Nunca minta para si mesma.
Se algo te incomoda, preste atenção.
Se ele silencia suas dúvidas com um sorriso, se suas desculpas nunca explicam nada, se você sente um nó no estômago sem motivo aparente, confie nisso.
O corpo percebe o perigo antes da mente aceitar.
Se algo parece errado, é porque está.
Se ele te ignora e depois volta agindo como se nada tivesse acontecido, se faz você se questionar se está exagerando, se brinca dizendo que você "pensa demais", preste atenção. Manipulação também pode vir disfarçada de carinho.
Se ele some sem explicação, se controla seus passos, se diz que te ama, mas faz você se sentir pequena, sufocada, insegura… acredite nos seus próprios olhos, não nas palavras dele.
Se você acha que está maluca, então está no caminho certo. Não ignore os sinais. Não tente se convencer do contrário. E, acima de tudo, nunca minta para si mesma por ninguém.
O monstro não está na sua cabeça, está bem na sua frente.
Capítulo Único
A noite estava fria, mas não o suficiente para justificar os calafrios que percorriam a espinha de Helene.
Tudo naquela noite parecia errado.
O clima estava mais denso do que deveria, as folhas faziam mais barulho que o comum e, ainda assim, ela não sabia justificar a sensação de erro. Talvez fosse apenas o peso de, pela primeira vez, decidir sair sozinha.
Ela empurrou a porta do bar com uma leve hesitação, cogitando ir embora, mas seus olhos logo vasculharam o ambiente e afastaram a ideia de sua cabeça. Não era tão ruim, era?
O local era um refúgio, tinha vários outros jovens como ela e o cheiro de uísque estava tão forte que ninguém a perceberia ali. Era exatamente o que ela precisava naquela noite.
Helene se sentou e pediu uma generosa dose de bourbon, sem gelo. Ela não era uma grande apreciadora de bebidas fortes, mas havia algo na queimadura que o álcool causava ao descer na sua garganta que tornava tudo menos pesado.
Quando seus olhos viraram para a frente, sua atenção ficou instantaneamente presa em um dos jovens. Ele estava algumas cadeiras adiante, inclinado sobre o próprio copo, os dedos longos tamborilando na madeira do balcão. A postura relaxada contrastava com a intensidade do olhar que encontrou o dela.
— Você tem um olhar interessante — ele disse, com um meio sorriso.
Helene arqueou a sobrancelha.
— Isso é um elogio ou uma tentativa barata de puxar conversa?
— Um pouco dos dois.
Ela girou o copo em mãos, observando-o pelo canto do olho. O homem não parecia desconfortável, pelo contrário. Havia uma confiança estudada nele, como se soubesse exatamente o efeito que causava nela ou em qualquer outra pessoa.
— Theo — ele se apresentou, estendendo a mão.
Helene hesitou por um segundo antes de aceitar o cumprimento.
— Helene.
O toque dele era firme, quente e durou um instante a mais do que o necessário.
A conversa fluiu fácil, quase como se se conhecessem há anos. Theo tinha um charme natural, um jeito de falar que fazia parecer que tudo o que dizia era verdade. Ele a fazia rir, a fazia se sentir interessante, e a fazia se sentir como se fosse a única pessoa naquele bar.
Muitos perigos em um homem só.
— Você sempre vem aqui? — ela perguntou, depois de um tempo.
— Às vezes. Quando quero espairecer.
— E hoje foi um desses dias?
Theo brincou com o gelo em seu copo antes de responder.
— Digamos que eu estava esperando algo interessante acontecer. E aconteceu.
Helene sentiu o rosto esquentar com a insinuação, mas disfarçou tomando outro gole de bourbon. Não deveria estar se deixando levar tão fácil, mas era difícil ignorar a forma como ele a olhava.
— E você? — ele perguntou. — Parece que está fugindo de alguma coisa.
Ela riu, mas desviou o olhar.
— Só precisava de uma noite para mim.
— E encontrou o cara errado para te acompanhar.
Helene franziu o cenho.
— O que te faz pensar que você é o cara errado?
