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Última atualização:27/07/2018

Prólogo

Beauty and the Beast
Primeira parte da fic, em um conto do dia dos namorados, trazendo nossa primeira noite!!!

O 'para sempre', como todos dizem, talvez não exista,
Mas pode ter certeza, independente de tudo, sempre te amarei.
Aos poucos entenderá isso.
Eu não sei por que,
Esse amor é insubstituível, uma surpresa repentina,
Você tornou-se uma pessoa melhor,
Contanto que viva ao meu lado, à vida é colorida.”
- What Is Love / EXO



1. My Little Princess

Londres - Primavera de 1847

ver.:

Aquela noite havia se estendido em meus sonhos, a lembrança mais vívida foi dos sussurros de em meu ouvido. Comecei a me espreguiçar em meio aos e aos poucos a claridade da janela foi tomando conta do quarto, abri os olhos. O motivo da claridade se chamava Isla, a governanta da Wincher Hall.

— Bonjour, lady Winchester. — disse ela ao abrir uma pequena fresta na janela para que o ar adentrasse.
— Bom dia. — disse em um sussurro observando seus movimentos — Onde está o senhor Winchester?
— No escritório, mi lady. — respondeu ela se virando para mim — Em reunião com o lorde Lewis, conde de Carnarvon.
— Meu pai? — sussurrei pensando em qual possível motivo para que ele estivesse aqui a esta hora da manhã.
— Mi lady, deseja algo em especial?! — perguntou ela se mantendo parada de frente para minha cama.
— Não. — me levantei — Apenas ajude-me a me vestir.

Ela assentiu, Isla parecia uma pessoa simpática e agradável, sempre dizia o necessário e se mantinha em silêncio, uma ótima profissional. Minhas roupas ainda estavam no baú que tinha trago de Lewis Castle, demorei um pouco para escolher, não havia levado toda a minha roupa, e sendo primavera, optei por colocar o vestido salmon pastel com bordados em linha verde musgo.

— Me deixe sozinha por favor. — pedi a Isla.
— Como quiser, mi lady. — ela fez uma breve reverência com a cabeça e se retirou do quarto.

Eu respirei fundo ajeitando o vestido em meu corpo, caminhei até o espelho e pegando meu estojo de toilette, que estava na mesa ao lado, me sentei na cadeira. Minha maquiagem seria suave evidenciando somente meus lábios, como o campo de lavanda na primavera, ao final peguei o frasco de metal com arabescos de ouro decorado, com meu perfume preferido e borrifei na altura do pescoço.

Fiquei alguns minutos me olhando no espelho, desde que tinha acordado eu me sentia estranha, mas era um estranha bom, como se algo de diferente tivesse sido estabelecido em minha vida. Bem, oficialmente eu estava casada, oficialmente tinha me tornado a esposa do homem mais influente e rico de Londres, porém meus sentidos não estavam tendendo para isso.

O que eu sentia estava ligado diretamente a , descartando seu sobrenome ou tudo que envolvia ele socialmente. Talvez aquela estranheza que eu estava sentindo, pudesse ser convertida em sensação de complemento, como se tivesse completado em mim em uma única noite, o que eu sentia que faltava todos esses anos.

— Lady Winchester. — disse uma voz grossa vindo da porta, era ele, provavelmente para saber se eu já estava acordada.
— Senhor. — desviei meu olhar para seu reflexo no espelho — Bom dia.
— Bom dia. — respondeu ele mantendo-se imóvel na porta.

Apesar de poder olhar meu reflexo, notei que seu olhar estava diretamente para mim, mesmo de costas para ele, a intensidade era a mesma. Aquilo que me deixava ainda mais intrigada, se ele podia olhar em meus olhos através do espelho, por que se contentava em olhar diretamente para mim, mesmo que de costas para ele?!

— Acredito que já saiba que vosso pai veio esta manhã. — continuou ele.
— Sim. — me levantei da cadeira e me virei para ele — Isla me disse que estavam no escritório.
— Ele a espera na entrada, para se despedir. — confirmou abrindo um pouco mais a porta para que eu passasse.

Disfarcei um breve sorriso no canto do rosto e caminhei em sua direção, assim que passei por ele, fez uma breve reverência, movendo seu corpo para o lado para que eu pudesse passar com mais liberdade. Retribui a reverência e segui em direção as escadas; assim que cheguei no hall de entrada da casa, meu pai já estava parado olhando para o vaso chinês que estava na mesa em frente à porta.

— Papai. — disse indo a seu encontro e lhe abraçando.
— Olá querida. — ele retribuiu meu abraço — Como está?!
— Tive uma boa noite. — respondi mantendo-me reservada aos detalhes — Não me diga que veio por estar com saudades de mim, mal se fez vinte e quatro horas que estou casada.
— Ah. — ele riu de leve, mantendo seu olhar no vaso chinês — Acabou descobrindo meu segredo, estava mesmo com saudade de minha filha amada. Está se sentindo confortável nesta casa?
— Um pouco, não é tão grande quanto a Lewis Castle, porém é maior e mais luxuosa que muitas casas em Londres.
— Fico aliviado em saber que minha filha estará vivendo bem.
— O senhor ficará para o desjejum? — perguntei a ele animada.
— Oh, não, não quero atrapalhar seu primeiro dia como uma senhora casada. — ele desviou seu olhar para trás de mim — E tenho certeza que o senhor Winchester gostaria de passar esta manhã, sem convidados indesejados.

Virei o rosto para , ele estava parado no último degrau da escada, seu olhar estava fixo em mim, sua face séria e os olhos suaves.

— Tenho certeza que o senhor não é um convidado indesejado. — retruquei mantendo meu olhar em .
— Minha querida, teremos muitas manhãs pela frente. — meu pai tocou em minha mão me fazendo olhar para ele — E tenho outro compromisso para esta manhã.
— Está sendo sincero? — reforcei.
— Claro que sim. — assentiu, me abraçando novamente — Prometo lhe visitar com frequência.

Assenti com um sorriso e o acompanhei até a porta, assim que fechei desviei meu olhar para , que continuava me olhando. Respirei fundo desviando meu olhar para o vaso chinês, era complicado ficar encarando ele, seus olhos pareciam invadir minha alma e ver meus pensamentos.

— O que meu pai realmente veio fazer aqui? — perguntei mantendo-me parada no mesmo lugar.
— Ele não lhe disse? — retrucou ele.
— Disse que estava com saudade de mim, porém sei que é mentira.
— Se ele não quis lhe contar, não serei eu a fazer isso. — ele desceu o último degrau e se dirigiu para a sala — Venha, nosso desjejum será no jardim.

Ele estendeu o braço, para que eu pudesse o acompanhar, dei alguns passos até chegar nele e pousando minha mão em seu braço, segui com ele até o jardim. Ao contrário da arquitetura clássica acompanhada do neogótico, que existia o interior da mansão, em sua fachada frontal e nas laterais, o jardim era mais gracioso e delicado.

Saímos pela porta da lateral da sala de jantar e seguimos por uma pequena trilha de seixos claros entre a grama baixa. Havia alguns pequenos arbustos espalhados por todo o espaço, usados como contorno dos canteiros de margaridas, rosas, peônias e lavandas, o que deixava o lugar ainda mais perfumado e colorido.

Continuamos seguindo a trilha, até chegar na fonte bem ao centro. pegou em minha mão e me soltou de seu braço, se afastou de mim seguindo até a mesa que estava posta mais a frente, então arrastou a cadeira e me olhou, como se estivesse me convidando para sentar. Sorri de leve, caminhei até ele e me sentei na cadeira, observando os bancos que ficavam do outro lado da fonte.

— Senhor Winchester, permita-me servi-los. — disse o mordomo ao se aproximar de nós.
— Agradeço, Lee. — consentiu .

Enquanto o mordomo nos servia, olhei para por algumas vezes, e como presumi ele estava com seu olhar fixo em mim. Ainda era difícil não ficar envergonhada com tamanha intensidade, o que me deixava curiosa. Desejava saber por que aparentemente, ele possuía uma certa obsessão por mim.

Lee se afastou, permanecendo no jardim, porém um pouco distante de onde estávamos.

— O jardim é muito bonito. — comentei desviando meu olhar para o pedaço de bolo, no prato de porcelana, que pelos ornamentos desenhados, parecia de origem francesa.
— Estou feliz que tenha gostado, foi feito para você, como tudo que existe nesta casa. — seu tom de voz permanecia inalterado, firme e grossa, com aquele toque suave.
— Suas palavras ainda me deixam sem reação, senhor. — disse me sentindo um pouco desnorteada.
— Pode me chamar de , se preferir. — ele tocou de leve em minha mão — Não precisa ser tão formal assim.
— Como quiser. — assenti com um sorriso.

Permaneci em silêncio enquanto saboreava meu desjejum, ao mesmo tempo que queria perguntar sobre sua enigmática vida, ainda tinha um certo receio no que provavelmente poderia descobrir. Em alguns momentos, eu fechava os olhos sentindo a brisa tocar minha pele, me envolvendo pelo aroma que deixava o lugar ainda mais confortável.

Mantive minha atenção nas flores do jardim, sabia que estaria com seu olhar fixo em mim, o que me fazia sorri de forma involuntária em alguns momentos. Me permitindo ter a sensação de que ele retribuía meu sorriso com outro um pouco discreto, atraindo meu olhar.

Assim que tomei o último gole de chá que estava em minha xícara, o mordomo Lee se aproximou com uma carta em uma bandeja de prata. Mantive-me em silêncio enquanto observava ele entregar a carta a , era difícil conter minha curiosidade, talvez fosse uma carta de felicitação por nosso casamento, ou alguma mensagem importante de alguns de seus muitos negócios.

— Algo urgente?! — perguntei mantendo meu olhar no envelope.
— Não, apenas imprevistos que tenho que resolver. — respondeu ele se levantando da cadeira — Perdoe-me por não poder apreciar esta manhã com você.

Ele desviou seu olhar para a carta. Era visível sua frustração por ter que se ausentar logo em nossa primeira manhã juntos.

— Terei você para o almoço? — perguntei me levantando também.
— Sim. — respondeu dele com um sorriso disfarçado — Tudo que quiser, não hesite em pedir ao Lee ou a Isla, você é a nova dona desta casa.

Assenti, mantendo meu olhar nele. se aproximou de mim e pousou sua mão em minha cintura, acariciou meu rosto de leve com a outra, o que me fez ansiar mesmo que de leve por um beijo dele. Fechei meus olhos lentamente e logo senti seus lábios tocando os meus.

Em segundos meu corpo se arrepiou, seu beijo era doce e suave com nuances de intensidade, ao mesmo tempo que me aquecia por dentro, me deixava estática. Era estranho um simples beijo de uma breve despedida, ser tão intenso como se fosse o beijo de uma partida eterna. Comecei a me perguntar, se ele tinha medo de voltar e não me encontrar naquela casa.

ainda manteve seu rosto encostado no meu por alguns instantes, o que me fazia ter a sensação de que aquele beijo era insuficiente para ele. Abri meus olhos, deixando meu olhar baixo, percebi que nossas respirações estavam sincronizadas, recuperando o fôlego. Por dentro, meu coração se manteve acelerado todo o tempo, talvez estivesse concordando com ele e aquele beijo era sim insuficiente, mas consegui descobrir a primeira coisa sobre ele.

não queria se afastar de mim, nem por um segundo.

"Por favor, espero que você veja como eu cresci.
Quero ser um homem que combine com você.
Por favor:
Permita-me entrar, em seu coração,
A qualquer hora que eu quiser."
- My Little Princess / Dong Bang Shin Ki



2. Hug

Londres - Primavera de 1847

ver.:

Ele se afastou de mim em silêncio, seguindo em direção a porta. Continuei imóvel onde estava, observando seus passos com meu olhar, respirei fundo sentindo meu coração se acalmar, porém uma certa melancolia por ele ter que partir logo em nossa primeira manhã juntos.

— Mi lady ?! — disse Isla ao se aproximar de mim.
— Sim?! — eu a olhei despertando de meus pensamentos.
— Mi lady deseja que algo em especial seja preparado para o almoço? — perguntou ela de forma natural, o que atestava ainda mais que eu era a nova dona daquela mansão.

Respirei fundo, não sabia o que responder, ainda mais por não conhecer os gostos e hábitos de . Aquela simples pergunta acabou me deixando um pouco insegura, pensando que se escolhesse de forma errada o cardápio a ser servido, talvez ele ficasse decepcionado ou irritado.

— Bem, eu ainda não… — a olhei — Preciso de alguns minutos para me decidir.
— Como quiser mi lady, caso queira me chamar, basta tocar. — disse ela deixando o sino de mão sobre a mesa.

Isla fez uma breve reverência e se retirou. Desviei meu olhar para a fonte ao meu lado, mantendo meu corpo de frente para ela, um lado novo em ser a dona da casa, ter que decidir por tudo que acontecia. Por mais que tivesse sido preparada para isso durante toda a minha infância, estar casada e ter uma família para cuidar, era bem mais complexo quando não se conhece o seu marido.

O que me despertava a vontade de descobrir quem ele era, internamente. Seus gostos, desejos, seus pensamentos, quem era por trás daquele olhar intenso e silêncio constante.

— Mi lady . — disse Lee retornando ao jardim — Os senhor Zachary, a senhora Poppy e o senhor Aidan estão no hall, aguardando a senhora.
— O que? — sussurrei.

O que a família de estava fazendo aqui? Perguntei para mim mesma, tentando não imaginar o que eles queriam. Acompanhei Lee até o hall de entrada da mansão, eles estavam perto da porta conversando entre si, enquanto me esperavam.

— Bom dia. — disse no meu tom baixo e habitual de falar.
— Oh, aqui está ela! — disse a senhora Poppy vindo me abraçar com euforia — Confesso que contei as horas para vir aqui esta manhã, estava curiosa para saber como foi a primeira noite do casa.
— Oh. — eu retribui o abraço dela com mais suavidade e me afastei um pouco — Foi tranquila na medida do possível.
— Não seja tímida, meu filho esperou tanto por esse casamento com você, tenho certeza que tranquila é um adjetivo que não classificou esta noite. — ela riu alto e deu um leve tapa em meu ombro.

Eu dei um sorriso meio tímido, desviando meu olhar para o senhor Zachary, pai de e depois para o senhor Aidan, sobrinho do senhor Zachary.

— Oh, sim. — ela riu ainda mais olhando para seu marido — Me esqueci que estamos na presença dos senhores.
— Não se contenha por minha causa. — Aidan deu um leve sorriso malicioso — De minha parte, adoro saber sobre essas coisas, a visão feminina sobre o amor é tão atraente.
— Modere suas palavras diante de duas senhoras casadas. — repreendeu o senhor Zachary num tom mediano.

Eu me encolhi um pouco, me sentindo desconfortável com a presença deles e mais ainda com as indagações da senhora Poppy.

— Senhores, fiquem à vontade na sala. — disse a senhora Poppy me pegando pela mão — Quanto a nós, vamos ter conversas femininas.

Ela me puxou em direção a escada sem que eu conseguisse me opor, subimos correndo e entramos no quarto principal. A senhora Poppy fechou a porta assim que entramos, então me fez sentar no sofá que tinha em frente à janela, ao seu lado.

— Senhora... — comecei a tentar fazê-la não se animar muito com o assunto.
— Minha querida, sei que está envergonhada. — ela segurou minha mão e me olhou de forma gentil — A primeira noite de uma mulher é como um marco em sua vida, tenho certeza que não é somente eu que estou curiosa sobre isso.
— Sim. — assenti.

Ela realmente poderia não ser a única, porém eu sabia que minha família conseguiria ser bem mais discreta que ela. Mesmo com costumes visivelmente diferentes, eu conseguia sentir que a senhora Poppy era muito gentil e queria ser minha amiga, estava tentando encontrar alguma forma de retribuir seu carinho evidente por mim. Só não sabia como fazer.

— Senhora Poppy... — disse num tom mais baixo que de costume — A senhora disse que o senhor Win... , me esperou por muito tempo, o queria dizer com isso?
— Você não sabe?! — indagou ela me olhando surpresa.
— Não senhora. — neguei.
— Bem. — ela deu um sorriso disfarçado — Eu disse isso me referindo aos três anos que ele passou interessado em você, desde que retornou para Londres.

A explicação dela não me parecia convincente, menos ainda sincera, parecia que algo a mais tinha nesta história. A senhora Poppy passou a mão em seus cabelos e ajeitou um pouco a saia do vestido azul marinho que estava vestindo, suspirou um pouco como se escolhesse suas próximas palavras.

— Bem, voltemos para sua noite de núpcias. — disse ela se animando novamente — Como foi? Meu filho foi gentil com você?
— Senhora Poppy, não quero ser indelicada com a senhora, mas gostaria de não mencionar sobre isso, é algo muito íntimo para mim. — eu me encolhi um pouco mais.
— Ah, sim, eu imagino que esteja me achando muito curiosa. — ela riu alto — Mas em partes, é preocupação de mãe, é um homem muito silencioso e pouco sociável, fico imaginando como poderia ser a convivência de vocês.
— A senhora não deveria se preocupar tanto, eu já percebi algumas características do , certamente me acostumarei com elas de acordo com o tempo. — assegurei com segurança.
— Posso ver em seus olhos uma ponta de curiosidade. — ela deu um largo sorriso — Se quiser posso lhe contar como encontrei ainda criança.
— A senhora faria isso? — disse me surpreendendo por ela ter confirmado os boatos — Sempre ouço comentários indiretos sobre ele ser adotado.
— Bem, eu chamo de meu pequeno anjo, ele salvou minha vida em um momento que eu não queria ser salva. — explicou ela com um pequeno brilho nos olhos — E mesmo tendo passado alguns anos longe de casa, estou feliz e orgulhosa por ele ser meu filho, mesmo que adotivo.
— A senhora não pôde ter filhos? — perguntei meio receosa.
— Não. — ela suspirou fraco — Infelizmente, Deus não quis que eu tivesse esse prazer, tenho um certo alívio por meu marido nunca ter cobrado, mas fico triste.
— Eu lamento. — coloquei minha mão sobre a dela e sorri de leve, não sabia ao certo o que falar.
— Ah, mas a vida me deu dois filhos lindos de criação. — ela sorriu também, era notável as pequenas gotas de lágrimas no canto de seus olhos — Aidan às vezes me dá um certo trabalho, porém me divirto com ele.
— Soube que os pais dele morreram em uma tempestade. — comentei.
— Soube de muitas coisas sobre nossa família. — ela riu um pouco.
— Perdoe-me senhora, se fui intrusa nos assuntos pessoais da família.
— Não precisa se desculpar. — ela riu novamente — Não é novidade que minha cunhada e seu marido, morreram em uma viagem de navio para a Espanha.

Ela se levantou respirando fundo.

— Mas, vamos deixar o passado para trás e olhar para o futuro. — ela pegou em minha mão e me levantou da cama — Temos um almoço para preparar, acredito que esteja curiosa para saber as preferências do seu marido.
— Confesso que um pouco senhora.
— Vou adorar te contar tudo. — ela riu ainda mais alto me puxando para fora do quarto.

Descemos as escadas com ela ainda rindo, me contando algumas histórias de quando era criança, passamos pela sala de visitas indo diretamente para a cozinha. Eu fiquei um pouco próxima a porta, observando a senhora Poppy montar todo o cardápio do almoço de forma bem detalhada, explicando a cozinheira com a companhia da senhorita Isla, sempre reforçando em como deveria sair o sabor dos alimentos.

O cardápio segundo a senhora Poppy, seria Yorkshire puddings de entrada, roast beef ou como ela costumava pronunciar, rosbife, acompanhado de puré e vegetais cozidos para o prato principal. Era um pouco engraçado ver como a senhora Poppy pronunciava o nome dos pratos, e um pouco animador ver como ela ordenava tão bem os empregados.

A sobremesa, segundo a senhora Poppy seria uma surpresa dela para os recém-casados, eu contive um pouco minha curiosidade. Assim que todas as instruções foram passadas, a senhora Poppy pegou minha mão e me levou de volta para a sala de visitas, o senhor Zachary e Aidan estavam conversando, sentados nas confortáveis e luxuosas cadeiras que compunha o mobiliário.

— Estou surpreso que tenha saído. — comentou o senhor Zachary.
— Deve ter sido algum problema grave no porto, para deixar sua esposa logo na manhã de recém-casado. — Aidan deu uma risada discreta, se levantando e caminhando em direção ao quadro de William Hogarth que estava na lateral direita da sala.

Eu o segui com meu olhar e analisei um pouco a obra de arte que estava dentro da moldura, vagamente eu poderia afirmar que já tinha visto este quadro quando criança, talvez na casa de algum aristocrata amigo do meu pai. Era curioso uma obra de arte de tanto valor estar na casa de um burguês, será que teria comprado?

O tempo foi passando. O senhor Zachary continuava seus assuntos sobre os negócios da família com Aidan, enquanto isso a senhora Poppy que se sentou na cadeira ao lado da minha, sempre puxava alguns assuntos triviais relacionados ao meu cotidiano em Derbyshire. Ela havia me contado que morou por anos em uma casa ao sul de Nottinghamshire, porém após Aidan ir morar com eles, decidiram vir para Londres.

— Oh, . — a senhora Poppy se levantou da cadeira e caminhou em sua direção — Estávamos à sua espera.
— O que fazem aqui? — disse surpreso.
— Viemos acompanhá-los para o almoço. — respondeu a senhora Poppy com um sorriso descontraído.

Ela parecia não se importar com o tom da voz dele, menos ainda com sua face séria. Seu olhar veio de encontro ao meu, estabelecendo assim aquela intensidade que sempre me deixava envergonhada.

