como todos os outros, e a hora parecia passar em um piscar de olhos enquanto atendia aos clientes.
— Você viu as notícias de hoje? — ela ouviu duas garotas conversando em uma das mesas. — Eu soube que era o corpo de uma estrangeira, da universidade. Uma coisa horrível... imagino o que ela deve ter feito para deixarem ela daquele jeito.
Com as imagens da reportagem em mente, ouviu aquela conversa com atenção, deduzindo que nenhuma daquelas garotas realmente tinha empatia pela garota morta. Distanciou-se, colocando seu corpo no canto do balcão e sorrindo ao tirar o celular de dentro do avental, afim de ver as respostas de Jungkook às suas últimas mensagens; tinham trocado a manhã inteira. Mas fazia quase uma hora desde sua última resposta. Em vez disso, haviam mensagens de .

“Vamos almoçar juntas?”
“Kim vai me levar para almoçar com os amigos de longa data dele, eu já conheço. Você vai amar!”

Jungkook provavelmente estaria incluído, certo?
Fora isso que a motivou a aceitar o convite sem nem mesmo pensar duas vezes, ansiando pelo horário do almoço quando retornou ao trabalho; quando aconteceu, mesmo que rápido, tomou tempo para arrumar seus fios de cabelo cacheados e a roupa no banheiro, pegando um táxi até a lanchonete onde haviam marcado.
— Ela chegou! — comemorou, batendo palmas quando passou pela porta do estabelecimento.
Junto dela, Namjoon estava sentado ao seu lado, com o braço por trás do corpo da namorada e ele sorriu para a morena quando ergueu a sua mão livre em cumprimento. Junto deles, haviam mais cinco na mesa, que também sorriram ao se virarem para a garota, por mais que não a conhecessem.
— Vem, ! Você é amiga da , então faz parte do nosso grupo oficialmente. — Namjoon a incentivou que se aproximasse, e ela o fez, retribuindo os sorrisos, mas se questionando mentalmente por Jungkook não parecer estar presente. — Pessoal, essa é a , como eu já disse. Querida, esses são Jimin, Taehyung, Yoongi, Seokjin e Hoseok. Eles podem até parecer nocivos, mas são do tipo que não mordem.
— Fale por você. — Seokjin, com uma expressão divertida no rosto, pronunciou-se. — Bem-vinda. Senta aqui. — ele puxou uma cadeira entre ele e , apontando com o queixo.
— Vocês são o que, uma banda? — ela riu baixo antes de se sentar, podendo observar que, apesar de nenhuma resposta a sua piada, todos sorriram mais uma vez. — É um prazer conhecer a todos. Mas... O Jungkook não faz parte desse grupo também?
— Ah, entendi. — Jimin apoiou os cotovelos na mesa, parecendo animado. — Então você não é qualquer . É “A” . Faz sentido.
— Como assim? — a garota olhou para , que disfarçou ao abraçá-la pelo ombro de forma carinhosa.
— Nada, amiga. É que eu amo falar sobre você e o quanto eu te amo, você sabe.
— Ele teve que resolver umas coisas com a irmã dele. Vamos fazer o pedido? — Namjoon desconversou, erguendo a mão para chamar a garçonete.
se encontrou pensativa mais uma vez, afinal, ela não sabia nada sobre a vida dele, apenas o que viu com os próprios olhos. Então, ele tinha uma irmã. E se estava com problemas, era o motivo por ter sumido e porque não respondeu suas mensagens.
Voltou ao momento atual quando a puxaram para a conversa, e acabou imersa na atmosfera agradável que todos eles criaram ali. Os meninos pareciam ser pessoas incríveis, para dizer o mínimo. Todos eram receptivos, divertidos; não havia qualquer coisa de ruim para falar de nenhum deles. Por isso, lamentou quando teve de se levantar da mesa, o seu horário de almoço estava chegando ao fim.
— Promete que vai sair com a gente de novo, vai. — Taehyung, com o rosto apoiado na mão, pediu antes que fosse, deixando-a com a sensação de estar sendo mesmo acolhida por eles.
— Pode deixar. A gente se vê.
Com um aceno de mão, ela se despediu de todos, mas ao cruzar a porta da lanchonete, avistou um carro parando do outro lado da rua — ela conhecia bem, era a caminhonete de Namjoon; os vidros eram límpidos o suficiente para ela conseguir ver uma garota sentada no banco do carona, com a mão na metade do rosto, o que parecia sangue escorrendo pelo braço. Aquela imagem lhe causou um calafrio que subiu pela sua nuca, e nesse momento, dois movimentos chamaram a sua atenção: por trás dela, Namjoon saía do estabelecimento e atravessava a rua, enquanto Jungkook saía de dentro do veículo.
Ele colocou os olhos nela e trocaram aquele olhar intenso; o rosto homem com aquela expressão dura e fria, não houve qualquer resquício de sorriso nos lábios pálidos. E quando ela ergueu a mão para o cumprimentar, ele desviou o olhar.

Capítulo 5

“A mão dele estava em sua nuca enquanto ela sentia o peito nu dele contra seus seios; não poderia ter sensação melhor do que aquela.
Jungkook segurou em seus fios de cabelo com força, sua cabeça pendeu para trás quando ele deixou de beijar os lábios de e ela puxou o ar com força, sentindo os dentes do homem roçarem contra a pele da sua garganta e suas unhas fizeram pressão contra os braços musculosos que a envolviam, fazendo com que ele soltasse um pequeno rosnado.
— Diga.
O moreno pressionou ainda mais o corpo dela contra a parede, a garota se via confusa com o misto de sentimentos. Não entendia onde a sua excitação terminava para que a paixão tomasse lugar. Ele não poderia ser real; não quando a segurava daquele jeito, podia sentir o seu volume entre as pernas e ela subiu as mãos para os ombros largos no momento em que ele ergueu o rosto em sua direção, forçando-a a manter aquele contato visual.
— Diga, . Ou eu posso parar agora mesmo.
— Eu sou sua. — a voz dela saiu rápida, exasperada, para então respirar fundo. — Eu sou sua, Jungkook.
Ele sorriu, a marca em sua bochecha fazendo presença enquanto ela encarava aqueles olhos escuros que a miravam de forma tão faminta que...”

