free web counter
Última atualização:20/01/2023

Prólogo - Allan

- Certo. Armas, roupas, livros, notebook, id's, celulares... - Hazel dizia pra si mesma. Eu estava sentado na cama observando-a arrumar as malas. As minhas já estavam prontas há algum tempo, então eu só esperava Hazel acabar com as dela. - Eu esqueci alguma coisa?
- Pegou o telefone do recepcionista do hotel? - Perguntei, sarcástico.
- Por quê? - Ela me olhou sem entender.
- Desde que a gente chegou nesse hotel ele não tira os olhos da sua bunda.
- Vá se foder, Carter. - Ela disse, revirando os olhos e voltando sua atenção para a mala.
- Eu devia atirar nele, sabia? Só eu posso olhar pra sua bunda.
- Cafajeste. - Resmungou.
- Vadia. - Pisquei pra ela.
- Vamos embora.
Levantei da cama, peguei as malas e Hazel me esperou sair para trancar o quarto. Nós saímos e ela pagou o hotel com um cartão forjado qualquer. Notei que o recepcionista ainda encarava Hazel de cima a baixo enquanto ela deixava a recepção. Dei um soco na mesa e o garoto se assustou e me encarou com os olhos arregalados, me fazendo sorrir. Eu não sou exatamente um troglodita, mas sou grande o bastante pra meter medo num moleque magricela daqueles.
- Escuta aqui... Larry? - Li o nome no crachá. - Cara, eu tenho uma arma naquele carro. Pare de encarar a garota.
Ele ficou branco e fez que "sim" com a cabeça. Deixei as chaves no balcão e saí do hotel, rindo.
- Qual é a graça? - Hazel me jogou a chave do carro e eu fui pro lado do motorista.
- Nada, Hazy. - Ela me olhou com cara feia, detesta que eu a chame assim. - Pra onde vamos agora?
- Pra um bar. Vamos passar a noite bebendo quantidades absurdas de álcool. - Ela disse. Eu sorri e concordei, entrando no carro.
Dei a partida no carro, Hazel ligou o rádio e Hammer To Fall, do Queen, começou a tocar. Então, nós fomos embora de Lawrence, Kansas.


Capítulo Um - Allan

Mas deixe-me explicar melhor a minha, digo, a nossa história. Minha e de Hazel.

Meu nome é Allan J. Carter, eu tenho 28 anos - Hazel gosta de dizer que eu tenho mentalidade de 15, mas isso não vem ao caso. Apesar da cara de cansaço, das várias cicatrizes e marcas de briga, eu costumo chamar muita atenção das garotas que encontro nas nossas viagens - modéstia à parte. Tenho cabelos loiros e bagunçados, na altura do ombro porque tenho preguiça de arrumar e cortar, olhos azuis, barba rala, mais ou menos um metro e noventa e tantas tatuagens que já perdi a conta. Cada uma com um significado e uma história diferente.
Eu vivo desde sempre com Hazel Green. Uma mulher linda de 25 anos, ruiva, de olhos castanhos claros, rosto cheio de sardas e com o corpo enfeitado por marcas, cicatrizes e tatuagens, como eu. Ela não tem muito mais do que 1,60m de altura e é bem magrinha, mas quando briga, meu amigo... ela incorpora o Chuck Norris.
Antes que você pense nisso: Não, nós não somos namorados. Eu nunca tive qualquer relacionamento sério com uma mulher na vida, por causa do trabalho, e Hazel, eu acho, nunca se envolveu com um cara pelos mesmos motivos. Nosso trabalho não permite ter laços com pessoas comuns. Mas nós temos um ao outro e, apesar de eu ser obrigado a manter minhas "mãos cheias de dedos" - como ela chama - longe dela, nos damos muito bem. Crescemos juntos, entende? Então nós temos alguma coisa, sim. Eu morreria por ela e sei que ela faria o mesmo por mim. Mas, infelizmente, eu só posso comer ela com os olhos, mesmo. Ela já me ouviu dizer isso centenas de vezes mas eu ainda acho que ela não leva a sério. O que fere um pouco o meu ego porque eu consigo toda mulher que quero, menos ela. Não me julgue, às vezes é difícil ignorar o lado neanderthal.
Mas tudo bem, ela é a minha melhor amiga e eu nunca vou fazer nada contra a vontade dela ou que a magoe. Ela é a pessoa mais importante no mundo pra mim e sem ela, não vai existir nenhum "eu".
Eu não conheço minha mãe. Meu pai contava que, numa de suas caçadas, ele se envolveu com uma garçonete chamada Michele e, nove meses depois, recebeu uma ligação de alguém dizendo para que ele fosse buscar seu filho. Meu pai voltou à cidade e descobriu que a garçonete morreu no parto e ao invés de me largar num orfanato, ele começou a me carregar por aí em suas caçadas.
Sete anos depois, veio a Hazel. Meu pai, James Carter, a adotou numa caçada quando seus pais desapareceram misteriosamente. Não me lembro muito bem de como aconteceu. Ela só tinha quatro anos e eu sete. Só sei que ele chegou na casa procurando algo que já não estava mais lá e encontrou a pequena Hazel desmaiada num armário. Meu pai não conseguiu deixá-la sozinha, então, começou a carregar Hazel pra tudo quanto é lugar junto comigo. E, enquanto ele trabalhava, eu era o responsável por cuidar dela. No fim, ela foi criada comigo para o mesmo ramo de meu pai. Passamos muito tempo juntos na infância e, quando meu pai morreu, continuamos o trabalho enquanto procuramos os pais dela.
Sei que você vai dizer que nós fomos criados como irmãos e é estranho que vez ou outra eu tenha sonhos impróprios com ela. Mas nós somos amigos e eu nunca a vi como uma irmã, pelo amor de Deus! Sempre fomos mais como amigos que implicam um com o outro todos os dias mas que cuidam um do outro.
Nós somos caçadores.
Não de veados, ursos ou sei lá. Mas de coisas realmente perigosas. Criaturas nojentas e macabras que andam no nosso mundo e matam pessoas inocentes. Se você ainda não entendeu, meu bem, estou falando de monstros. Fantasmas, poltergeist, vampiros, lobisomens, metamorfos e o caralho a quatro. Nosso trabalho é matar o máximo possível e salvar o máximo de vidas. Desde pequenos eu e Hazel acompanhamos meu pai nessas viagens atrás de coisas para matar.
Mas calma, de vez em quando, meu pai gostava de nos levar a alguns lugares legais para fingirmos ser crianças normais como parques e cinema. E em outras vezes ficávamos na casa de amigos dele. Como a casa do "tio Bobby" e da "tia Ellen". Gostamos dos dois, como família mesmo. E quase sempre tinham outras crianças junto, como a Jo, filha da Ellen e dois garotos que ficavam com Bobby de vez em quando... os Winchester. Você já deve ter ouvido falar deles, todos os caçadores já ouviram. E eu brincava com eles quando criança.
Quando eu e Hazy viramos adolescentes, meu pai começou a nos levar junto pra caçar de verdade. Ele já havia nos ensinado tudo sobre o assunto, mas nunca havíamos participado. Então caçamos um fantasma e foi um verdadeiro sucesso - para iniciantes, como meu pai fez questão de mencionar.
Enfim, depois disso viramos verdadeiros caçadores profissionais. Até que meu pai foi atacado por um lobisomem ano passado e, como sua força já não era mais a mesma, morreu. Eu fiquei acabado e Hazy chorou muito, mas nós seguimos em frente com o... como é que o garoto Winchester dizia? "O negócio da família".

E é isso. Essa é a nossa vida. Minha e da Hazel. De nada.

Agora, vamos voltar para a história.

Eu e ela estamos voltando de uma caçada em Lawrence, Kansas. Era um metamorfo que havia matado uma família inteira. No fim, descobrimos que o monstro era só um filho revoltado de 32 anos e que não gostou de ser colocado pra fora de casa. Eu quase fui mordido, o filho da puta era forte, mas Hazel meteu uma bala de prata no coração do desgraçado.
E agora estamos no carro, seguindo para o bar da Ellen para, como Hazel disse, beber quantidades absurdas de álcool que, depois de uma caçada, não cairia mal.