Theo sorriu de lado, como se soubesse algo que ela não sabia.
Ele não respondeu.
Apenas ergueu o copo e brindou no ar.
— A essa noite, então.
Helene, hesitante, brindou de volta.
Naquele momento, algo dentro dela sussurrou que deveria se levantar e ir embora. Mas, ao invés disso, ela permaneceu ali. Ignorando a sensação incômoda, deixando-se levar pelo sorriso fácil e pela voz rouca de Theo.
I've never seen an ugly truth that I can't bend
O sol da manhã atravessava as cortinas do quarto, derramando-se em listras douradas sobre o lençol. Helene piscou algumas vezes antes de perceber que estava sozinha na cama. O espaço ao seu lado ainda estava quente, mas Theo não estava ali. Sentou-se devagar, os cabelos caindo sobre os ombros em ondas desarrumadas. Seu corpo ainda se ajustava à rotina da nova casa, ao cheiro amadeirado dos móveis e ao colchão firme demais.
Bocejando, vestiu seu robe de seda e desceu as escadas.
A casa estava silenciosa.
Helene se dirigiu à cozinha e, quando encontrou a cafeteira desligada e nenhuma indicação de que Theo estivera ali, franziu a testa,
Ele devia estar em casa.
Seguiu até a porta que levava ao porão e parou.
Estava fechada. Como sempre.
Nos últimos meses, Theo passava muito tempo lá embaixo. Na primeira semana, ela achou que ele estava apenas organizando caixas e documentos antigos. Depois, ele começou a ficar cada vez mais tempo ali, por horas a fio. Helene não gostava disso. Não gostava do cheiro estranho que, de vez em quando, parecia subir pelas frestas da porta. Nem do som ocasional de algo sendo arrastado, mas Theo era um homem meticuloso, um perfeccionista. Talvez estivesse construindo um espaço para ele mesmo, um refúgio, um lugar para relaxar. Homens faziam isso, não faziam?
Ela não podia reclamar.
Tinha um marido lindo, carinhoso e bem-sucedido. O tipo de homem que todas desejariam ter.
Com um sorriso forçado, afastou os pensamentos e preparou o café.
Pouco tempo depois, ouviu passos no corredor.
Theo apareceu na entrada da cozinha com os cabelos um pouco bagunçados e a camisa preta justa ao corpo.
— Bom dia, amor.
Ele se inclinou para beijá-la na testa. Helene tentou não notar o cheiro metálico e enjoativo que parecia grudado à pele dele.
— Você acordou cedo — comentou, servindo-lhe uma xícara.
— Tinha trabalho a fazer.
Ela forçou um sorriso.
— No porão?
Theo parou por um instante antes de levar a xícara aos lábios.
— Sim.
Helene esperou que ele dissesse mais alguma coisa, mas tudo que recebeu foi silêncio.
"Ele é um homem ocupado," ela se lembrou. "Ele precisa de espaço."
— O que exatamente você faz lá embaixo?
Os olhos de Theo brilharam por um breve segundo antes dele soltar um riso baixo.
— Curiosa?
— Só um pouco — brincou, tentando manter o tom leve.
Ele girou a xícara nas mãos, com os dedos longos traçando o contorno da porcelana.
— Estou trabalhando em algo especial. Uma surpresa para você.
— Eu adoro surpresas.
Ele sorriu de volta, mas havia algo naquele sorriso que fez a pele dela arrepiar.
Theo era perfeito.
Um marido devotado.
Ela não deveria questionar.
Theo a levou a um restaurante discreto, mas sofisticado. O tipo de lugar que não gritava riqueza, mas exalava bom gosto. Helene se sentou de frente para ele, sentindo um misto de nervosismo e curiosidade. A cada movimento de Theo, ela notava algo novo. Como ele manuseava o garfo com tanta precisão, o jeito como suas mãos se moviam de forma calma e controlada, como se o tempo fosse uma abstração para ele.