— Não me lembro de tê-los convidado. — retrucou mantendo-se sério.
— Ah, deixe de pedir formalidade com sua própria família, queríamos fazer surpresa. — a senhora Poppy fez que iria se irritar, porém se virou para mim e piscou de leve.

Como se sua reação fosse uma forma de ensinamento para mim. Eu me levantei da cadeira e caminhei até ele, sorri de leve desviando meus olhares pelo percurso.

— Você chegou. — disse no meu tom baixo de sempre.
— Disse que viria para o almoço. — ele mantinha seu olhar em mim sem nenhum constrangimento de toda aquela intensidade que colocava — Sempre cumpro minha palavra.

Senti um breve arrepio em meu corpo.

— Bem, já que está assim tão mal-humorado que não pode ter a companhia de sua família. — pronunciou a senhora Poppy que estava ao nosso lado nos olhando.
— Sejamos honestos querida, estamos invadindo a privacidade do casal em seu primeiro dia juntos. — disse o senhor Zachary de forma franca.
— É claro que estamos agradecidos pela presença de vocês. — afirmei mantendo meu olhar em .
— Eu já imaginava que sim. — a senhora Poppy riu um pouco e se dirigiu para o centro da sala, sentando ao lado do seu marido.

pegou em minha mão com suavidade e me guiou até o jardim. Ele parecia um pouco nervoso e desconfortável, mas não conseguia identificar se era pela presença de sua família ou pelo motivo que o fez sair pela manhã. De qualquer forma, parecia sério e a cada instante segurava minha mão ainda mais forte sem perceber.

. — disse ao parar de anda, puxando um pouco minha mão para que ele percebesse o grau de sua força.
— Perdoe-me. — ele soltou minha mão e olhou para o céu, parecia tentar controlar sua voz — Eles não deveriam estar aqui.
— Eu gostei da visita deles. — disse tocando de leve seu rosto para que olhasse para mim.

Ele permaneceu em silêncio me olhando, percebi que o problema não era realmente sua família.

— Sua mãe é muito simpática. — disse suavizando ainda mais minha voz — Ela me ajudou a descobrir suas preferências para a gastronomia, além de contar sobre sua infância...

Em um piscar de olhos senti os lábios de tocarem os meus, em uma profundidade incomum que fazia minhas pernas estremecerem. Suas mãos envolveram minha cintura, aproximando nossos corpos, eu pousei de leve minha mão direita em seu tórax, senti seu coração um pouco acelerado.

— Pelo aroma, teremos um almoço especial. — comentei ao me afastar um pouco dele.

sorriu de leve mantendo seu olhar em mim. Voltamos para o interior da mansão, ao chegar na sala, Aidan estava contando mais uma de suas aventuras vividas em sua última viagem para a Espanha. Eu caminhei até a cadeira do canto, me sentando de frente para a senhora Poppy.

permaneceu de pé ao lado da lareira com seu olhar em mim, sua face estava um pouco mais serena, o que me fez ficar estranhamente bem mais aliviada.

, você já mostrou a sua bela esposa mi lady Winchester, seu dotes artísticos? — perguntou Aidan que estava de pé em frente ao outro quadro de Rembrandt.
— Ah sim, toque para nós . — insistiu a senhora Poppy — Tenho certeza que ficaria admirada em ver como é talentoso.

Meu olhar que estava na mesa de centro, se desviou para ele encontrando os seus, naquele momento não conseguiria reagir de uma outra forma, que estar surpresa. Porém percebi uma certa movimentação na porta, era o mordomo Lee, que discretamente acenou sua face para , que assim como eu tinha olhado em sua direção.

— Vamos. — disse ao se aproximar de mim e estender sua mão.

Assenti, pousando minha mão em seu braço, o senhor Zachary estendeu seu braço para a senhora Poppy e nos seguiu em direção da sala de jantar, acompanhado de Aidan. O almoço estava mesmo saboroso, a surpresa especial para a sobremesa foi gelado de baunilha, diferente do que costumávamos ver na sorveteria, havia sido encomendado com um sabor diferenciado, especialmente para aquele dia.

Foi um momento descontraído, que contava sempre com os comentários espontâneos da senhora Poppy. Eles não demoraram muito para partirem após a xícaras de café que foram servidas na sala de visitas, apesar de sempre se mostrar alegre para , ela havia percebido que ele precisava ficar a sós comigo.

Assim que me despedi deles na sala, deixei que os levasse até a porta. Caminhei para o jardim e me sentei em um dos bancos com encosto em frente da fonte no lado esquerdo, fiquei por um tempo olhando as águas que caíam do chafariz de escultura em mármore. Fechei meus olhos por um momento, graças a presença da família dele, aquele dia havia sido um pouco agitado para mim.

Logo senti alguém sentar ao meu lado, permanecendo em silêncio. De olhos fechados, tombei minha cabeça para o lado, encostando em seu ombro, uma breve sensação de conforto passou por mim, que me fez suspirar de leve. O aroma do seu perfume foi me envolvendo, acompanhado de suas carícias em meu cabelo, me fez adormecer lentamente.

"Quero te ver dormir confortavelmente, carinhosamente nos meus braços,
Por você, resolvo todos os problemas e tudo o que te incomoda,
Inclusive o monstro dos teus pesadelos.
[...]
Fico curioso pensando o quanto você gosta de mim,
Quero ser como seu diário, para saber os segredos do seu coração."
- Hug / Dong Bang Shin Ki



3. Destiny

Derbyshire - Outono de 1833

ver.:

Eu estava racionando a comida que tinha na trouxa de tecido, não sabia quando que eu iria encontrar comida novamente. Não podia voltar ao castelo da lady Lewis, não a colocaria contra sua preceptora novamente, não queria que ela fosse castigada por minha causa, uma segunda vez.

Continuei caminhando pelas beiras das estradas, nem sabia ao certo em que lugar da Inglaterra me encontrava. Tinha perdido toda noção de tempo e espaço, em alguns momentos até pensava estar andando em círculos quando me aventurava pelos bosques e vales, não poderia ficar muito tempo nas estradas, não queria ser levado novamente para alguma workhouse por ser um órfão.

O pouco que consegui contar das noites que se passaram, desde que olhei lady de costas pela última vez, já tinha se passado dez dias caminhando, poderia ser bem mais que isso. Continuei caminhando pela borda da nascente, que tinha encontrado ao leste daquele colina, era um final de tarde tranquilo até que comecei a ouvir de longe uma voz cheia de desespero.

Fui seguindo em direção de onde a voz surgia, quando cheguei próximo a uma árvore, avistei uma senhora na ponta do que parecia uma queda d’água. Eu conseguia ver nitidamente que estava chorando, mesmo que suas palavras fosse para o nada, ela agia como se estivesse falando com alguém.

Em um piscar de olhos, aquela senhora abriu seus braços e se jogou, por um breve momento meu corpo congelou, e sem pensar, corri até a ponta e me joguei atrás dela. Mesmo que tudo estivesse mal, não seria certo deixar aquela senhora se matar, mergulhei em meio ao impacto na água, e nadei até ela tentando segurar o máximo de fôlego que conseguia.

Eu tinha nadado apenas uma vez até aquele momento, ou melhor, eu tinha lutado contra a morte para sobreviver, quando o senhor Cooper me jogou no rio, após eu roubar a comida da despensa para dar às crianças mais novas. Esse foi o principal motivo para ter fugido de sua propriedade.

Assim que consegui passar por algumas rochas que apareceram pelo caminho, alcancei a senhora e a segurando pelo braço, deixei a correnteza nos levar até chegarmos na margem do rio. Com uma certa dificuldade, pois era um pouco robusta, a arrastei até chegarmos em um arbusto e tentei acordá-la, não sabia o que fazer e lutava contra o pânico que estava se formando dentro de mim.

— Hum… — disse ela tossindo um pouco, abrindo seus olhos — Vocês é um anjo?
— Não. — disse num tom baixo me encolhendo.
— Você me salvou. — sussurrou ela erguendo seu corpo e me abraçando — Meu anjo.
— Senhora, eu não sou um anjo. — repeti sem saber se deveria ou não retribuir seu abraço.
— É claro que é. — ela sorriu de leve — Oh, estamos molhados, precisamos nos secar antes que peguemos um resfriado.
— Hum. — eu olhei para minhas roupas, até mesmo a trouxa de tecido que tinha amarrado em minhas costas estava encharcada e vazia.
— Venha, me ajude a levantar. — disse ela pegando em minha mão — Vamos para casa.

Eu me levantei primeiro e a ajudei a se levantar, estava tentando entender a que casa ela se referia, eu não tinha nenhum lugar para ir. Ela começou a seguir na frente, mas parou e se virou ao perceber que eu tinha permanecido no mesmo lugar.

— Por que não está andando? — perguntou ela.
— Me desculpe senhora, mas não tenho casa, nem mesmo família, não posso ir para lugar nenhum.
— Mas é claro que pode. — ela abriu um largo sorriso novamente — Venha comigo, você é meu anjo e minha casa agora é sua casa.

Ela estendeu a mão para mim. Seu nobre gesto e suas palavras de conforto, fizeram minha memória refletir a face de lady , o olhar doce que me ajudou sem nem perguntar quem eu era. Uma gota de lágrima se formou no canto de meus olhos, como minha face ainda estava molhada, facilmente a senhora não notaria que eu estava um pouco emotivo naquele momento.

Eu segurei ainda receoso sua mão e segui com ela, andamos mais algum tempo, sua casa parecia ser longe, pois tínhamos chegado ao anoitecer. Quando entramos um homem também robusto veio a nosso encontro e abraçou a senhora, sua preocupação resplandecia de forma curiosa.

— Oh querida. — disse ele — Estava preocupado e atormentado pelo desespero de não vê-la novamente.
— Eu estou bem agora, graças ao meu anjo. — disse a senhora ao desviar seu olhar para mim.
— Quem é esta criança? — perguntou o senhor me olhando de cara fechada.
— Este é meu anjo. — a senhora se aproximou de mim e colocou sua mão em meu ombro, ela sorriu de leve e olhou novamente para o senhor — Ele será meu filho agora.
— O que? — o senhor alterou sua voz — Como pode dizer tal coisa, mal sabe sobre ele, e se tiver família.
— Ele não tem. — retrucou ela — Agora somos a família dele, foi graças a esta criança que eu tive uma segunda chance.

A face dela começou a aparentar tristeza.

— Quando me joguei no rio, estava desistindo da minha vida, mas ele me salvou. — ela acariciou meus cabelos com carinho — Meu anjo, e não aceito que você diga o contrário.
— Mas ele… — o senhor se calou por um momento permanecendo com seu olhar em mim, respirou fundo — Esta criança não vai substituir todos os bebês que perdemos.
— Eu sei. — ela me abraçou — Mas tenho certeza que vai preencher o vazio que sinto dentro do meu coração, já o considero meu filho, e se não fizer o mesmo…
— Tudo bem. — concordou o homem mesmo contrariado — Qual o seu nome garoto?
, senhor. — disse em sussurro.
— Você tem família? — continuou ele.
— Não, senhor. — respondi.
— Quantos anos tem?
— Oito anos, senhor.
— A partir de agora, será nosso filho. — o senhor manteve seu olhar em mim — Eu sou Zachary Winchester e esta senhora que deseja lhe dar o amor de mãe, se chama Poppy.
— E a partir de agora, me chame de mãe. — disse a senhora Poppy com um largo sorriso em seu rosto.

Assenti. Ainda tinha receio, mas no fundo estava feliz por ter encontrado uma família para chamar de minha, o que me fez sentir que aquilo estava relacionado a lady , conhecê-la tinha me dado sorte. A senhora Poppy, ou melhor, minha mãe pegou em minha mão e me levou para o segundo quarto da casa, segundo ela, eu precisava de um banho quente para não pegar um resfriado e roupas limpas.

— Obrigado. — disse a ela assim que terminei de vestir as roupas novas que tinha me dado.
— Não precisa agradecer por isso, sou sua mãe agora, meu dever é garantir que esteja sempre confortável e sinta-se sempre amado. — ela me abraçou novamente — Sonhei tanto com este momento, poder abraçar meu filho! Prometa que será para sempre meu anjo, querido .
— Eu prometo, mamãe. — disse num tom baixo e tímido.

Ela soltou um grito de felicidade, que me fez ficar assustado, mas era reconfortante que aquela senhora que há poucas horas desejava a morte, estava feliz por eu ter entrado em sua vida. Entretanto, lá no fundo, era eu que estava agradecido por ela ter entrado em minha vida, eu tinha ganhado uma família e um lar, além da esperança de poder ver lady novamente.

Minha família morava ao sul de Nottinghamshire e meu novo pai era um açougueiro, o que explicava ele sempre estar cheirando a carne. Mesmo não gostando de mim e disfarçando seu desconforto por uma criança estranha chamá-lo de pai, o senhor Zachary era muito gentil comigo e estava me ensinando tudo sobre sua profissão, ofício que tinha aprendido com seu pai e avô.

Passei dois anos aprendendo o básico com ele, até que finalmente pude acompanhá-lo aos mercados de carnes para vender as poucas peças que tinha. Aparentemente, seu ofício lhe dava mais prejuízo do que lucro, além de alguns clientes que nunca lhe pagavam ou barganhavam a carne dando outras coisas em troca.

- x -

— Conseguiu entender? — disse ele ao levantar a mão que estava a faca — É assim que se corta a carne de javali.
— Por que o senhor só mata alguns machos? — perguntei um pouco curioso.
— Dizem que os javalis estão extintos aqui na Inglaterra, desde de mil e setecentos e alguma coisa, porém atualmente basicamente sou o único açougueiro da região que ainda vende dessa carne. — explicou ele — Então para continuar o negócio preciso ser esperto e inteligente, não mato as fêmeas, pois procriam, deixo alguns machos para o acasalamento.
— Hum. — desviei meu olhar para o animal que estava ali morto em minha frente — E as pessoas gostam de comer javali?
— É uma das melhores carnes para se ter em um banquete. — ele deu um suspiro de satisfação.
— Se o senhor disse que está extinto na Inglaterra, como pode existir estes? — perguntei confuso.
— Digamos que tenho um amigo sueco que me presenteou com um casal de javalis há alguns anos atrás. — respondeu ele — Fui criando e hoje, minha pequena criação é o suficiente para vender a alguns nobres, clientes antigos.
— Hum. — me levantei do chão e arrastei a caixa de madeira até ele — Senhor, o que sabe sobre eles?
— Eles quem? — indagou desviando seu olhar para mim.
— Os nobres, o que sabe sobre os nobres? — repeti a pergunta.
— Ah, o pouco que conheço, posso afirmar que esses aristocratas são esnobes, arrogantes e sempre pensam ser melhor que as pessoas que não tem título. — ele suspirou fraco — Ah, fique longe deles, ou então pode correr o risco de parar na forca.
— Mas senhor, pensei que seus clientes fossem amigos.
— Ah não, esses aristocratas metidos só nos suportam porque a burguesia é o que movimenta a economia do país, mas um simples açougueiro como eu jamais teria espaço, além do mais, os nobres só socializam com nobres.
— Mas e se alguém da burguesia quisesse ser amigo de um nobre? — perguntei de forma inocente.

Ele começou a rir de mim, como se eu tivesse feito uma piada ou algo do tipo.

— Meu filho, um burguês só consegue ser notado por nobres se for realmente bem sucedido e muito rico. — ele respirou fundo — Alguém como nós nem chegamos perto dos grandes comerciantes.

Permaneci em silêncio, o observando manipular a carne do javali, comecei a ficar um pouco pensativo sobre nossa conversa. De certa forma, não éramos ricos, a casa da minha nova família era um pouco humilde e pequena, nem se comparava ao castelo de lady , o que me deixou triste no momento, ao me lembrar dela.

Um sentimento de frustração e revolta começou a tomar conta de mim, comecei a perceber que tudo naquele mundo realmente girava em torno de ter ou não ter dinheiro. Eu não tinha, menos ainda minha família, então como eu poderia ser amigo dela? Respirei fundo, engolindo seco e tentei manter minha atenção no que estava aprendendo, aquele javali seria entregue na Morg House, que pertencia a família Morgan.

Os dias se passaram… Cada vez mais meus pensamentos continuava borbulhando sobre meu futuro e como poderia ver lady novamente. Logo à noite, após me recolher em meu quarto, minha mãe veio para me desejar boa noite, uma rotina que tinha criado todas as noites desde que tinha me adotado.

— Mamãe. — disse assim que ela fechou as cortinas da janela.
— Sim, querido? — ela me olhou com suavidade.
— Posso te fazer uma pergunta?
— Claro. — ela caminhou até minha cama e se sentou — O que deseja saber?
— As pessoas só respeitam aqueles que têm títulos de nobreza ou dinheiro? — perguntei já sabendo vagamente a resposta.
— Infelizmente sim, querido. — ela pegou em minha mão, seu olhar era de curiosidade — Por que a pergunta?
— Uma vez o papai disse que nobres jamais eram amigos de pessoas que não eram nobres, mas eles respeitavam os grandes comerciantes que tinham muito dinheiro. — expliquei de forma objetiva.
— Sua curiosidade, tem alguma finalidade? Alguém te maltratou no mercado?
— Não. — respondi desviando meu olhar para a janela — Hum, é sobre outra coisa.
— Que coisa? — perguntou ela — Sou sua mãe, pode dizer.
— Uma garota, me ajudou quando estava com fome. — contei quase em um sussurro — Queria que ela fosse minha amiga.
— E ela é uma nobre? — perguntou ela como se estivesse decifrando o real motivo de minha pergunta.

Assenti com a face.

— Querido, não fique triste, você ainda é uma criança e a sua vida ainda não está traçada por completo. — disse ela como palavras de ânimo — A vida de uma pessoa é como um vale cheio de relevos, alto e baixos, ser for seu destino ser amigo dessa pequena dama, tenho certeza que nada e ninguém, impedirá isso.

Ela deu um leve beijo em minha testa e se retirou, deixando a porta fechada e a vela ao lado da minha cama acesa. Deitei mais meu corpo e fiquei olhando para o teto, as palavras positivas de minha doce mãe, haviam caído em meu coração como sementes férteis e meus planos para o futuro, seriam a água que regaria minhas esperanças.

Minha vida ainda não estava escrita por completo, isso significava que eu não era obrigado a aceitar a vida simples que meus pais tinham, significava que eu tinha o direito de ser rico assim como os comerciantes importantes. O sentimento de mudança estava vivo em meu coração, se ser rico e respeitado pelos nobres significava poder ser amigo de lady .

No futuro eu seria o homem mais rico de toda a Inglaterra.

"Você é linda, eu sonhei com você,
Eu me apaixonei por você, mesmo antes de saber seu nome."
- Destiny / TVXQ (Dong Bang Shin Ki)



4. My Answer

Londres - Primavera de 1847

ver.:

Duas semanas se passaram desde o nosso casamento, eu estava tentando me adaptar a rotina agitada que Londres me proporcionava, mais especificamente estava tentando me adaptar aos passeios constantes pela cidade, que a senhora Poppy me convencia a realizar com ela. Mesmo sendo gentil e atenciosa comigo, eu ainda me sentia um pouco desconfortável com suas perguntas e curiosidades sobre minha vida íntima com .

Naquela manhã da primeira semana de maio, o sol estava formoso e convidativo a um breve passeio. Logo após me vestir com a ajuda de Sophie, - a acompanhante que tinha contratado, para que eu não ficasse tanto tempo sozinha em casa - tomei meu desjejum no jardim juntamente com ela. havia partido cedo para o porto, ele não podia deixar seus negócios sem supervisão.

Sophie era uma amiga de infância de minha prima Emilly, ambas cresceram juntas onde meu tio ainda mora, ao leste do condado de Northamptonshire, porém naquele momento a família de Sophie estava desamparada após a morte de seu pai, ela e sua mãe haviam perdido todo o patrimônio para um parente distante. Um dos problemas de não se nascer um homem, nossa sociedade podia ser bastante cruel com as mulheres.

Eu havia me sensibilizado com isso, quando Emilly me contou em sua breve visita há três dias, e então ao saber que planejava contratar alguém para ser minha acompanhante, sugeri uma pessoa que eu conhecia e poderia em parte, confiar. Sophie era discreta e muito educada, além de silenciosa quando necessário, o que era um ponto positivo em sua contratação, com isso eu poderia ajudá-la de alguma forma, principalmente consentindo sua mãe morar com ela, nos quartos dos empregados, em minha casa.

— Espero que sua mãe esteja confortável em seu quarto. — disse mantendo meu olhar na fonte ao nosso lado.
— Ah, sim mi lady, estamos muito bem instaladas e lhe sou muito grata por ter me contratado e acolhido minha mãe em sua casa também. — agradeceu ela com um olhar esperançoso.
— Fico feliz em ajudar uma amiga de minha prima. — sorri com gentileza.

Passamos um longo tempo em silêncio, dava para se ouvir até mesmo os pássaros nas árvores.

— Mi lady, seria refrescante um passeio pelas ruas de Londres hoje. — sugeriu ela ao terminar de tomar seu chá.
— Sim. — concordei me levantando da cadeira — Uma boa ideia, estou admirada de minha sogra não ter aparecido ainda para me convidar.
— A senhora Poppy é muito divertida em seus passeios. — comentou ela disfarçando o riso, se levantando da cadeira.
— Ela é espontânea a todo momento. — dei alguns passos em direção a porta de entrada da sala.

Sophie me acompanhou até sala, eu a deixei por um instante e subi para meu quarto, precisava pegar minha bolsa. Assim que saímos, o cocheiro já estava com a carruagem preparada, nos esperando próximo à entrada da mansão, entramos sem muita demora e seguimos em direção ao centro comercial de Londres.