Capítulo Dois - Hazel

Chegamos ao bar da Ellen. Descemos do carro e vimos que estava tudo fechado. Não havia sequer uma luz acesa ou carro estacionado além do nosso.
- Será que elas estão aí? - Perguntei.
- Vamos descobrir. - Disse Allan, se aproximando.
Ele abriu a porta velha de madeira e entrou. Estava vazio ou, ao menos, parecia. Avançamos e ouvimos apenas o som da madeira rangendo à medida que andamos. De repente, no escuro, houve o "click" de uma espingarda. Olhei para trás e Allan estava com as mãos pra cima, rindo despreocupado.
- Qual é a graça, palhaço? - Ouvi a voz de uma mulher atrás dele. Era uma voz conhecida.
- Jo! Somos nós, idiota! - Falei. Ela baixou a arma e saiu de trás de Allan.
- Hazel? Nossa, me desculpe! Eu cheguei por trás e não vi que eram vocês! - Ela disse, sorrindo. - Mãe!
Então Ellen apareceu, sorrindo enquanto largava um rifle sobre o balcão de bebidas. Abracei as duas e Allan fez o mesmo.
- E aí, crianças, como vocês estão? - Perguntou Ellen.
- Acabamos de voltar de uma caçada e queremos beber! - Disse Allan, sorrindo.
Ellen riu e colocou uma garrafa de Whisky em cima do balcão com dois copinhos. Encheu os dois e nós viramos de uma vez só. Desceu queimando, mas eu precisava disso. Enquanto sentia o ardor do whisky na garganta diminuir, notei que Allan encarava alguma coisa do outro lado do salão com uma expressão confusa.
- Que merda é aquela ali? - Perguntou.
Quando olhei, achei que parecia só um amontoado de roupas, mas depois percebi que era um homem. Estava caído com as pernas pra cima ao lado da mesa de sinuca com uma roupa surrada e cabelos gordurosos. Me perguntei se estava vivo.
- Aquele é o Ash. Trabalha aqui. - Disse Jo. - Ele é um gênio.
- Se você diz. - Eu ri. - Tem lugar pra gente ficar, Ellen?
- Sim, não tivemos muito movimento essa semana. - Disse ela, bufando. - Mesmo assim, está meio bagunçado lá atrás... eu e Jo tivemos que colocar quase todos os colchões pra fora depois de uma tempestade. É incrível como até no meio do nada isso acontece. Se importam de dividir um colchão velho?
- Pra mim tá ótimo. - Disse Allan, me olhando com um sorriso safado. - Perfeito. Não podia ser melhor.
- Guarde seus pensamentos sujos pra você. Obrigada. - Falei, revirando os olhos. Jo soltou uma risada alta.
- Mas eu não disse nada, Hazel. Você é que pensou em coisas sujas. - Ele piscou, eu dei um tapa na cabeça dele e ele começou a rir. - Conte-me mais sobre o que você anda pensando de mim, Hazy.
- Cafajeste. - Falei.
- Vadia.
- Vou arrumar um dos quartos pra vocês. - Disse Ellen, rindo e saindo do balcão.
Depois de mais alguns goles de whisky, senti o cansaço da caçada bater. Meu corpo começou a ficar dolorido e senti um peso na cabeça... precisava de um banho e de uma longa noite de sono.
- Tem um chuveiro? - Perguntei.
- Sim, lá nos fundos. Primeira porta à esquerda. - Disse Jo.
- Quer companhia? - Perguntou Allan, me olhando com aquele sorriso de novo. Eu levantei e dei um beijo na bochecha dele em resposta. Então, saí sem dizer nada. Enquanto me aproximava do carro, percebi que ele andava atrás de mim. Comecei a caminhar de costas para encará-lo.
- O que foi? - Perguntou, sorrindo e colocando as mãos nos bolsos da calça.
- Por que você está me seguindo?
- Não seja tão convencida, Hazel Green. - Disse. - Só estou indo até o carro, ou acha que vou dormir vestido assim?
Olhei para as roupas dele. Ele sempre se vestia do mesmo jeito. Uma jaqueta de couro por cima de uma camisa xadrez e uma regata branca ou preta, uma calça jeans surrada e um coturno. Não que ele só tivesse isso, mas, das poucas roupas que ele tem, são todas iguais. Eu não sou muito diferente. Sempre uso as mesmas camisetas que a gente compra no cinema ou em shows de rock, uma camisa xadrez, uma jaqueta e uma calça que pode ser jeans ou leggings. O estilo de roupa só muda quando precisamos de disfarces específicos... um terno para fingir ser agente do FBI ou jaleco para se passar por médico legista. Nós não podemos nos dar ao luxo de nos vestir bem. Não temos dinheiro pra isso e nem ligamos se caçamos de gala ou de pijama.
Enfim, fui até o carro e abri o porta-malas. Tirei minha mochila e Allan tirou a dele. Em seguida voltamos para dentro do bar e eu fui direto para o chuveiro enquanto ele ia até o quarto que Ellen preparou pra gente.
Entrei no banheiro, tirei a roupa e entrei debaixo da água fria. A gente se acostuma com isso, afinal, não fui criada num palácio e os hotéis em que ficamos são sempre dos mais simples. Mas aquilo foi como tirar as dores e o cansaço com as mãos. Fiquei um tempão no chuveiro, só relaxando o corpo.
- Hazel! - Ouvi a voz de Allan do lado de fora do banheiro. - Vai sair daí hoje?
- Já terminei, seu chato! - Falei. Então, desliguei o chuveiro e me enrolei na toalha.
Depois, vesti um shortinho de pijama e uma regata, peguei a bolsinha que havia deixado na pia e comecei a escovar os dentes. De repente, Allan entrou no banheiro me dando um susto.
- Qual é o seu problema? - Falei, com a boca cheia de espuma.
- O que foi? Tô indo tomar banho. - Disse, jogando suas coisas em cima da tampa da privada.
- E não podia me esperar sair do banheiro? - Falei, cuspindo a espuma.
- Que nojo. - Disse ele, fazendo uma careta pra mim. - Não posso esperar porque você demora demais.
Terminei com os dentes e comecei a pentear os cabelos. Notei que ele começou a tirar a roupa atrás de mim. Coloquei as mãos no rosto, cobrindo a imagem da bunda dele. Não que eu nunca tivesse visto Allan sem camisa ou só de cueca, mas não queria ver o resto assim, de surpresa!
- O que você pensa que está fazendo, Allan?
- Indo tomar banho, já falei. - Disse. Tirei as mãos do rosto e o vi entrando no chuveiro.
- Ai meu Deus! Cobre isso aí, Carter! - Falei, me virando pra pia.
Não fique me achando estranha, ou pensando que eu não gosto de olhar homens. E sim, o Allan têm um corpo de deixar qualquer mocinha inocente sem ar, mas eu não sou obrigada a ficar lembrando disso o dia todo... ou a noite toda.
- Se você não quer olhar, feche os olhos! - Falou, quase chorando de rir da minha cara de vergonha. - Não sabe o que está perdendo!
- Aposto que não é grande coisa. - Falei, pegando minhas coisas. - Estou indo. Bom banho.
Saí do banheiro meio tonta e fui até o bar pegar um sanduíche na geladeira da Ellen. Olhei o relógio e vi que já estava perto da meia-noite. Então, dei boa noite para Ellen e Jo e fui para o quartinho no final do corredor.
O quarto estava uma bagunça. Havia armas, garrafas vazias de bebidas e roupas jogadas. Claramente, Ellen não esperava hóspedes naquele dia. O colchão estava bem no meio. Ellen deixou um cobertor bem grosso, porque estava meio frio. Terminei meu sanduba e me aconcheguei debaixo do cobertor. Fiquei um tempo olhando pro teto repassando os detalhes da noite anterior, quando matamos um metamorfo.
Uns minutos depois, Allan apareceu segurando um jornal. Ele estava só com a calça do pijama e com os cabelos molhados. Tentei desviar minha atenção.
- Estava olhando os jornais da Ellen. Parece que temos um caso. - Disse. Me sentei no colchão e ele jogou o jornal pra mim.

"A TRAGÉDIA DA FAMÍLIA DELABONI Após morte dos pais, jovem é encontrado morto no quarto.
Na semana passada, o Jornal Devenport trouxe a notícia da morte de Ralph DeLaboni. O advogado de 42 anos foi encontrado morto, esmagado por sua própria caminhonete. Na semana anterior, sua esposa Julia havia sido encontrada morta por sufocamento dentro do guarda-roupas do casal. A polícia suspeitava do marido e, quando foram interrogá-lo em casa, ele já estava morto.
Nesta manhã de 29 de Agosto, o filho único do casal foi encontrado morto, segundo o legista, também por sufocamento.
Amigos acreditam que ele possa ter cometido suicídio após a morte dos pais, mas a avó afirmou, em uma conversa com a equipe do jornal, que está com medo de ser a próxima vítima. A polícia de Devenport está procurando evidências que comprovem assassinato ou suicídio. Mas, assim como no caso dos pais do jovem, não havia sinais de arrombamento ou digitais no local."

- Parece nosso tipo de caso. - Falei. Ele se deitou ao meu lado. - Sem digitais ou sinal de arrombamento...
- Também achei. Vamos para Iowa amanhã de manhã? - Perguntou. Olhei o jornal para dar uma olhada nas fotos e ver o local onde as mortes aconteceram. Já tínhamos ido à Iowa duas vezes.
- Vamos. - Falei, virando de costas pra ele e puxando o cobertor até o pescoço.
- Vamos dormir de conchinha? - Perguntou, na maior cara de pau. Ele tem o dom de parecer inocente quando está de safadezas.
- Não se atreva. - Falei, sentindo o rosto queimar.
- Até parece que nunca dormimos juntos. - Disse.
- Quando tínhamos oito anos. - Falei, rindo.
- Chata. - Allan imitou uma vozinha infantil e birrenta.
Resolvi me virar pra ele, mas me arrependi na mesma hora. Ele estava mais perto do que eu calculei. Estava me encarando com aquele sorriso de antes.
- Boa noite. - Falei, tentando não sorrir.
- Boa noite, Hazy. - Falou, me dando um selinho. Então, fechei os olhos e relaxei ao lado dele.


Capítulo Três - Allan

Fiquei mais alguns segundos olhando pra ela depois que fechou os olhos. Então a puxei pra perto de mim e segurei sua cintura onde senti a enorme cicatriz prateada que começava um pouco abaixo do umbigo e terminava na metade das costas ... Ela soltou um gemido de dor.
- Ainda dói? - Perguntei, soltando-a. - Desculpe. - Falei, beijando a testa dela. Ela sorriu e suspirou, caindo no sono.
Hazel tem essa cicatriz desde que a conheço. Mas não sabe dizer como a conseguiu. Eu me lembro que, no dia em que meu pai a encontrou, ela estava escondida dentro de um guarda-roupa, desmaiada. Hazel só se lembra de ouvir gritos e de uma luz branca muito forte. Quando acordou, estava com uma cicatriz que ela não sabe de onde veio e seus pais haviam sumido.
Ela sente muita dor de vez em quando e já fez várias pesquisas, mas não encontrou nenhuma criatura sobrenatural que possa deixar uma marca como aquela. Eu mesmo já disse pra irmos consultar uma vidente, meu pai conhecia vários no país todo... mas ela não acredita nessas coisas. O que não faz sentido considerando o que a gente vê no nosso trabalho.

