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Capítulo Único


As festas da Cornell eram uma droga.
Começavam com música mediana e iam decaindo como uma gangorra. A cerveja era a mais barata possível, porque era mais interessante gastar o dinheiro com as drogas, e a pornografia saía das telas de computadores e iam direto para o plano físico, bem em cima da mesa de sinuca ou nos cantos mais escuros da fraternidade. Soava como o sonho universitário de qualquer calouro. sabia bem disso — porque já tinha sido uma delas.
Mas, bem, mostrar os peitos como Kat Stratford em 1999 não parecia mais tão legal assim.
Não que Havens já tenha feito esse tipo de coisa. Ah, de jeito nenhum. Ela era recatada demais para isso, pelo menos era o que seus melhores amigos Dom e Charlotte diziam — fazendo um adendo sobre o fato de ser desajeitada e invisível com grande potencial para ser facilmente ignorada ou ridicularizada. Mas uma deusa do caos morava em silêncio naquele interior turbulento de garota gentil, e desejava o tipo de vida abundante que fluía dentro de festas clichês como aquela.
Isso foi até começar a tirar A em todas as disciplinas. Até ser chamada para conduzir o decatlo acadêmico. Até ser a cabeça e co-autora de projetos científicos junto com outros engenheiros químicos, e também, de praxe, passar para a equipe de atletismo. O plano original era tentar uma vaga no clube de líderes de torcida, mas isso também servia. Ambas as coisas deixariam seus pais felizes.
E tudo que queria era deixar seus pais felizes. De verdade. Até porque, se parasse para pensar no que queria além disso, não conseguia pensar em nada.
Até aquela festa de merda da Cornell.
não o viu de primeira. Era tanta gente, tantas luzes, tanta música e tanta fumaça que era impossível reconhecer rostos específicos. Nem mesmo Dom, que estava muito ocupado flertando com um carinha qualquer no meio da multidão, conseguiu gesticular com a cabeça nos horários vagos em que o outro olhava para o lado, para que “julgasse” se ele deveria investir ou não. Como ela saberia? Não conseguia ver nada. Mas ele era alto, bem alto. E aquela sujeira no rosto parecia ser uma barba.
Foi quando outra sombra, bem alta e larga, se aproximou dela na pia da cozinha. Era o único lugar onde conseguia se recostar sem ter os ombros esfregados pela multidão estarrecida, e onde a bebida estava sempre disponível à mão, porque pelo menos, a Cornell tinha a brilhante ideia de espalhar bolsas térmicas pela casa, ou a bela cozinha da mãe de estudante X estaria seriamente arruinada.
deu licença para que o cara ligasse a torneira para lavar as mãos, sem dizer uma palavra. Com os olhos baixos, reparou furtivamente nas veias saltadas e nos dedos pálidos, junto com uma pulseira fina e gasta de barbante vermelho. Uma muito parecida com…
— Você também acredita? — o dono das mãos perguntou abruptamente, e como era possível que sua voz fosse perfeitamente audível mesmo com toda a música infernal soando ao redor?
fez uma expressão desentendida, erguendo o queixo para finalmente olhá-lo. Porra, ele era um gato.
— O que disse?
— Perguntei se também acredita nos fios vermelhos — ele apontou com o queixo para o pulso onde ela segurava o copo de plástico. Um fio de barbante gasto e velho contornava seu pulso, exatamente igual ao dele.
— O que tem neles pra acreditar? — perguntou, confusa. O cara abriu um sorriso divertido, um sorriso ridiculamente atraente.
— A cultura japonesa diz que essas coisinhas atraem as almas gêmeas. Que existe um fio vermelho do destino que une duas pessoas, e que elas vão se encontrar em algum tempo indefinido. Também dizem que essa predestinação acontece em várias vidas, de diferentes formas — ele gesticulou com as mãos na explicação, recostando-se na bancada, como ela, assim que fechou a água — É uma ideia interessante. Poupa muito trabalho nessa parte da vida, não acha?
piscou os olhos, descrente. Abriu e fechou a boca várias vezes antes de finalmente responder:
— Você disse almas gêmeas? — ela frisou, sufocando um riso — É assim que você flerta?
— Ah, não estou flertando com você. Definitivamente não estou — ele usou do mesmo tom, arqueando as sobrancelhas para reiterar a fala. Os ombros de baixaram, sentindo-se levemente… ofendida? — Ah, não entenda errado, você é bem bonita, é claro que é digna de flerte, na verdade, de muitos flertes, mas não estou fazendo isso. Acredite, se eu quisesse dar em cima de você, você nunca saberia.
— E por que não?
— Porque sou péssimo nisso. Não consigo alinhar interesses reais com minhas atitudes, isso confunde as pessoas. Como agora — ele apontou para a linha vermelha no braço novamente, e sufocou mais uma risada.
— Tá, tudo bem… mas como pode acreditar nessa coisa de almas gêmeas? Não é nada científico e muito menos atraente.
— Não gosta da ideia de passar o resto da vida com a mesma pessoa? — ele ergueu uma sobrancelha.
— Isso se chamava casamento, e o pretérito perfeito na frase explica bem o sucesso dessa dinâmica.