Não demorou muito para que avistasse um rosto conhecido caminhando pelas ruas, pedi para que o cocheiro parasse e desci da carruagem. Sophie me acompanhou e juntas, atravessamos a rua até que cheguei de surpresa atrás de minha querida irmã Margareth, que olhava para a vitrine de uma luxuosa loja de sapatos, com seus olhos brilhando.

— Aposto que está pensando em comprar. — disse em seu ouvido, como uma forma de assustá-la.
— AH. — ela se virou para mim surpresa — .
— Estava mesmo concentrada. — eu ri.
— Sim. — assentiu, respirando fundo — Que saudade.

Nos abraçamos por alguns segundos, então eu me voltei para minha acompanhante.

— Margareth, acho que se lembra de Sophie. — disse desviando meu olhar para minha irmã novamente — Uma amiga de infância de Emilly.
— Hum, acho que me lembro sim. — Margareth vez uma breve reverência — Como está?
— Já estive um pouco melhor. — respondeu Sophie meio tímida — Mas graças a lady Winchester, não estou tão mal assim.
— Oh, soube que perdeu seu pai, lamento por isso. — Margareth desviou seu olhar para mim — Mas mudando de assunto, adivinha quem está animada para passar uma temporada em Londres?!
— Hum. — fingi estar pensando — Para ser honesta, estou curiosa para saber o que faz em Londres.
— Inicialmente eu não viria, mas quando soube que minha mãe e Freya viriam, não me contive em vir. — explicou minha irmã caçula.
— O que sua mãe e Freya estariam querendo em Londres, lady Evelyn nunca gostou desta cidade. — comentei direcionando meu corpo para frente e começando a caminhar.
— Ah, ambas começaram a ficar cheias de segredos entre si. — Margareth apoiou sua mão em meu braço ficando ao meu lado — Isto está acontecendo desde que o papai veio te visitar.

Enquanto caminhávamos na frente conversando, Sophie continuou nos seguindo a uma certa distância, respeitando nossa privacidade.

— Eu ainda tenho curiosidades sobre isso. — afirmei — Ele disse que estava preocupado, queria saber se estava confortável em minha nova casa.
— Nem sabe mentir. — Margareth riu baixo — Você se casou com o homem mais rico da cidade, desde quando não estaria confortável em sua nova casa?
— Hum. — desta vez eu tinha que concordar — Margareth, onde estão hospedados aqui?
— Estamos hospedados na casa de lord Wood. — respondeu ela demonstrando um pouco de tédio — Mas não posso afirmar que seja um bom lugar para se ficar, principalmente por sua adorável esposa.
— Ele é um grande amigo do papai. — disse mantendo meu olhar para frente — Mas, você poderia ficar na minha casa.
— Sério?! — ela me olhou com uma ponta de esperança em seus olhos.
— Sim. — assenti com um sorriso — Temos tantos quartos, além do mais vou ficar muito feliz em receber minha irmã.
— Mas, e o senhor Winchester? — perguntou ela — Acha mesmo que seu marido vai gostar da ideia? Vocês ainda estão em lua de mel.
— Ah. — dei um suspiro fraco — Não estamos em lua de mel, para ser sincera, nem sei se teremos, só o vejo há noite e vagamente pela manhã.
— Hum. — ela me olhou — Isso é triste, não imaginava que os burgueses trabalhavam tanto assim, nem mesmo almoçam juntos?
— Nos primeiros dias, sim. — sibilei um pouco — Acho que houve um problema no porto e ele está resolvendo isso há dias.

De um simples passeio com minha acompanhante, minha caminhada se estendeu muito com a presença de minha irmã, tanto que até nos esquecemos da hora do almoço. Para nossa surpresa, encontramos minha madrasta Evelyn e nossa irmã Freya, saindo de uma perfumaria com algumas sacolas, fiquei um pouco intrigada e curiosa, já que papai estava em uma péssima situação financeira.

— Boa tarde, lady Evelyn. — disse ao nos aproximarmos delas — Boa tarde, Freya.
— Olá mamãe, olá Freya. — disse Margareth permanecendo ao meu lado.
— Boa tarde. — Freya não demonstrou satisfação em nos encontrar.
— Boa tarde, lady Winchester. — Evelyn me olhou de cima para baixo, permanecendo seu olhar um pouco mais no colar de pérolas negras, que estava em meu pescoço — Margareth, não disse que iria ficar na casa do lord Wood, até retornarmos?
— Fiquei entediada. — respondeu Margareth — Mas estou feliz, pois encontrei no caminho.
— E como vai o casamento, minha querida enteada?! — Evelyn manteve seu olhar disfarçado em meu colar — Está conseguindo sobreviver aos costumes dos burgueses?
— Meu casamento vai muito bem, afinal os burgueses são tão normais quanto nós da nobreza. — respondi a ela, deixando minha voz permanecer suave — Hum, acho que em uma coisa eles são diferentes.
— Em que? — Evelyn subiu seu olhar para meu rosto.
— Eles conseguem ser sinceros a todo momento, mesmo sendo julgados por isso. — expliquei de forma direta.

Claro que, tanto ela quanto Freya tinham pegado minha indireta, ambas conseguiam ser mais falsas que a cobra que enganou Eva no paraíso. Ainda não entendia como meu pai tinha se casado com aquela mulher após a morte de minha mãe, menos ainda como Margareth tão gentil e legal, poderia ser filha dela.

Desviei meu olhar para Freya por um instante, notei que no canto do seu rosto havia um disfarçado sorriso de deboche, o que me deixava um pouco irritada, afinal desde criança Freya sempre era assim comigo, invejava tudo que eu tinha e tentava pegar para ela. Passei minha mão de leve em meu colar, e devolvi o seu deboche com um sorriso gentil.

— Já que nos encontramos aqui, gostariam de tomar um chá em minha casa? — perguntei de forma natural e espontânea.
— Agradecemos, mas… — iniciou Evelyn.
— Oh, por favor, não aceito recusa. — intervi de forma suave — Vocês ainda me devem uma visita.

Minha madrasta assentiu com a face.

— Vamos então. — disse me virando para trás — Ah, acho que já conhecem Sophie, ela é minha acompanhante agora.
— Boa tarde mi lady Evelyn, senhorita Freya. — cumprimentou Sophie.

Segurei um pouco meu riso enquanto caminhavam pelas ruas, logo avistei minha carruagem. Nós quatro entramos e nos sentamos, Margareth ficando ao meu lado, enquanto isso Sophie iria na frente junto com o cocheiro. Assim que chegamos, Lee nos recebeu na porta, pedi para Isla preparar a mesa do chá no jardim, enquanto isso nos reunimos na sala de visitas.

Era visível os olhares admirados de Evelyn, para os muitos quadros que estavam nas paredes da mansão, além de algumas esculturas que já havíamos visto em casas de alguns aristocratas de renome. Permanecemos sentadas conversando um pouco, ou melhor, Margareth era quem mais falava, contando sobre sua experiência ao explorar a pequena biblioteca da casa de lord Wood.

Assim que Isla deu-me o sinal de que tudo estava pronto, guiei minhas convidadas até meu lindo jardim, as deixando ainda mais encantadas com minha nova casa. Nos sentamos ao lado da fonte, nosso chá seria acompanhado por deliciosos crumpets com geleias, queijos e compotas.

— Nossa. — disse Margareth — Isso é porcelana francesa?
— Não. — segurei um pouco o riso e expliquei — É porcelana chinesa, as cores são mais vibrantes.
— São muito bonitas. — elogiou Freya, por seu tom de voz, parecia estar engolindo sua inveja junto com o chá que tomava.
— Sim, foi um presente de casamento de um nobre chinês, acho que sobrinho do imperador. — continuei de forma espontânea.
— Nossa, então é verdadeiro os boatos que o senhor Winchester tem muitos amigos orientais. — comentou Evelyn.
— Segundo minha sogra, sim. — assenti sem medo — Isso é bom, principalmente para os negócios.

Degustamos do nosso chá, com paradas para breves comentários sobre meu jardim e a decoração da casa, até que Isla se aproximou de mim discretamente.

— Mi lady, o senhor Winchester retornou. — disse quase em sussurro.

Logo que assenti desviei meu olhar para minha madrasta e ela estava olhando para trás de mim. Meu coração pulsou um pouco mais forte, de certo era meu marido que estava em seu campo de visão, virei meu rosto e lá estava com seu olhar intenso e fixo em mim.

— Senhoras, me deem licença. — eu me levantei.

Fiz uma breve reverência para elas, e me afastei indo em direção a que já havia entrando novamente na mansão. Ao chegar na porta, respirei fundo, era estranho meu coração estar daquela forma só por eu tê-lo visto, mas era um estranho bom.

. — disse após adentrar a sala de visitas.

Ele que estava de costas, se virou e estendeu sua mão para mim. Dei mais alguns passos até ele e segurei em sua mão, deu mais um passo se aproximando ainda mais de mim, pousando minha mão em seu coração. De leve acariciou minha face e aproximando seu rosto do meu, nossos lábios se tocaram em um beijo intenso e aquecedor.

“Você é o meu tudo, eu tenho certeza,
Eu serei mais cuidadoso e te protegerei,
Então o seu coração nunca será machucado,
Eu nunca me senti assim antes,
Como se minha respiração fosse parar.”
- My Answer / EXO



5. Fallin in Love

Londres - Primavera de 1847

ver.:

Seu beijo estava tão doce, que comecei a cogitar a ideia de não voltar para a mesa de chá, porém tinha que terminar o que havia começado, principalmente por causa de minha não tão querida madrasta.

— Estarei no escritório. — disse ele em sussurro ao se afastar de mim — Tenha um bom chá.

Eu sorri de leve, agradecida, e após uma breve reverência, voltei para o jardim. Minhas convidadas estavam falando sobre enxovais de casamento, Freya fez questão de contar-me a novidade sobre seu possível noivado e casamento com um nobre, o que tinha me deixado curiosa em saber o nome do pretendente.

— Assim não vale. — disse Margareth — Conta-nos a novidade, porém pela metade.
— Concordo com a Margareth, também estou curiosa para saber. — disse sorrindo.
— Bem, esta informação somente será revelada em nosso jantar de noivado. — explicou Freya num tom de satisfação — E tenho certeza que vocês irão se surpreender.
— Esperarei ansiosa por meu convite oficial. — retruquei um pouco pensativa em quem poderia ser o “sortudo”.
— Você e o senhor Winchester serão os primeiros da lista. — confirmou Evelyn dando um sorriso de superioridade.
— Agradeço a consideração. — fiz uma breve reverência e desviei meu olhar para Margareth — Ah, Marg, disse para elas que ficará aqui em minha casa?!
— Oh, ainda não. — Margareth pegou em sua xícara — Estava para contar sobre isso assim que retornasse.
— Margareth aqui?! — a face de Evelyn ficou mais séria.
— Sim, eu a convidei hoje mais cedo. — confirmei — Algum problema?
— Nenhum, porém… — Freya desviou seu olhar para o lado.
— Porém...? — insisti.
— Não acha que nossa irmã aqui, atrapalharia sua lua de mel?! — Freya terminou a frase.
— Bem, minha lua de mel foi adiada temporariamente. — respondi não demonstrando estar abatida por sua pergunta — Meu marido tem estado ocupado com os negócios.
— Ah, burgueses e seus deveres. — Evelyn riu de leve do próprio comentário — É uma pena minha querida, que tenha se casado com alguém tão diferente de nós.
— Eu não acho. — retruquei com segurança — Pelo contrário, estou imensamente satisfeita com a minha escolha.
— Sua escolha? — Freya riu — Sabemos o real motivo de seu casamento, a dívida do papai.
— Freya está correta. — confirmou Evelyn.
— Não exatamente, claro que existia sim uma dívida, mas nosso pai nunca me obrigou a dizer sim perante o padre, então a escolha foi minha. — soltei um suspiro de satisfação — E jamais farei uma escolha tão certa em toda a minha vida, quanto a que fiz ao me casar com ele.

Meu coração acelerou um pouco, senti que minhas palavras eram reais e verdadeiras, eu não estava arrependida de ter me casado com , melhor ainda, eu ansiava conhecê-lo ainda mais do que já o conhecia. Minhas palavras tiveram um grande efeito sobre o sorriso de deboche que se apagou na face de ambas.

— Bem, estou imensamente feliz por terem aceitado meu convite. — disse me levantando da cadeira — Porém agora irei me recolher, Isla irá acompanhá-las até a porta, e Margareth mandarei que busquem suas coisas na casa do lorde Wood.

Eu fiz uma breve reverência a elas e segui em direção a mansão. Ao passar por Isla, dei minhas ordens e pedi para que um dos cocheiros levasse minha madrasta e Freya para a casa de lord Wood, e aproveitasse para pegar as bagagens de Margareth. Segui indo diretamente para o escritório onde estava, dei alguns toques na porta antes de entrar.

. — entrei fechando a porta — Está ocupado?
— Não. — ele fechou o livro que estava em suas mãos e manteve seu olhar em mim — Deseja algo minha senhora?
— Desejo saber se está tudo bem, como foi seu dia. — disse dando mais alguns passos até sua mesa.

Ele sorriu de canto disfarçadamente e se levantou de sua poltrona, mantendo-se em silêncio e com o olhar fixo em mim. era de poucas palavras, o que me deixava intrigada pelo fato de ser filho de burgueses, por mais que lhe perguntasse coisas sobre seu dia ou sobre sua infância, ele respondia da forma mais breve e direta possível.

— Está tudo bem. — assentiu ele.

Silencioso e observador, eram as maiores e mais marcantes características dele, o que me deixava irritada, sua voz grossa e marcante havia me deixado um tanto fascinada, principalmente quando sussurrava em meu ouvido. Dei mais dois passos até ele, tentava desviar um pouco meu olhar dele, ainda não conseguia confrontar toda a intensidade do seu olhar em mim.

— Eu… — precisava dizer sobre meu convite a minha irmã — Convidei Margareth para passar alguns dias em nossa casa, enquanto está em Londres.

Levantei meu olhar. Eu já havia percebido que ele não gostava muito de visitas inesperadas, a senhora Poppy era uma prova disso, suas aparições para o almoço ou jantar faziam atiçar os olhares de reprovação de .

— A casa é sua, tem a permissão de convidar quem quiser. — assentiu ele.
— Não quero deixá-lo desconfortável em sua própria… — ele tocou em meus lábios com seu dedo indicador.
— Só há um momento em que me sinto desconfortável. — ele desceu sua mão até minha cintura me deixando ainda mais próxima a ele — Quando não está ao alcance dos meus olhos, ou longe o bastante para que eu não possa tocá-la.

Ele encostou seus lábios em minha testa por alguns instantes, até que enfim meu coração se acelerou com o gosto doce do seu beijo, suave no início e se intensificando ainda mais a cada segundo. Minhas pernas sempre bambeavam quando sentia suas mãos segurando em minha cintura, assim como meus sentimentos por ele estavam pouco a pouco crescendo e se fortalecendo, eu já poderia admitir que estava apaixonada pelo meu marido.

… — sussurrei me afastando um pouco — Quem é você?
— Por que a pergunta?! — ele me olhou confuso — Sou seu marido.
— Você é bem mais que isso. — suspirei de leve — Como pode saber tudo sobre mim, e eu não saber nem a metade sobre você?!

Ele sorriu de canto mantendo seu olhar em mim.

— Um dia você saberá. — ele segurou em minha mão e deu um leve beijo.

Assenti com um sorriso, não estava muito conformada, tinha esperanças que obter todas as respostas dele, mesmo que superficiais e sem nenhum tipo de detalhe. Permanecemos no escritório por um longo tempo, ele sentado em sua mesa concentrado nos documentos de seus negócios e eu sentada na chaise lendo o livro de poesias que ele estava lendo quando entrei.

Foi um pouco engraçado ver ele tentando concentrar sua atenção nos papéis, pois seus olhos sempre vinham em minha direção. Mantive meu riso disfarçado, porém sempre que o via me olhando, não conseguia deixar de sorrir para ele antes de desviar meu olhar e voltar a minha leitura.

— Senhor Winchester?! — disse Lee ao bater na porta.
— Entre. — respondeu .
— Senhor, mi lady. — Lee caminhou até ele e disse algo em sussurro.

Se afastando um pouco, fez uma breve reverência para mim e saiu.

— Algum problema? — perguntei.
— Não. — se levantou e caminhou até mim, esticando sua mão — Venha, o jantar nos aguarda.

Assenti e segurei em sua mão, assim seguimos em direção à sala, Sophie e Margareth estavam sentadas no sofá nos aguardando. Seus olhares para mim, pareciam curiosos e cheios de perguntas sobre o que possivelmente eu estaria fazendo no escritório com o senhor meu marido.

Nos sentamos à mesa e fomos servidos pelos valetes, para minha surpresa, nosso jantar foi um pouco silencioso, acho que Margareth estava com um pouco de vergonha de , entretanto mesmo que suas palavras não saíssem, seus olhares para mim diziam tudo. Após o jantar, permanecemos mais algum tempo na sala de visitas, Margareth me fez tocar a canção da noite que meu pai tinha me ensinado quando criança.

Aquela foi a primeira vez que toquei na presença de .

— Ele é bem silencioso. — comentou Margareth assim que entramos no quarto que Isla e uma das criadas, havia preparado para ela.
— Sim. — assenti permanecendo na porta — Acho que já estou me adaptando a isso, em alguns momentos sinto que seu olhar pode dizer mais do que mil palavras.
— Hum. — ela sorriu de leve — Seus olhos estão brilhando.
— Estão? — perguntei surpresa.
— Está gostando dele, não está? — indagou Margareth se sentando na cama.
— Sinto que sim, a cada dia consigo gostar ainda mais de estar ao lado dele, será que posso considerar estar apaixonada por ele?
— Claro que sim. — Margareth riu de leve — A maneira como o defendeu dos comentários da minha mãe e Freya hoje no chá, já é o suficiente para perceber que está se apaixonando por ele.
— Ah. — dei um suspiro forte — Vou me recolher agora, lhe desejo uma confortável noite.
— Neste quarto maravilhoso?! Minha noite será encantada. — brincou ela tombando seu corpo sobre a cama.
— Boa noite Marg. — disse abrindo a porta.
— Boa noite ! — ela sorriu de leve.

Eu pisquei de leve para ela antes de fechar a porta do quarto, assim que entrei em meu quarto, a criada já estava me esperando, ela me ajudou a me banhar e colocar minha camisola nova de linho egípcio, um presente da senhora Poppy. Segundo ela, uma senhora casada não deveria repetir suas roupas íntimas nos primeiros meses de casada.

— Agradeço, pode ir agora. — disse a criada.
— Com sua licença, mi lady. — a criada se retirou.

Eu me coloquei em frente ao espelho e comecei a pentear meus cabelos com a escova, por um momento fiquei um pouco distraída e perdida em meus pensamentos, estava pensando na notícia do noivado de Freya. Inegável minha curiosidade em saber quem seria o corajoso, a se casar com a pessoa mais materialista que eu conhecia.

Em meio a muitos pensamentos desnecessários, senti de repente um longo arrepio em meu corpo, proveniente de um beijo que tinha dado em meu pescoço. Toda minha atenção se voltou para ele de imediato, meus olhos direcionados para seu reflexo no espelho. Respirei fundo tentando manter meu coração calmo, virei-me para ele.

— Pensei que demoraria mais. — disse com minha voz meio falha — Sua conversa com Lee parecia séria e importante.
— Hum. — ele acariciou minha face suavemente.
— Posso saber sobre o que conversavam? — perguntei mordendo meu lábio inferior.
— Estava confirmando minhas ordens sobre… — ele parou por um momento, seu olhar suavizou um pouco.
— Sobre?!
— Aprontarem minha casa em Paris. — finalizou ele.
— Vai viajar para Paris?!
— Não. — ele segurou em minha cintura, acho que já tinha descoberto meu ponto fraco — Nós vamos a Paris, em lua de mel.
— Paris?! — sussurrei sentindo meu coração acelerar um pouco.
— Perdoe-me por adiar tanto. — disse ele sorrindo de leve.
— Não há o que perdoar, sei que tem muitos compromissos. — desviei meu olhar para o chão.
— Sim, eu tenho. — ele tocou em meu queixo erguendo minha face, me fazendo olhar para ele — Mas você é mais importante que todos eles.

Me senti um pouco sem ar com aquela declaração, senti sua aproximação e logo fechei meus olhos, instantes depois seus lábios já estavam tocando os meus. Era como se toda a intensidade que ele tinha em seu olhar, se transferisse para seus beijos maliciosos e ao mesmo tempo doces, que faziam meu corpo se aquecer de forma incontrolável.

O toque de seus dedos em minhas costas faziam meu corpo se arrepiarem, e quando ele alisava todas as linhas das minhas cicatrizes, eu perdia até mesmo os sentidos. Todos os músculos do meu corpo se movia em sincronia com o dele, principalmente minha respiração que a cada beijo parecia ainda mais ofegante.

— Você perguntou quem eu era. — disse ele assim que nossos corpos tocaram os lençóis de seda da cama.
— Sim. — assenti o olhando nos olhos.

Ele aproximou seus lábios do meu ouvido e sussurrou.

— Permita-me mostrá-la quem sou eu.

Senti meu corpo se arrepiar por inteiro, eu queria sim saber quem realmente era , e porque eu tinha me apaixonado tão rápido por ele. Por que meu coração acelerava simplesmente ao ouvir sua voz, por que minhas pernas ficavam bambas com o toque de tuas mãos, por que de forma tão intensa meu corpo reagia ao amor dele sem nenhuma resistência.