Ele não era do tipo que falava demais, mas quando falava, sua voz era firme, segura, sem nunca ser excessiva. Cada palavra que saia de sua boca soava como uma escolha meticulosa, como se ele pesasse o significado de cada frase antes de pronunciá-la..
— O silêncio incomoda você? — ele perguntou depois de alguns minutos de conversa pausada.
Helene sorriu.
— Pelo contrário. Gosto de pessoas que não falam apenas por falar.
Theo a observou por um instante, e então ergueu a taça de vinho em um brinde silencioso.
— Eu gosto do seu sorriso — Theo disse de repente, interrompendo seus pensamentos.
Ela o encarou, surpresa.
— Ah, é? — perguntou, meio sem saber como reagir.
— Sim. — Ele deu um pequeno sorriso, o que fez seu coração disparar ainda mais.
Ela queria ele.
E pela forma como Theo segurou seu rosto antes de beijá-la pela primeira vez, ela teve certeza de que ele sentia o mesmo.
A casa era grande demais para ser silenciosa.
Helene se deu conta disso na terceira semana após a lua de mel, quando Theo começou a passar mais tempo no porão. No início, ela achou que era normal, afinal, um casal recém-casado precisa de tempo para se adaptar, certo? Ele sempre foi um homem reservado, com seus próprios hábitos e rotinas. Mas, às vezes, no meio da tarde, quando ela andava pelos corredores de piso de madeira impecavelmente encerados, sentia a casa vazia. Não era o silêncio pacífico de um lar. Era algo mais profundo.
Mas ela não podia deixar a mente divagar.
Theo era um bom marido. O marido perfeito.
Ele a tratava com carinho, comprava flores sem motivo, enlaçava sua cintura sempre que passavam tempo juntos. E sempre, sempre sussurrava que a amava.
O que mais ela poderia querer?
Helene subiu as escadas, arrumou os lençóis brancos da cama e tentou ignorar a pontada incômoda no peito.
Theo desceu para o porão logo depois do café da manhã. Ela viu quando ele pegou um copo d’água e a chave que mantinha sempre no bolso. Ouviu quando a porta se fechou com um clique.
E agora, quase duas horas depois, ele ainda não havia saído.
Ela se obrigou a ignorar.
O casamento era novo. Ainda estavam aprendendo a rotina um do outro. Se ele precisava de um tempo sozinho, ela não seria a esposa pegajosa que reclamaria disso.
Respirou fundo, passou um pouco de perfume nos pulsos e pegou a bolsa, talvez ela só precisasse de um tempo com as amigas. Era isso, ela sabia!
You don't have to lie to girls
If they like you, they'll just lie to themselves
If they like you, they'll just lie to themselves
A Itália foi escolha dele.
Helene sempre sonhou em viajar, e Theo a surpreendeu com passagens de última hora.
Em uma noite morna de verão, enquanto caminhavam por uma ponte de pedra em Florença, ele parou abruptamente.
Ela se virou, confusa, e viu que ele segurava uma caixinha de veludo nas mãos.
O anel brilhava sob as luzes da cidade.
— Você quer casar comigo? — ele perguntou, sem rodeios, sem discursos longos.
Simples.
Direto.
Perfeito.
Helene riu, sentindo o coração disparado.
— Você não vai nem se ajoelhar?
Theo ergueu a sobrancelha.
— Preciso?
Ela mordeu o lábio, olhando nos olhos dele.
Não.
Ele não precisava.
— Sim. Eu caso com você.
Ele sorriu e deslizou o anel em seu dedo.
Foi assim.
Sem grandes gestos dramáticos, sem lágrimas exageradas.
Apenas Theo sendo Theo.
E foi perfeito.
— Eu ainda não acredito que você casou primeiro que a gente — Claire comentou, mexendo o cappuccino com uma colher prateada. — E logo com Theo!
A risada de Helene soou natural, como se ela não tivesse passado a manhã inteira tentando ignorar os próprios pensamentos.
— Pois é… Eu mesma nem esperava.
— Ah, não se faça de desentendida — Zoey interrompeu. — Você sempre foi apaixonada por ele. Desde a época da faculdade.