— Casamento é um pedaço de papel. Estamos falando de amor aqui, senhorita Cética — o cara desconhecido abriu um sorriso desafiador enquanto gesticulava novamente com os braços, como se estivesse empolgado — Essa coisa que é maldição e benção ao mesmo tempo, torna o sexo melhor, tira a nossa visão e destrói sanidades… existe uma única pessoa assim no mundo pra você, não importa quantos tenham passado no meio do caminho. Consegue entender isso?
mordiscou o lábio inferior ao mesmo tempo em que franziu o cenho. Minha nossa, que cara mais estranho. Estranho e tagarela. Estranho e lindo de morrer. Ou são as luzes e o álcool fazendo o trabalho de sempre? Mas uma coisa era certa: estranho. E não sabia se era prudente conversar em uma festa com um estranho, mesmo que elas tecnicamente servissem pra isso.
— Consigo entender que você parece estar tentando vender uma filosofia oriental pra uma pessoa que passa o tempo lendo a revista Science. Não vai dar muito certo.
— Vender? Acha que tenho potencial pra isso? — ele riu, aproximando-se um pouco dela — Tudo bem, eu confesso, sou um pouco prolixo. A maior dificuldade dos meus 25 anos de vida é de chegar ao ponto, ser objetivo. Porque tudo que eu queria era perguntar como você tem essa coisinha vermelha amarrada no pulso.
deu de ombros.
— Prendedor de cabelo, talvez?
O cara fez uma careta de desaprovação.
— É um prendedor de cabelo bem decepcionante. Posso continuar acreditando que mais alguém compartilha do mesmo interesse que eu pelas culturas alheias?
— Não posso não permitir, senhor Alma Gêmea, mas espero que não se decepcione depois.
— Por não encontrá-la? Ah, já tô preparado pra isso. Antes de tudo: sou jovem, adulto em formação e… — ele remexe nos bolsos, puxando a metade de um baseado e um isqueiro — Completamente inconsequente.
não segurou a gargalhada que rugiu do nada em sua garganta, levando o garoto a fazer o mesmo enquanto tentava prender a bituca entre os dentes.
— Que legal, você realmente me enganou. Era isso que queria o tempo todo?
— O quê? Fumar um baseado? Pode ter certeza — ele disse enquanto ligava a chama na ponta e puxava para dentro uma vez.
— Você queria jogar conversa fora — disse ela, com um revirar de olhos. Ele deu de ombros, soltando a fumaça presa na garganta pela boca entreaberta.
— Sempre quero jogar conversa fora, senhorita Curie. Ainda mais quando elas acontecem de um jeito tão bizarro quando eu só vim limpar a sangria que derrubaram em mim — ele riu, puxando o baseado para prendê-lo entre os dedos — E você? O que quer agora?
não respondeu imediatamente. Apenas repuxou os lábios e estreitou os olhos na direção dele.
— Quer mesmo saber?
— A pergunta foi feita.
— Estou louca por um pacote de Thin Mints.
O cara bonito a encarou por alguns segundos antes de sorrir indecentemente e tragar mais uma vez a erva, assentindo com a cabeça lentamente enquanto soltava novamente a fumaça para o lado.
— Tudo bem. Você provavelmente é uma adoradora da ciência, mas parece ser legal, então vou te fazer esse favor. Vamos — disse ele, começando a sair para o outro lado.
— Espera. O quê?
Ele voltou-se para ela, dando de ombros.
— Você não quer biscoitos recheados? Pois então, conheço um cara — ele respondeu naturalmente, como se lhe informasse as horas — Ele não costuma ficar muito, então melhor se apressar.
ainda estava parada. Ainda estava se perguntando se aquilo era sério. Esse cara parecia ser o tipo perfeito de uma confusão bem… confusa. Aquele tipo de gente bonita que era cativante e misteriosa, que deviam guardar um passado difícil e uma enorme faixa de identificação que faria perder a cabeça e se distrair com essas coisas tolas.
Ela nunca o tinha visto. E era uma ótima fisionomista, sendo uma bela vantagem no futuro ofício, mas não conseguia trazer aquele rosto na memória. Ele era novo? Era amigo de algum daqueles garotos? Será que tinha mesmo 25 anos? Tinha idade pra estar fumando maconha de um jeito tão desinibido?
Ela olhou rapidamente para o lado. Dom havia sumido. Charlotte estava muito ocupada em uma viagem de família para a casa do lago. Não existiam mais amigos ou pessoas a quem ela pudesse cumprimentar e trocar umas risadas. Não existiam paqueras em potencial, porque provavelmente a pose de desinteresse de os afastava, sempre os afastou, mesmo que fosse algo automático e sem intenção.
Mas sua pose não afastou aquele cara estranho, e era uma festa, e as festas da Cornell sempre eram uma droga…
Por isso ela caminhou até ele, largando o copo em cima de alguma mesa.
— Tudo bem — murmurou, sem se importar se a música o deixaria ouvir ou não.
O cara abriu um grande sorriso, jogando o restante do baseado no chão e puxando uma pequena caixa de som dos bolsos, tão compacta quanto um fone sem fio.
— Acho que não te assustei tanto assim — ele disse em alívio e soltou uma risada. Seus pés começaram a se mover novamente para a multidão, mas logo ele parou, virando-se para — Ah, me esqueci de um detalhe: você prefere seus Thin Mints batizados ou naturais?
arregalou um pouco os olhos, mas não pensou muito antes de responder:
— Tanto faz.

🎯

David não imaginava que a Cornell poderia ser tão imutável.