"Estou apaixonada por você, eu devo ter perdido a cabeça,
No momento em que as pontas dos seus dedos tocaram meu corpo,
[...]
Meu coração,
Está batendo tão rápido."
- Falling In Love / 2NE1



6. Destination

Nottinghamshire - Inverno de 1837

ver.:

Havia passado alguns anos e recentemente nossa casa havia recebido mais um hóspede, Aidan era sobrinho dos meus pais, devido a uma fatalidade acontecida com seus pais que vieram a falecer em um desastre, sua única opção além de um orfanato foi morar em nossa casa. Ele era um pouco mais novo que eu, porém nem sua pouca idade impediu meu pai de lhe ensinar o ofício da família, claro que eu seria responsável por Aidan.  

— Estou com fome. — disse aquela pequena criança pela quinta vez, ao se sentar no chão.
— Não podemos comer agora. — abaixei a faca que estava em minha mão e o olhei — Ainda estamos trabalhando, meu pai deixou tudo isso para fazermos.
— Mas estou com fome. — ele suspirou fraco me olhando como um cachorro abandonado.
— Hum, tudo bem, pode ir comer, eu termino de fazer isso. — assenti voltando meu olhar para os cortes do porco que estavam em minha frente.
— Obrigado . — ele se levantou mais que depressa e saiu correndo em direção a casa.

Respirei fundo e voltei ao trabalho, a parte boa de finalmente aprender todos o segredos daquele ofício, foi aprender também o básico sobre negócios, o que me levou a perceber que meu pai era um tanto ruim neste quesito. Além de não anotar todas as dívidas dos seus clientes, ele também não sabia negociar e nem cobrar o que lhe deviam, o resultado era a nossa vida precária e miserável. Eu sentia lá no fundo que deveria fazer algo a respeito, mas não sabia o que, ninguém daria ouvidos a uma criança.

Porém, mesmo assim já estava determinado a mudar meu destino, uma vida de pobreza não estava nos meus planos para o futuro, principalmente por causo do meu propósito inicial que é me aproximar da lady . Continuei meu trabalho em silêncio, fazendo minha mente funcionar constantemente arquitetando soluções, a primeira delas me veio juntamente com um brilho no olhar.

Mesmo que inicialmente meu pai não quisesse seguir eu estava decidido a insistir, então assim que terminei de colocar todos os cortes dos porcos, em seu lugar para conserva corri para casa para compartilhar a ideia com minha mãe.

— Oh, anjo, pensei que não viria comer também. — minha mãe me olhou com aquele doce sorriso em seu rosto, que sempre me fazia sentir acolhido.
— Estava terminando meus afazeres, mas confesso que estou mesmo com fome. — desviei meu olhar para o chão, colocando a mão na barriga, a sentindo fazer alguns barulhos estranhos.
— Ah, estou percebendo, você se dedica muito a este ofício, estou orgulhosa que esteja ajudando seu pai. — ela manteve aquele sorriso no rosto — Olha lave as mãos e venha comer.

Assenti e corri até o balde com água que estava em cima de uma cadeira ao lado da porta, lavei minhas mãos rapidamente e me voltei para a mesa.

— Estaríamos muito melhor se o papai conseguisse receber dos seus clientes. — comentei.
— O que está falando de mim?! — logo sua voz soou vindo da porta — Assim como eu, sua roupa estava suja de sangue.
— Nosso filho só está falando a verdade. — consentiu minha mãe — Os clientes do açougue são nobres, deveriam pagar pelo que compram.
— Não devemos reclamar… — ele suspirou com um ar de cansado, sua face parecia mesmo cansada, ele estava trabalhando nas entregas desde a primeira hora do dia — Temos cliente e isso já é uma benção.
— Clientes que não pagam, e quando fazem são somente restos de seus castelos. — mantive meu olhar para o prato, me sentindo frustrado.
— E o que você sabe sobre isso, ainda é uma criança. — ele levantou seu tom de voz — Acha que consegue fazer melhor que eu?
— Não senhor. — sussurrei.
— Deixemos de discutir, a hora do almoço é sagrada, então vamos nos sentar e agradecer a Deus pelo que temos. — minha mãe sentou na cadeira ao meu lado — Tenho certeza que mesmo sendo uma criança, quer fazer o melhor pela nossa família, isso me deixa ainda mais feliz.

Dei um sorriso fraco, por dentro me sentia incapaz de tudo por ser uma criança, queria ser um adulto e poder resolver tudo no lugar deles. Para mim aquele jantar foi amargo, ainda mais por todos os defeitos que meu pai ainda apontava em tudo que eu fazia, talvez ele estivesse chateado por minha reclamação, mas eu estava certo, não seríamos pobres se ele fosse um bom comerciante. Passei o resto do dia pensando sobre como eu poderia ajudar minha família, minha única solução foi a mais perigosa.

Eu fugiria de casa.

Sem o menor remorso, eu teria que aprender longe de casa, precisava crescer não somente fisicamente, mas também mentalmente e não conseguiria fazer isso perto da minha família, meu pai era um bom homem, mas tinha medo da nobreza. Eu não conseguiria aprender o que é ser respeitado ou temido com ele, precisava aprender com alguém que não tinha receio nenhum de enfrentar aquele nobres. Eu precisava me tornar um homem forte e respeitado.

No meio da madrugada, me levantei da cama, já havia deixado uma trouxa de tecido com alguns suprimentos, escondida debaixo da minha cama, respirei fundo ao pegá-la tentando não fazer muito barulho. Não queria acordar ninguém, pois daria uma enorme confusão.

?! — disse Aidan se remexendo na cama — Onde está indo?!
— Na cozinha, pegar um pouco de água. — sussurrei ao olhar para ele — Volte a dormir.

O cobri mais um pouco e me afastei de sua cama, olhei novamente para minha cama fixando meu olhar no pequeno bilhete, meu coração estava apertado pois a segunda pessoa que mais amava choraria com meus atos. Minha mãe ficaria triste sem seu anjo, mas faria isso por ela também, de alguma forma beneficiaria a minha família. Respirei fundo pela última vez deixando aquele quarto, aquela casa, aquela família, eu voltaria, mas não como uma criança, mas como um homem de respeito.

Segui pela estrada secundária do condado, até que avistei algumas tropas da nobreza e me escondi no meio dos grandes arbustos. Já havia ouvido sobre a visita de um de um grão-duque ao condado de Nottinghamshire, primo de terceiro grau do príncipe, que vagamente se lembravam que estava na linha de sucessão, mas com um título de nobreza tão alto, já era o bastante para ser bajulado por toda a população.

— Odeio os aristocratas. — sussurrei vigiando a passagem das tropas.

Todos com sua impecável postura de cavaleiros da realeza, com o brasão britânico serigrafado em suas armaduras, e o estandarte logo a frente guiando os demais, tive que continuar meu caminho pelos arbustos, pois a comitiva parecia grande. Aproveitei aquele momento para comer uma das frutas, que estavam na trouxa além de descansar também. Demorou vários dias, até que consegui chegar em Nottingham, considerado o centro administrativo do condado.

Para mim, aquela cidade poderia representar uma oportunidade para mim, comecei aproveitando a estadia do tal nobre, para oferecer meus serviços a um mercador que precisava de mais funcionários. Apesar de ser uma criança, mostrei a ele o quanto poderia ser útil no esforço físico, aproveitando observaria como seu comércio funcionava e como ele comercializava seus produtos diante da nobreza. Aquele homem era um mercador de peles de animais, era conhecido como Jones das peles, e parecia ser muito famoso entre os outros comerciantes, principalmente alfaiates e costureiras.

Segundo o senhor Jones, suas peles eram as mais raras que as pessoas encontrariam, o que fazia seus produtos ficarem mais caros, já que todos procuravam. Esta foi a primeira coisa que aprendi longe de casa, um comerciante deve sempre valorizar seus produtos e fazê-los ser mais raros e preciosos aos olhos dos clientes. Isso me lembrava das criações de javali que meu pai tinha, eram raras e ele não as valorizava, já que estavam extintos em nosso país.

— Eu garoto, vais ficar parado aí? — gritou o senhor Jones — Se apresse e coloque as peles no baú.
— Sim senhor. — corri até a carroça onde estavam as peles e peguei as duas que o homem tinha comprado e levei até onde estava o baú, em sua carruagem.

Passei toda aquela temporada aprendendo sobre peles com o senhor Jones e principalmente como conservá-las, aprendi também algumas coisas sobre como negociar com os clientes, aquilo havia me deixado maravilhado. Continuei trabalhando com o senhor Jones durante alguns anos, indo de condado em condado até que chegamos a grande capital Londres. Meus olhos até brilharam com todas aquelas construções monumentais e luxuosas.

Fiquei ainda mais tentado a passar algum tempo naquele lugar para aprender um pouco mais como aquela desigual sociedade funcionava, foi neste momento que comecei a trabalhar na mais famosa padaria da cidade.

— Tem certeza que conseguirá fazer todas estas tarefas ao dia? — perguntou novamente a senhora Hill.
— Sim senhora, eu consigo fazer muitas tarefas ao mesmo tempo, tenho muito conhecimentos em conservar mercadorias. — assenti me encolhendo um pouco.

A senhora Hill era uma mulher robusta e suas expressões faciais eram de causar medo, mulheres independentes como ela eram consideradas pela sociedade má influência, às damas da nobreza, porém mesmo assim todos faziam diversas encomendas a sua padaria. O segredo do seu sucesso, eram os famosos pães de mel, que fazia toda a cidade reverenciar e aplaudir aquela padaria, mas tinha que admitir que eram realmente gostosos, principalmente por serem feitos com puro mel de abelha das colmeias que ela cultivava no jardim dos fundos da padaria.

— Você já trabalhou em açougue, com mercador de peles, sabe que o tipo de alimento que eu produzo, não é algo para se conservar. — ela se levantou de sua cadeira, com aquele olhar sério, que fazia minha espinha tremer — Todos os pães, bolos, croissants, biscoitos que existem nessa padaria são feitos e vendidos diariamente, não guardamos nada.
— Então, o que a senhora faz como o que sobra? — perguntei confuso.
— Vendemos para um senhor, para alimentar seus porcos. — respondeu ela com um leve ar de superioridade, como se estivesse fazendo um bom negócio.
— Mesmo assim senhora, tenho certeza que conseguirei fazer todas estas tarefas. — afirmei com confiança.
— Muito bem, lhe darei uma chance, se falhar no primeiro dia, te enxotarei daqui. — assegurou ela com aquele tom intimidador.

Assenti pensando se aquilo era um bom negócio, pois havia visto alguns pães dormidos semelhantes aos da sua padaria sendo vendidos mais barato, o que me levou a acreditar que não eram porcos que comiam. Felizmente consegui sobreviver o primeiro mês, tinha certeza que minha motivação estava nas duas pessoas que mais amava na vida, minha mãe e lady , a cada amanhecer que eu mantinha meus pensamentos nela para aguentar mais um dia.

, já limpou toda a área pública da padaria? — perguntou Oliver ao se aproximar de mim, ele era o filho único da senhora Hill, que apesar desse grau de parentesco era tratado da mesma forma que os demais funcionários, pela mãe.
— Sim, é o primeiro lugar que eu limpo, sei que a padaria abre para o público na primeira hora da manhã. — confirmei minha tarefa inicial do dia, que me fazia acordar de madrugada — Precisa de mais algo?
— Sim, que limpe o escritório, a senhora Hill irá receber um cliente especial. — pediu ele dando demonstrações de estar cansado.
— Está tudo bem senhor?! — perguntei preocupado.
— Não muito, estamos com problemas de sobra, como se as pessoas estivessem parando de comprar em nossa padaria. — explicou ele.
— Acho que sei a causa. — eu estava guardando aquilo para mim, pois a senhora Hill jamais daria ouvidos a um subalterno como eu, mas sei filho talvez — Eu acabei presenciando uma cena bastante curiosa, já vem acontecendo desde que comecei a trabalhar aqui.
— O que seria?! — ele parecia curioso por minha informação.

Contei a ele sobre as vendas de produtos semelhantes ao da padaria, Oliver por incrível que pareça acreditou em mim de imediato e pediu para que eu comprasse um desses produtos para servir de prova. Eu o ajudaria a convencer sua mãe a acreditar e experimentar uma ideia que ele havia tido tempos atrás, em troca ele me daria uma recompensa além do salário que eu ganhava ao trabalhar lá.

Assim que apresentamos a prova a senhora Hill e Oliver propôs novamente a solução de reutilizar as sobras como outros produtos, ela ficou um tempo em silêncio olhando para aquele pães dormidos.

— Você acha que minha padaria deveria fazer isso? Somos seletos em nossos pães e derivados, como poderíamos vender algo passado? — ela parecia confusa e furiosa ao mesmo tempo.
— Senhora, tenho certeza que dará certo, pelo menos da forma que desejo fazer. — argumentou seu filho — Dê-me esta chance que eu lhe mostrarei resultados positivos.
— O que este funcionário está fazendo aqui?
— Ele está me ajudando senhora, foi ele quem me contou sobre as vendas falsas. — explicou Oliver.
— Darei somente uma oportunidade, se falharem, já conhecem o caminho da porta. — anunciou ela.

Um frio gelado passou por meu corpo. A senhora Hill teria mesmo coragem de expulsar o próprio filho?!

Foi trabalhoso para Oliver conseguir colocar em prática suas ideias, porém após cinco noites em claro de testes e mais teste, conseguimos chegar ao resultado esperado. Ele havia finalmente provado para sua mãe que seria o melhor padeiro de Londres e eu finalmente tinha aprendido todo o ofício deles, além de como funcionava a cozinha de uma padaria. O que resultou na segunda coisa que aprendi longe de casa, jamais se contentar com o que está fazendo e sempre se superar, Oliver superou todas as expectativas com os pães dormidos, transformando eles em coisas melhores e mais saborosas, finalmente a padaria voltaria a sua fama e riqueza inicial.

Os anos foram passando, quando finalmente o glamour de Londres começou a me deixar tedioso, além da padaria, trabalhei em quase todos os comércios da cidades, sempre adquirindo mais conhecimento e experiência.  Porém um mercador de peixes do porto cruzou o meu caminho, me deixando ainda mais curioso para ser como funcionava o comércio marítimo, algo que estava gerando muito lucro atualmente.

Logo me ofereci para trabalhar com ele, e graças a toda minha experiência com os burgueses da cidade, ele me contratou sem o menor problema, felizmente naquele trabalho eu ganharia bem mais. O que me fazia lembrar que tinha que ser mais cuidadoso, com minha pequena fortuna, como não tinha despesas e sempre comia as sobras, guardava cada moeda de prata que recebia de pagamento.

Foi no porto de Liverpool no condado de Merseyside, que a coisa mais imprevisível aconteceu comigo, eu a vi ao longe, lady também estava naquela cidade. Por um breve momento, as tinha certeza que era ela, estava linda como da primeira vez que a vi, segui sua carruagem ao longe, até chegarem a casa do governador. Fui me aproximando aos poucos, até que percebi uma movimentação suspeita aos arredores da casa.

Pela primeira vez, me deparei com piratas, os mesmos das histórias que minha mãe me contava.

— Lady . — sussurrei já me preocupando com ela.

“Os golpes da bandeira ao vento, minha visão se torna mais escura
Eu serei capaz de ver o meu destino
O vento agitava a bandeira, os meus passos estão perdidos ao longo da frente
Eu seria capaz de chegar ao meu destino”
- Destination / SHINee



7. Black Pearl

Liverpool - Outono de 1842

ver.:

Mesmo de longe eu conseguia ver algumas armas que estavam mal escondidas nas mãos de um deles, me mantive escondido atrás de uma das carruagens que estavam estacionadas, respirei fundo desejando que ele não adentrassem aquela enorme casa. Em minha mente a imagem de lady se firmava de forma intensa, mesmo não sabendo ao certo se era realmente ela.

— Preciso fazer algo. — sussurrei de leve mantendo meu olhar em um dos piratas que parecia comandá-los.

Respirei fundo e passando por alguns barris que estavam próximo a entrada dos criados, cheguei a cozinha, pela posição dos piratas tudo indicava que entrariam pela porta da frente, então só teria um lugar para que eu pudesse entrar. Como todos naquele lugar estavam aparentemente concentrados em seus afazeres, aproveitei para passar silenciosamente pelas beiradas do longo caminho que levava ao grande salão.

Ao chegar próximo de uma grande escultura de mármore, me escondi atrás e fiquei observando, haviam muitas pessoas naquele lugar que deveriam ser importantes. Minha visão passou por cada um daqueles homens que falavam tão cordialmente e baixo, ao contrário dos comerciantes que eu estava acostumado a conviver. Depois voltei minha atenção para o lado onde se concentravam as mulheres, todas com seus vestidos monumentais e cheias de joias, eram belas e delicadas.

Porém uma bela dama que estava mais próximo a escultura, era essa que meus olhos procuravam, seu olhar voltado para o vaso ao lado a fez se aproximar ainda mais do lugar onde eu estava. Foi neste momento que um estouro surgiu bem próximo a porta da frente e logo os piratas adentraram o lugar, não me contive em meu desespero de pensar que algo aconteceria a ela. Peguei na mão de lady em um momento de distração que seus olhos se voltaram para os piratas que adentravam, então a impulsionei para minha direção a envolvendo em meus braços abaixando um pouco seu corpo.

— O que está… — ela se remexeu, mas logo outro barulho do que seria de uma colt, o que a fez se encolher um pouco mais para perto de mim.

Meu coração acelerou um pouco com aquilo, ajeitei o capuz que estava em minha cabeça escondendo um pouco mais meu rosto, eu teria que tirá-la de lá o mais rápido possível. Como tinha muitas pessoas além dos diversos empregados, era uma oportunidade, segurei em sua mão de maneira firme, mas que não a machucasse e tomando impulso direcionei nossos corpos para um corredor lateral que estava mais escuro. Não sabia para onde nos levaria, mas era nossa oportunidade para sair dali ou nos esconder.

Então chegamos a uma porta, que sem maiores preocupações abri. Saímos no que parecia um jardim lateral, diferente de todo jardim que eu já havia visto antes, o que foram poucos, eu mantive minha mão segurando a dela e a guiei para longe da porta, até chegarmos em um alto arbusto.

— Espere por favor. — disse ela de forma insegura — Quem é você?

Me mantive em silêncio, virando minha face para o lado para que não visse meu rosto.

— Diga-me por favor, preciso agradecer adequadamente a pessoa que tanto me protege. — insistiu ela com mais afinco.

Logo ouvi vozes perto da porta e então a afastei de mim para que ficasse atrás dos arbustos, foi então que outro tiro soou atrás de mim.

— Ei você. — gritou um homem com voz rouca — Pelas veste não é um nobre, deve ser a plebe.
— Olha, ele parece não ter língua. — um pouco robusto logo atrás deu dois passos em minha direção — O que esconde aí?

Balancei minha face negativamente, recuando um pouco.

O homem robusto se aproximou de mim e antes que segurasse minha capa com força, fiz um sinal com a mão direita para trás, para que lady não fizesse nenhum movimento que a denunciasse. O homem me arrastou por alguns instantes, mesmo debatendo meu corpo e tentando me soltar era um tanto inútil por seu tamanho.

— Coloque ele para dormir. — disse o homem da voz rouca — Temos que ir.
— Vou levá-lo comigo. — disse o robusto — O capitão vai gostar de um mascote.

Aquelas palavras fizeram a espinha do meu corpo estremecer, antes que eu pudesse fazer mais algum movimento, senti um forte impacto em minha nuca me fazendo perder os sentidos.

- x -


Acordei sentindo um leve enjoo que me fez vomitar assim que abri os olhos, uma estranha sensação de instabilidade tomou conta de mim, ao olhar em minha volta estava em um lugar úmido e cheirando a mofo. Ergui meu corpo do chão, colocando-me de pé e lancei meu olhar para frente, a poucos passos havia uma grade diante de mim me fazendo presumir que estava em algum tipo de cela.

— Olha só o mascote acordou. — o homem robusto estava do outro lado, fixei um pouco meu olhar naqueles dentes sujos e podres, que me davam mais ânsia de vômito — Vou te tirar daí, vamos ver se diante do capitão continua mudo.

Ele deu uma gargalhada estranha e destrancando a fechadura, abriu a cela e logo veio para cima de mim me pegando desta vez pela camisa, já que haviam retirado a capa de mim e me arrastou em direção à proa no navio.

— Vejam só nosso mascote. — aquele homem da voz rouca estava em próximo a escada que subimos — Torça para o capitão ir com a sua cara.

Mantive minha face mais abaixada, ainda sendo puxado por aquele homem robusto e fedorento.

— Aqui está ele capitão. — disse o homem me jogando no piso da proa.
— Ora ora… — a voz do capitão era áspera e firme, soava um certo sarcasmo — Vocês me trouxeram uma criança de mascote.

Criança? Eu já estava me aproximando de meus 18 anos e ele me olhava como uma criança, levantei meu corpo daquele chão grudento e respirei fundo, com minha face abaixada meu olhar continuava direcionado para as velhas botas daquele homem.

— Olhe para mim mascote. — ele aumento um pouco o tom de sua voz.

Meus olhos foram seguindo cuidadosa e atentamente, das botas até chegar em seus olhos cheios de mistérios, engoli seco já imaginando que aquele poderia ser meu último momento em vida. Um aperto logo veio em meu peito, imaginando que não teria nem mesmo sequer uma gota de oportunidade, de me aproximar adequadamente de lady . Soltei um suspiro de satisfação, pelo menos ela estava segura e longe de tudo aquilo que me acontecia.

— Você tem nome? — perguntou ele.

Mantive-me em silêncio novamente.

— Ele é mudo capitão. — comentou o robusto — Não soltou nenhum som desde o momento em que o vimos.
— Hum… — ele me olhou de cima para baixo e sorriu de canto — Acho que você tem sorte criança, bem-vindo ao Bella Donna.