Helene apertou os dedos ao redor da xícara. Ela gostava de Theo, claro. Mas quando ele finalmente demonstrou interesse por ela, foi como um sonho se tornando realidade. Ele era lindo, misterioso, bem-sucedido. O tipo de homem que todas olhavam com desejo.
E agora, ele era dela.
— E como está sendo? — Claire apoiou o rosto nas mãos, com os olhos brilhando de curiosidade. — A vida de casada?
Helene hesitou por um segundo.
O que deveria dizer? Que às vezes acordava no meio da noite e não o encontrava na cama? Que ele evitava falar sobre certas coisas, especialmente sobre o tempo que passava no porão? Que algumas vezes o pegava olhando para ela de um jeito… estranho? Mas isso não significava nada.
Theo era perfeito. O homem dos sonhos de qualquer mulher.
— Está sendo incrível — ela respondeu com um sorriso que quase soava verdadeiro.
As amigas suspiraram, invejando sua “sorte”.
— Você realmente tem tudo — Zoey comentou. — Um marido maravilhoso, uma casa linda… Ele te trata como uma rainha, não é?
Helene assentiu, ignorando o nó que se formou em sua garganta.
— Ele me ama.
E então, como para selar aquela mentira, ela enfiou um pedaço de bolo na boca, engolindo junto a inquietação.
All of your best excuses, no, they don't stand a chance
Against all the chances I give you
Isn't ideal, but damn
You don't even have to try, turn you into a good guy
Quando voltou para casa, o céu já estava tingido de laranja.
O carro de Theo estava na garagem, mas a casa ainda parecia estranhamente silenciosa.
Ela deixou a bolsa sobre a mesa, tirou os sapatos e passou os dedos pelos cabelos. Caminhou pela sala, apreciando os móveis elegantes que Theo escolhera. Cada peça exalava sofisticação. O gosto dele era impecável.
Mas algo parecia fora do lugar.
Um cheiro estranho pairava no ar.
Era sutil, quase imperceptível, mas estava lá. Algo metálico e enjoativo.
O coração de Helene deu um salto.
Ela virou o rosto para a porta do porão.
Fechada. Como sempre.
Mordeu o lábio. Sentiu a garganta secar.
Antes que pudesse pensar mais sobre isso, passos ecoaram no corredor.
Theo apareceu.
Ele usava uma camisa escura, os cabelos um pouco bagunçados e sorria. Mas algo em sua expressão a fez prender a respiração.
Seus olhos estavam… diferentes. Um brilho intenso, quase febril.
Ele abriu os braços.
— Eu senti sua falta.
Helene tentou rir, tentou parecer natural.
— Eu saí só por algumas horas.
— E pareceu uma eternidade.
Ele a puxou para um abraço, envolvendo-a com o calor de seu corpo.
Foi então que ela sentiu.
O cheiro.
Não era suor, nem perfume. Era algo mais denso, mais ferruginoso.
Sua mente imediatamente quis associar à cozinha. Talvez ele tivesse cortado carne, talvez tivesse derrubado vinho. Mas nada disso explicava por que suas mãos pareciam ter sido recentemente lavadas, como se estivesse se livrando de algo.
Helene ignorou o arrepio que subiu por sua espinha.
Ele era seu marido. Seu marido perfeito. Ele a amava.
Então ela fechou os olhos, afundou o rosto em seu peito e fingiu que não sentia nada.
— Você quer chá antes de dormir?
Theo ergueu os olhos.
Eles eram bonitos. Intensos. Escuros como um céu sem estrelas.
— Chá? — ele repetiu, como se estivesse se ajustando de volta à realidade.
— Sim. Camomila. Você parecia gostar antes.
Ele sorriu.
— Eu gosto.
Ela assentiu, aliviada por um momento, e se virou para preparar a bebida.
Sentiu quando ele se levantou e caminhou até ela.
Sentiu quando ele parou perto demais.
— Você cheira bem.
Helene riu.
— Deve ser o sabonete novo.