Com o século 21 e as redes sociais, era de se esperar que um dos prédios mais antigos do país recebessem carinhas novas e uma montanha de ideias progressistas que destruiriam rotinas tradicionais insuportáveis que o fizeram ir embora da primeira vez. Era uma esperança crescente quando desceu daquele avião, quando cruzou aquele aeroporto e quando disse o primeiro cumprimento em 2 anos ao seu pai, o grande doutor David da 1º Vara Criminal.
Mas, bem, aparentemente, não era apenas a Cornell que continuava a mesma. Aquela casa, aquela cidade e aqueles jantares executivos estavam no mesmo lugar. E os mesmos acordos que tanto tentou correr também estavam ali, de pé.
abominava todas as regalias impostas de um herdeiro, mesmo que não soubesse exatamente como fugir delas.
Uma dessas formas era fazer o que literalmente quisesse no tempo livre. Como fazer umas tatuagens, competir em algumas rodadas de jogos eletrônicos, fumar um baseado no telhado e, claro, frequentar as festas chatas da universidade.
Festas imutáveis. As mesmas de sempre. Com as mesmas pessoas, ainda que os rostos tenham mudado ou sido substituídos por novos.
Até que um desses rostos se fez presente como uma chama diferente. acreditava em poucas coisas na vida, e as que acreditava fugiam do padrão social. Era um leitor assíduo, um estudante avançado em Literatura-Italiana e devorador de gente apaixonada fora da realidade. Era bom conhecer todos os lados das visões de mundo das pessoas, e a de poetas loucos e bêbados o atraíam mais do que livros de economia e medicina baratos. Sua filosofia de vida estava inteiramente ao lado de Robin Williams em “Dead Poets Society”, mesmo que às vezes achasse que aquele professor poderia dar algum crédito à matemática da vida.
Havens parecia totalmente inclinada ao lado realista da vida. Ele soube por cada detalhe daquele rosto vasculhando o ambiente. Um olhar que quer enxergar mais do que vê, e enxergar principalmente os motivos por trás de tudo. Essas coisas poderiam certamente irritá-lo em qualquer outra situação, mas ele viu o fio vermelho em seu pulso. Viu a mecha de cabelo que caía em sua sobrancelha, e viu suas bochechas levemente coradas quando ele se aproximou da pia. E talvez tenha sido guiado por uma rápida e distante vontade de deixar o pouco álcool fazer seu trabalho e, como gostava de dizer, jogar um pouco de conversa fora.
Agora ele tinha o número de Havens e não fazia ideia do que faria com ele.
Compartilhar Thin Mints batizados ou não com uma garota não era uma novidade. tinha muitos amigos em Nova York, assim como em todos os lugares em que já esteve na vida. Sua vida parecia ser um livro aberto porque não tinha muito o que esconder — todos sabiam quem era David, e o que ele fazia. Ou simplesmente mostrava o que queria e sabia muito bem sustentar o personagem.
No entanto, aquela garota não parecia alguém… minimamente conhecedora dele. Nem mesmo quando disse seu nome mais tarde, chapados em cima do gramado. Nem mesmo quando contou de seu MBA finalizado com louvor em Oxford. Nada disso a fez ter ideia sobre quem ele era.
E isso era interessante. Muito interessante.
Se tornou ainda mais surpreendente quando a viu pela segunda vez, naquela festa repentina de Diego, que tinha uma decoração, no mínimo, exótica.

não sabia pra onde olhar primeiro.
A piscina de bolinhas seria uma opção interessante se não estivesse tão ocupada com bolhas de sabão e fios de chocolate derretidos. As lanternas de papel poderiam iluminar melhor se não tivessem formas estranhas de pênis e bolas de futebol americano. A água da piscina em cor esverdeada não a dava vontade nenhuma de arriscar uma loucura e, claro, os trampolins e gangorras no jardim também não pareciam em nada com uma festa universitária normal.
Bem, estavam certos. As festas de Riley Diego nunca eram nada parecidas com o normal.
O garoto tinha vivido a vida inteira em colégios internos e via seus pais 3 vezes por ano, o que as pessoas queriam?
Era provável que, novamente, não deveria estar ali. Mas essa era uma das vantagens das festas de Riley: ele contratava garotas. Pra todas as finalidades. Desde passarem a noite fingindo uma briga na piscina de espuma sem sutiã, manter a sujeira das bebidas e drogas bem longe do sofá caríssimo da mansão e, claro, servir bebidas e preparar drinks caso seu conhecimento fosse avançado a esse nível.
não era boa nessa parte, que ficava muito bem estabelecida nas mãos de Charlotte, mas servir bebidas para Riley e sua multidão trazia sempre boas gorjetas.
Foi em um desses momentos, em que ela tentava equilibrar um copo de cerveja e outro de algum coquetel colorido em cima de uma superfície lisa de madeira que servia como bandeja que esbarrou com o mesmo garoto de algumas semanas atrás, um que facilmente esquecera o nome, mas provavelmente nunca esqueceria seu rosto.
? — pelo visto, se lembrava das duas coisas. No meio da multidão, percebeu que sentiu quase a mesma coisa de quando o encontrou pela primeira vez, talvez com uma intensidade ainda maior. Estrelas nos olhos. A dominação daquele sorriso radiante.
— ela o retribuiu, com um sorriso torto.
— Uau. Não esperava te ver aqui. Eu deveria esperar? — ele torceu a boca em zombaria. umedeceu os lábios e revirou levemente os olhos. Como ele saberia que ela estaria ali se não tinha entrado em contato desde que pegou seu número?