— Que droga, ! O meu vestido novinho!
afastou a amiga ao colocar a mão em sua cabeça; a morena demorou alguns segundos para se dar conta do que estava acontecendo. Passou as costas da mão pelos lábios, não precisando de muita coisa para entender que acabara babando no ombro da ruiva depois de cair no sono. Se soubesse com o que ela estava sonhando, talvez tivesse sido minimamente compreensiva.
— Quem tem que se desculpar é você. Me acordou na melhor parte do meu sonho.
— Uma ova. — com um movimento da mão, cruzou os braços e virou o rosto para o outro lado, um de seus pés batendo incessantemente no chão. O nome da ruiva foi chamado no fim do corredor de mulheres sentadas e cruzou os dedos, assistindo a amiga se distanciar.
Não era a primeira vez que a acompanhava e sim a quarta; conseguir uma carreira como modelo em Los Angeles era quase impossível. E por mais que apoiasse a outra em sua vontade, sabia que havia limites para querer tanto uma coisa assim.
Seus pensamentos foram interrompidos quando os gritos se fizeram presentes e conseguiu ver dois seguranças carregando pelos braços em sua direção. Ela estava erguida do chão e balançava os pés com tanta vontade quanto colocava a voz para fora. Eles a largaram somente quando a deixaram do lado de fora do prédio, e a garota continuou esperneando no meio da calçada. esperou que ela terminasse de extravasar para se aproximar ainda mais, segurando no ombro da amiga e tomando a sua atenção.
— O que disseram dessa vez?
— Ainda sobre o meu peso. Se eu emagrecer mais que isso, vou ficar desnutrida! Mas quer saber... — passou os dedos pelos cabelos, logo em seguida pegando sua bolsa na mão de e retirando o maço de cigarros de dentro da mesma. — Eu não ligo mais. Realmente, estou cheia disso tudo. Não vou voltar mais nessa espelunca.
— Vamos para o meu apartamento, você dorme lá hoje. Mas não vai usar essa coisa lá dentro. — referiu-se ao cigarro, mas ignorou o uso enquanto estavam caminhando pela rua.
Não sabia se a ruiva estava mesmo falando sério sobre desistir. Assim como nas outras vezes em que falhou pelo seu peso, passava os dias seguintes entregando a atenção que a amiga demandava, o que em sua cabeça era o mínimo. Mas, dessa vez, não se tratava apenas de sua carreira como modelo. Ela sabia que tinha a ver com o fato de ter brigado com Namjoon, precisamente duas semanas atrás, naquele mesmo dia do almoço com os meninos. Por mais que não houvesse qualquer demonstração verbal sobre o assunto, tinha plena consciência de que o motivo da briga entre os dois havia sido ela e Jungkook, pelo modo que ele a ignorou; e continuava ignorando.
A garota era boa em seguir em frente, fazia isso praticamente a sua vida inteira. Não se lembrava de qualquer fase de sua vida em que não tivera que passar por cima de alguma coisa que a machucava a ponto de não querer mais sair da cama, mas estaria mentindo se dissesse que não estava magoada pela atitude do homem, por mais que eles não fossem envolvidos de fato. Ela não conseguia acreditar no cinismo de alguém que aparecia na porta do seu prédio, deixava um cachorro e depois fingia que sua existência era insignificante.
Bom... nem tanto assim.
Ele não falava com ela, nem mesmo havia aparecido, mas quando as duas chegaram ao prédio de , o porteiro lhe entregou um pacote enorme de ração que havia sido deixada. Era a segunda vez, exatamente uma vez por semana era deixado comida ali para Cookie. Ela estava longe de ser burra, além do mais, não havia ninguém além de Jungkook para deixar comida para o filhote.
— É engraçado. — jogou suas coisas no sofá, vendo Cookie rodear as suas pernas. — Parece que ele largou um filho com você.
— Não tem nada a ver. — foi obrigada a rir, virando o corpo ao trancar a porta e se inclinando para brincar com o filhote. — Eu não ligo. Eu gostei, muito. Ele tá me fazendo mais companhia do que qualquer pessoa.
— Ei! — a ruiva abriu os braços, recebendo a língua da amiga como resposta. — Tá legal, o que vamos beber?
— Agora, nada. Você vai tomar um banho e eu vou cuidar de você depois.
Não houve discussões, acatou as palavras de e seguiu para o banheiro; mas a cabeça da ruiva não parava nem mesmo por um segundo. Ela estava com raiva e magoada, e o que mexia mais com sua cabeça era saber que aqueles sentimentos não eram, num todo, somente pelo seu fracasso iminente em conseguir o emprego dos sonhos. Ela ainda pensava naquela conversa estranha que havia tido com Namjoon e Jungkook.


» Duas semanas atrás.