Disse ele enfatizando o nome do navio.

Com aquilo pude respirar mais aliviado, ou melhor, era o que eu pensava até me jogarem na cozinha, não parecia ao certo uma cozinha e ficava próximo às celas bem abaixo do convés. Outra sorte minha foi ter aprendido a cozinhar com o Oliver, eu não seria um inútil naquele navio e poderia garantir alguns dias a mais de vida, apesar de começar a acreditar que morreria de tanto trabalhar naquele lugar. Algo que fazia voltar a memória meus dias na workhouse do senhor Cooper, nem mesmo na casa de meus pais eu trabalhava tanto naquele açougue.

Os meses no mar foram passando, aos poucos consegui me acostumar com o balançar do navio, até mesmo havia feito algum tipo de amizade louca com os dois piratas que arrastaram-me para aquilo tudo. O de voz rouca era chamado de Sid, já o robusto se chamava de Gibbs, quanto a mim fiquei sendo chamado por todos de Mascote, algo que me cansava.

— Mascote, mandei que trouxessem-lhe pois estou com um novo objetivo em vista. — disse o capitão ao pegar uma maçã verde que estava junto a bandeja de prata com as outras frutas.

Mantive meu olhar observado em suas expressões corporais, no pouco tempo que estava ali já havia percebido que o capitão era diferente dos outros, mesmo com aquelas vestes sujas e fedorentas de um homem que estava ao mar a anos, ele tinha um porte que lembrava os nojentos nobres da Inglaterra. O que me fazia pensar sobre o passado do capitão, será que ele era da nobreza ou conviveu com eles?

— Sou um homem que dispõe de muito tempo, venho o analisando durante este tempo, percebi que mesmo sendo mudo, és muito observador ou que nos ajudaria muito e como provaste ser de confiança, irei te ensinar algumas coisas sobre a vida, principalmente sobre as riquezas do mundo. — eu olhar ficou mais intenso como se estivesse imaginando algo para mim.

Senti-me receoso por isso, entretanto, uma breve palavra que me dissera havia atiçado minha vontade de aceitar seus ensinamentos: riqueza. Era aquilo que eu buscava acumular a muito tempo e não conseguia, mantendo meu olhar no capitão, respirei fundo e assenti com segurança no olhar.

— Muito bem, começaremos agora mesmo, há muito para aprender em pouco tempo. — ele sorriu de canto.

O capitão parecia mesmo muito animado, todos os dias ele me acordava antes do pôr-do-sol, e meu treino se iniciava da forma mais cruel e brutal possível, desde manejar uma espada ou atirar com armas mais modernas como uma colt, a combates físicos contra os outros piratas em pleno sol do meio dia. Comecei a constatar que aqueles treinamentos eram mais cansativos que trabalhar o dia todo limpando o barco e cozinhando para toda a tripulação.

Eu sentia os ossos do meu corpo querem se partir ao meio, minha carne ardia de dor e todos os dias eu dormia na ponta da proa sob o céu estrelado, sempre amarrado como um castigo por não ganhar nenhuma luta. Eu queria desistir, eu ansiava por algo que me tirasse daquela situação, mas quando me lembrava que o segundo nível do treinamento era conhecimento, sentia meu corpo se fortalecer instantaneamente.

— Congratulations mascote, sobreviveu a tudo até agora. — a ironia soava um pouco em seu olhar, batendo algumas palmas para mim.

Assenti mantendo meu olhar voltado para ele.

— Agora vamos para a sua recompensa, vamos ao conhecimento. — ele sorriu com satisfação.

Sim, conhecimento. Era naquele estágio que eu queria chegar, era conhecimento que os nobres tinham e eu queria ter.

— Eu lhe ensinei a ser forte e brutal, agora te ensinarei a ser cordial e cavalheiro. — ele deu alguns passos até o fundo da cabine e alisou algo grande que era coberto por uma capa — Este é meu segredo, seu que não contará nem mesmo para os marujos, eu não nasci no mar… Eu era… Em uma breve parte de minha vida, fui um nobre.

“Eu já imaginava capitão.” Pensei comigo.

— Por que mudei o curso de minha vida? Por amor, o amor nos faz mudar de rota e causar grande destruição se assim desejar… — ele suspirou fraco e pegando na capa a puxou, mostrando o grande piano que havia debaixo — Mas minha vida não vem a situação atual, vamos a sua primeira aula, um verdadeiro cavalheiro deve saber tocar este instrumento e lhe ensinarei.

Assenti novamente deixando meu olhar voltado para o piano, aquilo era muito mais do que eu poderia imaginar aprender, mas estava ansioso para começar. Não somente o piano, mas tinha aulas sobre literatura, economia, ciências, filosofia e outras coisas a mais que o capitão havia estudado em seu passado. De tudo aquilo, o que mais me atraía era sobre economia, entender como funcionava realmente o mundo capitalista.

— Confesso que não sei por quanto tempo mais ficará conosco, entretanto sinto-me com o dever cumprido. — disse o capitão ao se aproximar de mim na ponta da proa do navio — Não mais um menino, agora um homem completo.

Mantive meu olhar no mar vendo o brilho da lua tocá-lo, permanecendo debruçado no beiral, ele permaneceu há dois passos de mim.

— Confesso que sempre pensei em ter um filho, para ensiná-lo tudo o que ensinei-lhe, mas acho que posso considerar este jovem a minha frente uma pequena do que seria ter um filho. — ele riu — Acredito que teria sofrido bem mais.

Ele soltou uma gargalhada estranha.

— Enfim. — seu suspiro pareceu cansado — Chegamos a parte que realmente deve estar interessado, a riqueza.

Eu ergui meu corpo e voltei meu olhar para ele.

— Agora sim, após todo o conhecimento e força, apenas te falta uma coisa. — ele olhou para o céu — Vou te ensinar a forma mais segura e rápida de conseguir.

Riquezas, finalmente havia chegado nesta fase de todo o treino. Finalmente depois de quase dois anos havia conquistado não só a confiança, mas também o respeito e lealdade do capitão, me deixando assim com boa esperança para o que aconteceria em minha vida daquele momento em diante. Como eu não participava de nenhuma das pilhagens por ordem do capitão, porém ajudava muito em todos os planos, ele tinha um singelo presente para mim, singelo e perigoso ao mesmo tempo.

- x -


— Aqui está. — disse o capitão ao me entregar um velho pedaço de pergaminho — Seu presente.

Eu o olhei confuso ao pegar o pergaminho.

— Por todo este tempo, você conseguiu chegar a um nível que nenhum desses marujos conseguirão, se considere abençoado por isso Mascote. — ele sorriu de leve — Este pedaço de pergaminho é meu maior tesouro, porém não precisarei dele.

Assenti mantendo meu olhar no capitão.

— Em dois dias vamos atracar no mar do Leste, em um porto desconhecido do Japão, estará bem próximo a rota que te levará a Kyoto, lá você seguirá seu destino.

Respirei fundo mantendo meu olhar no pergaminho.

“Eu não preciso de um mapa, meu coração me leva a você,
Mesmo que o caminho seja perigoso, eu não posso parar agora,
Eu nunca me esqueci de você por apenas uma hora,
Se eu só posso vê-la no final do horizonte distante.”
- Black Pearl / EXO



8. Colorful

Paris - Primavera de 1847

ver.

Assim como o prometido, estávamos desembarcando no porto de Le Havre na França, para nossa planejada lua de mel.

Pelo que havia notado, aquele era o único porto do país que recebiam os navios mercantes de , ele tinha uma singularidade para os negócios que o fazia ser um tanto quanto seleto em suas negociações, além de escolher a dedo para quem venderia seus carregamentos. E toda essa exclusividade fazia seus negócios serem ainda mais prósperos, o tornando ainda mais rico do que já era.

— Uahhhh… Não me lembro nem mesmo de como foste a última vez que estive em Paris. — comentou Margareth deslumbrada ao finalmente chegarmos a carruagem, seus olhos pareciam sem rumo certo olhando para todos os pontos importantes daquele lugar.
— Confesso que também não me lembro, vagamente posso afirmar que nossa última estada aqui faz uns dez anos. — observei procurando discretamente com meu olhar.
— Freya deve estar morrendo de inveja de mim agora. — Marg deu uma risada baixa desviando seu olhar para a carruagem que nos aguardava — Vamos esperar pelo senhor Winchester?
— Não sei. — sussurrei mantendo minha atenção na direção em que ele se encontrava — Quanto a Freya, ela irá se casar com alguém rico certamente, aposto que pedirá por uma lua de mel em Paris também.
— Freya sempre teve inveja de você. — ela bufou de leve — Não entendo o porquê, você sempre foi legal com nós duas, além do mais te considero mais minha irmã do que ela.
— Que sua mãe jamais a ouça dizendo tal coisa, te colocaria em um convento ao sul da Itália. — ri baixo.
— Verdade. — ela riu junto — Andas muito silenciosa Sophie.
— Oh, senhorita Margareth, é minha primeira vez na França, ando um pouco impressionada com tudo o que meus olhos alcançam. — ela deu um sorriso tímido — Fico honrada por ter convidado-me a vir juntamente.
— Por mais que esta seja minha lua de mel, aposto de não ficarei as quatro fases do dia com o senhor meu marido. — nisso eu não tinha dúvidas. — Isso é verdade, os burgueses sempre estão tão ocupados trabalhando. — comentou Marg.
— Ainda nessas circunstâncias, agradeço a oportunidade. — Sophie tinha uma leve humildade que me deixava confortável e ao mesmo tempo me fazia querer ajudá-la ainda mais.

Era um tanto quanto estranho minha necessidade de sempre ajudar pessoas menos abastadas, talvez seria uma forma de gratidão a minha mãe que morreu ao dar a luz a mim, somente preocupada se eu ficaria bem e saudável. Uma maneira de retribuir a ela por tal amor e cuidado, mesmo tendo uma saúde frágil optou por ter um filho com meu pai, eu jamais conseguiria chegar ao seu nível de afeto ao próximo, algo que meu pai sempre me contou sobre ela. Lady Mary Lewis, uma mulher caridosa e admirada por toda sociedade londrina, espero um dia conseguir fazer o mesmo.

Desviei meu olhar por um momento para o cocheiro, que organizava com tanto cuidado nossas bagagens no bagageiro da carruagem, neste pequeno tempo de distração foi o suficiente para que se aproximasse de mim sem que percebesse. Ele se colocou ao meu lado, logo senti o aroma de seu perfume assim como os movimentos discretos nas mãos de minha irmã.

— Iremos agora? — o perguntei num tom ainda mais baixo.
— Terei que deixá-la ir na frente, mas em três dias estarei em Paris. — sua voz tinha traços de frustração, porém a entonação de firmeza continuava a mesma, além do seu olhar fixo em meus olhos.
— Eu ficarei bem. — assenti sem demora — Estarei bem acompanhada.
— Acredito de sim. — ele sorriu de canto e foi se aproximando aos poucos de mim, até encostar seus lábios em minha testa, demorando um pouco para se afastar — Tenho que ir agora, divirtam-se.

se afastou de nós sem mais demora, indo até um senhor que o esperava junto a um outro homem que parecia comerciante, voltei meu olhar para Marg que escondia um sorriso no canto do rosto.

— Você ainda fica tímida perto dele, me pergunto o motivo. — ela riu — Será o olhar intenso ou a voz estremecedora?
— Marg?! Olha os modos, deixe-me em paz com esta parte de meus sentimentos. — dei de ombros e olhei para o cocheiro que já nos aguardava com a porta da carruagem aberta v Vamos agora, serão algumas horas de viagem.
— Claro irmã preferida. — ela riu ao me seguir até a carruagem.

Foram mesmo longas horas até que chegamos a bela cidade de Paris.

Após um dia na estrada e duas paradas somente para as tocas de cavalo, a carruagem finalmente estacionou em frente a Cher House, a mansão que segundo a senhora Poppy, havia construído há pouco mais de dois anos, no melhor bairro de Paris bem próximo ao Jardin du Luxembourg. Lembro-me dela frisando várias vezes o quanto o imóvel velho que ficava no lugar havia custado ao filho, que sem menores problemas pagou a quantia exigida.

Esse tipo de comentários feito pela senhora Poppy, principalmente nos momentos em que está na presença da minha família, faz me acreditar que não era somente capricho em ostentar a fortuna do filho, mas mostrar que sua família também tinha seu valor apesar de pertencer a burguesia. Suspirei fraco ao avistar os empregados todos enfileirados a minha espera, apesar de sempre dizer que eu era a dona de tudo que ele possuía, ainda tinha alguns receios sobre até que parte de tudo eu poderia tocar.

— Está tudo bem senhora? — perguntou Sophie.
— Sim. — assenti mantendo meu olhar na mansão.
— Uau, seu marido realmente tem dinheiro, não são somente boatos. — comentou Marg boquiaberta — Esse lugar é lindo, ainda mais lindo que a Wincher Hall.
— Arquitetura francesa. — sussurrei.

Sim, a mansão tinha traços mais limpos de clássicos do que a de Londres, o jardim era na frente da casa compondo toda a entrada que tinha um caminho de pedras ornamentais que levava a entrada da mansão. Logo o mordomo abriu o portão e se curvou de leve, desviou seu olhar para os lacaios que estavam atrás fazendo um gesto para que pegassem nossas bagagens.

— Bem-vinda a Cher House, mi lady Winchester. — disse o mordomo de traços e roupas indianas, voltando seu olhar para mim.
— Agradeço. — me curvei de leve e respirei fundo.
— Eu sou Patel, o mordomo e esta é Aimee a governanta, tudo que mi lady precisar basta ordenar. — ele se curvou novamente e estendeu a mão para que eu entrasse.

Assenti me movendo para entrar, Marg e Sophie seguiram atrás de mim ainda deslumbradas com o jardim que seguia pela extensão até chegarmos a fileira de empregados. Patel pronunciou o nome de cada um para mim, porém estava com meus pensamentos tão longe daquele lugar que não conseguir nem mesmo memorizar o nome do primeiro.

A mansão era realmente luxuosa, com todos os seus cômodos amplos e decorados de forma que atraía leveza. Aimee me acompanhou mostrando cada um dos ambientes, demorou algum tempo até chegarmos ao terceiro andar, onde ficavam os quartos, ainda havia o quarto andar que estava em reforma. Ao chegarmos no primeiro quarto principal, Sophie que estava atrás de mim continuou sendo guiada por uma criada até seu quarto que ficava um pouco mais afastado, Marg por sua vez acompanhada por outra criada, escolheu um bem próximo ao meu.

Assim que adentrei o quarto principal, me deparei com um ambiente claro e visualmente confortável, as diferenças entre o quarto principal da Wincher Hall eram notórias a primeira vista.

— Todas as bagagens referentes a mi lady e ao senhor Winchester estão aqui, logo mandarei uma criada para guardar os pertences. — ela se manteve próxima a porta, sua postura assim como a de Isla era impecável, seu tom de voz baixo e olhares discretos — Deseja algo mais mi lady?
— Gostaria que servisse o chá da tarde no jardim por favor, em vinte minutos. — ordenei.
— Como desejar, com sua licença. — assim que ela abriu a porta Marg apareceu com sua empolgação adentrando o quarto.

Esperamos até Aimee sair fechando a porta, para que os surtos de minha irmã se iniciassem.

, eu estou encantada com sua casa, quero definitivamente morar em Paris. — ela deu alguns rodopios pelo quarto enquanto falava, até que se jogou em minha cama — Isto é um sonho, não quero acordar.
— Margareth, só estamos no primeiro dia. — ri de leve de minha irmã, voltando meus passos para perto da extensa janela que tomava quase toda a parede da varanda do quarto — Apesar de…
— Apesar de que? — ela ergueu seu corpo e saltou da cama vindo até mim — Oh… Isso é mais que um sonho, estamos no paraíso?
— Claro que não, isto é simplesmente Paris. — a corrigi delicadamente.
— O senhor Winchester deve mesmo ter muito prestígio até em Paris, para lhe proporcionar uma vista tão linda. — comentou ela impactada pelo que via. — Sim. — concenti sussurrando.

Passamos algum tempo admirando a deslumbrante paisagem do Jardin du Luxembourg, era mesmo uma surpresa que a janela do quarto principal desse vista para aquele colorido lugar, que era ainda mais perfumado na primavera. Se era um sonho, estava a cada dia não querendo acordar dele.

— Já me decidi. — Marg se afastou um pouco e voltou a sentar sobre a cama.
— Sobre o que? — a olhei curiosa.
— Quero me casar com um francês. — havia uma entonação forte de certeza em sua voz.
— Um francês? Acha que papai deixaria você se casar com um? — aquilo me admirou um pouco.
— O que tem? Se ele for um nobre melhor ainda. — ela deu me ombros — Além do mais, você se casou com um burguês.

Mesmo sabendo que eram palavras inocentes, aquilo me feriu um pouco, como se fosse vergonhoso ter um marido burguês, talvez eu tivesse achado isso há alguns meses quando recebi o pedido de casamento, ou até mesmo estivesse chateada por um casamento arranjado em minha noite de núpcias. Porém agora, eu me sentia um pouco mais leve sobre o assunto, de fato a escolha havia sido minha de qualquer forma e estava em paz com isso.

— Perdoe-me as palavras inoportunas que usei. — disse Marg com uma carinha de arrependida, talvez tivesse pensado no peso de suas palavras.
— Está tudo bem. — dei um suspiro cansado — Sei que não foi intencional.
— Você está mesmo bem com este casamento. — comentou ela — Apesar da diferença entre vocês.
— Sim, em alguns momentos consigo perceber esta diferença, em outros é como se algo muito além do casamentos nos unisse, é loucura isso.
— Eu diria que é amor. — ela sorriu — Dizem que os opostos se atraem.
— Somos mesmo muito opostos. — admitir a realidade — Mas, é tão… Não encontro adjetivos para classificar isso, conhece todos os meus gostos.
— Todos?! — a surpresa pairou em seu olhar.
— Todos, que eu me lembre. — mordisquei o lábio inferior de leve — Incomum, mas comparando a época em que o sir Ulrich me cortejava, ele não conseguia nem mesmo gravar em sua memória minha cor favorita.
— Que loucura. — ela riu de leve — Você era fascinada por ele, desde o momento em que ele a salvou na cachoeira naquele verão, achei mesmo que se casaria com ele.
— Eu também, até aparecer. — desviei meu olhar para a janela olhando o jardim da frente da mansão — Sinto meu coração acelerar quando menciona algum detalhe sobre mim, ele sabe até mesmo quando estou estou apreensiva com algo.
— Uau, em tão pouco tempo de casados, ele já consegue ler suas expressões corporais?!
— Como eu disse, parece loucura… — eu a olhei novamente — Mas ele demonstra me conhecer de uma forma mais profunda ainda.
— Seria invejoso desejar um marido assim? — Marg me olhou com uma cara sapeca, se levantando da cama.
— Um pouco. — nós rimos de leve — Vamos descer, um chá nos aguarda.
— Sim, mi lady Winchester. — ela fez uma breve reverência.

Eu a abracei lhe fazendo algumas cócegas, era divertido estar com a Marg naquele momento, mesmo ainda estando no início de um casamento, ter alguém familiar por perto de passava mais força e coragem. Assim como desejado, nosso chá da tarde foi em meio das perfume das flores do jardim, estávamos em meio a uma conversa nada tendenciosa sobre o possível perfil do noivo de Freya, quando Aimee se aproximou.

— Mi lady, a pouco chegou este convite para a senhora. — ela segurava uma bandeja de prata com um envelope prateado.
— Agradeço. — peguei o envelope e o cortei com a pequena faca de prata que havia ao lado.

Era mesmo um convite para um jantar de recepção, pela vinda de a Paris e também com algumas felicitações por nosso casamento, dizia também que já haviam enviado este convite a ele no porto, para que não pudéssemos ter oportunidade de recusar. Eu não estava tão confortável assim com a idéia, mas Marg já estava sonhando em conhecer algum aristocrata francês de muitas posses neste jantar.

Uma casa tão grande pareceu ainda mais solitária e vazia nos dias que se passaram, mesmo com a companhia de Margareth e Sophie durante todo o dia, lá no fundo algo estava incompleto em meu tempo. O que me fazia passar a maior parte do tempo na biblioteca, enquanto Marg sequestrava Sophie e a forçava andar pelas ruas de Paris, era um fato que os livros me distraíam mais do que elas, apesar dos assuntos aleatórios que Marg propunha.

— O Conde de Monte Cristo. — sussurrei ao ler o nome do livro que estava em minha mão.
— Devo dizer que este é o melhor livro entre todos que se encontra nesta biblioteca?! — a voz firme e grossa do meu marido ecoou na direção da porta.

Senti minha respiração parar de imediato e então soltei um suspiro fundo, me virei em sua direção e sorri de leve, seu olhar intenso em mim continuava o mesmo, não… Parecia ainda mais desejoso em olhar para mim.

— Levarei em consideração sua sinceridade ao ler. — desviei meu olhar dele por um momento e voltei para o livro — Quando chegou?
— Não tem muito tempo, gostaria de ter vindo com você. — ele deu alguns passos até mim de forma tranquila e lenta, mas sentia sua pressa em se aproximar — Espero que tenha se divertido.
— Eu não fiquei sozinha, já foi um começo… — pensei por um instante no que havia dito — Bem, agradeço por não se importar com a presença da Marg, sei que Sophie é minha dama de companhia, mas minha irmã também veio…

Eu não estava muito atenta a sua aproximação, ao tentar encontrar a explicação certa se realmente me diverti ou não nestes três dias sem ele, até que ele
me beijou de surpresa sem que eu terminasse de falar. E ali estava o complemento, não era somente seu beijo intenso e doca, nem a forma como envolvia seus braços em minha cintura como demonstração de segurança, mas o conjunto de tudo o que acontecia quando ele estava presente me fazia sentir mais completa.

era um dos motivos pelo qual eu era ainda mais grata a Deus, pela minha vida. Um casamento com um burguês, que significava uma maldição para muitas das garotas que um dia se nomearam minhas amigas, desde o primeiro dia havia se mostrado uma bênção que talvez eu não fosse merecedora. Logo que meu coração acelerou ainda mais com o gosto do seu beijo, senti uma lágrima se formar no canto do meu olho, me fazendo afastar dele.