– Não faço ideia. Não estou exatamente na festa — ela ergueu as duas bebidas, e havia acabado de reparar na blusa de mangas que mostravam o umbigo e os jeans de cintura baixa que marcavam bem o quadril. O típico uniforme das garotas de Diego.
— Ah… Grana pra um headphone novo? — brincou, dando de ombros.
— Um airpods, na verdade. Os meus quebraram e não sei o que vou fazer se ficar mais um dia sem Black Eyed Peas.
A música alta ao redor era estonteante e enérgica. O mesmo clima de barulhos altos estava sempre entre e , mas, de alguma forma, ele sempre a escutava perfeitamente. E escutou muito bem quando ela falou sobre sua banda favorita.
— Você gosta de Black Eyed Peas? — ele franziu o cenho.
— Existe alguém que não gosta?
Talvez garotas cientistas como você, ele pensou em dizer, mas soaria muito arrogante. Ele não teve exatamente tempo para julgar sua personalidade sem erva no corpo.
— Imagino que muita gente maluca não goste. E qual sua música favorita?
poderia responder, se não fosse o esbarrão em seus ombros que a fez se lembrar repentinamente de que ainda estava em uma festa e que ainda precisava fazer o necessário pelos dólares de Diego, e esse algo não incluía bater papo com David, seja lá quem ele fosse de verdade.
— Acho que vou ter que te responder depois — ela apontou para a pequena bandeja, e ele assentiu.
— A que horas você termina? — ele perguntou com o tom zombeteiro. riu.
— Ao fim da festa. Você já deve saber.
— Claro que sei. Já se exercitou em cima de um trampolim?
— Fala das camas elásticas que ele colocou lá fora? Não, obrigada, não posso me dar ao luxo de quebrar uma perna.
— Ah, vamos — a impediu de dar um passo à frente, colocando-se diante dela — Você não pode estar com medo de um brinquedo infantil.
Ela tinha um pouco de medo, na verdade. Há 10 anos, Havens tinha vivenciado o esplendor de quebrar um braço naquela coisa quando inventou de entrar nele junto com uma criança da vizinhança que era estupidamente maior e mais enérgica do que ela, a garotinha franzina. O resultado desastroso consistiu em sua mãe desesperada e super protetora batendo na porta dos vizinhos exigindo que pagassem as despesas médicas e, de quebra, que aquele garoto a pedisse desculpas.
Bem, certas coisas não eram aceitáveis para o cérebro de , e camas elásticas podiam ser também.
Você já tem 22 anos, pare com isso.
— Não tenho medo de brinquedos — ela pensou em completar, mas recebeu outro esbarrão e desta vez, ele veio acompanhado de um olhar feio de Kate lá do outro lado, que com certeza reclamaria de estar entregando as bebidas sozinha — Te encontro depois.
— Nos trampolins? — ele perguntou com um sorriso enquanto a via se afastar. sufocou um sorriso pelo desafio.
— Espere e veja.

🎯

Antes daquela noite, soube apenas previamente sobre a existência de David.
Era um cara mais conhecido do que pensou. Popular, bonito e inteligente. Grandes coisas rodeavam essa popularidade massiva que o tornava extremamente magnético: seu dinheiro, sua família, suas formações e, claro, sua ex-namorada.
Em Cornell, todo mundo já tinha ouvido falar de Tabi Young.
Modelo desde criança. Estudou Moda e Design por dois semestres antes de ser chamada para trabalhos fixos na Europa, e agora só era vista exclusivamente por outdoors e sua página no Instagram. Linda de morrer, exatamente o tipo de garota que soava como inalcançável. Ainda tinham algumas fotos dos dois em seu perfil para quem quisesse descer o feed demais, mas era apenas aquilo. Ou o que parecia.
O que Charlotte disse era muito claro: ela foi embora, qual é. Manter as fotos de um relacionamento antigo no perfil é totalmente comum pra um cara low profile, e ex-namorados ainda podem se dar bem, não podem?
Claro que podiam. Essa nem era a questão mais importante para . A questão era: por que se sentia extremamente atraída por aquele cara, a um ponto de encerrar seu famigerado expediente antes da hora para caminhar até o jardim, se desvencilhando de corpos despencados pelas misturas e de casais fazendo o que ela não sabia que queria tanto fazer até enxergar e sua fumaça andando em círculos na grama.
Por mais estranho que parecesse, talvez quisesse muito aceitar o convite da cama elástica. Se tudo desse errado, ficaria muito claro como suas decisões tomadas sozinhas eram estúpidas; começaria a duvidar de seu próprio julgamento.
virou para ela a poucos segundos de ser alcançado, jogando a bituca para o lado. Desta vez era cigarro, não maconha — não que melhorasse muita coisa.
— O trampolim te convenceu? — perguntou com um riso. revirou os olhos.
— Ele é maior do que pensei. Os riscos de acidentes foram reduzidos com sucesso.
— Os dias passam bem mais fácil quando a gente não pensa nessas coisas — com uma piscadinha, o rapaz se virou para o brinquedo, esticando as pernas para o alto até conseguir se colocar acima da superfície elástica. reparou novamente em como ele era alto, e uma parte da camiseta se levantou quando ele colocou os braços para cima, revelando também músculos definidos de alguém que certamente não passava a maior parte do tempo sentado na frente de um computador.
se equilibrou perfeitamente por cima da área irregular do brinquedo, e puxou dos bolsos aquela caixinha de som minúscula novamente, apertando em um botão a tempo de fazer soar Meet Me Halfway.
soltou uma risada pelo nariz. Ele estendeu o aparelho em sua direção, chamando-a para perto com uma sobrancelha erguida, fazendo um convite para que a garota apreciasse a vibe de histórias fantásticas que envolviam lagos estranhos e árvores sonhadoras que aquela música trazia.