***


- Allan! Allan! - Ouvi a voz de Hazel. - Allan! Acorda!
Abri os olhos, assustado. Peguei a arma que estava no chão ao meu lado e apontei pra frente. Hazel me olhava, assustada. Baixei a arma e me virei pra ela.
- O que aconteceu? - Perguntei.
- Você estava se debatendo e gritando. - Disse, respirando quase tão rápido quanto eu. - Acho que estava tendo um pesadelo, de novo.
Então me lembrei. Estava sonhando com monstros matando todos que eu conheço, sangue, rostos deformados... não conseguia correr e nem me defender, só ficar assistindo. Passei a mão no meu rosto suado para tirar os cabelos da testa e encarei Hazel, que massageava o próprio braço. Olhei com mais atenção e vi que havia uma marca ali que, provavelmente, ficaria roxa. Não era grande, mas parecia estar doendo.
- Fui eu?
- Não foi nada. - Ela disse, forçando um sorriso. - Você me acertou sem querer enquanto dormia.
- Desculpa, Hazy. Nossa... Me desculpe, eu... - Falei. Ela me abraçou e riu baixinho.
- Tudo bem. Não foi de propósito. - Ela disse, então me deu um beijo na bochecha. Odeio quando ela faz isso. Então, me virei e roubei um selinho. Ela me empurrou, rindo, e eu me deitei de novo.
- Que horas são? - Perguntei.
- Dez da manhã. Temos que ir. - Ela levantou e foi até o banheiro.
Levantei também, me vesti, fui comer alguma coisa e arrumar as malas pra viajar. Hazel chegou em seguida pra me ajudar. Nos despedimos de Ellen e Jo e fomos embora.
Nosso carro muda todo mês, porque sempre param de funcionar. Pegamos os carros do Bobby emprestados ou roubamos carros por aí. Depois de anos de prática, não é difícil. O carro da vez era um Chevy antigo meio marrom, meio verde. É cor de carro velho.
Nós sempre íamos trocando de lugar durante a viagem para que um pudesse dormir enquanto o outro dirigia. Como tínhamos acabado de sair da cama, passamos o tempo todo acordados, discutindo o que sabíamos sobre o caso. Hazel ia com o notebook aberto no banco do carona, lendo outras matérias, checando o site da polícia, redes sociais, nomes, endereços... eu ia dirigindo enquanto ela falava o que descobria. Pelo jeito, a família DeLaboni era bem famosa na cidade. Eram donos de uma companhia de seguros mas, com a morte do casal, a empresa estava prestes a fechar. Hazel estava pesquisando possíveis concorrentes que poderiam ter se dado bem com essas mortes, pra ver se encontrava algum suspeito, quando chegamos no hotel. Foram quase cinco horas de viagem até Davenport. Minha bunda estava ficando quadrada.
O hotel em que ficamos era um daqueles sem nada de especial. Havia um letreiro neon rosa que mostrava uma silhueta de mulher e o nome Passion. Hazel odiava ficar nesses lugares, mas era mais difícil de sermos rastreados e era mais barato, também. Quando entramos, uma mulher loira que devia ter uns 25 anos nos atendeu. Ela usava uma regata e uma calça jeans bem justa... não teve como não reparar que ela era uma gata.
- Boa noite. - Disse Hazel. - Você tem algum quarto disponível?
- Temos um quarto com cama de casal e um com camas de solteiro. - Ela me olhou de cima a baixo, como se Hazel nem estivesse ali. - Qual você prefere?
- De solteiro, por favor. - Disse Hazel, mudando o tom de voz.
- Perfeito! - A loira se virou pra pegar a chave atrás dela, empinando a bunda de um jeito nada sutil. - Aqui está a chave. Fique à vontade. - Ela estendeu a mão para entregá-la a mim, mas Hazel arrancou da mão dela com força. Pela reação da loira, deve ter doído. Fizemos o check-in e fomos para o quarto. Hazel batia os pés, irritada.
- Qual é o problema? - Perguntei, achando graça. - Não gostou da recepcionista?
- Ah, vai me dizer que não viu o jeito como ela olhava pra você? E aquela empinada na bunda na maior cara de pau? - Ela disse.
- Tá com ciúmes, Hazy?
- Ciúme? Claro que não! Só não gosto desse tipinho! - Ela disse, jogando a mala em cima da cama com violência. Olhei pra ela com uma cara confusa e ela percebeu que eu não entendi nada. - Ah, você sabe! Viu como ela falava com você como se eu nem estivesse ali? Abusada! Eu ri alto. Não acreditei no que estava ouvindo. O melhor era a cara de birrenta dela enquanto falava da recepcionista.
- Qual é a graça?
- Está morrendo de ciúmes! - Falei. - E não consegue nem disfarçar!
- Não estou com ciúmes!
- Quer dizer que eu posso ir pra cama com ela, numa boa?
- Faz o que quiser, Allan. Não é sua primeira namoradinha. Mas eu não vou te dar injeções na bunda quando você pegar uma doença. - Falou. Aquilo era verdade, eu já havia ficado com várias mulheres em vários lugares diferentes. Mas eu me cuidava muito. - Só que se você transar com ela na minha cama ou no carro eu juro que atiro nos dois!
- Sim, senhora. - Falei.
- Podemos começar a caçada de verdade ou você quer ir lá bater um papo com ela? - Perguntou. - Não, vamos. Pegue o distintivo do FBI e a roupa de gente metida. - Falei.
Ela não gostava quando eu dava ordens, mas concordou e fez o que eu disse. Peguei meu distintivo falso e vesti o terno, ela fez o mesmo. Então, descemos as escadas do hotel e fomos em direção ao carro. Quando passamos pela recepção, a loira piscou pra mim. Hazel viu e bufou alto, me fazendo rir.


Capítulo Quatro - Hazel

Fomos direto a casa da avó do tal Mich, a última vítima. Segundo os jornais, ela estava com medo de ser a próxima, então, talvez soubesse de alguma coisa. Eu, que sempre fui melhor com computadores, havia achado o nome e endereço dela no sistema do FBI - ilegalmente, é claro. A velhota morava num bairro pequeno ao norte de Davenport e se chamava Alexandra DeLaboni. Ela nos atendeu depois de algumas batidas na porta e nos encarou, séria. Parecia uma vovó de filme com cachinhos brancos e curtos, meio gorducha e baixinha. Só não tão simpática... o que é de se esperar, já que ela acabara de perder os filhos e o neto.
- Senhora DeLaboni - Falei. - Somos do FBI. Sou a agente Sparrow e esse é o agente Turner. Estamos investigando as mortes que ocorreram na sua família nos últimos meses. Se importa de responder algumas perguntas?
- Mas eu já falei com a polícia... - Disse.
- O FBI está cuidando da investigação agora, depois de novas evidências. Serão poucas perguntas, eu prometo. - Tentei ser o mais meiga possível.
- Claro, entrem, por favor. - Disse. - Acabei de preparar um chá, vocês querem?
- Sim, obrigada. - Agradeci. Nos sentamos no sofá e ela foi até a cozinha. Era uma casa aconchegante, cheia de flores e fotos de família.
Allan aproveitou a oportunidade para tirar o EMF (Medidor de Campo Eletromagnético) do bolso, mas ele não apitou. Quando a velhinha voltou com o chá, nós nos servimos e ela se sentou numa cadeira de balanço de frente pra gente.
- Senhora DeLaboni, como era seu filho, Ralph, e sua família? - Perguntou Allan. - Eles se davam bem?
- Ah, eles eram felizes, sim... - Disse, tentando segurar o choro. - Viajavam todos os anos, faziam jantares e sempre me convidavam. Não foi justo... Eles não mereciam...
- A senhora sabe de alguém que pudesse querer fazer mal a eles? - Perguntei. - Alguém que pudesse se beneficiar com essas mortes?
- Claro que não! Eles eram muito populares, muito queridos. - Disse, soluçando. - Faziam eventos para pessoas carentes todos os anos, no Natal... E quem é que se beneficiaria com a morte de Mich? Ele era só um garoto!
- Sabe me dizer se eles vinham agindo com estranheza ultimamente? - Perguntou Allan. - Como assim? - Alexandra o encarou, confusa.
- Reclamando de luzes piscando, calafrios... talvez alguma sensação de estarem sendo seguidos ou vendo coisas. - Disse Allan. Olhei feio pra ele, pedindo mentalmente para que ele tentasse ser mais sutil.
- Eu... não sei dizer. - Disse a velhota, parecendo nervosa. - O que vocês estão insinuando?
- São perguntas padrão, senhora. - Falei, tentando amenizar a tensão. - A senhora não tem ideia do que ou quem possa ter feito isso com eles?
- Não! - Disse, começando um choro mais intenso. Olhei pra Allan e imaginei que ele estivesse pensando a mesma coisa que eu: hora de ir embora.
- Se não tiver mais nada para nos contar, senhora DeLaboni, nós vamos embora. - Disse Allan.
- É melhor vocês irem mesmo. - Ela disse, tentando se acalmar.
- Obrigada, senhora DeLaboni. Se lembrar de mais alguma coisa, me ligue, tudo bem? - Falei, entregando um cartão com um nome falso e meu número de celular. Ela pegou e agradeceu.
Saímos da casa dela e paramos no meio fio.
- Acho que ela fala a verdade. - Disse Allan. Concordei com a cabeça.
- Que tal irmos até a casa da família? - Perguntei. - Talvez o EMF funcione melhor lá.
- Boa ideia.
A casa não era muito longe, então não demoramos muito para chegar. Desci do carro e vi as faixas da polícia, que mantinham a casa fechada. Havia uma fileira de flores com fotos e cartazes em homenagem à família. Pelo jeito, eles eram mesmo populares.
- Vamos pelos fundos. - Disse Allan. - Alguém pode nos ver.
Demos a volta no terreno, procurando uma porta na área dos fundos da casa. Quando a encontramos, Allan tirou um grampo do bolso e começou a cutucar a tranca da porta. Nós entramos, pegamos o EMF e começamos a circular pela casa. Eu fui para o andar de cima e Allan ficou com o andar de baixo, o porão e a garagem.
No quarto do casal, Julia e Ralph, não havia nada de interessante. Abri o guarda-roupa e o EMF piscou um pouquinho, mas não o bastante pra eu suspeitar de algo sobrenatural. Procurei por enxofre ou saquinho de bruxa e, como não encontrei, fui até o quarto do filho, Mich. Havia plaquinhas indicando que ele morrera ali. Mas não havia sangue. O EMF apitou com mais força ali no quarto do garoto. Quando saí na porta para chamar Allan ele gritou:
- Hazel! Vem aqui! Estou no porão!
Demorei para encontrar a entrada e, pelo estado da portinha, Allan precisou arrombar pra entrar lá embaixo. Desci as escadas de madeira que rangiam e encarei Allan, que fazia uma careta.
- Vem ver isso aqui. - Disse. - Acho que os DeLaboni guardavam alguns segredinhos, não é?
Me aproximei dele e vi que ele segurava o EMF, que apitava pra caramba, perto de uma espécie de altar. Havia a foto de um homem jovem, de mais ou menos uns vinte e poucos anos com um símbolo estranho desenhado com sangue e um livro de ocultismo ao lado. Eu peguei o livro e Allan, a foto.
- Eh, está em outra língua. Vou demorar um pouco para traduzir. Mas esse símbolo é bem familiar... devo ter nas minhas anotações. - Falei.
- Tem um telefone e um nome aqui. - Disse Allan, lendo o verso da fotografia. - Cliff Jenkins. Que nome horrível.
- Será que ele está morto? - Perguntei.
- Sei lá. Tente ligar pra ele e vê se consegue descobrir alguma coisa. Depois veja se encontra esse símbolo no seu diário de menininha.
- Não é um diário! São anotações! - Retruquei, fazendo rir. - E você, o que vai fazer? - Eu vou pro hotel, ver se consigo traduzir isso. - Disse, pegando o livro da minha mão.
- Você está todo autoritário hoje, Allan. - Falei, e ele piscou pra mim. - Mas é pra se concentrar no caso! Nada de dar em cima da balconista peituda!
Allan caiu na risada. Então nós saímos da casa e voltamos pro hotel. Enquanto ele entrou para traduzir o livro, eu fiquei no carro com as minhas anotações. Era mesmo como um diário. Eu escrevia sempre que encontrava algo relevante nas caçadas que pudesse ser útil no futuro... algum ritual diferente, proteções contra monstros ou símbolos. Era um caderninho pequeno que eu guardava na mochila.
- Eu sabia que conhecia aquele símbolo! - Falei, quando encontrei o desenho no diário. Era um símbolo triangular com um círculo e uma estrela de três pontas dentro. Logo abaixo, eu escrevi o que ele significava:
"Runa do Espírito Vingativo - O ritual trás um fantasma para se vingar dos seus inimigos."
- Ótimo. - Falei, baixinho. - É um símbolo de invocação de espíritos. As instruções devem estar no livro que Allan vai traduzir, mas aposto como alguém dessa família invocou alguém para matar o tal Jenkins... a questão é: por que eles morreram também?
Mandei uma foto do diário pro celular do Allan e liguei pro número que havia atrás da foto. Demorou um pouco, mas uma mulher atendeu.
- Alô?
- Oi, esse é o número de Cliff Jenkins? - Perguntei.
- É sim. Quem fala?
- Aqui é a agente Sparrow, do FBI e eu gostaria de falar com ele. A senhora o conhece?
- Ele está morto há quase um mês. Sou a viúva dele. - Disse, com a voz trêmula.
- Se importa se eu for até aí conversar com a senhora? Ou podemos nos encontrar em algum lugar?
- Pode vir até minha casa. Enquanto meus filhos estão na escola.
- Ótimo. Me passe o endereço. - Falei, ligando o carro.