Theo não respondeu de imediato. Em vez disso, seus dedos deslizaram suavemente pelo braço dela, subindo até sua nuca.
O toque era gentil, mas algo nele fez a pele dela se arrepiar.
— Você confia em mim, não confia?
A pergunta fez seu estômago revirar.
Ela se virou devagar, forçando-se a encará-lo nos olhos.
— Claro.
Ele a observou por alguns segundos, umedecendo os lábios com a ponta da língua.
Então sorriu.
— Isso é bom.
Helene tentou rir, mas a risada morreu em sua garganta.
Era óbvio que confiava nele.
Theo era seu marido. Seu marido perfeito.
Ele a escolheu. Entre todas as mulheres, foi ela quem ele quis.
Ela não deveria duvidar.
Não precisava saber o que havia lá.
Não precisava perguntar.
Tudo estava bem.
Ele era o homem perfeito.
E o homem perfeito não teria segredos.
You don't have to lie to girls
If they like you, they'll just lie to themselves
If they like you, they'll just lie to themselves
Eles compraram a casa juntos.
Theo queria um escritório espaçoso. Helene queria um jardim.
Ele não reclamou quando ela escolheu móveis claros e delicados, e ela não questionou quando ele insistiu em manter o porão trancado.
— Espaço meu — ele explicou, e Helene aceitou sem hesitar.
Eles falavam sobre filhos às vezes.
— Dois — Theo dizia.
— Ou três.
— Dois — ele repetia, e Helene ria.
Nos domingos, cozinhavam juntos. Nos feriados, viajavam.
A vida era boa.
A vida era perfeita.
You don't have to lie to girls
If they like you, they'll just lie to themselves
If they like you, they'll just lie to themselves
— Bom dia — ela disse, tentando parecer natural.
Theo ergueu os olhos, e seu sorriso se formou rapidamente.
— Bom dia, meu amor.
Ele se inclinou e pressionou um beijo em sua testa, demorando-se ali por um segundo a mais do que o necessário.
Helene fechou os olhos e tentou se concentrar no momento.
Ele era carinhoso.
Era atencioso.
— Fiz café — ele avisou, indicando a xícara fumegante no balcão.
Ela pegou a bebida, soprando levemente antes de tomar um gole.
E então, hesitante, olhou para ele.
— Você… dormiu bem?
A pergunta era simples, mas havia algo na forma como Theo a observou que a fez se arrepender imediatamente.
Ele inclinou a cabeça, como se estudasse cada traço de sua expressão.
— Dormi. Por quê?
— Eu… — Helene forçou um sorriso, tentando disfarçar o desconforto. — Só achei que você tivesse saído da cama.
Theo ficou em silêncio por um instante.
Depois sorriu.
— Acho que você sonhou.
Ela piscou, surpresa pela resposta imediata.
— O quê?
— Você estava dormindo profundamente quando eu me levantei para ir ao banheiro. Talvez tenha sentido minha falta e imaginado que eu não estava ali.
Sua voz era suave, quase hipnotizante.
Helene abriu a boca para argumentar, mas então parou.
Ele parecia tão seguro. Tão calmo.
Talvez… talvez ele estivesse certo.
Talvez ela estivesse exagerando.
— Você pode ter razão — murmurou, desviando o olhar para a xícara.
Theo soltou uma risada baixa.
— Sempre tenho.
O tom era brincalhão, mas Helene sentiu um arrepio.
Ele pegou sua xícara e tomou um gole do próprio café.
— Você tem planos para hoje?
A pergunta foi casual, mas algo nela a fez hesitar.
Ele nunca perguntava isso.
— Eu… acho que vou encontrar as meninas de novo.
— Hm.
Só isso.
Nenhum protesto, nenhuma sugestão alternativa. Apenas um som neutro, como se não fizesse diferença.
Ela não sabia dizer se isso a aliviava ou a deixava mais nervosa.
Theo deu a volta no balcão, passando os dedos por sua cintura enquanto pegava a carteira.
— Não se esqueça de que eu te amo, Helene.
A forma como ele disse aquilo foi estranha.