Tudo que Black Eyed Peas cantava podia ser levado para um tom literal de devaneio.
No entanto, seguia dizendo:
— Acho que isso não vai dar certo.
deu um longo suspiro, pulando levemente uma vez.
— Você viu? — ele usou os braços para gesticular na direção dos apoiadores — São seguros. Tenho 1,80m, e te juro que Pierce Gow do time de futebol americano foi visto nessa mesma cama elástica há 2 horas atrás. Diego sabe bem onde comprar essas belezinhas, não tem com o que se preocupar.
Ela pensou em dizer: “Preciso de mais informações”, mas não gostou em nada da forma como soou fazendo isso. No fundo, queria enrolar a decisão de andar e subir naquela coisa porque gostava da forma como insistia por ela. Coisa de gente egocêntrica, talvez? Bem, nunca parou pra pensar que não era uma.
Com um sorrisinho de canto, ela caminhou até o brinquedo e aceitou as mãos dele para puxá-la para cima, e se agarrou com mais força em seus braços quando sentiu a extensão mole e desigual sob os pés, responsável por causar um sentimento de incerteza absurdo.
Com uma risada, disse a :
— Pode ficar tranquila. Não vou te deixar cair.
Ela revirou os olhos, mas acreditou nele. O aperto em volta de sua cintura dizia tudo. Estranhamente, aquele cara não a deixava ficar com medo de muita coisa.
Movendo os pés devagar, deu a ela a segurança suficiente para que fizesse o mesmo e, em pouco tempo, os dois estavam se movimentando juntos, impulsionando-se para cima com perfeito equilíbrio — afinal, saltar de trampolim não era algo que se desaprendia — e com muitas risadas, como duas crianças que faziam uma dança esquisita ao som de I Gotta Feeling.
Ali, talvez, estava uma característica que se esqueceram de colocar na ficha popular de David: ele era engraçado. Muito. E cada vez que via a face de se tornar um pouco mais pálida pelo medo de sair voando dos limites do brinquedo, ele tratava logo de se aproximar e focar os olhos dela apenas nele, fazendo movimentos engraçados e distraindo a atenção dela do pior que poderia nem acontecer.
Quando se cansaram o suficiente, deixou o corpo cair de livre e espontânea vontade no tecido grosso, segurando a barriga enquanto ria do garoto que lançou as costas com força na lona, fazendo com que o corpo dela fosse atirado para cima e voltasse a cair de novo, de costas.
! — ela gritou do ar, mas já estava gargalhando de novo quando caiu — Você é um doido do cacete.
— Ainda bem, senhorita cientista — ele riu ofegante, relaxando o corpo ao lado dela até que a superfície mole abaixo deles se estabilizasse e só ouvissem as respirações voltando ao normal à medida que I Just Can’t Get Enough começava.
Aquela música. Era tão especial e tão foda que não se segurava para começar a cantarolar. Toda a história que a rodeava era legal, mesmo que não tenha acabado bem, mas detestava focar no fim abrupto das coisas. abriu a boca para cantar junto, mas vê-la encarando o céu enquanto movia os lábios em I’m addicted, wanna jam inside your love o dava certa impressão de que ela estava feliz.
Bem, ele sabia que ele estava feliz.
— Posso perguntar como gosta tanto de uma das melhores bandas dos anos 2000?
virou a cabeça para ele, dando de ombros.
— Quando eu tinha 17 anos, um ex-namorado me mostrou. Ele não gostava tanto, só dizia que era o som que não podia faltar em uma festa.
piscou os olhos várias vezes antes de erguer o corpo para cima e apoiar-se em um dos cotovelos, olhando-a com descrença.
— Não brinca — arfou, com uma risada — Também os conheci melhor com uma ex.
— Caramba… — riu, balançando a cabeça — Como eu disse, o cara não se interessava muito pela mágica de R&B com hip-hop de qualidade. Acho que disse que gostava só pra me impressionar, ou sei lá o que. Você não está tentando me impressionar, está?
— Acha que alguém que sabe cantar My Humps de trás pra frente e foi em 4 shows só na América quer te impressionar?
segurou uma risada, junto com o lábio inferior entre os dentes.
— Você está certo. Seria um trabalho e tanto — ela voltou o olhar para o céu novamente, respirando fundo — A sua ex também gostava de verdade ou é mais uma dessas que queriam impressionar?
não respondeu por um momento. A dúvida de que ela poderia ter, finalmente, sabido sobre ele não o atormentava, mas também não animava. era um ponto fora da curva e ele nem sabia o porquê. Não sabia que era um cara tão egocêntrico assim pra se interessar por garotas que não tinham conhecimento algum sobre ele. Mas, bem, considerando os olhares que receberam nesta festa até essa cama elástica, e na anterior, não era impossível que alguém não contasse a ela.