Capítulo Cinco - Allan

Cheguei no hotel e subi as escadas sem dar atenção à recepcionista. Estava pensando no caso... as mortes, o EMF, a foto, o altar, Hazel...
Entrei no quarto, joguei o livro em cima da mesa e abri o notebook. Demorou um pouco até que ele ligasse e a internet funcionasse, mas logo comecei as pesquisas.
Não demorou muito pra achar a tradução. Como eu já esperava, era uma invocação de espíritos. Diz o que fazer e como fazer. Muito simples, na verdade. Enquanto eu lia a tradução, Hazel me enviou uma foto do seu diário com o símbolo, confirmando minhas pesquisas. O tal Cliff, o homem na foto, provavelmente está morto agora. O livro dizia que tudo o que você precisa fazer é conseguir uma parte do corpo que o espírito habitava antes de morrer - pode ser cabelo, sangue, dentes... - e mistura-lo com o que você vai usar para desenhar o símbolo de invocação na foto de quem você quer que o espírito mate. Tem uns detalhes a mais, é claro, mas eu não vou te ensinar a invocar um fantasma do mal.
Encontrei um website de ocultismo que falava um pouco sobre o símbolo:
Ao ser desenhado em uma foto de uma pessoa, essa pessoa está na lista de morte de um espírito que pode ter sido invocado. É um tipo de feitiço para amaldiçoar alguém e sentenciá-la à morte. Mas é muito perigoso usá-lo, pois espíritos vingativos são instáveis e podem machucar as pessoas à sua volta. Para reverter, apenas queimando os restos de fantasma ou esperar até que quem os invocou morra.
Mas então, por que a família DeLaboni morreu? Se alguém da casa queria se livrar do tal Cliff, não fazia sentido o espírito se voltar contra a família... talvez assassinar as pessoas próximas a ele, mas não isso.
Resolvi pesquisar algumas coisas sobre o tal Cliff. Ele morreu algumas semanas antes do casal DeLaboni. Ao que tudo indica, Cliff foi encontrado enforcado no banheiro de um bar com cacos de vidro presos na garganta. Sem pistas ou digitais, a polícia não encontrou nenhum suspeito.
Terminando a pesquisa, fui até o frigobar e peguei um sanduíche e uma garrafa de água. Olhei o relógio e notei que já eram quase oito da noite.
- Hazel, cadê você? - Pensei em voz alta. Se ela tivesse encontrado alguma informação, já teria mandado uma mensagem.
Peguei o telefone e liguei pra ela. Duas, três... cinco vezes. A única coisa que escuto é o recado: "Bom, aqui é a Hazel. Se você ligou e eu não atendi, devo estar ocupada, então... deixe um recado ou tenta de novo daqui a pouco."
- Hazy, tô preocupado contigo! - Falei, ao telefone. - Cadê você? Me liga, tá bom?
Fiquei mais uma meia hora esperando por ela.
Então escutei alguém bater na porta do quarto.
- Esqueceu a chave, Ha...? - Falo, abrindo a porta, sorrindo. Mas quando notei que não é ela parada ali, interrompi a frase.
- Boa noite. - Disse a recepcionista.
O que ela tá fazendo aqui?, pensei. Ela estava parada, segurando duas garrafas de cerveja. Analisei a garota de cima a baixo. Não deu pra evitar. E ela pareceu bem contente com a minha reação, abrindo um sorriso e se inclinando para mim.
- Posso ajudar? - Pergunto, sorrindo.
- Sabe o que é... - Disse, mexendo nos cabelos. - Eu notei que você chegou sem sua amiga. Então pensei que talvez você fosse, sei lá, querer uma companhia. - Ela fez uma cara muito falsa de inocente e foi entrando sem permissão.
- Bom, minha amiga já vai voltar. - Geralmente eu não desperdiço uma chance de sexo fácil. Mas a única coisa que eu queria naquele momento era que Hazel voltasse pro quarto segura. - Não sei se...
- Ah, qual é! - Disse, chegando perto de mim. Ela tirou minha jaqueta e tirou o celular da minha mão. - Se ela já vai voltar, temos um tempinho, não?