— Algum problema? — perguntou ele um pouco preocupado.
— Não. — me virei de costas para ele e limpei rapidamente aquela lágrima — Estou bem.
— Não deveria esconder seus sentimentos de seu marido. — insistiu ele ao segurar de leve em minha mão — Bons ou ruins.
— Não quero lhe preocupar. — sorri de leve — O único sentimento que tive foi... saudade.
— Tenha a certeza de que este sentimento é recíproco. — sussurrou ele me envolvendo ainda mais em seus braços.

Nem mesmo terminei e logo ele me abraçou, foi confortável sentir seu perfume e ouvir os batimentos acelerados do seu coração, cada pequeno detalhe de descobria dele era uma conquista para quem não sabia nada sobre o próprio marido.

- x -


— Estamos de fato muito honrados por ter aceitado nosso convite. — a senhorita Belle, filha do conde Remy Chermont, abriu um sorriso largo mantendo seus olhos em , direcionando seu comentário de forma singular.
Winchester. — disse o conde Remy ao se aproximar com uma taça de champanhe em sua mão — Finalmente, esta é a primeira vez que aceitas um convite para um jantar de recepção.
— Só aceitei desta vez para que pudesse ter a oportunidade de conhecer minha esposa. — voltou seu olhar para mim — Lady Winchester.

Senti uma certa satisfação em sua voz assim que pronunciou seu sobrenome.

— Oh, madame. — conde pegou de forma respeitosa em minha mão e deu um suave selinho, cortesia vinda do charme dos franceses — Me sinto honrado em poder conhecer-te, a tal famosa lady .
— Famosa?! — olhei para um tanto curiosa.
— Vamos omitir algumas partes. — manteve seu olhar suave, voltando-o para o conde Remy.
— Oh… Oui, como quiser. — o conde se colocou um pouco mais sério e voltou seu olhar para Marg — E quem é esta mademoiselle?
— Esta é Margareth minha irmã caçula. — respondi prontamente ainda intrigada.
— Prazer mi lorde. — Marg fez uma breve reverência.
— Oui, prazer.
— E esta é Sophie, minha dama de companhia. — completei apresentando a Sophie, que reverenciava em silêncio.
— Uma dama de companhia. — Belle desviou seu olhar de surpresa de para mim, aquilo já estava começando a me incomodar.
— Como já viram, esta é minha bela e doce Belle, minha caçula e aquele boêmio ao fundo a jogar sinuca, é meu filho Pierre.
— Tens uma bela família mi lorde. — elogiei de forma cordial.
— Agradeço, bem são muito bem vindas em minha casa. — conde Remy estendeu a mão, para que adentrássemos um pouco mais o pequeno salão — Espero que se divirtam esta noite.

Diversão… Não diria ao certo se conseguiria me divertir, com os constantes olhares que Belle lançava em de forma pretensiosa, o que ao longo da noite passou a me deixar ainda mais desconfortável. Porém, ao contrário de mim, Margareth parecia mesmo estar se divertindo ao conhecer algumas jovens da nobreza francesa, até mesmo arriscou a aprender a jogar sinuca, algo totalmente fora de nosso cotidiano.
— Se Evelyn visse isso. — sussurrei observando minha irmã — Certamente mataria-me.
— Sua madrasta parece ser uma pessoa de difícil convivência. — comentou Sophie.
— Difícil ainda seria um adjetivo suave para ela. — suspirei fraco — Aquela mulher foi o pesadelo da minha infância.
— Ela realmente não demonstra muito afeto por você. — admitiu Sophie de forma discreta — Pude observar isso nos chás que participei.
— Acho que esta falta de demonstração só não é vista por meu pai. — desviei meu olhar para a janela ao lado — Entretanto, isso não me afeta mais.
— Acredito que este olhar triste, não seria por causa do que sua madrasta pensaria sobre o comportamento de vossa irmã neste jantar. — Sophie realmente era perspicaz em suas suposições.
— Observou bem, meu desconforto está sendo gerado por outro motivo. — engoli seco ao lançar novamente meu olhar para Belle que havia se aproximado propositalmente de — Creio que não estou me sentindo bem.

Me encostei de leve na parede para manter o equilíbrio de meu corpo, talvez minha mente não estivesse preparada para tal situação, talvez eu nem imaginasse que em algum momento poderia por menor que fosse a intensidade, sentir ciúmes do meu marido. Principalmente por começar a considerar que a senhorita Belle o conhecesse a mais tempo que eu.

— Mi lady?! O que está sentindo?! — Sophie pegou em minha mão me fazendo apoiar sobre seus ombros.
— Eu… — respirei fundo — Não sei, como se o ar estivesse sendo tirado de mim a força…

Antes que eu pudesse pedir para que Sophie me tirasse daquele lugar, já surgiu em meu lado e me pegando no colo, tirou-me daquele ambiente que me causava mal. Um tanto quanto surpreendente para mim, porém um gesto assim somente poderia ser esperado de um burguês.

, não deverias… — sussurrei.
— Logo chegaremos ao lugar que deseja estar. — disse ele me interrompendo.

Assim que me colocou dentro da carruagem, me acomodei adequadamente e tentei ouvir as ordens que ele dava a Sophi do lado de fora, não demorou muito até que ele subisse. Encostei minha face na janela da outra lateral e fiquei olhando para rua, não sabia ao certo o que poderia dizer em explicação ao meu mal estar, seria tolo dizer que era emocional devido a uma crise de ciúmes.

— Patel, leve-nos um pouco de chá. — ordenou assim que entramos na mansão e fomos recebidos pelo mordomo.
— Como desejar senhor. — ele assentiu já se retirando em direção a sala de jantar, por onde dava passagem para a cozinha.

me guiou até o primeiro quarto principal, considerado não meu, mas sim nosso. Pois, diferente dos casamento tradicionais, meu casamento não era nada tradicional e ele testificava isso, ao insistir que deveríamos dormir no mesmo quarto.

— Agora pode me dizer. — disse ele com tranquilidade ao me ajudar a sentar na cama.
— Dizer o que? — o olhei um pouco confusa.
— O que estava lhe perturbando?! — seu olhar se intensificou mais, como se analisasse cada movimento e expressão minha.
— Poderia algo me perturbar? — retruquei sentindo o desconforto voltar.
— Acredito que tenha ficado desconfortável com algo, seu olhar estava triste e seu sorriso um tanto quanto artificial. — ele foi direto e descritivo, realmente me conhecia melhor que eu mesma.
— Conseguiu perceber tudo isso?! — desviei meu olhar para a porta, sentindo uma movimentação ao lado de fora.

Logo dois toques na porta soaram.

— Entre. — disse mantendo seu olhar em mim.
— Senhor. — Patel entrou rapidamente, parecia reconhecer na voz de que deveria ser preciso.

Assim que ele deixou a bandeja com o chá na mesa de canto, saiu em silêncio, nos deixando novamente a sós, tudo ocorrendo com aquele olhar fixo em mim.

— Não vai mesmo dizer?! — insistiu ele — Ou prefere que eu suponha?
— Belle Chermont. — um nome e muitos significados.
— Como eu esperava. — sussurrou ele num tom que me permitisse ouvir — O que sua mente fez parecer?
— Não me pareceu nada, mas fiquei desconfortável por ver que o olhar dela estava sempre em você. — admiti sem receios.
— E o meu olhar estava onde? — perguntou ele tranquilamente.

Respirei fundo me mantendo em silêncio.

— Diga. — ele se aproximou de mim e segurando minha mão me fez levantar da cama — Permitiu-se ficar sem equilíbrio, por estar preocupada com uma pessoa que olha para seu marido, por que fizeste isso?
, eu…
— Não importa quem está olhando para mim, o que importa é para quem eu estou olhando. — a firmeza em sua voz estremecia meu interior e minha insegurança.
— Peço que somente releve o que lhe causei esta noite. — me senti um pouco envergonhada.
— Não me causaste nada, não gosto de festas, somente aceitei ao convite pois vi o quanto vossa irmã ficou empolgada, então percebi que aceitaria ir para deixá-la mais alegre. — ele acariciou meu rosto — Para ser sincero, o melhor lugar para eu estar é aqui, com você em meus braços.

Ele me puxou para mais perto e envolveu seus braços, me abraçando de forma em que me transmitia ainda mais segurança e carinho, com sua leve mão acariciando meu cabelo.

“Por causa de você, meu coração é colorido,
No mundo em preto e escuro,
No momento em que tento fechar meus olhos,
Você faz minha vida colorida.”

- Colorful / SHINee



9. Evanesce

Limerick - Verão de 1847

ver.

Já havíamos completado pouco mais de quatro meses de casados, era a estação mais quente do ano, porém em raros momentos eu sentia uma certa frieza rondando minha vida. Isso se iniciou assim que recebi o convite formal para o noivado de Freya, em um papel branco com letras douradas e bem adornadas, o nome de seu noivo ainda era uma incógnita, porém a estranheza veio ao ver que o evento seria recepcionado no castelo de Meagher, em Limerick.

A princípio percebi que um desconforto pairou na face de quando leu o convite, porém não havia nenhum motivo para recusar nossa presença, pelo contrário Freya era minha irmã e minha presença era demais necessária. O ponto mais crítico e assombroso foi o fato do meu marido ter que se ausentar, por uma semana teria que resolver alguns assuntos em Nottinghamshire, onde ficava os terrenos que sua família criava animais.

Aquela ausência significava que eu ficaria uma semana em Limerick, algo que de alguma forma o perturbava visivelmente, mas seu cavalheirismo era maior em relação a não me manter afastada de minha família. Não era somente ele que ficaria frustrado com a distância, era um fato que havia uma parte do meu passado em Limerick, porém meu presente importava bem mais para mim.

— Ainda me lembro da última vez que estivemos aqui. — comentou Marg sentada ao meu lado na carruagem.
— Sim, o dia que seria meu noivado com sir Ulrich e acabou sendo o anúncio do meu casamento com . — dei um suspiro ao me lembrar nitidamente daquela noite.
— Verdade, todos fomos pegos de surpresa. — Marg me olhou — Papai foi um tanto direto ao dizer que você estava prometida ao , mesmo sem lhe perguntar se queria.
— Talvez ele já imaginasse que eu aceitaria. — desviei meu olhar para a janela, olhando para o sol que já se punha atrás das colinas do campo — Somente hoje percebo que realmente não sentia algo forte por Ulrich, que vale-se lutar naquela época.
— Mas, você teria coragem de falar não, mi lady? — Sophie que estava sentada em nossa frente, me perguntou em um tom curioso.
sempre teve coragem para enfrentar nosso pai e estabelecer seus sentimentos. — respondeu Marg prontamente com um leve sorriso nos lábios — Gostaria de ser assim.
— Marg, nem sempre dizer não é o melhor caminho, mas estou feliz por ter dito sim ao . — a olhei e sorri junto — Deixemos o passado para trás, de fato também estou curiosa para saber o motivo pelo qual o noivado será feito no castelo dos Meagher, entretanto não me importo mais com Ulrich e seu destino.
— Pois eu já suspeito do motivo. — disse Marg.
— E qual seria?!
— Sabes que a Lewis Castle está em ruínas de tão vazia e sem adornos, quase todas as nossas obras de arte já foram vendidas, somente restam lá dois quadros que são sua herança da família de sua mãe. — explicou Marg num tom amargurado — Tenho certeza que o orgulho do papai não o deixaria fazer nenhuma recepção em nossa casa.
— Faz sentido e além do mais, o falecido pai do conde sir Ulrich era um grande amigo de nosso pai, talvez seja por cavalheirismo que esteja sendo planejado neste lugar. — concordei.
— Pelo menos poderemos estaremos em um lugar que conhecemos. — disse Marg empolgada — Não vejo a hora que poder andar a cavalo novamente, tivemos que vender os nossos.
— Hum… — desviei meu olhar para a janela — Espero ser bem recebida, após todo aquele constrangimento.
— Ah, tenho certeza que irá, você é casada com o homem mais rico da Inglaterra, acha mesmo que vão te maltratar? — Marg riu — Se não for por naturalidade, acredite será por interesse, já sabemos que todas as pessoas em nossa volta querem sempre agradar o senhor Winchester.
— Não sei se devo levar isso como algo positivo ou negativo. — dei um suspiro fraco — Nunca sabemos quem está sendo sincero e quem está sendo falso, fico feliz que pelo menos a família de não me julga por eu ter me casado inicialmente por dinheiro.
— Acho que o argumento de ter sido por dinheiro já foi quebrado a muito tempo, basta olhar em seus olhos para ver o brilho que aparece quando fala o nome dele. — Marg riu — Está mesmo muito apaixonada pelo senhor Winchester, já é visível.
— Acho que sim. — dei um suspiro esperançoso ao sentir a carruagem parar — Acho que chegamos.

Logo o cocheiro abriu a porta para que saíssemos, a mãe de Ulrich já estava ao lado de fora do castelo, bem na entrada acompanhada de minha madrasta nos aguardando. Respirei fundo ao desembarcar da carruagem e segui, com Marg e Sophie pelo caminho de pedras ornamentais até chegar a elas.

— Seja bem-vinda lady Winchester. — a ênfase que a senhora Lira havia dado ao sobrenome do meu marido, me causou um certo desconforto — Seja bem vinda também Margareth, e quem é esta jovem ao lado?
— Esta é Sophie, minha dama de companhia. — respondi mantendo meu tom de voz baixo, porém firme, acho que estava absorvendo um pouco da superioridade que meu marido exalava perto dos nobres.
— Uau, dama de companhia. — ela desviou seu olhar para Sophie por um momento e depois voltou para mim — Pensava que somente a realeza se agraciava com isso.
— Foi um singelo presente de casamento do meu marido. — expliquei segurando o sorriso de satisfação que queria sair.
— Imagino, o senhor Winchester é muito conhecido em Limerick também. — Lira tentou-me jogar um olhar de desdém, porém não conseguia.
— Bem, quem no Reino Unido que não o conhece. — sorri de leve — Ainda assim, agradecemos pela estadia, tenho certeza que ficarei muito confortável em seu castelo, mas devo anunciar que só poderei ficar enquanto o senhor Winchester estiver longe.
— Então, ele não se hospedará aqui? — Evelyn me olhou curiosa.
— Como sabe, ele possui suas próprias propriedades, onde quer que necessite. — expliquei tranquilamente — Somente permitiu que ficasse no castelo de Meagher para que pudesse estar perto de minha irmã em uma momento tão importante.
— Não é surpreendente saber que ele tenha alguma propriedade em Limerick. — Lira desviou seu olhar para Evelyn.
— Pois quanto a mim, estou demasiadamente surpresa. — ela deu um sorriso forçado — Se seu pai soubesse, talvez tivesse pedido para que o casamento fosse planejado…
— Oh não, isto também foi uma surpresa para mim, afinal foi adquirida recentemente. — completei interrompendo ela.
— E podemos saber qual propriedade ele comprou? — perguntou Lira.
— Ah, digamos que ele não comprou… — mordi de leve meu lábio inferior.
— Não?! — Evelyn me olhou curiosa.
— Não, bem… A família do marquês James Allen contraiu uma grande dívida com o senhor Winchester, dívidas de muitos anos que não poderia ser pagar de outra forma.
— Este é o pior lado dos burgueses, sempre querem tudo o que pertencer aos nobres. — Lira finalmente conseguiu me lançar aquele olhar de superioridade.

Eu engoli seco, pensando por um breve momento se deveria ao não responder a altura seu projeto de humilhação.

— Bem, é uma via de mão dupla. — respirei fundo mantendo meu olhar tranquilo sobre Lira — Já que os nobres também desejam ter a fortuna dos burgueses.
— Ah…. Está me dando uma fome. — disse Marg querendo quebrar o clima de confronto — Tenho certeza que a senhora nos preparou um delicioso chá, como quando éramos crianças.
— Ah sim, claro. — Lira se virou para Marg e sorriu — Venham, os servos irmão acomodar suas bagagens nos devidos quartos — Lira se voltou para mim — Como não sabíamos que traria uma serviçal, espero que não sinta desprezo se ela ficar na ala da criadagem.
— Está tudo bem lady Meagher, sou somente uma empregada. — Sophie manteve sua face levemente abaixada em forma de respeito.
— Pois eu gostaria que Sophie fosse instalada no quarto ao lado do meu. — intervi sem o menor receio.

Senti todos os olhares virem de encontro a mim, porém mantive meu olhar em Lira, acho que estava sendo divertido a confrontar em sua própria casa.

— Mi lady?! — Sophie me olhou desacreditada.
— Tenho certeza que com mais que duzentos quartos neste castelo, não haveria problema, não é mesmo lady Lira? — dei um sorriso pretensioso.
— Claro que não. — ela deu um sorriso forçado — Não queremos causar nenhum desconforto em sua estadia, mandarei a governante cuidar disso pessoalmente.
— Agradeço a gentileza. — retribui com uma sorriso singelo, daqueles que sempre fazia meu pai se lembrar de minha mãe.
— Lady . — disse uma voz masculina que bem conhecia, vindo de trás de mim — A quanto tempo.

Era a voz de Ulrich, em quem estive parte de minha vida solteira fascinada por ele, quem um dia sonhei que me casaria e teria filhos, era algo de meu passado que há muito havia decidido esquecer, mas como poderia esquecer completamente dele, já que me salvara de um afogamento quando criança. Respirei fundo de forma discreta e me virei com leveza em sua direção, logo meu corpo paralisou ao ver Freya ao lado de braços dados com ele, como um casal feliz.

— Sir Ulrich… — voltei meu olhar para minha irmã que dispunha de uma sorriso de satisfação como se tivesse vencido algo ou alguém — Boa tarde Freya.
— Olá . — o olhar de Freya exalava vitória — Fico feliz por ter vindo.

O que me fazia de fato constatar que o noivo de Freya era ele, pior lembrar de como sua face superior estava quando anunciou que se casaria. Agora estava entendendo porque a pressa, o noivado seria celebrado formalmente no sábado à noite e logo pela manhã teríamos a cerimônia na catedral da cidade. Senti até mesmo minha face ficar rígida e imóvel, meu olhar não conseguia se desviar dos braços deles que estavam entrelaçados.

— Nos sentimos honrados por voltar de Paris só pelo nosso casamento. — Ulrich parecia sem graça com a situação, por certo deve ter entendido que eu não sabia que ele era o noivo — Soube que esteve todo este tempo lá com o senhor Winchester.
— Sim, Paris também é bela no verão, mas após quatro meses longe já estava sentindo falta de casa, Londres sim é o melhor lugar para mim. — expliquei ponderando minha voz e tentando achar equilíbrio interno — Além do mais, não poderíamos prolongar ainda mais nossa lua de mel, o senhor Winchester tem muitos negócios.
— Por mim teríamos ficado ainda mais. — comentou Margareth sem nenhum pudor — Sua casa em Paris é como um sonho de verão, principalmente por causa da vista.
— Vejo que se divertiu muito pequena Margareth. — Ulrich deu um breve sorriso de canto, mantendo seu olhar em mim — Paris é realmente mágica. — Sim, fomos convidados a todos os bailes e recepções organizados durante esse tempo, apesar de e o senhor Winchester não aceitarem participar de todos. — ela deu um suspiro frustrado.
— Ainda assim conseguiu se divertir Marg. — a olhei com repreensão.
— Desculpe-me, sim, me diverti muito mesmo. — ela olhou para Freya — E vocês, já escolheram onde passarão a lua de mel?
— Não nos olhe assim, pois não a levarei como . — ela se agarrou um pouco mais a Ulrich — Quero minha privacidade.

Ulrich deu uma risada baixa e se afastou um pouco dela, beijando-lhe a mão.

— Adoraria desfrutar do chá com a belas damas, mas tenho outro compromisso agora. — ele se voltou para mim — Espero que possa se acomodar confortavelmente, deve estar acostumada com lugares mais luxuosos oferecido pelo senhor Winchester.
— Agradeço a preocupação. — fiz uma breve reverência.

Ele se afastou de nós, em direção a carruagem da família que já o aguardava pronta.

— Bem, vamos ao nosso chá. — disse Lira estendendo a mão para a direção onde a mesa já estava posta nos esperando.

A seguimos pela lateral o centro do jardim, nos acomodamos devidamente apesar de Sophie ter que ficar de pé um pouco mais afastada, o que me deixou um tanto incomodada pela forma que tratava minha dama de companhia.

- x -


— Está mesmo tudo bem? — perguntou Marg ao entrar no meu quarto.
— Sim. — eu me encolhi um pouco, estava encostada na parede ao lado da janela, olhando para o jardim — Não deveria estar tão preocupada, tivemos uma longa viagem até aqui, deveria estar descansando.
— Eu sei, mas não consegui deixar de pensar em sua cara de surpresa. — ela fechou a porta e deu alguns passos para se sentar na cama — Confesso que também fui pega de surpresa, mas já era de se esperar algo assim…
— Não consigo entender, como papai pode fazer isso. — segurei todas as lágrimas que queria rolar em minha face — Não me importo que seja o Ulrich, me importo que não tenham me contado, o pior foi o olhar de vitória, de superioridade…
— Freya e sua inveja. — Marg bufou — Não consigo acreditar nisso, pelo menos você tinha mesmo o direito de ser a primeira a saber.
— Não pensar mais sobre isso, pelo menos até amanhã, já que terei que conviver com ambos juntos durante esta semana. — voltei meu olhar para minha irmã — Nunca desejei tanto que o tempo passasse rapidamente.
— Você vai ficar bem? — Marg se levantou da cama e veio me abraçar.
— Tentarei. — retribui o abraço e sorri de leve — Agora já para cama Marg.
— Boa noite.
— Boa noite.