— Ela é uma pessoa legal. Não precisa impressionar ninguém, sabe? É inteligente e determinada. Só é… complicada — não existia palavra que a descrevesse melhor. A visão marcante de Tabi em todo o relacionamento deles invadia seus pensamentos vez ou outra, e a única palavra que melhor chegava perto de tudo que aquilo tinha sido era… Complicado — Eu também sou um pouco, eu acho.
encarou o escuro acima dos olhos diante do tom sério e repentino do cara. De repente, os dois já tinham entrado numa redoma de silêncio mútuo, sem qualquer constrangimento ou necessidade de conversas.
— Acho que também sou complicada — ela murmurou depois de um tempo, lembrando-se das exigências tolas que fazia a Dean naquela época conturbada e em como tudo soava como culpa dele.
a encarou pelo canto do olho, logo depois voltando a olhar na mesma direção que ela: o tapete de estrelas acima. Era muito fácil conversar com Havens, e se sentir confortável com isso.
— Então parece que nós somos os ex complicados.
virou a cabeça a tempo de rir dele, e a aproximação de seus corpos fez com que ela sentisse seus dedos se esbarrando, e não se importou com a sensação do toque; muito pelo contrário. agarrou a mão dela e, como um convite, se aproximou mais de seu peito, sentindo o cheiro já característico de cigarro e hortelã.
E ali, ela pensou seriamente que poderia passar o resto da noite naquela mesma posição.
— E então — ela começou, com um suspiro — Como é o show do Black Eyed Peas?
E com uma risadinha nasalada, começou a contar uma das tantas outras histórias que compartilharia com Havens.

🎯

Tudo em volta de David beirava a inocência.
Suas breves mensagens de boa noite; as selfies esporádicas dele mesmo e algumas de Rudy, seu vira-lata; fotos nada conceituais de seu café-da-manhã; os primeiros convites para jantar; as tardes inteiras passadas lendo livros na biblioteca juntos; beijar no banco do carro…
Coisas simples. Pitorescas. Não diziam nada alarmante sobre ele. era um cara extremamente verdadeiro e comunicativo, e em nenhuma camada da realidade poderia ser alguém que estivesse escondendo alguma coisa.
Era o que acreditava. Na verdade, não chegou a cogitar o contrário até aquela manhã aparentemente normal, onde saltou de seu Ford e saiu andando até a sala oval da aula de Estatística.
Se não estivesse tão maluca, notou que estava sendo observada. Mais do que observada, parecia estar sendo julgada. Em uma olhada rápida para as próprias roupas, buscou ver se achava algo fora do normal, terrivelmente fora do lugar, mas não. Usava as mesmas botas pretas, os jeans medianos e o suéter fino de outono. Não era nada escandaloso e nem brega demais. Era totalmente aceitável, rotineiro.
Mas até a hora do almoço, as percepções estavam piorando e não viu outra saída a não ser perguntar.
— Que merda tá acontecendo? — disse para Charlotte enquanto a amiga devorava um pretzel com lentidão e falta de vigor. Devia estar pensando em quantos animais foram mortos para alimentar toda aquela gente entulhada no restaurante, com certeza.
— Do que tá falando? — respondeu com a boca cheia. revirou os olhos, batucando os dedos no tampo da mesa. No momento, quem estava morrendo era ela, de pura ansiedade.
— As pessoas estão olhando pra cá ou é impressão minha? Teve uma garota que até apontou no corredor.
— Sério? Por que estariam olhando pra nós? — Charlotte riu, voltando a comer. Ela nunca prestava atenção nas coisas ao redor; parecia sempre alheia à realidade da universidade, concentrando-se em toda a sua arte e em seus ideais ativistas. Era o tipo de pessoa que não tinha nem um celular.
No entanto, existia Dom e sua correria pelo refeitório naquele momento, lutando contra ombros esguios e se apressando ainda mais quando visualizou e Charlotte na mesa.
— Finalmente encontrei vocês! — ele arfou, olhando para os lados antes de se sentar — O que você está fazendo aqui assim? — perguntou à .
A garota franziu o cenho, sem entender.
— Assim como?
— Tranquila. Presente — sua voz saiu em um sussurro. mantinha a expressão, até que o garoto revirasse os olhos e aproximasse o tronco para o meio da mesa — Tá todo mundo falando de você no Twitter. Por causa do . E, bom, parece que pessoalmente também.
Um sentido de alerta piscou na mente de . Olhando em volta mais uma vez, ela percebeu os cochichos esporádicos das pessoas intercalados com a refeição. Um gelo desceu por sua espinha, uma antecipação de algo ruim.
Antes que perguntasse à Dom o que raios poderia ter acontecido para toda aquela balbúrdia, o amigo tirou o celular dos bolsos e estendeu para ela, fazendo sentir os músculos rígidos apenas pelo reflexo do que o aparelho mostrou.
Uma foto, bem nítida e sem nenhuma margem para dúvidas, de com a tão desejada Tabi foi literalmente como um balde de gelo bem em cima de sua cabeça.
A foto poderia não ter nada demais, mas na verdade, tinha e muita… Os dois abraçados, de mãos dadas, sendo recente o bastante para que desviasse os olhos e sentisse ondas de um sentimento inexplicável e muito ruim.
Mas não deixou de olhar por muito tempo. A questão não era a foto, mas os comentários. Vários deles, com tentativas falhas de marcá-la — por ter um perfil privado, diziam como a vagabunda de Havens esteve em cima de David durante todo o tempo em que ele ainda namorava claramente Tabi.
E desde quando namorava?!
— Não tô entendendo… — ela sussurrou, chocada. O amigo estalou a língua.