Capítulo Seis - Hazel

- Por que, de repente, o FBI quer saber sobre a morte do meu marido? - Perguntou a senhora Jenkins. Era uma moça jovem, morena e triste. Me sentei no sofá e ela me serviu um copo d'água.
- Só posso informar que encontramos uma pista. - Falei, sem querer dar muitas explicações. - Acham que ele foi assassinado? - Ela ficou pálida e trêmula. - Mas quem faria uma coisa dessas? Ainda mais de uma forma tão... tão..
- Esperava que a senhora me dissesse.
- Não acha que eu fiz isso, não é? - Disse, parecendo nervosa. - Eu nunca faria uma coisa dessas! Quer dizer, eu e Cliff tínhamos nossos problemas, é claro, mas eu...
- Que tipo de problemas? - Perguntei.
- Bom ele... - Ela fez cara de quem segurava o choro. - Ele tinha um caso.
- Com quem?
- Julia DeLaboni. - Disse, com desgosto na voz.
Então tudo ficou mais claro pra mim. Então, existiam pessoas que queriam fazer mal à família DeLaboni. Talvez Ralph - marido de Julia - ou a sra. Jenkins tinha chamado um espírito pra matar Cliff.
- Eu comecei a suspeitar do caso alguns meses antes de ele morrer. Então contratei um detetive e ele me trouxe fotos. Logo depois, eu pedi o divórcio. Mas ele morreu antes de assinar os papéis. - A mulher desabou em lágrimas.
- O marido de Julia sabia dessa relação deles? - Perguntei.
- Não que eu saiba. - Disse, entre os soluços. Por um instante, ela pareceu entender o que eu estava pensando. - Não acha que Ralph matou meu marido, acha?
- Ainda não podemos afirmar nada. - Falei, pensativa. - Tudo bem... Se importa se eu der uma olhada nas coisas do seu marido?
Ela concordou e me trouxe uma caixa com fotos, cartas, um colar, a aliança. Disse que não havia mais nada dele em casa. O resto foi doado para hospitais e instituições de caridade. Ela ainda parecia muito magoada pela traição dele.
Olhei o relógio e vi que já estava perto das seis da tarde. Logo, os filhos dela estariam em casa, mas achei que eles não teriam nenhuma informação pra mim. Me despedi, agradeci pelas informações e disse que, se lembrasse ou precisasse de alguma coisa, que me ligasse.
Parei em frente ao jardim da sra. Jenkins e fiquei observando-a pela janela. Mas ela não parecia suspeita. Peguei o celular e não vi nenhuma mensagem de Allan. Estava quase sem bateria, então resolvi que era hora de voltar pro Hotel.
Assim que ligo o carro, dou mais uma olhada na janela da sra. Jenkins antes de partir. Mas vejo algo que me chama atenção. Um homem velho de roupas surradas passou na janela, do lado de dentro da casa. Senti um arrepio percorrer minha espinha. Ela não estava mais sozinha.
Saí do carro e bati na porta. Não houve resposta.
Bati de novo, ficando ansiosa.
- AAAAAAAAAAHHHHH!!! - Escuto a voz da sra. Jenkins na casa. Corro até a janela mais próxima e vejo a mulher batendo, desesperada, no vidro. Então, algo invisível a puxa e as cortinas se fecham.
Com toda força que posso, meti um chute na porta, mas só consigo deixar uma fratura ridícula na madeira. Pego a pistola que estava presa na minha calça e dou um tiro na maçaneta, abrindo a porta. Assim que pisei dentro da casa, escutei um estrondo, vindo da sala de estar onde conversávamos minutos antes.
- Jenkins! - Grito. Sigo o som até ela e vejo-a flutuando. Uma mão agarrava o pescoço e a outra estava estendida para mim, pedindo ajuda. Ela se contorcia e balançava as pernas, desesperada. Não havia um vulto ou qualquer sinal de seja-lá-o-que-fosse que estava estrangulando ela.
- Soc-gh-rr... - Ela tentou dizer.
Peguei um cartucho de pistola com sal que guardava no bolso para situações como aquela e joguei em cima dela. Ela caiu, inconsciente, mas viva. Senti o corpo arrepiar e um vento gelado percorrer a sala. Olhei pra trás e vi um homem parado a centímetros de mim. O mesmo que vi pela janela, mas agora, bem mais nítido. Era um velho, de expressão cruel, olhos brancos e pele acinzentada. Usava uma camisa branca, um casaco marrom surrado, calça curta e suspensório. Antes que eu conseguisse atirar, ele me empurrou contra a parede. Fiquei grudada ali, sem conseguir me mexer.
Então ele me encarou com um sorriso frio. A sra. Jenkins ainda estava caída no chão, começando a se mexer. Mas assim que acordou, soltou outro grito de pavor. O fantasma aproximou a mão de seu peito e ela começou a ficar vermelha.
- Pare com isso! - Grito. Mas sou ignorada. Tento mexer o braço e agarrar minha pistola caída no chão, mas é como se estivesse amarrada na parede.
E Jenkins fica cada vez mais vermelha... cada vez mais... e cada vez mais... Então, em segundos, tudo o que um dia fora a sra. Jenkins preencheu a sala. Sangue, pedaços e tripas por toda parte. O fantasma me encarou de novo, sorrindo, e apontou pra mim.
- Me salve. - Disse, com uma voz arrastada. Então, ele desapareceu e eu caí no meio da gosma do que era uma mulher há quinze segundos atrás.
Olho pra mim mesma e me vejo totalmente suja de "restos-de-Jenkins". Senti a bile subir até a garganta e botei tudo o que tinha no estômago para fora.
Sem conseguir respirar, me levantei e caminhei até encontrar o banheiro, onde tinha um espelho. Só dava pra ver o branco dos meus olhos, o resto estava coberto de Jenkins. Olhei pra sala onde tudo aconteceu e estava quase totalmente vermelho. Cheio de pedaços e sangue espalhados por tudo. Me voltei para o espelho e notei que havia sangue pingando dos meus cabelos, das minhas mãos...
Fiquei estática por alguns minutos. Foi a primeira vez que vi alguém explodindo na minha frente e fiquei coberta de restos mortais da cabeça aos pés. Aquele espírito era muito poderoso. Aquele símbolo... devia ter algo que deixamos passar. O som do telefone da casa me assustou e eu sai do transe.
- A-alô? - Disse, com a voz fraca.
- Gina, minha querida! Você está bem? - Disse a voz. - Ouvi você gritar aqui ao lado, aconteceu alguma coisa?
- Vo-vôcê é a vizi-zinha da sra. Jen-jenkins? - Falo.
- Sim, quem está falando?
Respiro fundo.
- Eu... ela... - Sem conseguir dizer nada, desligo o telefone.
Então, saio correndo pelo jardim e me enfio dentro do carro, estacionado bem em frente à casa. Estava tremendo tanto que não conseguia pegar a chave do bolso pra ligar logo o carro e dar o fora dali. Sentia lágrimas escorrendo pelo meu rosto e ouvia palavras desconexas saírem da minha boca. Parte de mim tinha consciência de que estava passando por um momento de trauma e que logo, os filhos de Gina Jenkins ou a polícia podiam aparecer. A outra parte estava apavorada demais pra se mexer.
Finalmente, consegui dar a partida no carro e corri pra bem longe dali. Estacionei algumas quadras antes do hotel onde estava hospedada com Allan. Sentindo que recuperava o controle sobre meu corpo, peguei o celular. Havia muitas ligações perdidas de Allan e uma mensagem de voz.
Hazy, tô preocupado contigo! Cadê você? Me liga, tá bom?
Assim que a mensagem terminara, o celular apagou, sem bateria. Respiro fundo e desço do carro. Não era uma ideia inteligente levar o carro cheio de sangue da Jenkins até o hotel. Me escondendo atrás de latas de lixo e carros e aproveitando que já estava escurecendo, caminhei até o hotel. Entrei pela porta dos fundos e suspirei aliviada quando não vi a recepcionista no balcão. Assim, ela não me veria toda ensanguentada e nem daria chilique.
Subi as escadas bolando um novo plano. Tínhamos que sair daquele hotel naquela noite, antes que a recepcionista notasse as pegadas de sangue que eu deixava pelo tapete e chamasse a polícia. O corredor até o quarto estava vazio, então eu corri e peguei a chave. Abri a porta, entrei devagar e deixei as costas escorregarem na parede do quarto.
- Opa! - Escutei a voz de alguém. Mas não era a de Allan. Abri meus olhos e me levantei, dando um pulo.
- Hazel! - Allan gritou.
Só aí notei que ele estava na cama com a recepcionista. Ela estava em cima dele, cobrindo os peitos com o lençol e ele estava com as mãos no quadril dela, me encarando com cara de idiota. Durante um minuto de silêncio eu absorvia o que estava acontecendo.
- EU NÃO ACREDITO!!! - Gritei.
- Hazel! - Ele disse, empurrando a loira pro lado e se enrolando no lençol. Ele andou até mim, com um olhar preocupado e colocou a mão no meu ombro. - O que é isso? De quem é esse sangue, Hazel?
Empurrei a mão dele e o encarei com raiva.
- Hazel, por favor! Me fala que esse sangue não é seu!
- Cala a boca, Allan! - Gritei. Então, caminhei até a loira, deitada na cama, com um olhar apavorado. Não tirava os olhos do sangue em mim. - Você, fora.
- Como é que é? - Ela disse, recuperando o foco.
- Eu disse pra sair do meu quarto.
- Olha aqui, eu... - Ela fez pose e ergueu uma sobrancelha, mas não a deixei terminar. - VOCÊ JÁ SE DIVERTIU BASTANTE, NÃO ACHA? TEM DOIS SEGUNDOS PRA TIRAR A BUNDA DESSE QUARTO OU EU JURO QUE TE DEIXO MAIS ENSANGUENTADA DO QUE EU, TÁ ME ENTENDENDO? FORA DAQUI! - Eu gritava, descontrolada.
Allan me olhou, assustado. Por um instante, tive a impressão de que ele ia começar a rir. A mulher se levantou, enrolada num cobertor e andou até a porta, segurando suas roupas e sem me encarar.
- Você vai me ligar? - Perguntou à Allan antes de sair.
- ACHEI QUE TINHA DITO PRA VOCÊ DAR O FORA! - Gritei, empurrando ela e fechando a porta com força. Olhei pra Allan com vontade de matá-lo. - Pelo visto, a pesquisa rendeu bem, não foi, Carter? - Cuspi nome dele com o maior desprezo que pude.


Capítulo Sete - Allan

- Pelo visto, a pesquisa rendeu, não foi, Carter? - Ela disse isso com tanto desprezo que eu senti como se fosse um soco na cara.
- Hazel, eu fiz as pesquisas... - Minha voz saiu como se eu estivesse com medo dela. Mas não é verdade. Ela não me assusta, o que me assusta é eu fazer uma merda tão grande a ponto de ela ir embora e eu perdê-la pra sempre. E eu sei que sou bem capaz de fazer isso.
- Ah, eu notei! - Ela ainda falava entredentes. - E conseguiu achar algo sobre o fantasma no útero dela?
- Hazel, de onde veio esse sangue? - Perguntei. Ela nem me olhava, então decidi gritar também. - Hazel! Olha pra mim! Quem fez isso com você?
- Não foi nada, caramba. O sangue não é meu. Não enche.
- Hazel! Me desculpa, tá legal? - Falei, bem mais alto do que gostaria.
Ela entrou no banheiro, me ignorando, e bateu a porta. Escutei o som do chuveiro ligando e entrei mesmo assim. Tinha uma cortina cobrindo Hazel do pescoço ao tornozelo e dava pra ver o sangue descendo pelo ralo.
Geralmente, ela gritaria comigo ou ficaria vermelha de vergonha se eu entrasse no banheiro com ela no chuveiro. Mas dessa vez, ela nem me olhou.
- Qual é o problema?
- Vai se foder.
- Hazel, o que foi que eu fiz? É por causa da... da recepcionista? Me fala o que foi, pelo amor de Deus! - Comecei a gritar e ela virou de costas pra mim.
- Bom, digamos que tem a ver com ela, sim. Eu estava lá fora, brigando com um maldito fantasma, tomando banho de tripas e trabalhando enquanto você estava aqui transando com a Mãe do Stiffler!
- Não foi minha culpa! - Falei, sem querer.
- Ah, claro que não. - Ela falava, em tom sarcástico. - Ela tropeçou e caiu com as pernas abertas em cima de você. Coitadinho do Allan.
- Não foi o que eu quis dizer, Hazel. Tô dizendo que, depois que terminei minhas pesquisas, liguei pra você milhares de vezes e você não atendeu. Aí a Jeanine apareceu e...
- Não quero saber.
Ela puxou a toalha pendurada num gancho ao lado do chuveiro e saiu de trás da cortina, enrolada na toalha. Tentei não olhar, pra não esquecer que ela estava irritada comigo, mas foi impossível. Tive que sair dali. Me sentei na cama e ela ficou mais alguns minutos no banheiro. Quando saiu, vestindo uma calça jeans e uma camiseta branca, foi pegando suas coisas e jogando dentro da mala.
- Aonde você vai? - Perguntei.
- Embora. Achar outro lugar pra ficar. - Disse, sem gritar, mas ainda claramente irritada. - Vai embora? Tá dizendo que vai me deixar aqui e vazar?
- Se a polícia descobrir que eu estive lá, virão atrás de mim. Eu larguei o carro há algumas quadras daqui, mas está cheio de sangue. Eu não quero ir pra cadeia. - Disse.
- Lá onde? Que história é essa?
- O tal do Cliff Jenkins... Fui até a casa dele pra conversar com a viúva e antes de eu vir pra cá um espírito apareceu e explodiu as tripas dela pela sala. Por isso eu estava toda suja.
- E o que você descobriu? - Perguntei, sem dar conta de que ainda estava enrolado no lençol da cama.
- Bom, o cara tinha um caso com Julia DeLaboni. - Hazel continuava colocando coisas na mala.
- Acho melhor voltarmos à casa da sra. DeLaboni e ver se ela sabia disso. Você reconheceu o fantasma que te atacou? - Perguntei, indo ao banheiro.
- Não. Era um homem velho, com roupa de época. Muito mais forte que um espírito comum. - Escutei Hazel falando enquanto largava o lençol no chão e ligava o chuveiro. - Vou ter que passar a noite pesquisando pessoas ligadas à família. Tchau Allan.
Tchau? Como assim "tchau"?
Desliguei o chuveiro e saí do banheiro do jeito que estava, sem o lençol me cobrindo. Parei de braços cruzados na porta, bloqueando a saída dela.
- ALLAN! - Ela gritou, ao notar que eu estava totalmente nu. - O que está fazendo?
- Você não vai sair daqui sem mim! - Falei. Ela esticou a mão para abrir a porta mas eu fui mais rápido: tranquei e peguei a chave, que ainda estava suja de sangue.
- O que está tentando fazer?
- Você vai me esperar. Eu vou tomar um banho e nós vamos juntos.
- O caralho que vou te esperar! Chama a Jeanine pra vir te fazer companhia! - O som dela dizendo aquilo foi hilariante. - Me dá a chave!
- Não. Senta aí e espera. - Falei.
Ela correu pra cima de mim, desviando o olhar pra evitar reparar nos detalhes. Segurei-a pelas pernas e a joguei na cama, caindo em cima dela. Hazel é muito ágil e uma ótima lutadora, mas eu, com meu tamanho, sou bem mais forte. Então, ela ficou imobilizada.
- Sai. De. Cima. - Disse, com o rosto completamente vermelho. Só não sei se era raiva ou vergonha. Ou os dois.
- Vai me esperar?
- Já disse que não.
- Então, vamos ficar assim a noite toda, porque eu não vou te dar a chave e você não vai sair daqui sem mim. - Falei, sério. Ela tentou se mexer, mas não conseguiu.
- Tá bom! Tá bom! Só veste alguma coisa, pelo amor de Deus! - Gritou, e eu caí na risada. - Ótimo. - Disse, me levantando. Quando soltei seus braços, ela colocou as mãos no rosto e ficou ali, deitada, até eu entrar no banheiro - ainda segurando a chave do quarto.
Sorte minha. Se ela visse o efeito que causou em mim ter que segurá-la naquela posição em cima da cama, ela me mataria.