— Eu vou acabar com a vida desse cretino! Me solta, Namjoon!
balançava os braços e pernas enquanto era erguida do chão pelo namorado; a alguns passos de distância, Jungkook estava parado na porta de sua casa, com uma expressão de tédio que não deixava o seu rosto, mesmo que houvesse uma pessoa demonstrando querer atacá-lo bem no gramado da sua residência. Ele apenas mudou o apoio do corpo de uma perna para a outra, cruzando os braços sobre o peito.
— Por que você ignorou ela daquele jeito? Você por acaso é algum doente mental? — Namjoon a colocou no chão, mantendo-a contra o seu corpo, mas a atenção dela continuava no tatuado. — Responde!
— Eu não devo explicação alguma para você, eu sequer te conheço. Sabe o que significa? Significa que eu não dou a mínima para o que pensa sobre mim. Agora saia logo da frente da minha casa, ou eu não vou continuar sendo amigável.
— Jungkook. — dessa vez, a repreensão veio pela voz rouca de Namjoon. Ele ergueu o olhar para o amigo, as expressões duras. — Controle-se.
Os dois homens permaneceram alguns instantes se encarando, e a ruiva assistiu aquilo sem conseguir entender o que havia por trás daqueles olhares; as expressões sérias pareciam dizer muitas coisas, mas era impossível para ela decifrar qualquer uma delas.
— Você que devia se controlar. Sabe como tudo isso vai acabar se continuar brincando de casinha. — Jungkook fez o amigo soltar um suspiro profundo, e então balançou a cabeça em negativo. — Eu tenho outras coisas para fazer. Não volte aqui, .
Com a porta da casa se fechando, o casal se movimentou quando os dois adentraram a caminhonete. A garota olhou em direção ao namorado, que mantinha os olhos fixos no volante, sem qualquer outra reação. Ela tocou em seu ombro, e em um sobressalto, ele se desvencilhou do toque.
— O que foi?
— Escuta... — Namjoon girou a chave na ignição, então ouviram o ronco do motor. — Ele não é nada disso do que parece. Eu posso jurar, porque o conheço. Toda essa casca... é uma forma de se proteger. Aconteceram muitas coisas no lugar de onde viemos. Às vezes, não é fácil seguir em frente. Ele é complicado, mas sempre acaba achando o caminho, no final.
— Você só está tentando justificar as atitudes dele porque ele é o seu amigo.
— Você não entende.
— Então me explica! — ela se exasperou, virando o corpo de lado no banco. — Você é quem não entende. Me disse que seria uma boa nós juntarmos os dois e eu te ajudei nisso, mas ela vai acabar magoada. A ... ela é sozinha. Ela já passou por tantas coisas, você nem mesmo imaginaria. Eu não vou assistir calada enquanto um marmanjo desses fica achando que pode brincar com ela. Então me explica agora que papinho foi aquele.
Namjoon ficou em silêncio, nem mesmo a olhou depois daquilo; alguns minutos se passaram e a ruiva apenas se conformou, afundando o corpo no banco e esperando que ele a deixasse em casa.


» Momento atual, do outro lado da cidade.