Eu a acompanhei até a porta.

Antes de me deitar, certifiquei que a porta estava devidamente trancada para não ter nenhuma visita indesejada, seja por Freya ou pelo próprio sir Ulrich. Assim que meu corpo tocou o fino lençol, senti como se um peso tivesse saído de mim e logo fiquei relaxada, isso possibilitou para que meu sono não demorasse a chegar.

Os dias que seguiram foram monótonos, quando não estava em meu quarto lendo o livro que havia me indicado, eu estava na biblioteca folheando outros livros para passar o tempo. Havia momentos em que me esquivava de Ulrich, que sempre tentava orquestrar um encontro a sós comigo, em outro momento me sentia entediada com os assuntos das mulheres na mesa de chá ou na sala de música.

Pior ainda, eram os momentos em que Freya sentia sua necessidade habitual de demonstrar que sabe tocar melhor que eu, apesar de sempre falhar miseravelmente.

— Graciosa como sempre. — elogiou Lira ao aplaudir.
— Agradeço mi lady. — Freya sorriu com satisfação.
— Você toca melhor do que ela. — cochichou Marg que estava ao meu lado, me fazendo segurar o riso.
— O que disse Margareth? — Evelyn a olhou atravessado.
— Nada mamãe, só pensei que Freya tocaria algo como Mozart. — respondeu Marg segurando o riso.
— Todos sabemos que Freya tem dificuldades com Mozart. — expliquei de forma natural.
— Não deveria. — retrucou Marg — Até mesmo um burguês sabe tocar.
— De quem está falando? — Freya se levantou do bando que sentava em frente ao piano.
— Margareth, não deveria dizer tal coisa. — olhei para Marg tentando repreendê-la, mas por dentro estava aplaudindo sua ousadia — Não deve espalhar a intimidade dos outros.
— De quem estão falando? — sir Ulrich apareceu da porta e me olhou curioso, dando alguns passos para mais perto de onde Freya estava.
— Nada de mais importante. — Freya sorriu.
— Como não. — Marg o olhou — Só estava falando que o senhor Winchester sabe tocar Mozart.

Eu senti a afronta que aquelas palavras causaram não somente em Freya, mas em todos os outros presentes.

— Ele sabe… Não acredito que um burguês consiga ser assim tão suave com a teclas de um piano. — Lira me olhou.
— Você se surpreenderia ao ouvi-lo tocar. — comentei tranquilamente.

Logo o mordomo entrou na sala.

— Sir Ulrich, mi ladys. — ele se curvou de leve — Anuncio mi lord, conde Lewis e o senhor Winchester.

Meu olhar se voltou para porta automaticamente, assim que ele apareceu meu coração acelerou de forma inesperada.

— Agora vai ficar mais interessante. — sussurrou Marg.
— Meus cumprimentos senhores. — sir Ulrich se aproximou deles e os cumprimentou com um aperto de mão.

Mesmo tendo aceitado o cumprimento, o olhar do meu marido estava fixo em mim como sempre, eu que me sentia ainda tímida com aquela intensidade no olhar, agora estava sentindo um conforto inexplicável. Como esperado, em menos de vinte minutos de conversa, que mantinha seu olhar em mim todo aquele momento se retirou da sala, um sinal de que queria estar sozinho em minha presença.

Eu me levantei discretamente e segui em direção a porta, ouvindo alguns cochichos vindos de trás. Caminhei por toda a extensão do corredor até chegar a escada principal, lá estava ele olhando o grande estandarte na parede, com o brasão dos Meagher bordado com fios de ouro.

— Oi. — disse quase em sussurro — Está tudo bem?

Ele deu alguns passos até mim e pegou em minha mão.

— Agora estou melhor. — ele sorriu de leve — Perdoe-me por todo este tempo longe.
— Infelizmente devo me acostumar com suas breves ausências, agradeço por sempre ter uma companhia.
— Hum. — ele moveu seu olhar para o carpete do chão.
— Claro que nenhuma companhia se compara a sua. — minha voz saiu tão suave.

Ainda segurando em minha mão, entrelaçou nossos dedos e se virou para a escada.

— Que tal um passeio? Sei que gosta de jardins. — convidou ele.
— Seria um prazer passear com meu marido. — respondi sorrindo de leve — O jardim do castelo do Meagher é lindo.
— Não estava me referindo a este jardim. — ele me olhou tranquilamente — Estava me referindo ao jardim que construí para você.
— Para mim?! — o olhei surpresa.
— Sim. — ele sorriu de canto e respirou fundo — Vamos.

Assenti me deixando ser guiada por ele, ao chegarmos na entrada do castelo, nossa carruagem já nos aguardava. Nos acomodamos e silenciosamente seguimos o caminho até o castelo que ele havia comprado, mesmo ainda passando por reformas internas, mantinha sua vontade de se instalar em algo que é dele. Assim que a carruagem parou e ele me ajudou a desembarcar, meu coração paralisou e pulsou mais forte.

Era lindo o jardim que compunha a entrada do castelo, ele segurou segurou minha mão entrelaçando nossos dedos e começou a me guiar em direção a entrada. O jardim era como um leve desenho de formas em arabescos, com os canteiros precisamente posicionados da forma para que o caminho de pedras ornamentais traçassem esse desenho.

— Camelia… — disse ele tranquilamente — São suas flores favoritas.
— Não me lembro de ter comentado sobre isso com… — sorri de leve me lembrando vagamente de uma conversa que tive com sua mãe — A senhora Poppy lhe contou.
— Minha mãe é uma boa pessoa para contar informações. — ele riu baixo — E margaridas são as flores preferidas da sua mãe.

Senti um breve arrepio em meu corpo, uma emoção tomou conta do meu coração de maneira surpreendente, poucas pessoas sabiam daquilo, ou melhor, apenas eu e meu pai sabíamos. era mesmo uma caixinha de surpresa, aquela havia sido a mais intensa de todas, ele realmente me conhecia além do que eu poderia saber.

— Presumo que desta vez tenha sido meu pai. — sorri naturalmente, sentindo uma paz grande ao olhar aquele jardim.
— Sim. — assentiu — Achei que gostaria de ter algo que lembrasse sua mãe aqui, já que ela nasceu em Limerick.
— Você sabe tantas coisas sobre mim. — observei — Gostaria de saber algo a mais sobre você.
— Saber que eu te amo não lhe é suficiente? — ele parou e me olhou — O que mais quer saber?
— Como sabe tanto sobre mim? Quando exatamente me viu pela primeira vez? A senhora Poppy menciona tanto sobre seu amor por mim e sua vontade de se casar quando retornou a Londres aos dezenove anos, fico me perguntando sobre isso. — suspirei fraco — Às vezes sinto que há algo mais profundo que nos une.
— Sim, o nosso amor. — ele sorriu — Sou grato a Deus por nosso amor.

Ele foi se aproximando pouco a pouco de mim, até que seus lábios tocaram os meus. Senti meu corpo estremecer de imediato assim que ele envolveu seus braços em minha cintura, o beijo de ainda me deixava sem direção e totalmente entregue, seja em qualquer momento ou lugar que acontecesse.

- x -


— Mi lady. — Sophie se aproximou de mim discretamente e me entregou um bilhete.

Eu peguei sem que Margareth que estava ao meu lado percebesse.

— Distrai minha irmã, por favor. — sussurrei para ela, que assentiu sem problemas.

Olhei para a direção em que estava, naquele momento sua atenção se voltava para os nobres que meu pai o apresentava, de fato sua presença estava sendo o destaque da noite. Me aproximei mais das laterais, o grande salão estava cheio de nobres convidados, então seria fácil conseguir me afastar sem que percebessem. Assim que cheguei ao corredor, senti uma mão segurar a minha e me puxar.

— O que… — tentei me soltar mas sem sucesso.
— Não lhe farei nenhum mal. — a voz era de Ulrich.
— Para onde está me levando?
— Você verá.

Subimos alguns lances pela escada dos serviçais, até que entramos na biblioteca.

— Sir Ulrich, tem noção do que está fazendo? — olhei para o bilhete que estava em branco — Presumo que isso lhe pertença.
— Perdoe-me por meu impulso. — ele pegou o bilhete — Mas, lhe devo mais desculpas.
— Não me deve nada sir Ulrich. — o olhei.
— Eu realmente pensei que soubesse sobre a eu e Freya. — seu tom estava um pouco mais baixo — Sinto que lhe devia algumas explicações, já que…
— Repito que não me deves nada. — respirei fundo — Sei que tivemos algo no passado, mas não estamos mais no passado, hoje sou uma senhora casada, e você se casará com Freya.
— Me casar com ela não significa que meu coração pertença a ela. — ele segurou em minha mão — Ainda penso em você.
— Sir Ulrich, pedirei somente uma vez. — respirei fundo segurando sua mão, para que soltasse a minha — Esqueça o passado, seu coração deve pertencer somente a Freya, assim como seus olhos devem estar na direção dela.
— Ulrich, eu… — Freya adentrou na biblioteca de forma repentina — .

Me afastei dele mais que depressa para que ela não imaginasse coisas erradas.

— O que está havendo aqui? — seu olhar fuzilante para mim era intenso.
— Não está havendo nada. — Ulrich fez uma breve reverência com a face e saiu da biblioteca.
— Não deveria estar com seu marido ? — perguntou ela dando dois passos para frente.
— Não gosto de participar de conversas políticas ou econômicas, além do mais isso não é assunto para uma dama. — a olhei com tranquilidade — Temos que concordar que meu marido está sendo a centro das atenções de todos os convidados, em seu próprio noivado, devo pedir desculpas por isso?
— Não, ele tem um singelo crédito neste dia. — ela deu um sorri de satisfação — Já que foi ele quem deu dinheiro ao papai pelo meu dote, hum… Devo agradecer por isso?

Meus punhos se fecharam automaticamente, senti uma forte raiva pairar em meu interior.

— Tenha uma boa noite. — Freya saiu rindo da biblioteca.

Passei um longo momento paralisada remoendo todas as palavras que Freya havia dito, era o responsável pelo dote e provavelmente sabia que o noivo era Ulrich, logo me lembrei da visita que meu pai fizera no dia seguinte a minha noite de núpcias. Não era exata para me visitar ou por preocupação, certamente sua visita foi para obter dinheiro para o dote de Freya.

— Mi Lady?! — uma voz me despertou de meus pensamentos, era Sophie.
— Sim?! — a olhei respirando fundo — Algum problema.
— Estava a sua procura, o senhor Winchester…
— Entendi. — tomei impulso para a direção da porta.
— Está tudo bem? — perguntou ela.
— Não, mas ficarei bem.

Dei um sorriso forçado e segui em direção ao corredor.

já nos aguardava perto da carruagem, meu pai estava ao seu lado, ambos pareciam falar sobre assuntos rotineiros. Me aproximei em silêncio deles e me despedi do meu pai, entrei na carruagem primeiro sendo seguida por Sophie e pedi para que se sentasse ao meu lado. entrou instantes depois e mesmo sabendo que seu olhar ficaria em mim por todo o caminho, mantive meu olhar direcionado para a janela e minha atenção bem distante dali.

— Está tudo bem? — perguntou assim que adentrou o nosso quarto.
— Porque não estaria?! — eu que estava de frente para o espelho olhei seu reflexo.
— Talvez pela sua voz não estar normal, seu olhar distante… — ele respirou fundo — Está assim por Freya estar se casando? Ou pelo noivo ser ele? — Talvez esteja assim por ter sido a última a saber que meu marido foi o financiador de tudo. — não resisti em dizer o real motivo — O que sinto não é referente a sir Ulrich.
— Pode realmente confirmar isso? Posso acreditar que se não fosse ele a se casar com Freya, também reagiria assim?
— O que está querendo afirmar com isso?! — me virei e o olhei.
— Que ainda não o esqueceu, por está agindo com tanta indiferença a mim. — sua voz tinha um pouco de amargura — Mas como eu poderia competir, mesmo que tenhamos nos casado, continuo sendo um mero burguês não é mesmo?
— Como podes insinuar tal coisa? — um sentimento de chateação tomou meu coração — O que me deixou assim não foi pelo fato dele ser o noivo, o que me deixou assim foi saber que escondeste de mim por achar que meu sentimento por você é leviano e frágil, vejo que ainda sente que o que nos uni é somente seu dinheiro, sinto-me por completo indignada por ainda pensar assim.
— Perdoe-me, não queria lhe causar este tipo de sentimento. — ele deu alguns passos até mim estendendo sua mão para me tocar, porém recuei.
— Não sei se consigo lhe perdoar, não neste momento. — me virei em direção a janela — Preferiria que não me tocasse durante este tempo.
— Como desejar. — sua voz ficou seca e áspera.

Instantes depois ouvi o som da porta bater, fazendo meu corpo se arrepiar e minha alma estremecer, senti como se estivesse atiçado o pior lado do meu marido, entretanto estava chateada demais para me importar com os sentimentos dele. Respirei fundo e mantive meu olhar no jardim ao lado de fora, mesmo que o dia seguinte fosse algo especial para meu pai e os outros, eu não seria tão cordial assim e não colocaria meus pés naquela igreja.

“Não sei por quê (não sei por quê)
Me diga por quê (me diga por quê)
Por que o amor acaba?
Por que as coisas
Desaparecem?
Tão bonito?
É apenas um sonho,
O amor é como um sonho."

- Evanesce / Super Junior



10. Islands

Kyoto (Japão) - Inverno de 1847

ver.:
Assim como o planejado, o navio atracou em um porto desconhecido ao norte de Hyogo, o plano dos marujos seria saquear as cidades do litoral, já o capitão me levou até uma trilha secreta que estava entre os bosques. Nem mesmo os outros sabiam sobre aquela trilha, pois fazia parte do pergaminho que ele havia me entregado.

— Chegamos Mascote. — disse o capitão Salazar — A partir desta trilha, Kyoto está à leste daqui, basta somente seguir de acordo com o pergaminho.
— Obrigado por tudo capitão. — disse quase em sussurro.
— Você fala?! — o capitão me olhou surpreso e logo riu exageradamente — É por isso que ganhou minha confiança, continue sábio assim que ganhará o mundo.

Assenti com a face, durante todo aquele tempo com os piratas aprendi que ficar em silêncio poderia era uma qualidade útil, além de me fazer mais observador, minha audição havia se tornado bem mais avulsada que o normal. Porém toda a minha evolução ao longo dos anos não estava relacionado ao poder, só havia um motivo para eu querer ser uma pessoa importante e respeitada na sociedade, ou melhor, uma palavra determinava todo o meu esforço: .

Eu havia perdido minhas poucas economias quando fui levado ao navio dos piratas, nesses meses que estive com eles não consegui juntar muita coisa e tudo o que possuía além daquele velho pergaminho que já havia decorado totalmente, estava em uma trouxa de pano juntamente com um cantil de água. Me despedi do capitão que voltou pela mesma rota em que viemos, a partir daquele momento eu estava sozinho novamente.

Andei por dias, sem saber onde estava e nem exatamente onde chegaria, entre bosques e montanhas, até que decidi sair da trilha principal e pegar o caminho alternativo, que estava indicado com uma fina linha tracejada no pergaminho. Mais dias de caminhada, percebi que até a água do cantil havia acabado, meu corpo quase desidratado não conseguia mais se manter de pé.

Em pleno sol que se encontrava bem ao centro do céu, minhas vistas escureceram e logo que meu corpo desabou sobre a terra, perdi a consciência. Fui despertando aos poucos sentindo meu corpo balançar, como se estivesse sendo carregado por algo ou alguém, nem mesmo meus olhos tentaram se abrir e desmaiei novamente. Não sei quanto tempo permaneci desacordado, mas despertei novamente sentindo alguém me dar água de um cantil.

— Você está bem agora! — era uma voz feminina, transmitia calma — Nós cuidamos de você.
— Onde estou?! — sussurrei abrindo os olhos.

Minha visão embaçada foi tomando forma, diante de mim a figura de uma jovem dama surgiu, seus traços orientais de sua face eram mais finos e delicados que as nobres damas de Londres, até mesmo seus trajes eram diferentes e de acordo com o que tinha aprendido, deveria ser uma jovem japonesa. Ela mantinha um sorriso singelo nos lábios, enquanto me olhava com serenidade.

Retirando com cuidado o tecido que estava em minha testa e o umedecendo, colocou novamente sobre mim, curiosamente aquilo me fazia sentir refrescância já que minha temperatura parecia elevada além do normal.

— Senpai, ele acordou. — disse ela assim que um homem entrou na tenda.
— Onde estou?! — sussurrei novamente tentando me levantar, porém meu corpo ainda estava sem forças.
— Nós é que perguntamos, que és?! — retrucou ele parando em frente o lugar onde estava deitado.
— Meu nome é . — respondi ainda sentindo um pouco de tontura — O que aconteceu comigo? Quem são vocês?
— Eu sou Michimiya. — disse a jovem — E este é Daichi senpai, nós te resgatamos na trilha secreta ao oeste.
— Trilha secreta?! — não conseguia entender o que eles queriam dizer com isso.
— Como conseguiu achar aquela trilha? — perguntou o homem de nome Daichi — O que veio fazer aqui?
— Eu tenho um pergaminho que me trouxe até aqui. — expliquei.

O homem se afastou.

— Fique de olho nele, Michimiya.

Assim que ela assentiu com a face, ele se retirou. Voltei meu olhar para ela, parecia ser uma pessoa caridosa e gentil, aparentemente estava cuidando de mim, então mesmo que de forma receosa poderia confiar nela.

— Michimiya, onde estou? — perguntei.
— Estamos no vilarejo Akaashi. — respondeu ela — Como conseguiu seu pergaminho?! Poucas pessoas sabem da nossa localização.
— Ganhei de um amigo. — respondi — Mas, por que este lugar é tão escondido e secreto?
— Porque o homem do mundo externo não sabe conviver com nossas riquezas. — respondeu um outro homem, um pouco mais velho e de cabelos brancos ao entrar na tenda.
— Papai. — Michimiya se levantou e o olhou — Daichi foi avisar sobre…
— Agradeço sua dedicação minha filha, mas acho que a partir de agora, nosso hóspede conseguirá se mover sozinho. — disse ele num tom de ordem, mas não era para mim.

Logo a jovem entendeu aquilo como se fosse um recado para ela, então em silêncio e discreta frustração se retirou da tenda.

é seu nome. — continuou ele e elevando sua mão direita, mostrou estar segurando meu pergaminho — Isto?! Devo presumir que não lhe pertença.
— Atualmente sim, mas antes não. — concordei — Ganhei de um amigo.
— Foi o que presumi, você sabe aonde este caminho o leva?! — perguntou ele novamente.
— Não senhor, só tem um caminho para qual eu quero chegar, não é aqui. — fui claro e um pouco verdadeiro em minhas palavras.
— Consegue se levantar?!

Assenti com a face, mesmo sem saber se realmente conseguiria. Apoiando minhas mãos onde estava deitado, ergui meu corpo e me levantei com um pouco de dificuldade, o senhor continuou me olhando atentamente em cada movimento.

— Venha meu jovem, vamos conversar um pouco. — disse ele caminhando em direção a saída da tenda.

Assenti com a face o seguindo, do lado de fora me deparei com um lugar encantador, haviam várias tendas montadas pelos arredores, a mistura entre a natureza e as simples construções do homem traziam uma harmonia incomum ao lugar. À direita onde estávamos haviam alguns arbustos que davam flores e frutos, à esquerda ao longo do monte haviam várias plantações do que parecia ser arroz.

Me peguei impressionado com tudo o que via ao meu redor, consegui sentir que não somente o lugar era puro e aconchegante, mas as pessoas que ali moravam mesmo eu sendo tão diferente, não me olhavam com preconceito ou superioridade, mas só conseguia enxergar a curiosidade neles.

— Presumo que você seja de muito longe. — disse o senhor.
— Sim, sou, mas tem muito tempo que não volto para casa. — assenti me lembrando vagamente da minha família — O senhor é o líder deste vilarejo?
— Não diria assim… — ele riu baixo — Porém, sou o ancião mais velho, por isso sinto que devo proteger a todos.
— Um lugar tão lindo, deve mesmo ser protegido. — concordei — Agora entendo sua palavras sobre as riquezas daqui, um lugar que nenhum ouro pode comprar.

Senti o olhar admirado do ancião vir sobre mim.

— Você parece ser um jovem muito sábio. — comentou ele — Acho que pode ficar aqui até melhor por completo.
— Agradeço por poder ficar.

Após algumas horas de longos passeios pelos arredores do vilarejo sendo apresentado para os moradores, acabei descobrindo o nome daquele ancião, o senhor Takashi havia me acolhido com gentileza e eu ficaria naquela mesma tenda, sob a companhia de Daichi que seria responsável por mim. Passei algumas semanas aprendendo um pouco mais sobre a cultura deles, desde o idioma e sua escrita até a agricultura, era ainda mais fascinante meus momentos de conversa com o senhor Takashi ao pôr do sol.