Capítulo Oito - Hazel

Tirei as mãos do rosto e me levantei da cama rápido - eu reparei que Allan e a tal Jeanine estavam se enroscando ali minutos antes. Então, me joguei na minha que, a princípio, estava limpa e intocada.
Allan não era de demorar muito no banho mas, naquela noite, parecia que não sairia nunca do maldito banheiro.
- Pode ser hoje, Carter? - Gritei, socando a porta. - Tá fazendo o quê aí até agora?
- Pensando em você! - Debochou, me fazendo revirar os olhos. Eu esperava que ele estivesse brincando. - Já vou sair.
Alguns minutos depois, ele saiu... vestindo roupas de verdade e não um lençol. Ele arrumou sua mala e saímos do quarto. Ao passar pela recepcionista, achei que Allan iria fazer de conta que não a viu. Mas ele se apoiou no balcão e encarou Jeanine com um olhar "Gato de Botas" que me pegou de surpresa.
- Olha... sinto muito pela forma como Hazel falou com você mais cedo... - Disse ele, devagar. - Por favor, não ligue pra polícia, tá? Ela só teve um acidente e estava um pouco nervosa.
Por um instante, achei que a mulher ia agarrá-lo ali mesmo. Mas ela só encolheu os ombros e sorriu, colocando uma mecha de cabelo atrás da orelha.
- Não vou ligar. - Disse.
- Obrigado. - Allan piscou pra ela e se afastou.
Andamos algumas quadras no meio da noite, procurando um carro fácil de roubar. Quando o encontramos, eu sentei no banco do motorista sem saber muito bem o que fazer.
- O que foi isso? - Perguntei, confusa.
- O quê, Hazel?
- Esses olhos de Gato de Botas e todo esse charminho...
- Só não quero que ela ligue pra polícia só por ter ficado com raiva de você. Também não quero que você vá pra cadeia.
Sem dizer mais nada, fiz ligação direta no carro e fomos atrás de outro hotel. Chegamos em um que era ainda mais precário que o outro, mas quem nos atendeu foi uma senhora mais velha e simpática.
- Quarto para os dois? - Perguntou. Eu ia gritar um não bem alto, mas ela me interrompeu. - Deram sorte, é o último quarto disponível!
- Está ótimo. - Disse Allan. Então ele fez o check-in e a mulher nos levou até o quarto. Era um quarto agradável e, apesar de bem acabadinho, era aconchegante.
- Boa noite. - Disse ela, saindo do quarto e nos deixando sozinhos. - Se precisarem de algo, é só chamar!
Ficou um silêncio constrangedor depois que ela saiu.
- Posso arrumar uma cama no chão pra mim. - Disse Allan, de olhar baixo.
- Por quê?
- Você não vai me querer perto de você depois de hoje, ou vai? - Perguntou, com sinceridade. - Hoje não. - Falei, indo ao banheiro me arrumar pra dormir.
Quando saí, ele já estava deitado no chão, em cima de um cobertor velho e uma almofada. Fui até a cama e me deitei.
- Allan?
- Hm?
- Está com sono? - Perguntei.
- Ainda não, Hazy. Por quê?
- Eu... Quero te contar o que eu descobri sobre o caso. - Falei. Ele soltou um "Hum" de frustração. - E saber o que você descobriu.
- Claro, claro... - Disse, com a voz murchando.
Então nós ficamos até altas horas da noite discutindo o caso. Eu contei tudo o que descobri e ele me contou o que descobriu. Resumindo: O tal Cliff pode ter sido a primeira vítima do espírito. Mas, como já era esperado, o espírito enlouqueceu com o mundo dos vivos e começou a matar os outros ligados a Cliff e Julia, como Ralph, Mich e Gina. O símbolo era bastante antigo e, com certeza, deixava o espírito mais forte. A questão era: quem foi que o invocou?
Decidimos falar com a sra. DeLaboni pra ver o que ela sabia sobre o caso, investigar a casa dela e pesquisar parentes próximos para ver se achávamos quem era o fantasma, para queimar os restos e acabar com aquilo de uma vez.
- E como é que você está? - Perguntou Allan. - Sabe... Depois de ser atacada e ver a viúva do Jenkins virar pudim?
Não contive uma risada nervosa.
- Estou bem. Só cansada.
- Então é melhor irmos dormir. Temos um cadáver para queimar amanhã. - Falei. - Boa noite, Hazy.
- Boa noite, Allan.
- Hazel?
- O que foi, Allan?
- Você me acha charmoso?
- Boa noite, Allan. - Falei, encerrando a conversa.


Capítulo Nove - Allan

- Acorda, Hazy! - Sussurrei no ouvido dela. Ela se encolheu, arrepiada, e abriu os olhos devagar.
- Que horas são?
- Dez da manhã. Olha só! - Falei, mostrando o simples e pobre café na cama que preparei pra ela. Tinha uma xícara de café, um copinho com Whisky, uma torrada com manteiga e... só. Foi o que eu consegui encontrar no hotel.
Ela piscou algumas vezes antes de sorrir e vi que seus olhos brilharam. Me sentei de frente pra ela na cama enquanto ela se espreguiçava e começava a comer.
- Por quê? - Hazel perguntou, depois de engolir o primeiro pedaço de pão.
- Não gostou?
- Adorei, é que...
- Até parece que nunca ganhou um café na cama na vida. - Interrompi. Ela me olhou, fazendo uma careta. - O quê? Nunca ganhou?
- Não. - Disse, envergonhada.
- Bom, eu quero me desculpar por ontem. Achei que um café na cama seria uma boa ideia pra começar. - Falei. Ela ficou vermelha e continuou a comer, sem responder.
- Precisamos voltar na casa da velhota... ver se ela sabia do caso do Jenkins com a DeLaboni. - Falei, tentando quebrar o gelo.
- Sim. - Hazel respondeu, sem me olhar.
Assim que Hazel terminou seu café da manhã, nós vestimos as roupas de agentes do FBI e fomos conversar de novo com a senhora DeLaboni. Era a única pessoa que restava na família e podia acabar sendo a próxima vítima logo, logo.
Chegando lá, notamos que ela parecia ter envelhecido uns 30 anos de um dia pro outro. Parecia mais cansada do que da última vez que a vimos.
- A sra. está bem? - Perguntei. - Passamos pra fazer mais algumas perguntas, mas podemos voltar outra hora.
- E-estou bem, querido. - Disse, nos trazendo pra dentro da casa e nos servindo xícaras de chá.
Notei que ela tremia, então a ajudei a servir.
- Soube da sra. Jenkins? - Perguntou Hazel, olhando a velhota como se ela fosse cair dura a qualquer momento.
- S-soube... Soube sim. - Disse, se sentando. - Um ab-absurdo.
- A senhora sabia do caso que o sr. Jenkins tinha com a sua nora? - Perguntei.
- Fiquei sabendo quando me contaram que Gina havia pedido o divórcio. Pobrezinha...
Ela soluçava baixinho.
- E a senhora não contou ao seu filho?
- Ele não quis que isso se tornasse público... a família tinha grande prestígio na cidade e ele queria manter as aparências. - DeLaboni revirou os olhos.
- Acha que havia mais alguém envolvido nisso a ponto de querer algum mal a eles? - Perguntou Hazel.
- Não sei. Como eu já tinha dito à vocês... eles não tinham inimigos, apesar de tudo. - Disse.
Eu franzi a testa pra ela, pensativo. Se a velhota sabia do caso, por que não tinha nos dito antes? Não fosse a aparência frágil dela, eu daria uma pressionada... ela parecia estar escondendo alguma coisa. Olhei pra Hazel, que parecia concordar comigo.
Como a sra. DeLaboni não ia ser de grande ajuda naquele momento, eu e Hazel decidimos encerrar o interrogatório e ir até a biblioteca da cidade atrás de algum documento histórico que pudesse ligar a família ao fantasma que Hazel tinha visto na noite anterior.