Não era um “eu te amo” jogado no meio da conversa.
Foi um lembrete.
Helene sentiu um nó na garganta, mas sorriu.
— Eu também te amo.
You don't have to lie to girls
If they like you, they'll just lie to themselves
Don't I know it better than anyone else?
If they like you, they'll just lie to themselves
Don't I know it better than anyone else?
— O que você está pensando? — ele perguntou, o olhar fixo nela com uma curiosidade genuína.
Helene não soube ao certo como responder. Estava feliz, isso era certo, mas o que realmente a fazia sentir essa paz era ele, a forma como ele a fazia sentir segura, como se nada pudesse dar errado enquanto ela estivesse ao seu lado.
— Em como você é tudo o que eu sempre quis — disse, as palavras saindo sem pensar.
Theo a olhou, com os olhos brilhando de surpresa, mas logo ele sorriu, aquele sorriso que a fazia derreter por dentro. Ele pegou sua mão, segurando-a com delicadeza, como se fosse algo precioso.
— Você é tudo o que eu sempre quis também. — A voz dele estava calma, mas havia uma sinceridade em cada palavra.
Aquele momento, simples, mas cheio de significado, a fazia se sentir a mulher mais feliz do mundo.
— Eu nunca imaginei que seria assim... — ela murmurou, olhando para as mãos entrelaçadas. — Nunca imaginei que encontraria alguém como você.
Theo deu um pequeno suspiro, mais como se estivesse aliviado do que qualquer outra coisa. Ele se inclinou para mais perto, com os olhos fixos nela, seu toque agora mais firme.
— Eu também não. Mas estou feliz que tenha sido você. E, a partir daqui, só vai melhorar. — Ele falou isso com uma segurança que a fazia acreditar em cada palavra.
Ela assentiu. Estava tão segura, tão tranquila com ele. Não havia dúvidas. Ela sabia que, com Theo, sua vida seria perfeita. Não havia mais nada que ela precisasse.
— Você me faz sentir tão bem... tão... feliz — ela disse, quase sussurrando, como se aquelas palavras fossem um segredo que ela precisava dividir apenas com ele.
Theo, com aquele sorriso que fazia seu peito apertar, a puxou levemente para um beijo rápido. Quando se afastaram, ele disse:
— E você vai sempre ser a minha felicidade. Não importa o que aconteça.
Ela se sentiu protegida, amada. Como se, naquele momento, nada mais importasse.
Theo era tudo o que ela precisava, tudo o que ela sempre quis.
Com ele, tudo estava certo.
E ela queria acreditar, de todo o coração, que nada jamais mudaria isso.
O jantar estava silencioso.
Helene tentava se concentrar no prato à sua frente, mas cada garfada parecia pesada, sem sabor. Theo estava sentado à sua frente, comendo tranquilamente. Seus movimentos eram sempre precisos. Cortes exatos, mastigação controlada, postura impecável.
A perfeição dele sempre a fascinou.
Mas, agora, ela não sabia dizer se isso a tranquilizava ou a incomodava.
Ela girou o garfo nos legumes e olhou para ele, tentando ignorar a tensão em seu peito.
— Como foi seu dia?
Theo ergueu os olhos, como se a pergunta fosse inesperada.
Ele piscou lentamente antes de responder.
— Produtivo.
E nada mais.
Nenhum detalhe, nenhuma história. Apenas aquela resposta vaga que parecia encerrar qualquer possibilidade de continuar a conversa.
Helene forçou um sorriso.
— Que bom.
Ela queria perguntar mais.
Onde você esteve? O que fez? O que há naquele porão?
Mas sabia que perguntas assim eram desnecessárias.
Theo não gostava de ser pressionado.
E ela era uma boa esposa.
Uma esposa perfeita para um homem perfeito.
Então, engoliu suas dúvidas junto com um pedaço de frango e tentou acreditar que tudo estava exatamente como deveria estar.
Ele parecia relaxado.
Normal.
Então, por que ela sentia aquele aperto no peito?
Suspirando, se levantou.
— Vou tomar um banho.