Com uma mão no bolso, Jungkook usava da outra para levar a bituca até os lábios, tragando e, em seguida, expelindo a fumaça; repetiu isso diversas vezes, recostado na parede do lado de fora da loja de conveniência, enquanto esperava a sua irmã. Quando ouviu o tilintar do sino da porta, virou a sua atenção e a viu vindo em sua direção, um pequeno sorriso no rosto enquanto segurava duas bolsas.
— Estamos prontos.
Ele apenas assentiu, deixando que olhos vagassem pelo rosto da mais baixa; a cicatriz em sua bochecha era somente um risco vermelho naquele momento, diferente do ferimento da semana passada.
Com poucos minutos pilotando a moto, chegavam à fachada da casa de dois andares onde Taehyung morava com Yoongi e Hoseok. Quando adentraram, todo o resto do bando estava espalhado pela sala. Eles estavam rindo e bebendo, e comemoraram quando Soomin mostrou mais bebidas nas sacolas. Jungkook apenas fez seu lugar em uma das poltronas, lamentando mentalmente por seu maço de cigarros ter chegado ao fim.
— Por mais que eu esteja curtindo muito ter todos vocês aqui... — Yoongi se colocou no meio do cômodo, com uma lata de cerveja na mão. — Não estamos aqui para festejar. — ele virou o corpo, parando o olhar em Jungkook. — Não é mesmo?
— É... isso mesmo. — o moreno deu um pequeno sorrisinho, erguendo-se e colocando o corpo ao lado do amigo. — Eu lamento atrapalhar a vida de todos vocês. Mas como podem ver... as coisas voltaram a se complicar.
Com uma pequena pausa, todos se retraíram onde estavam, as expressões mudando enquanto se viam na mesma posição de anos atrás; temendo o que estava por vir. Namjoon, entre todos eles, tinha algo a mais em seus olhos: havia uma fúria que chegava a ser comparada à que Jungkook carregava, mas talvez a sua mente estivesse muito longe daquela sala.
— A garota que foi morta fazia parte do grupo de estudos da Soomin. No mesmo dia em que anunciaram, ela foi atacada. Acho que todos viram, naquele dia, o machucado na bochecha dela. — ele olhou para a irmã e a garota baixou o olhar para o chão. — Pode ter sido um caso isolado, mas não temos como ter certeza disso. Ela não conseguiu ver o rosto dele, estava coberto.
— Acha mesmo que podem ser eles? — a voz de Jimin chamou a atenção dos outros para ele. — Qual é, gente? Já se passaram dois anos. Ninguém além do Jungkook pensa sobre isso, inclusive a Soomin. — Yoongi lançou um olhar feio para o amigo, mas isso não o impediu de continuar falando. — Vamos todos ser lógicos. Todos nós estamos vivendo as nossas vidas, como deveria ser. Os caras que fizeram aquilo estão na Coreia. Nós estamos muito longe de lá. Não estamos sendo perseguidos.
— E você pode me dar certeza disso? — Jungkook encarou Jimin, pronto para iniciar uma briga, de fato. — Pode me dar certeza que eu devo ficar tranquilo e dormir em paz? Com quem eu devo falar se a Soomin acabar morta dessa vez, você? Vai levar a responsabilidade?
— Larga desse papo ridículo. — levantou-se, parando à frente do moreno. — Ninguém pode ter certeza de nada nessa vida. Eu posso sair daqui e simplesmente ser atropelada e acabar morrendo. E nem mesmo por isso eu tenho medo de andar pela rua. Kookie... — colocou as mãos nos ombros do moreno, que desviou o olhar. — Isso não é sobre a gente. Nós temos que continuar seguindo em frente. Todos estamos fazendo isso, menos você. Isso está fazendo mal para a sua vida e para a vida da sua irmã.
Todos o olhavam naquele momento, inclusive Soomin. Jungkook viu os olhos tristes da irmã e não suportou continuar naquela sala. Nos segundos seguintes, estava do lado de fora da casa, sentado nos degraus da varanda. Os braços estavam cruzados e apoiados nos joelhos, a testa contra os braços. De olhos fechados, ele implorava a si mesmo por uma mudança, um pedido de socorro silencioso. Ele havia passado aqueles anos dentro daquela bolha criada para se proteger e agora tudo parecia desmoronar novamente.
Lembrava-se da sua vida de antes, de como trabalhar com a dança e música o fazia feliz. Depois de ver sua irmã ferida e terem começado a vida novamente em um lugar estranho, aquilo já não fazia mais sentido. Por sorte, ele tinha os seus amigos. De certo, seria nada sem eles — as pessoas que largaram tudo para trás somente para o seguir e garantir que ele ficasse bem.
— Toma. — Yoongi se colocou ao lado dele, sentando-se e lhe estendendo uma lata. Demorou alguns segundos, mas o moreno pegou e abriu. — Não estou aqui para reforçar nada. Acho que todos nós estamos assustados, no fim das contas... mas ele está certo. Não podemos viver com medo.
— Eu sei disso. Minha intenção não é arrastar ninguém para o mesmo buraco que eu... só não quero que coisas ruins aconteçam as pessoas que eu amo.
— A gente sabe disso. — Yoongi tocou em suas costas e o moreno sorriu. — Aí está, esse é o meu melhor amigo. Pode ignorar o que o Jimin falou, só escute o que eu te digo. Para de ser um babaca, de uma vez por todas. Pode continuar protegendo a si mesmo, a sua irmã, a gente... quem quer que seja. Mas volte a ser o Jungkook pelo qual todos nós deixamos as nossas vidas na Coreia e viemos para cá. Nós só queremos ele de volta.
Apertou a lata entre os dedos e seus pensamentos o levaram até . Em meio ao processo de fazer com que ela ficasse longe dele e de sua bagunça, provavelmente havia a machucado.