Capítulo Dez - Hazel

- Não acredito! - Falei alto, fazendo todos na biblioteca olharem feio pra mim.
Um funcionário havia nos trazido os registros de famílias antigas da cidade e estávamos caçando informações há algumas horas. Allan já estava quase dormindo em cima de um livro com compras e vendas de terreno da cidade e pulou quando me ouviu gritar.
- O que foi? - Perguntou Allan, esfregando os olhos.
- Achei o cara! - Sussurrei. - É ele, eu tenho certeza! O nome dele era Edgar. E adivinha qual é a ligação dele com a família DeLaboni?
- O quê?
- Ele era o marido de Alexandra DeLaboni. - Falei.
- Alexandra? Não é a...
- A senhorinha triste com quem acabamos de falar! Olha, mas eu sou capaz de apostar que foi ela quem o invocou pra matar o Cliff! Afinal, se o filho não ia fazer nada pra manter as aparências...
- ...talvez ela tenha tentado encerrar o caso que Cliff tinha com a Julia! - Allan terminou a frase. - Mas o fantasma surtou e agora está matando as duas famílias!
- Na verdade, não tenho certeza se ele surtou... no dia em que ele me atacou eu achei ter ouvido... - Comecei, mas não sabia bem como explicar. - Acho que ele está preso aqui de alguma forma. E você sabe o que acontece com os espíritos quando eles andam pelo mundo dos vivos por tempo demais...
- Certo... - Disse Allan, enquanto nos levantávamos para ir até o carro. - O que vamos fazer? Temos que voltar lá agora! Antes que ele mate aquela velha idiota também!
- Mas temos que queimar os restos do Edgar! - Falei. - Se não, ele vai continuar matando! Allan parecia tentar decidir o que fazer.
- Vou deixar você cuidar da velha. - Disse. - Coloque ela num círculo de sal e espere eu ligar. Eu vou queimar os restos do fantasma e encontro você lá, está bem?
- Quando foi que você ficou tão mandão? - Perguntei, tentando aliviar o clima tenso.
Allan deu uma risada fraca e virou na rua da senhora DeLaboni. Assim que ele parou o carro em frente a casa dela, eu desci e ele partiu para o cemitério.
Hora de caçar um fantasma.


Capítulo Onze - Alexandra DeLaboni

- Não acredito! - Falei alto, fazendo todos na biblioteca olharem feio pra mim. Um funcionário havia nos trazido os registros de famílias antigas da cidade e estávamos caçando informações há algumas horas. Allan já estava quase dormindo em cima de um livro com compras e vendas de terreno da cidade e pulou quando me ouviu gritar.
- O que foi? - Perguntou Allan, esfregando os olhos.
- Achei o cara! - Sussurrei. - É ele, eu tenho certeza! O nome dele era Edgar. E adivinha qual é a ligação dele com a família DeLaboni?
- O quê?
- Ele era o marido de Alexandra DeLaboni. - Falei.
- Alexandra? Não é a...
- A senhorinha triste com quem acabamos de falar! Olha, mas eu sou capaz de apostar que foi ela quem o invocou pra matar o Cliff! Afinal, se o filho não ia fazer nada pra manter as aparências...
- ...talvez ela tenha tentado encerrar o caso que Cliff tinha com a Julia! - Allan terminou a frase. - Mas o fantasma surtou e agora está matando as duas famílias!
- Na verdade, não tenho certeza se ele surtou... no dia em que ele me atacou eu achei ter ouvido... - Comecei, mas não sabia bem como explicar. - Acho que ele está preso aqui de alguma forma. E você sabe o que acontece com os espíritos quando eles andam pelo mundo dos vivos por tempo demais...
- Certo... - Disse Allan, enquanto nos levantávamos para ir até o carro. - O que vamos fazer? Temos que voltar lá agora! Antes que ele mate aquela velha idiota também!
- Mas temos que queimar os restos do Edgar! - Falei. - Se não, ele vai continuar matando! Allan parecia tentar decidir o que fazer.
- Vou deixar você cuidar da velha. - Disse. - Coloque ela num círculo de sal e espere eu ligar. Eu vou queimar os restos do fantasma e encontro você lá, está bem?
- Quando foi que você ficou tão mandão? - Perguntei, tentando aliviar o clima tenso.
Allan deu uma risada fraca e virou na rua da senhora DeLaboni. Assim que ele parou o carro em frente a casa dela, eu desci e ele partiu para o cemitério.
Hora de caçar um fantasma.


Capítulo Doze - Hazel

Ela abriu a porta com um sorriso forçado. Suas mãos tremiam muito e seus olhos mostravam que estava chorando. A velhinha também parecia mais pálida do que o normal.
- A senhora está bem? - Perguntei.
- Sim, querida. Entre. - Entrei e sentei no sofá ao lado dela. A casa estava silenciosa e fechada. - Como posso ajudá-la?
Por um minuto fiquei pensando se deveria ir direto ao ponto ou jogar algumas informações que eu sabia pra ver se ela abria o bico. Decidi começar devagar. Se estivéssemos errados e ela não tivesse invocado nada, ia me achar louca e colocar a polícia de verdade atrás da gente.
- Bom, eu estive fazendo algumas pesquisas. E acho que senhora nos escondeu alguma coisa sobre o assassinato da família do seu filho e dos Jenkins.
Percebi que ela começou a tremer ainda mais. Então, desabou em lágrimas e cobriu o rosto com as mãos.
- Eu não... - Ela gaguejava. - Eu não sei, eu... não fiz... você... achar... louca...
- Seja lá o que for, pode me contar, senhora DeLaboni.
- É o meu marido...
De repente, um grito arrepiante de homem interrompe a fala dela. Senti um frio percorrer a sala e as luzes começaram a piscar. Me levantei, segurando a arma carregada com sal. A velha pareceu se assustar com meu movimento e parou de chorar na mesma hora.
- Sra. DeLaboni! - Grito. - Acho que é uma boa hora pra começar a falar!
- É melhor você ir embora... - Falou, sem se mexer.
- Olha só, eu sei que foi você quem invocou o espírito do seu marido e matou aquelas pessoas!
- Você... mas... como? Não! Você está louca, eu nunca...
Antes que ela terminasse de falar, um vulto falho e cinzento surgiu no corredor. O homem velho nos encarava, sorrindo maliciosamente.
- Estou louca, é? - Falei, atirando no fantasma. Ele desapareceu na hora, soltando um riso baixo e maligno. Ele iria voltar.
- Não foi minha intenção matar todas aquelas pessoas! - Ela chorava, desesperada. - Quando eu soube da traição de Julia, o chamei para que matasse ela e Cliff, mas ele simplesmente ficou louco! Ele matou meu filho... e o meu netinho... Edgar...
Torci para que Allan já estivesse no cemitério, pronto para queimar os restos desse desgraçado.
Deixei a velhota chorando na sala e corri até a cozinha. Fiz uma bagunça até encontrar mais sal e, quando achei um pacote relativamente cheio, voltei para a sala.
- O que vai fazer? - Perguntou, entre os soluços.
- Proteção. - Falei, enquanto fazia um círculo de sal em volta do sofá. Então me sentei ao lado dela, esperando. - Seu marido está enterrado naquele cemitério perto daqui, certo?
- Sim.
- Então vamos esperar. - Falei. - Allan vai queimar os restos dele.
Notei que ela ficou rígida e ainda mais pálida. Então, voltou a chorar copiosamente. As luzes pararam de piscar na mesma hora em que meu celular vibrou. Era Allan.
- Já? - Perguntei, surpresa.
- Acabei de jogar o fósforo! Pode dizer pra essa mulher maluca que acabou. Estou indo aí te buscar! Nós vamos beber!
- Venha logo. - Falei, desligando na cara dele. - Está acabado, senhora.
- Eu sinto muito. - Ela disse, respirando mais devagar. - Eu amava meu filho... Só queria o melhor pra ele.
- E como conseguiu invocar seu marido? - Perguntei.
- Encontrei o livro no meio de umas coisas antigas da família, pouco tempo depois que Edgar morreu. - Ela ainda chorava, mas parecia estar se acalmando. - Mas quando soube do caso de Julia, achei que valia a pena arriscar.
- E não sabia dos riscos de invocar um espírito?
- Sabia sim. - Disse, secando as lágrimas. - Mas o Edgar era um homem tão bom... Não achei que fosse capaz de fazer uma coisa dessas...
- Vovó, aprenda o seguinte: Se ele morreu, deveria ter continuado morto. - Falei. - Acredite, eu sei do que estou falando. Não existe fantasminha camarada, eles voltam pra matar e incomodar, nunca pra ajudar.
A velhota se acalmou e logo eu ouvi a buzina do carro. Me levantei e DeLaboni me acompanhou até a saída. Já estava menos pálida e tremia menos, mas eu sabia que ela ia chorar ainda mais depois que eu fosse embora.
- Obrigada. - Ela disse, com a voz meio rouca.
- Não se preocupe. - Falei, abrindo a porta. - A senhora vai ficar bem?
- Eu vou sim. Vou queimar aquele livro maldito, não se preocupe. - Ela tentava sorrir. Me virei pra sair e vi Allan, saindo do carro com um sorriso de vitória no rosto. Mas, assim que ele me olha de volta, a porta se fecha sozinha, prendendo a mim e a sra. DeLaboni dentro da casa.