Theo apenas assentiu, sem tirar os olhos da tela.
Helene tentou ignorar a sensação de que algo estava errado e foi para o banheiro.
A água quente escorria por sua pele, e ela fechou os olhos, tentando organizar seus pensamentos.
Theo era um bom marido.
Ele nunca gritou com ela, nunca foi agressivo.
Ele era gentil, protetor, atencioso.
Talvez um pouco distante às vezes.
Mas isso não significava nada.
Cada homem tinha seus próprios segredos.
E tudo bem.
Certo?
Ela abriu os olhos e desligou o chuveiro, sentindo a pele quente e avermelhada.
Se enxugou rapidamente e vestiu a camisola antes de voltar para o quarto.
Mas, assim que abriu a porta, seu corpo travou.
O tablet de Theo estava largado sobre a cama.
E ele não estava lá.
Helene franziu a testa, dando um passo hesitante para dentro do quarto.
Seu coração batia rápido, e ela tentou se convencer de que isso era uma reação exagerada.
Talvez ele tivesse ido beber água.
Ou talvez…
Seu olhar deslizou para a parte de baixo da casa, onde ficava o porão.
Quando caminhou em direção às escadas, descendo uma e parando sobre os degraus da outra, percebeu.
Ela estava entreaberta.
Helene sentiu um frio na espinha.
Ela não deveria descer.
Sabia disso.
Mas, antes que pudesse pensar, seus pés já estavam se movendo.
Cada passo ecoava nos degraus de madeira, o ar ficando mais frio conforme descia.
O cheiro estava ali.
Aquele cheiro metálico e químico que sempre pairava quando Theo passava horas ali embaixo.
Seu estômago revirou, mas ela continuou.
A luz vinha de uma lâmpada fraca no teto, e sombras dançavam pelas paredes de pedra.
Então, ela o viu.
Theo estava de costas para ela, ajoelhado diante de uma mesa.
E, sobre a mesa, havia algo que Helene não conseguia identificar de imediato.
Algo envolto em plástico grosso.
Algo… grande.
A respiração dela ficou presa na garganta.
Ela abriu a boca para falar, mas, antes que qualquer som escapasse, Theo se virou.
Os olhos escuros a encontraram no mesmo instante.
Por um longo segundo, ninguém se mexeu.
Então, ele sorriu.
E, naquele momento, Helene percebeu algo.
Algo que tentou ignorar por tempo demais.
Havia algo muito errado com seu marido perfeito.
— Helene. — sua voz saiu baixa, quase um sussurro. — Você não devia estar aqui, amor.
Ela tentou engolir em seco, mas sua garganta parecia um deserto.
Seu olhar deslizou para a mesa.
Para o plástico grosso.
Para a mancha escura que se acumulava ali.
Para o corpo.
Seu corpo inteiro ficou tenso, e uma parte dela quis acreditar que aquilo era outra coisa.
Qualquer coisa.
Mas o cheiro metálico no ar contava uma história diferente.
Theo suspirou calmamente, como se tivesse acabado de cometer um pequeno erro de cálculo.
— Droga, querida. — Ele balançou a cabeça e, então, se levantou. — Agora vou precisar te matar também.
You don't have to lie to girls (Don't have)
If they like you, they'll just lie to themselves
Girls will cry, and girls will lie
And girls will do it 'til they die.
Fim.
Nota da autora: Essa história não é só sobre Helene e Theo. É sobre todas as vezes que nos convencemos de que está tudo bem, quando sabemos que não está. Sobre os sinais que vemos, mas escolhemos ignorar. Sobre as mentiras que contamos a nós mesmas porque a verdade, às vezes, parece difícil demais de encarar.
Helene insiste em acreditar no conto de fadas. Mas e você? Quantas vezes já vestiu essa mesma venda?
Espero que essa história te prenda, te intrigue, mas, acima de tudo, te faça refletir. E se, em algum momento, você se reconhecer nas entrelinhas, lembre-se: você não está maluca. Você está enxergando a verdade.
Boa leitura! 💜
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