Os dois ficaram apenas em silêncio durante bons minutos, até o tatuado se pronunciar.
— Pode levar a Soomin em casa?
Yoongi assentiu, mesmo confuso, e então recebeu o beijo na cabeça que Jungkook deixou antes de se levantar e ir em direção à própria moto; o amigo balançou a cabeça em negativo, mas sorria, assistindo ele ir embora pela rua.
Durante seu caminho, sentiu os pingos de chuva atingirem seu corpo, apenas poucos minutos antes de ele parar e se colocar na frente do prédio, apertando o número do apartamento de no interfone de maneira incessante. Já passava de um horário avançado da noite, mas ele não se importava; assim como não se importava de estar ensopado em frente à portaria. Não ligou, imaginando que ela pudesse negar descer por ser ele; continuou apertando os botões até assistir a garota aparecer no hall.
Céus, como estava linda.
Seus fios de cabelo estavam presos no alto da sua cabeça, usava shorts de moletom e uma blusa justa de alça que realçava suas curvas. Nos pés, usava chinelos e ela cruzou os braços ao constatar que era ele.
— Deixa eu entrar!
Elevou a voz, movimentando a mão por entre a grade. Ele apostou na misericórdia que ela teria por se encontrar na chuva do lado de fora, o que foi um acerto. Quando liberou o portão, ele adentrou, subindo as escadas para o hall do prédio e parando a alguns passos dela.
o encarou, não sabendo no que focar com mais intensidade naquele momento; na vontade de mandar ele ir embora ou o fato de que ele estava mais irresistível do que nunca naquele momento. Usava uma calça larga, que agora se encontrava encharcada, assim como a blusa preta, mas diferente da outra peça, essa estava colada contra o tronco de Jungkook, deixando evidente todos os detalhes de seu abdômen. Os braços fortes estavam nus e molhados, os fios de cabelo caídos pela testa e ele sorriu para ela, feito o cafajeste que era.
Sem dizer uma palavra, avançou em direção à garota. Não lhe deu tempo para pensar quando sua mão segurou no cabelo preso com firmeza, mantendo o rosto dela próximo ao dele quando chocou os lábios. A garota moveu as mãos, com a intenção de o afastar, elevando os dedos para o peitoral do homem, mas desistiu quando ele achou um espaço por entre seus lábios e encontrou a sua língua, iniciando um beijo intenso que fez com que os dedos dela se agarrassem na camisa molhada e ele se aproximou ainda mais, juntando os dois corpos quando sua outra mão encontrou o quadril desenhado de . Ela sentiu o piercing dele passando por seus lábios, a língua trabalhando contra a sua; nunca havia recebido um beijo tão bom quanto aquele. Antes mesmo que terminasse, ela temia ficar estragada para qualquer outro.
Quando seus lábios se afastaram minimamente, permitindo que a garota recuperasse parte do fôlego, ela se aproveitou do momento ao recobrar a consciência. Antes que Jungkook iniciasse outro beijo, ela o empurrou com força, dando passos para trás para se afastar dele.
— Você ficou louco de vez?!
— Você gostou. — ele sorriu mais uma vez, passando a língua pelos próprios lábios; ela apertou os dedos com força, irada.
— Jungkook, você é do pior tipo que existe. Está me ignorando a duas semanas e acha que pode chegar aqui e me beijar? Em que mundo você vive? Vai embora agora mesmo.
— Tem razão, . — ele ergueu as mãos na altura dos ombros. — Você tem razão. Me desculpe, não era essa a minha intenção inicial. Eu só... não consegui me conter. Você está tão linda. — ela desviou o olhar dele, passando a mão pelo rosto. — Eu não deveria aparecer assim, eu sei. Mas não poderia conversar pelo telefone. Eu quero... quero me retratar pelo modo como eu agi.
— Nós não temos nada. Logo, você não tem que se explicar. Mas também não vai fazer parte da minha vida. Eu quero você bem longe.
— Apenas me dê uma chance. — ele tornou a se aproximar, e ela deu mais passos para trás. — Uma chance. Deixa eu te levar para sair, como deve ser. Eu quero te mostrar quem eu realmente sou.
parou de andar, permitindo que ele continuasse a vir em sua direção. Logo, Jungkook estava à sua frente novamente e ele a olhava de cima, daquele jeito que qualquer mulher se sentiria lisonjeada; ela se lembrou do sonho que tivera mais cedo. Ele estava a olhando daquele mesmo jeito, do modo como ela se lembrava. O arrepio percorreu toda a sua espinha, parando em sua nuca e ela puxou o ar com força por entre os lábios.
— Melhor você tomar cuidado, a chuva está bem forte. Tenha uma boa noite, Jungkook.
se esquivou do corpo dele, apontando com uma das mãos a saída do prédio. Ele a encarou por alguns segundos, acabando por sorrir aberto; como ele conseguia ser daquele jeito?
Jungkook acenou com a cabeça, arrumando os fios de cabelo com os dedos, então começou a se afastar pelo hall.
— Eu vou embora, mas não pense que eu desisti, . — falou de costas para ela, acenando com uma das mãos naquela posição.
A morena ficou olhando até ter certeza de que ele tinha mesmo ido embora. Riu sozinha, desacreditada no que havia acabado de acontecer. Não poderia ser o que se passava na cabeça do homem, mas tinha deixado claro que um beijo inesperado, juntamente de sua aparição, não apagavam suas atitudes, ele tinha que merecer ser desculpado. Uma parte dela, mesmo que não fosse confessar em voz alta, estava ansiosa para saber se ele estava sendo verdadeiro quando disse que não desistiria.