Capítulo Treze - Allan

E a porta se fechou sozinha.
- MERDA! - Gritei, correndo até o porta-malas do carro e procurando uma arma ou um bastão de ferro. Assim que consegui, corri até a porta e dei dois socos. - HAZEL!
- Allan! Ele está vindo! Volta pro círculo de sal, AGORA! - Ela gritou para a sra. DeLaboni. Me afastei um pouco e dei um tiro no trinco da porta. Ela se abriu e eu consegui entrar.
Corri até a sala e vi as duas. Hazel estava parada, segurando sua arma e um saco com sal e Alexandra estava sentada no sofá com as mãos no rosto.
Quando dei um passo em direção à sala, senti um puxão no umbigo e voei até Hazel. Caí em cima dela e ela gritou. Quando consegui me levantar, olhei pra trás e vi o velho da foto que Hazel me mostrara mais cedo.
- Desgraçado! - Gritei. Me levantei e fui até ele com meu bastão de ferro, mas parei no meio do caminho, engasgando com alguma coisa. Senti meu corpo ficar quente.
- ALLAN! - Ouvi Hazel gritar. Ela correu até o fantasma e esvaziou o saco com o sal em cima dele. Ele desapareceu e a sensação de engasgo, também. Me levantei e nos posicionamos um de costas pro outro, esperando outro ataque. - Por que ele não morreu? - Hazel perguntou.
- Eu não sei! Queimei tudo o que havia dele! Não sobrou nada! - Falei.
- Ah, meu Deus. - Disse Alexandra, ainda sentada no sofá da sala. - Não... não...
- E desabou em lágrimas. Merda. Merda. Merda. Merda.
- E agora? - Perguntei.
Mas antes de Hazel me responder, veio outro golpe invisível e fomos lançados na escada. Hazel levantou antes de mim e notei que ela estava flutuando. Estava com as mãos no pescoço como se estivesse sendo estrangulada. Me levantei pra tentar salvá-la, mas o velho apareceu e me jogou na parede. Não consegui me mexer.
- Hazel! - Gritei. - Deixa ela, seu filho da puta! - Percebi que ela estava ficando roxa e inconsciente. - HAZEL!!!
- Me salve. - Disse uma voz rouca.
Ele ia matá-la! Ia matar a Hazel e eu não ia poder fazer nada de novo! Procurei a minha arma, mas estava longe demais. Eu tentava fazer força pra sair dali, mas não adiantava. Ele ia matar a Hazel e eu não ia poder fazer nada de novo.
De repente, a imagem do velho ficou mais fraca, como uma televisão sem sinal. Ele se virou devagar e encarou uma figura imóvel na sala. Segui seu olhar e vi Alexandra DeLaboni enfiando uma faca afiada bem no peito. Pouco antes de cair no sofá, ela retira a lâmina de seu coração e sussurra um "sinto muito" sem som.
- Então Hazel e eu caímos no chão. Corri até ela e vi que ela estava desmaiada, mas viva.
- Hazy...
O fantasma me encarou, dessa vez com os olhos vermelhos.
- Se salve. - Ouvi a mesma voz rouca de novo. Mas a boca do velho não se mexeu.
Ele avançou para mim, com as mãos parecendo garras prontas pra me estraçalhar e um rosto assustador e desfigurado enquanto soltava um grito rouco de gelar o sangue.
Foi como em câmera lenta.
Eu me levantei e tirei a foto dele que estava no meu bolso com o símbolo feito com sangue junto com o isqueiro que usei pra queimar seus restos. Coloquei fogo na foto e ouvi o velho soltar outro grito. Me joguei sobre o corpo imóvel de Hazel para protegê-la e, quando olhei pro fantasma, ele entrou em combustão pouco antes de me alcançar.
Alexandra estava morta. Edgar se foi. Acabou.

***


Coloquei Hazel no carro. Ela ainda estava desacordada, mas precisávamos sair da cidade antes que a polícia chegasse na casa e encontrasse Alexandra DeLaboni morta. Antes de sair da casa, eu a carreguei escada acima e a deixei deitada na cama. Tirei a faca de seu peito e a arrumei como se ela estivesse dormindo.
Depois, dirigi para o hotel.


Capítulo Catorze - Hazel

Abri os olhos e olhei para os lados. Estava na cama do hotel, deitada. Minha cabeça doía um pouco e eu sentia um desconforto na garganta, como se alguém a tivesse apertado muito.
- Finalmente, Bela Adormecida. - Disse Allan.
- O que aconteceu? E a Alexandra? E o Edgar? - Perguntei.
- Relaxa, eu cuidei de tudo. Matei o fantasma.
- Não, sério, o que aconteceu? - Perguntei. Ele riu.
- Você precisa ter mais fé em mim, Hazy! - Falou. - Alexandra enfiou uma faca no próprio peito e agora os dois se foram. Só precisei queimar a foto dele com aquele símbolo de sangue.
- E deu certo? - Ele acenou com a cabeça em resposta. - Como sabia que ia funcionar?
- Não sabia. - Falou, sorrindo.
- Você é uma mula. Uma mula sortuda. Mas ainda assim, uma mula.
Ele soltou uma risada alta e se sentou ao meu lado, na cama.
- Como é que você está?
- Estou bem. - Disse. - Quer dizer que acabou? E a Alexandra morreu mesmo? - Eu odiava caçadas que acabavam assim. De que adiantava nos arriscarmos para salvar as pessoas se, no final, elas morriam?
Senti como se tivesse sido tudo em vão. Mas não adiantava lamentar. O fantasma havia sumido e ninguém mais seria atacado. Era o que importava.
- Morreu. Eu estava esperando você acordar pra irmos embora da cidade. - Disse Allan. - E eu queria...
Ele hesitou por um momento. Seu sorriso desapareceu e ele abaixou a cabeça.
- O quê?
- Queria pedir desculpas de novo pelo que aconteceu no hotel com a recepcionista. - Disse, com uma expressão arrependida. - Juro que se eu soubesse que você estava com problemas, eu teria deixado a garota lá e ido atrás de você.
- Tudo bem, Allan. Já te perdoei.
- Mas eu não me perdoei. - Disse. - Você quase foi morta e eu não estava lá. E também não consegui te proteger dessa vez. Me desculpe.
- Allan...
- É sério, Hazel. Eu sei que você é forte e pode se cuidar sozinha, mas eu não quero que você fique irritada comigo por eu te deixar na mão de novo e vá embora.
- Como assim? Acha que eu vou te deixar, é isso? - Perguntei. Não acreditei no que ouvi.
Ele não respondeu, só ficou me olhando com aquela cara de culpado. Então, eu me estiquei até ele e o beijei. Um beijo de verdade, não como os selinhos que trocávamos vez ou outra. Notei que ele se assustou com minha atitude no início, mas quando me afastei, cortando o beijo, ele me puxou de novo e continuou.
Isso é uma coisa que nunca acontece, mas eu queria provar pra ele que, por mais merdas que ele faça, eu nunca conseguiria odiá-lo ou ir embora. Nunca conseguiria viver comigo mesma se fizesse isso. Nem mesmo consigo imaginar o que seria de mim sem ele.
Ficamos ali, nos beijando, por um tempinho, até eu sentir a mão dele na minha coxa. Então, eu cortei o beijo, rindo, e joguei o travesseiro na cara dele.
- Você tem o dom de estragar tudo, mesmo! - Falei, rindo.
- Não custava tentar, Hazy! - Respondeu. Desaforado.
- Cafajeste. - Falei.
- Vadia.
Ele se aproximou e meu deu mais um selinho. Depois disso, fomos arrumar as coisas pra voltar pra estrada.


Epílogo - Hazel

- O que vem agora? - Perguntou Allan, com os pés no porta-luvas, fingindo tocar bateria no ar.
- Bom, olhando os jornais mais cedo... - Comecei. - Vi que tem pessoas desaparecidas numa cidade não muito longe daqui. Com um órgão em especial faltando, adivinha.
- O coração. - Disse, suspirando. - Então, vamos parar num bar, encher a cara, descansar e, depois, vamos caçar.
- Pra mim tá ótimo. - Respondi.
E nós fomos em direção à próxima caçada.


Só não digo que é o "FIM" porque nossa história ainda está longe de acabar.


Entre Monstros - Livro 2
Prólogo - Hazel

A dor queimava como o inferno. Eu gritava mas era como se eu estivesse sozinha no escuro e ninguém pudesse me ouvir. Tentei me debater, mas sentia como se meus músculos estivessem atrofiados. Então, por que eu não morria? Assim a dor passaria e eu poderia descansar.
- Hazel! - Escutei a voz de uma mulher no escuro. - Corre!
Tentei correr, mas não conseguia mexer um músculo. De repente, uma luz azul muito forte surgiu no escuro, me cegando.
- Hazel! Por favor! Não! - E a mulher misteriosa soltou um grito agudo no escuro.
- Hazel! - Abri meus olhos e dei de cara com Allan, segurando meus ombros. Ele estava com os olhos arregalados e parecia assustado.
- A-Allan... O que...
- Você estava chorando, gritando e se debatendo na cama. - Disse, me ajudando a sentar. - O que houve?
Estávamos numa pousada em uma cidadezinha pequena no interior do Texas. Havíamos acabado de matar um vampiro e queríamos descansar antes de procurar a próxima caçada.
- Eu não sei, eu... tinha uma... uma mulher, me chamando e ela... Ela começou a gritar e... eu...
Comecei a chorar incontrolavelmente. Allan me abraçou e eu molhei a camisa dele com lágrimas. Mas não importava o quanto eu chorasse, a dor continuava dentro de mim e eu não sabia nem explicar o que acontecera. Eu sentia algo muito estranho dentro de mim. Como um aperto no coração. Como se, de repente, eu tivesse me lembrado de sentir falta de alguém... o problema era que eu não sabia de quem, exatamente.
- Tudo bem, Hazy. - Disse Allan, me dando um beijo na testa. - Você está acordada, já passou.
A sensação diminuiu depois do abraço de Allan e do beijo na testa. Consegui me acalmar e me sentar direito na cama, secando as lágrimas do meu rosto e ainda soluçando um pouco.
Coloquei a mão sobre a cicatriz que começava do lado direito do umbigo e terminava na metade das costas. Dei um gemido de dor e encostei a cabeça nas costas da cama. - Está doendo? - Allan perguntou, preocupado.
- Um pouco. - Menti. Doía mais do que nunca. - Deve ser porque estava me debatendo na cama...
Allan concordou com a cabeça, mas não parecia convencido. Não quis preocupá-lo dizendo que a dor era quase insuportável. Ele me trouxe um copo d'água e, com o tempo, fui me sentindo um pouco melhor. Se tentasse ignorar a dor.
- Me sinto o Harry Potter. - Falei, tentando me distrair da dor. - Sonhos estranhos com uma mulher berrando e uma cicatriz que eu não sei de onde veio...
- Fora os pais que você não conhece. - Disse Allan, sem pensar.
- Obrigada. - Falei, com voz irônica.
- Me desculpe, escapou. - Demos risada e senti mais uma fisgada na cicatriz, mas eu tentei não demonstrar isso.
O que está acontecendo comigo?




FIM



Nota da autora: Allan e Hazel retornarão em Entre Monstros II!! Estou muito feliz de trazer meus bebês para o FFOBS! Espero que vocês amem minha dupla de caçadores! Não esqueçam de deixar aquele comentário amorzinho e de me seguirem no instagram: @jack_ally_autora!

QUER FAZER UMA AUTORA FELIZ? DEIXE SEU COMENTÁRIO AQUI.

Qualquer erro nessa fanfic ou reclamações, somente no e-mail.


comments powered by Disqus