— Ah, você com certeza está entendendo! David é um sacana — ele trincou os dentes quando disse — Eu te falei sobre esse cara. Falei que ele não era confiável.
mal o escutava. Um zumbido de fora parecia ter vedado todo o barulho ao redor. A única coisa que piscava em sua frente era a foto de com sua ex-namorada, como se nunca tivessem se separado. Como se não a tivesse deixado em casa há dois dias, com direito a um beijo demorado e convites futuros para que repetissem a dose.
Era inocente, assim como recente. tinha pulado de cabeça naquilo porque ele parecia tão… transparente. Diferente da maioria das pessoas que tinha conhecido. Ele a fazia sentir viva e ela gostava disso. Gostava dele.
Gostava dele pra caralho.
Agora só queria agachar embaixo daquela mesa, mandar que todos fossem embora e pensar um pouco sobre a situação. Pensar sobre o que viu e o que estava sentindo, porque não fazia sentido. Como assim amante? Vadia, puta… Que tipo de coisa dava direito às pessoas de falarem aqueles absurdos sobre alguém que nem conheciam?
Dom puxou o aparelho de volta, que nem lutou para manter. Sentiu-se levianamente exposta, nua, observada como mais cedo, mas de um jeito totalmente depreciado. Não precisava perguntar aos amigos para saber que seu rosto provavelmente estava miserável.
— Que babaca! — agora Charlotte arfou, puxando o mesmo telefone para encarar a foto e olhar para os lados com raiva — Quem essa gente pensa que é? Bando de mariquinhas! Se estivessem aqui…
não viu a hora que puxou a bolsa quadrada e se levantou da mesa, deixando Charlotte e Dom gritando coisas incompreensíveis enquanto mirava apenas na saída e no controle emocional para não explodir antes do tempo.

🎯

Convenientemente, David não estava atendendo ao celular.
E não atendeu durante toda aquela semana.
Como se já não bastasse o inferno astral de ter sido rejeitada de forma indireta, ainda precisava aguentar os burburinhos e até alguns rosnados. Foi quando percebeu com pavor a dimensão da popularidade de e em como estava alheia a ela quando decidiu se envolver com aquele cara. David tinha uma base de admiradores não apenas dele, mas também de Tabi e uma comunidade conjunta que se dedicava a torcer pelo casal número 1 de toda a Nova York. Em uma dessas ocasiões, quando se preparava para entrar no laboratório, foi obrigada a ouvir um “vadia” dito sem nenhuma reserva por uma caloura e não teve escolha a não ser fingir que nada aconteceu. Ainda tinha os projetos, pessoas a gerir e precisava manter o máximo de profissionalismo para não perder a bolsa de estudos.
Não que isso importasse muito agora, já que sua reputação de garota prodígio e discreta tinha sido bruscamente manchada por causa de seu envolvimento quase público com .
Quase. Não era algo que ela pretendia mostrar ao mundo, mas também não estava escondendo. E muito menos ele! Isso tornava as coisas ainda mais estranhas! O cara garantiu que tinha uma ex-namorada. A garota inteligente e maravilhosa que não precisava impressionar ninguém. A que não gostava muito de Black Eyed Peas. A que foi embora para a Europa sem nenhuma intenção de voltar.
Está feliz agora, ?, ela pensou com raiva quando saiu do laboratório, largando o jaleco no armário com força. Era isso que você queria? Ter seu nome na língua de todos sem nem poder se defender?
Ela andou até o carro com passos rápidos, uma atitude normal que tomava naquela semana. Às vezes, ficava horas com as mãos no volante, observando as pessoas passarem e certificando-se se iriam continuar falando o que estavam falando. Sobre ela, sobre , sobre qualquer coisa que dissesse onde aquilo tinha começado. Ou melhor: onde ele estava! Era muito louco como as coisas foram de 0 a 100. Achou que os dias que passou ao lado daquele cara tinham sido um sonho, mas como um sonho desses terminava de um jeito tão ruim?
Ou era aquele lance de profecia que ele vivia acreditando. Coisas ruins são necessárias para que as coisas boas venham. Bem, aparentemente, ele não era a parte boa do negócio, só fez o papel de mensageiro do caos.
Quando tomou coragem para dirigir de volta para casa, já estava mudando de ideia sobre um pensamento anterior. Ela acreditava, até ontem, que se aparecesse e a explicasse tudo, talvez não sentiria tanta raiva dele. Não ficaria tão decepcionada e poderia até mesmo esquecer tudo aquilo. Quem sabe podiam até voltar a ser como eram antes. Mas já tinham se passado muitos dias e agora queria genuinamente que ele se fodesse. Diria isso a ele o mais rápido possível. Assim que ele tivesse coragem de aparecer.
No entanto, isso aconteceu mais rápido do que imaginava.
Distraída, puxou o freio a tempo de não bater no grande Volvo preto estacionado em frente ao alojamento. Aquele carro se misturava na escuridão como ninguém, e com faróis igualmente pretos em uma rua com déficit de iluminação se tornava parte do cenário. arfou, sentindo o coração pular depressa. Primeiro, pela quase batida e segundo porque reconhecia aquele veículo.
Ela o viu abrir a porta do motorista ao mesmo tempo que ela fazia o mesmo no Ford.
chamou, aproximando-se dela — Caramba, como é bom te ver.
Ela não sorriu ou retribuiu o cumprimento. Suas sobrancelhas estavam torcidas, a feição não tinha vida e, por mais que tenha sentido o coração dar uma pirueta ridícula no peito ao vê-lo, não serviu para aplacar sua frustração.