Capítulo 6

» 3 anos atrás – Seul, Coreia do Sul.

Os gritos e as batidas contra as mesas o incentivavam ainda mais a continuar; de cima do palco, aquela era a visão que ele gostava de ter. As pessoas querendo mais dele, do que era capaz de fazer quando tinha um microfone na mão e uma superfície lisa o suficiente para ele deslizar com facilidade.
No fim, como sempre, ele se curvava levemente para a frente e entregava um sorriso aberto para todos, um acenar com uma das mãos. Com o suor escorrendo pela lateral do rosto, desceu do palco e colocou os fios de cabelo para trás enquanto caminhava em direção à mesa de seus amigos. Esses, por sua vez, estavam como sempre ficavam nas noites de sábado — extremamente bêbados.
— Esse é o meu amigo... É o meu amigo, porra! — Yoongi estava pendurado no ombro de Jungkook, enquanto todos os sete caminhavam pelas ruas de Seul naquela madrugada típica de fim de semana; o moreno sempre se apresentava naquele bar aos sábados e nenhum deles perdia uma única noite.
— Não, ele é meu amigo. Sai fora. — Jimin se colocou do outro lado do corpo de Jungkook, também se apoiando em seu ombro, acabando por sobrecarregar o moreno. — Kookie, fala para esse imbecil que você me ama mais.
— Eu amo todo mundo. Podem ficar relaxados. — ele riu em resposta, sabendo que não havia vencedor naquela conversa.
Entre as suas vozes falando alto e reverberando por entre os becos, conseguiram chegar ao seu destino final: a casa onde Jungkook morava com Soomin a alguns anos. Depois da morte da avó dos irmãos, ele havia tomado as rédeas de tudo, para cuidar de sua irmã mais nova. Não era nada fácil, seria mentira se dissesse não sentir vontade de jogar tudo para o alto às vezes, mesmo assim, amava a jovem mais que tudo no mundo.
— Vocês já estão tão velhos para isso. Ficar dormindo todo mundo na minha casa... não tem espaço.— mesmo que os repreendesse enquanto entravam e se estiravam no chão da sala, não imaginava uma vida onde não visse os amigos fazendo aquilo.
— Que seja. Vou acordar todo mundo às sete, eu tenho compromisso. — Namjoon falava de olhos fechados; nem mesmo ele encontrava sentido no que falava.
Jungkook passou por cima dos corpos no chão, caminhando pelo corredor que dava para a porta dos quartos; estava tarde, sabia que Soomin deveria estar dormindo. Mesmo assim, ele abriu uma fresta da porta do quarto da jovem, somente para verificar. Em vez de ter a imagem da garota coberta em sua cama, ele a viu sentada contra a parede.
Aquela fora a imagem de quando tudo começou, na verdade. O moreno jamais esqueceria os detalhes da cena: ela estava tremendo, haviam ferimentos por todo o seu corpo. Soomin olhava para um ponto no chão, os olhos esbugalhados. Em seu corpo, apenas partes do que fora um vestido qualquer hora.
— Soomin.
A voz dele saiu arrastada conforme se aproximava, o coração tão acelerado que poderia atravessar o peito. Agachou à frente da mais jovem, segurando em seu rosto com as duas mãos e o erguendo em sua direção. Ela o olhou pela primeira vez, então as lágrimas começaram a rolar pelo rosto, que agora já não parecia mais intocado, e sim violado. Jungkook conseguiu ver, em seu pescoço, um corte que seguia até sua clavícula. Não era profundo, mas visível e latente para escorrer sangue.
— O que... o que aconteceu? Fala alguma coisa.
Ele se culpou na mesma hora por questionar daquela maneira, mas estava desesperado. Soomin se agarrou a ele, não colocando para fora nada além de suas lágrimas e os sons que fazia ao chorar alto; ele olhou ao redor do quarto dela, tentando achar qualquer coisa que denunciasse quem havia feito aquilo. Encontrou, com os olhos atentos, a maleta de couro ao lado da cama. Estava aberta, recheada de notas de dólar.
A garota não esboçou qualquer reação por dias. Ela aceitava a comida e acenava a cabeça quando afirmava a fala de alguém, mas nada além disso. Não aceitava sair de casa, nem mesmo visita; os meninos foram proibidos de passar pela porta da casa, passavam horas sentados do lado de fora.
Depois de uma semana, ela tocou no braço do irmão enquanto ele preparava lámen para o jantar.
— Nós temos que ir embora.
Jungkook achou que a irmã estava falando sobre Seul; ir embora, talvez, para bem longe da pessoa que havia feito aquilo. Poderia explicar o dinheiro, mas era bem mais sério do que uma simples mudança.
Aquela frase desencadeou a confissão de todo o ocorrido; horas depois, o moreno estava do lado de fora, dividido entre controlar a tremedeira em suas mãos e conseguir tragar o cigarro.
— Espera... espera. De novo. Você precisa se acalmar, está gaguejando. — Taehyung segurou no ombro do amigo, tomando a sua atenção.
— Respira. — Namjoon o olhou de frente, uma expressão dura no rosto. — Vai, fala.
— É o filho da porra do promotor mais famoso do gabinete de Seul. — Jungkook jogou a bituca no chão, pisando nela e a arrastando antes de se afastar do toque de Taehyung, dando passos para o lado. — Ela estava namorando com ele. Não sei como estava acontecendo bem de baixo do meu nariz, mas estava. E ele espancou ela quando... — deu uma longa pausa, tentando regular a sua respiração forte. — Achou que ela estava grávida. Ela não está, afinal de contas. O pai chegou na hora que estava acontecendo e deu aquela maleta. Ela só contou porque disse que o nosso tempo está acabando. As ordens são para sairmos do país, ou vamos sumir do mapa.
— Puta merda. Isso é muito para a minha cabeça. — Hoseok se levantou de onde estava, andando de um lado para o outro enquanto coçava nervosamente o braço.
O silêncio se instalou entre todos eles; estavam se dando conta da seriedade da situação. Homens como o promotor não permitiam erros, pedras em seu caminho. Com um filho problemático, deveria estar acostumado a encobrir casos como aquele. E estava, de fato — era muito bom nisso. Jungkook sabia disso, sem precisar de qualquer mensagem direcionada a ele. Tinha consciência de que estaria lidando com pessoas de sangue frio; não hesitariam nem mesmo por um instante antes de dar fim na vida dele, caso resolvesse fazer algo a respeito.
— E para onde vocês vão se mudar? — Seokjin se pronunciou, recebendo a atenção de todos.
— Você viu o estado da minha irmã. — Jungkook tirou outra bituca do bolso, acendendo quando estava dentre seus lábios. — Eu posso até mesmo me mudar, mas nada disso vai curar o que ela está sentindo. Vai demorar para ela conseguir voltar a ter um pouco de normalidade. — ele soltou a fumaça, encarando cada um dos amigos. — Antes de qualquer coisa, eu vou dar o troco.


» Los Angeles, dias atuais.

— Ele está aqui de novo. — Lindsey, a sua colega de trabalho além de Henry, sussurrou quando chegou perto do seu corpo. virou o rosto sobre o ombro, conseguindo ver o homem sentado na mesa ao lado da vidraça; estava sentado com as pernas afastadas, braços cruzados e os olhos estavam atentos nela.
Virou-se para a frente mais uma vez, levando uma das mãos ao rosto e coçando o queixo. Era a segunda vez que ele aparecia, somente naquele dia. Estavam perto do horário de fechar e quando ele chegou, mais cedo, a morena havia pedido para Lindsey o atender e sumiu do campo de visão.
— Pode atender ele de novo, por favor?
— Eu faria, com prazer. Ele é um gostoso. — olhou de lado para a garota, reprovando a sua fala. — Mas ele não quer. Pediu que eu viesse te falar que é para você ir até a mesa.
Com uma lufada de ar forte sendo expelida, ela tirou o pequeno bloco de notas de dentro do bolso do seu avental e se pôs a andar em direção à mesa; conforme chegava mais perto, mais o sorriso dele se estendia no rosto e ela sentia as maçãs do rosto esquentarem. Quando, finalmente, parou com o corpo ao lado da mesa, inclinou a cabeça para o lado, encarando-o de cima.
— Qual vai ser o seu pedido?
— Você está no cardápio?
— Jungkook! — ela bateu o pé contra o chão, esforçando-se para não enforcar ele naquele momento. — Você não deveria vir aqui desse jeito. Eu estou trabalhando agora, ainda não percebeu?
— Não precisa ficar tão arisca, . — ele umedeceu os lábios com calma, apoiando os cotovelos na mesa. — Eu só quero um café gelado. O meu único intuito é esperar você estar liberada, então nem mesmo tente me colocar para fora.
Desacreditada, ela o mirou com aquela expressão atônita por alguns momentos até lhe dar as costas; deixou-o na mesa depois de entregar o seu café, mas não ficou menos desconfortável depois disso, porque sentia ele a observando enquanto tentava trabalhar devidamente. Ela pôde ver como Henry estava se comportando com a presença de Jungkook; cochichava com Lindsey e entregava olhares feios para o outro homem. Ele era apenas seu amigo, então a garota não compreendeu porque estava agindo daquela forma infantil.
— Quer que eu te leve em casa? — Henry perguntou enquanto terminavam de fechar o café; já haviam se trocado e permaneceu com os fios de cabelo presos num coque.
— Não precisa. Tem alguém me esperando. — como se isso não fosse óbvio para todos, Jungkook estava do outro lado da rua, recostado contra a sua moto e prestando atenção em tudo o que ela fazia. — Mas obrigada. Até amanhã.
Depois de acenar para os outros dois, olhou para os lados antes de atravessar a rua com calma e se aproximar daquele que estava mais que ansioso para o momento em que ela estivesse perto; ele usava a mesma jaqueta que havia lhe emprestado na noite em que o viu lutar. cessou os passos quando parou numa distância considerável do corpo dele, segurando a bolsa em seu ombro e estreitando o olhar.
— Não faça isso.
— Está falando exatamente sobre o quê? — ele a retrucou com uma voz calma, tirando as mãos do bolso.
— Isso. Vir ao meu trabalho, ficar me esperando... Eu não quero me aproximar de você. Já entendi o tipo de cara que você é. Vai fazer eu ficar acostumada com tudo isso e depois sumir de novo. Até decidir voltar e eu nunca vou conseguir fugir desse círculo vicioso.
— Eu não sou esse tipo de cara. — por poucos segundos, criou-se um vinco entre as sobrancelhas dele. — E eu não vou ficar tentando provar isso através das palavras. Eu já disse, só quero que me dê uma chance. Se eu der qualquer sinal de bandeira vermelha mais uma vez, eu juro que não vou te procurar mais quando me rejeitar.
Lá estava ela; sentindo-se mais tentada do que nunca a colocar seus pensamentos sombrios de lado e permitir que Jungkook se aproximasse daquela maneira. Poderia ser tão ruim assim? Ah, claro. Poderia ser até mesmo pior do que parecia naquele momento; ela sabia com qual tipo de queda estava lidando e o homem postado a sua frente significava uma queda tão dolorosa quanto inesquecível, e somente ela decidiria se iria cair ou não.
— Então... — ele a instigou mais uma vez, aproximando-se mais e com o capacete em uma das mãos, levou a mão livre até os fios de cabelo dela e desatou o nó que os mantinha presos; eles caíram livremente por seus ombros e o sorriso nos lábios dele aumentou. — Eu gosto deles soltos. Vamos, vou te levar para comer. — sem rodeios, ele colocou o capacete nela, como da primeira vez.
não apresentou nenhuma objeção; ninguém, em sã consciência, negava uma proposta daquela. Não prestou atenção no caminho, seus braços rodearam o tronco do homem e ela chegou a fechar os olhos durante o trajeto; estava dormindo em seu apartamento nos últimos dias, o que acarretava em noites mal dormidas.
Quando a moto parou, ela percebeu estarem em frente a uma lanchonete de fachada antiga. Mesmo assim, o interior estava cheio. A garota não se pronunciou, apenas o acompanhou para o interior e pôde observar que ele conhecia os funcionários, visto que todos o cumprimentaram enquanto ele a guiava para uma mesa mais afastada da área movimentada. Enquanto se acomodava de frente para Jungkook, ele fez o pedido para os dois.
— É o melhor hambúrguer de toda Los Angeles. Também foi o primeiro que eu comi quando cheguei. — tirou a jaqueta, apoiando-a junto com os outros pertences dos dois sobre o canto da mesa.
— É mesmo? — apoiou os cotovelo, olhando em volta antes de parar no rosto à frente do dela; ele estava na mesma posição e ela desceu os olhos para a camisa branca e justa que ele usava. — me contou que vocês se mudaram para cá, todos juntos. São uma grande família, pelo que eu entendi.
— Somos. — baixou os olhos por um instante, coçando o maxilar ao se lembrar do dia em que a viu com os outros meninos. — Quando eu vim, estava com a minha irmã e Yoongi. Os outros chegaram algumas semanas depois.
— A sua irmã está bem? — ela percebeu uma pequena mudança nas expressões de Jungkook, mas que durou poucos segundos. Afastaram os braços quando o atendente colocou os copos de refrigerante entre eles. — Me desculpe, eu não quero ser inconveniente. Namjoon disse que ela estava com problemas e ela me pareceu machucada, naquele dia. Não precisa responder, se não quiser.
Enquanto ela mexia no líquido gelado com o canudo, em seguida o sugando, Jungkook imitou o seu ato, sem tirar os olhos dela. Não se sentia mal em lhe responder, muito pelo contrário. Ele sentia como se pudesse colocar tudo para fora se ela perguntasse; mesmo que não fosse de fato fazer isso.
— Não tem problema, . Você quer ter certeza se aquela era a minha irmã. — ergueu uma das sobrancelhas, sugestivo. — Era ela. Soomin, o seu nome. Ela está bem, foi apenas uma confusão na faculdade, nada demais. Mas eu quero ouvir sobre você. — apoiou o rosto nas mãos, olhando-a atento com aqueles olhos escuros. — Eu quero saber de tudo. Se tem família, o que já fez... quantos anos tem, só vamos sair dessa mesa depois de uma biografia completa.
soltou uma risada genuína, logo em seguida o pedido estava na mesa; mesmo apreciando comer besteiras, nunca havia visto um hambúrguer tão grande quanto aquele. As batatas que acompanham estavam crocantes e apimentadas; quando ela mordeu o sanduíche, não escondeu o que sentiu ao deixar um gemido de contentamento escapar.
— Nossa, isso aqui...
— Eu sei.
Os dois trocaram um olhar cúmplice, enquanto de boca cheia, e ambos sorriram um para o outro, mantendo a boca fechada, o que acarretou em riso logo em seguida.
— Tá legal, a minha biografia completa. Você sabe o meu nome, onde eu trabalho. Atualmente, com vinte e três anos, minha família é a e o cachorro que você largou na minha casa. — numa pausa, ela tapeou a mão dele que tentava roubar suas batatas. — Sabe a universidade que apareceu no noticiário a algumas semanas? Sobre aquela menina... bom, eu estudei lá. Artes. E como pode ver, não deu muito certo, continuo sendo uma garçonete.
A garota se exasperou quando Jungkook começou a bater contra o próprio peito, de repente parecendo engasgado. Seu rosto ficou vermelho e ela fez menção de se levantar para o ajudar, mas ele a impediu quando ergueu a mão e colocou o resto de refrigerante do copo para dentro.
— Estou bem. Não foi nada. — passou as costas da mão pelos lábios, controlando a respiração; de certo, ele não esperava que ela dissesse que havia estudado na mesma universidade onde sua irmã estudava. Não significava nada para a história deles, mesmo assim o lembrava de como o mundo era minúsculo. Sorriu, empenhando em continuar o assunto. — Artes, hum? Até que combina com você. Você pinta? — a garota torceu os lábios, desviando o olhar. — O que foi?
— Vamos mudar de assunto, já chega.
Os próximos minutos ficaram por conta de ele tentar convencer a lhe contar sobre suas pinturas; mas não conseguiu, no fim das contas. Depois de terminarem de comer, ainda permaneceram sentados por um longo tempo, apenas jogando papo fora. Conversaram sobre coisas bobas do cotidiano, volta e meia Jungkook percebendo que estava rindo com facilidade na presença da garota. Aquilo encheu seu peito de um sentimento que não poderia explicar naquele momento.
Como imaginava, ele a levou até em casa. Despediram-se na porta do prédio, ela acenou com uma das mãos e lhe entregou um sorriso aberto; havia gostado daquela noite, muito mais do que pensava que poderia. Mesmo encantada, tinha em mente que deveria levar a situação com calma.
Ao chegar em frente à porta do apartamento, ouviu o barulho do celular em sua bolsa, resgatando-o pela primeira vez naquelas horas e percebendo a hora avançada, assim como as mensagens de Jungkook.