— O que você quer aqui? — perguntou, seca. franziu o cenho, mas logo se recuperou porque ele não era idiota. Sabia o que estava acontecendo. Sabia o motivo de encontrar rodeada de paredes espessas.
— Eu vim… — ele moveu um braço, mas não continuou. Soltou um grande suspiro, olhando rapidamente para a porta antes de se virar novamente para ela — Enfim. Eu sei o que você viu.
— A pergunta é quem não sabe.
— Eu não sei o que foi aquilo — ele disse, levantando os ombros — Eu juro. Foi só uma foto. As pessoas foram babacas e ridículas por causa de uma mísera foto.
piscou os olhos em descrença. Em ocasiões anteriores, simplesmente soltaria uma risada e se afastaria daquele cara porque não importava o quanto o tempo junto fosse bom, não valia perder seu tempo. Mas era . E ela gostava de David, gostava dele como não gostava de outro garoto há anos.
— O problema é a foto? — ela grunhiu, abrindo os braços em descrença — Não acha que tem algo mais problemático nisso tudo?
— Pedi pra Tabi não postar nada. Pedi porque não tinha nada certo ainda, estávamos conversando…
— Você viajou pra voltar com a sua ex-namorada?
— Não foi com essa intenção. , juro que não foi. Mas…
esperou que ele completasse a frase, mas nada veio. Um tronco pesado de uma daquelas árvores pareceu cair bem em cima de sua cabeça. Ele não parecia afetado com o fato que estava contando, e também não parecia muito incomodado com os comentários nojentos sobre na rede social.
Na verdade, ele parecia estar muito bem com tudo aquilo.
— Você sumiu por mais de uma semana — ela disse em voz baixa, encarando-o fundo nos olhos — Sumiu por um tempão porque voltou com sua ex e não teve coragem de me contar isso?
olhou novamente para a porta do prédio, coçando brevemente a nuca.
— Eu ia contar. É claro que eu ia te contar…
— Então por que não contou?
— Eu não queria te magoar, .
— Tá, claro. Então por que não avisou aos seus queridos fãs que eu não sou uma piranha que implorou pra ser sua amante? Ou uma puta que estava em cima de você na primeira oportunidade que se separou da Tabi?
— Isso foi muita estupidez, . Sério, eles foram uns babacas e não compartilho de nenhuma daquelas ideias. Eu e Tabi estávamos brigados há meses, dissemos que nós resolveríamos assim que ela voltasse ou eu…
— Então vocês não tinham terminado de verdade? — abriu bem os olhos com a constatação um tanto assustadora e ridícula, e viu abrir e fechar a boca várias vezes, sem conseguir responder — Meu Deus. Você estava mesmo namorando quando me chamou pra sair?
— Não estávamos namorando, . Era um tempo. Um tempo muito longo — ele se embolou, respirando fundo e se aproximando devagar de — Ela é o meu primeiro amor, . Sempre foi. Não é algo que eu escolhi, só é. Mas você é uma garota incrível. Inteligente, determinada, fã de Black Eyed Peas e virtuosa. Se eu pudesse escolher, seria você. Você sempre vai ser minha preferida.
Como se fosse possível: agora terminava de martelar o seu coração com uma foice. Aquela frase havia sido uma maneira muito boa de perder o resto de respeito por ele.
Maldito Dom. Você disse que isso aconteceria. Disse com tanta certeza que quase acreditei. Mas bem, eu não sabia o que podia ter dado. E a única maneira de compensar a admissão de não saber algo era segui-la imediatamente com as palavras “mas vou descobrir”.
E descobriu. E o resultado foi tremendamente oposto ao que pensou.
Antes que respondesse alguma coisa que finalizasse aquela conversa tenebrosa, ela ouviu uma voz aguda na lateral do espaço, gritando animadamente por “” seguido de um perfume forte que penetrou as narinas dos dois em assustadores 10 metros de distância.
A garota linda de cabelos loiros caminhou a passos largos para perto deles, irradiante em botas de salto alto e um sorriso penetrante sem mostrar os dentes. Tabi Young, a modelo inalcançável, a rainha de Ithaca que tinha se mandado para oportunidades melhores.
Estava bem ali, saindo do prédio vizinho, um bem maior e mais moderno do que o de .
Se por algum segundo, pensou que fosse digno de receber um perdão em um tempo futuro, ali, ele não a deu tempo de descobrir se isso valia a pena. Não valia. Nem um pouco.
… — ele tentou antes que a loira se aproximasse. inspirou pelo nariz e balançou as mãos na frente do rosto, calando-o.
— Não. Não — ela interrompeu, puxando as chaves para o bolso e o fitando firme pela última vez — Depois de tudo que disse, eu espero sinceramente que você vá se foder, David.
E sem dar vazão para que ele respondesse, andou bruscamente para o caminho de pedras até o prédio, passando furtivamente pela loira sem encará-la, mesmo que tenha notado que ela fez o mesmo ao se virar. Não importava. Que se fodam. Os dois. Que se fodam todas as pessoas que queriam dizer quem ela era. Que a colocaram como assunto do momento. Que se foda seu coração ridículo e maltratado que só queria tirar um tempo para si mesmo, e agora estava uma bagunça de novo.
Que merda.
Tudo isso porque tinha gostado de um garoto.


FIM



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