“Obrigado pela noite.”
“Vou dormir pensando em você.”

Com um sorriso enorme no rosto, ela empurrou a porta depois de girar a chave; a expressão abobalhada sendo substituída por uma assustada, para logo em seguida se tornar uma furiosa.
e Namjoon estavam no sofá, a garota por baixo enquanto o outro estava por cima, sem grande parte de suas roupas. Eles a perceberam ali somente quando ela jogou, propositalmente, a bolsa em cima da mesa de centro.
!
se exasperou, Namjoon nem mesmo teve qualquer reação que não fosse tentar cobrir seu corpo com as almofadas, de modo desesperado. A morena apenas piscou lentamente, levando o olhar de um para o outro.
— Vocês dois têm cinco minutos para vazar daqui. Os dois, estão ouvindo bem? — balançando a cabeça em negativo, ela rumou o quarto pelo corredor, sendo seguida por Cookie; somente algumas horas fora e tomavam conta de seu próprio apartamento. — Era só o que me faltava...
Enquanto os dois juntavam suas coisas pelo chão, Jungkook estava a caminho de casa; mas sua irmã estava bem longe da residência naquele momento. Acompanhada de Seokjin, os dois tinham lanternas em mãos enquanto caminhavam pelos arredores do campus da universidade. Naquela altura da noite, não havia qualquer aluno ou funcionário andando por entre os prédios, a maior parte do terreno sem qualquer iluminação.
Os dois rumavam em direção aos corredores de armários, somente pararam os passos quando estavam de frente para o que estava marcado como “614”.
— Tem certeza de que é esse? — Jin resmungou, com dois objetos afiados em mãos. — Quando se faz alguma merda, tem que fazer direito.
— Eu tenho certeza. Vai logo!
Soomin iluminou para que o mais velho pudesse conseguir destrancar o armário; por mais que todos estivessem empenhados em fazer com que Jungkook não ligasse a morte da jovem a eles, a garota precisava ter certeza do que vinha bagunçando sua mente.
Poucos dias antes do anúncio de sua morte, fora ouvido que a sua colega do grupo de estudos havia estava esbanjando luxo depois de receber dinheiro de alguém. Até então, isso não seria qualquer motivo de alarde. A jovem era uma coreana um pouco mais velha que a própria Soomin, popular dentre todos no campus.
Um dia antes de desaparecer, Soomin recebera um convite para uma festa em sua casa, à qual não compareceu. Depois de tudo o que acontecera, era inevitável pensar que havia algo estranho em meio as atitudes da jovem que havia sido morta.
— Pronto.
Jin abriu o armário por completo e os dois começaram a colocar todos os objetos para fora; coisas normais de uma garota, como batons, um espelho pequeno. Livros, cadernos... até Soomin perceber um envelope inteiramente branco, com as extremidades sujas, e um volume incomum.
Os dois trocaram um rápido olhar antes que o mais velho tomasse as rédeas e abrisse o envelope sobre os objetos jogados ao chão; diversas fotos caíram, não demorando para revelar que todas as imagens eram sobre Soomin, Jungkook e todos os outros.




Continua...



Nota da autora: Oii, gente!
Estava com vontade de fazer uma fanfic nessa vibe a tempo, e decidi fazer com o JK antes que acabasse enlouquecendo com o meu amor por ele.
Espero que vocês gostem da história! Beijos <3

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