— Então seu desejo é se tornar importante para conquistar esta jovem. — concluiu o senhor Takashi assim que terminei de contar sobre minha história.
— Sim, meu coração tem batido por ela desde o primeiro momento em que a vi. — confirmei serenamente, enquanto mantinha meu olhar para frente vendo o sol de por — É um dos motivos de ter saído de casa, pertence a nobreza e eu não era ninguém no mundo.
— Te conhecendo um pouco mais através desses dias, começo a perceber que ainda é uma criança pura e inocente. — disse ele com seu tom suave de sempre.
— Criança?! — o olhei confuso.
— Sim, ainda é uma criança sob o olhar dos gananciosos. — explicou ele — Espero que seu coração jamais se corrompa pela a ambição das riquezas e do poder, para isso, mantenha sempre seu olhar nesta jovem que te motiva a ser melhor.
— Me lembrarei deste conselho senhor. — me curvei de leve em forma de respeito — Irei primeiro.

Assim que ele assentiu, me afastei indo em direção a Daichi, que já se preparava para fazer sua ronda noturna pelo perímetro dos bosques, eu havia me oferecido para ajudá-lo e mesmo relutante em aceitar minha companhia, teve que acatar a ordem do senhor Takashi.

— Estou aqui, podemos ir agora. — disse num tom respeitoso, já que Daichi era o segundo no comando por ser o guerreiro mais forte e corajoso do vilarejo.

Ele era considerado um protetor por todos, tão silencioso e observador como eu. Seguimos pela nascente primeiro até chegar ao rio, caminhamos por mais algumas horas entre as árvores do bosque, me afastei um pouco de Daichi ao ouvir um barulho estranho ao sul perto da trilha. Quanto mais próximo do som eu chegava, mais nítido dava para entender que eram vozes de homens, me aproximei de um arbusto e fiquei abaixado observando.

— São piratas orientais. — sussurrou Daichi aparecendo misteriosamente ao meu lado — Não é a primeira vez deles aqui.
— Estão bem perto do nosso perímetro, não vamos fazer nada? — perguntei mantendo meu olhar naqueles homens.
— Não, enquanto estiverem longe de nós, ficaremos longe deles. — respondeu mantendo a firmeza em sua voz.

Ficamos por um longo tempo observando aqueles homens, até que adormeceram, aproveitamos para sair daquele lugar, ao chegar na metade do caminho, eu que estava caminhando na frente, senti Daichi me empurrar forte. Assim que olhei para trás, ele já estava caído e sendo preso por uma armadilha estranha, sua calça de linho estava rasgada e o sangue já se escorria pela roupa.

— Vá embora, volte e não deixe ninguém te seguir. — disse ele num tom preocupado.
— E te deixar aqui, jamais. — me levantei depressa e indo até ele, comecei a analisar como era feita aquela armadilha — Eu já vi uma assim antes.
— Deixe-me aqui, a minha própria sorte. — ele me empurrou novamente — De certo não valerei mais nada.
— Pare de dizer tal coisa, sempre há como reverter algo. — mexi em alguns pinos que compunham a armadilha e desprendendo uma ponta solta, consegui abrí-la sem que fizesse algum barulho ou machucasse mais ele — Vamos agora.

O ajudei a se levantar e o fiz se apoiar em mim, tinha que levá-lo imediatamente ao vilarejo, assim Michimiya com sua sabedoria em ervas poderia ajudar de alguma forma.

— Acho que te devo essa. — sussurrou ele, sua cara demonstrava o quanto era forte a dor que sentia.
— Você me salvou antes, quando me empurrou. — ri de leve — Estamos acertados.

Assenti, parei por um momento para que ele pudesse descansar, não estávamos muito longe da trilha que levava ao vilarejo, porém Daichi não estava conseguindo andar. O ajudei a se sentar e rasgando uma parte de sua calça, amarrei o tecido na região em que sua perna estava ferida, para estancar o sangue. Meus conhecimentos da medicina eram poucos, mas o básico conseguiria fazer para ajudá-lo.

— Onde aprendeu tudo isso? — perguntou ele.
— Eu tenho uma vida fora daqui. — disse de forma descontraída — Passei um tempo com alguns marujos, pude aprender muita coisa.
— Perdoe-me. — sussurrou ele.
— Pelo que?! — o olhei confuso.
— Por achar o pior de você. — ele suspirou fraco — Talvez por ciúmes.
— Fique tranquilo, jamais haverá algo entre eu e Michimiya. — o assegurei com confiança — Meu coração já está ocupado por alguém, mesmo que ela venha não me querer, serei somente dela.
— Vejo a sinceridade em seu olhar, desejo que consiga o amor dela. — Daichi desviou seu olhar para trás de mim e suas pupilas se dilataram.
— Levante-se. — uma voz grossa surgiu.

Eu me levantei cautelosamente, precisava de uma ideia para mudar aquela situação, se aquele homem tivesse acompanhado, poderia ser um perigo para nós e mais perigoso ainda se eles encontrassem a trilha. Assim que me virei para o homem, fiz um movimento rápido para derrubá-lo, antes mesmo que ele perdesse completamente o equilíbrio, peguei sua espada e cortei sua mão.

Era a minha primeira vez ferindo alguém em uma luta, em muitas batalhas que enfrentávamos no mar, o capitão sempre me deixava trancado em sua cabine para que eu não me machucasse, mesmo sendo o melhor em armas de toda a tripulação. Em segundos, os outros vieram e Daichi mesmo machucado levantou e com sua força e coragem, ajudou-me a desarmar e ferir todos.

Era admirável como Daichi me superava de todas as formas em um manejo com a espada, talvez por seu modo de lutar ser um tanto diferente do meu, entretanto suas habilidades mesmo machucado não estavam sendo afetadas.

— Pela contagem, estão todos aqui. — disse assim que empurrei o último corpo pela colina abaixo, todos estavam feridos e desmaiados — Analisando agora, acho que sabiam que estavam sendo vigiados.
— Talvez, ou deve ter sido pela armadilha. — Daichi se escorou em uma grande rocha e colocou a mão na altura da barriga.
— Oh não. — disse ao ver uma ponta de sangue surgir — Está mais ferido ainda.
— Penso em desistir agora. — disse ele cambaleando um pouco.
— Não vai. — o segurei firme — Você irá continuar e ainda o verei se declarar para Michimiya.
— Acha mesmo que ela aceitará?! — ele me olhou, suas pálpebras pareciam pesadas — Michimiya anda com seu olhar em outra pessoa.
— Ela já sabe o que penso sobre isso. — assegurei — Já disse, ainda quero vê-lo se declarando para quem está em seu coração...

Seu corpo desfaleceu antes mesmo que pudesse terminar o que dizia, o joguei em minhas costas e segui em direção a trilha. Uma noite em claro de caminhada, até que cheguei ao vilarejo gritando por socorro, os homens vieram ao meu encontro e sem demora levaram Daichi para a tenda. Meu corpo também desfaleceu no chão, porém permaneci consciente, vi ao longe Michimiya sendo solicitada e correndo para a tenda.

Permaneci lá mesmo, na terra onde havia caído, pedindo a Deus para que meu novo amigo sobrevivesse. Assim que Takashi veio até mim, contei a ele tudo o que havia se passado, desde o momento em que saímos do vilarejo até nosso retorno. Ele havia confirmado que não era a primeira vez daqueles homens ali, assim como todas as outras pessoas que já se aproximaram da trilha para o vilarejo, eles estavam a procura das riquezas daquele lugar.

— Sua coragem foi admirável. — disse o senhor Takashi ao se aproximar de mim — Muitos deixariam Daichi para trás.
— Não costumo fazer isso. — assegurei — E ficarei mais aliviado quando vê-lo em segurança novamente.
— Mesmo ele te tratando com indiferença todo este tempo, vejo que ainda o respeita e considera. — o ancião era sempre direto e sincero em suas palavras, sejam elas quais forem.
— Sim, sempre serei. — suspirei fraco — Além do mais, não queria privá-lo de receber os cuidados de Michimiya.
— Ah sim, todo este tempo que esteve aqui, Daichi sempre lutou para despertar o interesse de minha filha. — ele manteve seu olhar na direção da tenda — Agora ele terá, me entristece que seja nessas circunstâncias.
— A mim também.

As horas foram se passando, eu descansei um pouco na tenda do ancião, quando acordei recebi a notícia que Daichi estava bem e já havia acordado. Meu coração se alegrou por isso e logo fui vê-lo pessoalmente.

— Você está realmente bem. — disse ao entrar na tenda — Está pronto para outra aventura.
— Por favor, deixe-me mais um pouco aqui. — brincou ele — Estou em meu melhor dia.
— Imagino o motivo. — desviei meu olhar para fora da tenda onde MIchimiya estava pegando mais água — Então se declarou?
— Quando pensei que realmente iria morrer. — respondeu ele.
— E a reação dela?

Assim que terminei minha pergunta Michimiya adentrou na tenda.

— Meu pai o aguarda lá fora. — disse ela ao se aproximar de mim.

Assenti em silêncio e me afastei dela indo em direção ao ancião.

— Espero que esteja melhor hoje meu jovem. — disse ele.
— Sim senhor.
— Venha, quero lhe mostrar algo. — disse ele seguindo para o leste.

Assenti o seguindo, não sabia ao certo para onde estávamos indo, mas confiava no ancião. Foi uma longa caminhada entre as colinas, até que chegamos a uma escadaria que parecia ainda mais infinita, ao topo uma espécie de templo, que estava em ruínas. Virei meu olhar para trás e contemplei um pouco o horizonte rico de belezas naturais, o ancião me fez esperar sentado por um tempo. Segundo ele, só poderíamos entrar naquele lugar quando a lua surgisse no céu.

E assim aconteceu, ao anoitecer ele acendeu a tocha que havíamos levado e encontrando em uma velha pira, logo o fogo tomou a pira, seguindo por toda a extensão da lateral. Deste modo, adentramos o lugar que já se encontrava totalmente iluminado pelo fogo, meu corpo congelou e minha mente parou assim que coloquei meus olhos em todo aquele tesouro que ocupava o salão principal do tempo.

— Um dia eu lhe disse sobre nossa riqueza. — se pronunciou o ancião — Mas não me referia as belas paisagens que nos rodeia.

Agora sim eu entendi, principalmente sobre o modo em que mencionava sobre a ganância do homem por ouro e prata, me faz imaginar que todo este tempo em que Takashi me deixou ficar no vilarejo, era um teste para saber se eu era ou não digno de saber sobre a verdade que se escondia naquele lugar.

A estrada é longa e a água era profunda,
Meus pés estão congelados e houve luz além do oceano,
O tempo flui, mesmo em dias que não são calmas,
Você estava comigo durante todo o meu tempo."
- Islands / Super Junior



11. Miracles in December

Derbyshire - Inverno de 1847

ver.:

— Mi lady. — disse Sophie ao adentrar a biblioteca — Bom dia.
— Bom dia. — mantive meu olhar na janela, estava observando conversando com meu pai.

Ainda estávamos brigados, o que era um absurdo segundo as palavras da senhora Poppy, mas eu me mantinha contínua em meu pensamento, não o deixaria tocar em mim até que confiasse por completo em meus sentimentos por ele. Talvez pudesse ser meu orgulho ferido em admitir que estava errada por ter brigado com ele, de fato Freya ter se casado com Ulrich havia se tornado algo tão insignificante para mim.

Entretanto, o que me irritava era sempre me lembrar da forma em que Freya havia mencionado sobre seu dote, isso deixava meu coração congelado de raiva, se me amava mesmo, jamais esconderia algo deste nível de mim.

— A senhorita está bastante pensativa esses dias. — comentou ela permanecendo perto da porta.
— Vendo aprendendo com a convivência. — disse de forma espontânea me referindo ao meu marido — Sabe se Margareth já acordou?
— Sim, eu vi a senhorita Margareth indo cavalgar com lady Evelyn. — respondeu ela.
— Cavalgar?! — desviei meu olhar para ela confusa — Desde quando tem cavalos novamente em Lewis Castle?
— Chegaram hoje pela manhã, na primeira hora do dia. — explicou — A senhorita Margareth se empolgou tanto que quis cavalgar de imediato.
— Eu não saí do quarto esta manhã. — sussurrei a causa de minha surpresa.

Voltei meu olhar para a janela, fixando meu olhar no motivo de termos cavalos novamente no castelo: Winchester. Certamente deve ter feito isso para ganhar mais pontos com meu pai ou o restante da minha família, ou somente inutilmente tentando me agradar, se aproximar de mim era tudo que ele mais tentava fazer ao longo daqueles meses de silêncio de minha parte.

Sophie era sem dúvida a melhor e mais discreta dama de companhia que eu já havia visto, ela estava passando todo o tempo comigo em silêncio, comentários curiosos ou inoportunos jamais viriam dela e isso era a melhor parte. A única coisa que me preocupava, era Ainda, o primo de , começar a demonstrar certo interesse por ela. Já sabia de sua fama de libertino, o que intensificava ainda mais minha preocupação.

. — disse Margareth ao bater na porta — Está ocupada?
— Não Marg. — virei minha face para sua direção — Já se cansou dos cavalos novos?!

Infelizmente um tom de ironia escapou de minha voz.

— Estou sentindo um tom diferente vindo de você. — ela adentrou o quarto e fechou a porta — Está tudo bem?
— Sim. — cruzei os braços e deu um suspiro cansado.
— Estou vendo que não. — ela caminhou um pouco mais em minha direção — Poderia nos deixar a sós Sophie?
— Claro, com sua licença. — Sophie se afastou de mim indo em direção a porta.
— Desculpe-me Marg, estou um pouco de mau humor hoje. — a olhei arrependida.
— Percebe-se. — ela veio ao meu encontro e me abraçou — Ainda estão brigados?
— Sim.
— Não se preocupe, não disse nada sobre isso a ninguém. — assegurou ela.
— Não sei como irei me sustentar no natal. — disse sentindo um aperto em meu coração.
, não deveria se reconciliar com ele? — sugeriu ela — Tenho certeza que é o que o senhor Winchester mais quer, ele é louco por você.
— Não, não sem que ele tenha certeza que meus sentimentos são reais. — mantive-me séria — Não quero que novamente nosso casamento seja baseado somente no dinheiro que ele tem.
— Então mostre a ele o que pensa sobre isso. — Marg tocou de leve em meus braços me fazendo descruzá-los — Ele só vai saber que gosta dele verdadeiramente se demonstrar isso.

Ela estava teoricamente certa.

— Deixe de orgulho. — insistiu.
— Vou pensar sobre isso. — assegurei.
— Hum… Vamos falar sobre outra coisa. — Marg me puxou para longe da janela e me fez sentar na cama com ela — Freya disse que tem uma supresa para nos contar no natal, o que acha que vai ser?
— Se tratando da Freya… Nem consigo imaginar. — suspirei fraco.
— Verdade… Se bem que a surpresa mais louca foi seu casamento. — ela me olhou meio curiosa — Você deveria ter ido a igreja.
— Sophie me representou muito bem. — disse em um tom tranquilo — E não estava me sentindo bem naquele dia.
— Eu fiquei intrigada pelo senhor Winchester ter ido. — comentou ela — Mudando de assunto, você vai mesmo viajar para o Japão com ele?
— Como soube sobre isso? — a olhei intrigada, havia mencionado de nossa viagem há somente dois dias.
— Eu discretamente ouvi a senhora Poppy comentando sobre isso. — respondeu ela com um olhar sapeca.
— Já estou entendo este seu olhar. — cruzei os braços — Não me faça pedir isso ao .
. — ela segurou minha mão fazendo uma carinha de criança abandonada — Eu fui para Ásia, nem sei quando poderei ter outra oportunidade, deixei-me ir com vocês, só desta vez.
— Você disse isso da última vez, quando fomos para Espanha no final do outono. — a olhei séria.
— Sei que você precisa de privacidade, mas quem teria privacidade com a senhora Poppy no mesmo ambiente?! — seu argumento tinha fundamentos, porém…
— Mesmo a família dele estando presente, Marg, não quero ter que… — me calei por um momento, vendo seu olhar — Tudo bem, pedirei a ele para ir conosco.
— Sério?! — seu olhar se encheu de esperança — Sério mesmo?!
— Sim. — sorri de leve.
— Você é a melhor irmã do mundo… — ela me abraçou empolgada — E direi isso na presença de Freya.
— Não precisa causar discórdias. — comecei a rir retribuindo o abraço — Comece a preparar suas coisas no baú, só por precaução, iremos logo após o natal.
— Ahhhh!!! — ela se levantou e começou a dar alguns rodopios pelo quarto — Já estou sonhando com esta viagem.

Eu ri um pouco de seu deslumbramento, Margareth ainda era uma criança inocente que só pensava em se divertir, o que me deixava feliz em poder lhe proporcionar dias alegres. Logo ouvimos alguns toques na porta, Sophie entrou com suavidade e veio até mim.

— Mi lady, seu pai a solicita. — disse num tom mais baixo.
— Meu pai?! — voltei meu olhar para Marg, que também me olhava com curiosidade.

Assenti brevemente e segui em direção a porta, Marg me deu o braço ficando ao meu lado, enquanto Sophie nos seguiu a uma certa distância. Assim que terminamos de descer a escadaria principal do Lewis Castle, avistei um rosto novo e conhecido.

— Pierre. — disse Marg com uma entonação de surpresa — O que faz em Derbyshire?
— Pierre veio passar o natal com nossa família. — explicou papai com um olhar de satisfação.

Ele sempre fazia este olhar, quando conhecia alguns amigos importantes de , e como Pierre era filho de um renomado conde francês, tinha certeza que sua satisfação estava ainda mais elevada.

— Mon cherí. — Pierre deu um daqueles seus sorrisos galanteadores e logo pegando a mão de Margareth beijou suavemente as costas — Gostaste da surpresa?!
— Imensamente. — ela sorriu com alegria, mas se conteve um pouco por causa de nosso pai.
— Mi lady Winchester. — Pierre se curvou em respeito, ele já sabia que não gostava que outros homens me beijasse as mãos — É prazer vê-la novamente.
— Sinta bem-vindo a Lewis Castle.
— Oh sim, já estou honrado só de estar aqui. — ele olhou rapidamente ao nosso redor — Este lugar é encantador, assim como as pessoas quem pertence.

Olhei rapidamente para Marg, seus olhos fixos em Pierre brilhavam ainda mais pelo elogio.

— Agradeço as palavras sinceras. — disse segurando um pouco mais firme na mão de Marg para que suavizasse sua face deslumbrada — Vieste sozinho?!
— Sim, meu pai e Belle tiveram outros compromissos inadiáveis. — explicou ele.
— E Louise? — perguntou Marg.

Minha irmã havia se tornado amiga e muito íntima da prima de Pierre, a qual lhe prometera ajudar conquistá-lo, de fato Marg estava apaixonada por aquele francês bon vivant.

— Deixarei vocês por algum tempo. — disse meu pai voltando seu olhar para mim, assim como Marg, ele também havia me dito para fazer as pazes com meu marido — Tenho alguns compromissos para esta tarde. Pierre, mais uma vez seja bem-vindo.
— Merci mi lord. — agradeceu ele.

Assim que papai se afastou, pude perceber a presença de , como sempre com seu olhar inteiramente voltado para mim. Confesso que a empolgação de Margareth e a surpresa de ter Pierre conosco havia prendido toda minha atenção para aquele possível futuro casal.

— Permita-me mostrá-lo a Lewis Castle?! — se ofereceu Margareth.
— Adoraria sua companhia, mas acho que não seria bem visto adentramos o castelo sozinhos. — disse ele um pouco preocupado com o que eu pensaria.
— Sophie se juntará a nós. — Margareth olhou para mim como sempre olhava quando queria algo de mim — Não é?!
— Claro. — assentiu sem saber dizer não a ela — Sophie, poderia acompanhá-los?!
— Como quiser mi lady. — assentiu ela.
— Agradeço. — Marg deu um suave porém apressado beijo em minha bochecha, se afastando pousou sua mão no braço de Pierre que já estava a sua espera.

Sorri com gentileza ao vê-la animada por novamente ter a oportunidade de estar perto dele, seu interesse era visível. Assim que se afastaram também, meu olhar se voltou para por um breve momento, seu olhar mesmo triste continuava intenso e sua face ainda que séria, transmitia suavidade.

— Espere. — disse ele ao segurar minha mão, assim que deu o primeiro passo para me retirar — Por favor.
— Hum. — virei minha face para sua direção, permanecendo com meu olhar abaixado.

Ele me puxou para mais perto e me abraçou, meu coração se acelerou de imediato e todo o meu corpo se aqueceu. Um sentimento de arrependimento tomou conta de mim, percebi que não somente ele sentia a minha falta, mas eu também estava sentindo a sua, todos aquele meses me mantendo afastada dele só estava nos trazendo solidão, mesmo vivendo em um mesmo ambiente.

— Perdoe-me, por te afastar de mim. — sussurrou ele, senti ainda mais tristeza em sua voz.

Por que ele estava pedindo desculpas, seu a culpa era minha per tê-lo afastado?

Senti a primeira lágrima rolar pelo meu rosto, me agarrei um pouco mais em seu colete me aninhando em seus braços, aquele abraço que me fazia sentir segurança estava de volta em minha vida. Naquele momento decidi em meu interior que nunca mais me afastaria de , queria para sempre estar em teus braços, sentir o teu amor sem reservas.

— Eu te amo. — sussurrou ele me fazendo chorar ainda mais — Não chore, apenas sorria e deixe-me chorar em seu lugar.

Eu me agarrei ainda mais a ele, meu coração que estava apertado todo aquele tempo ficou mais leve e em paz, senti que tudo estava se encaixando novamente em minha vida.

— Oh, não sabia que estavam aqui. — disse uma voz indesejada que parecia ser de Freya.

se virou para a sua direção, enquanto eu fiquei de costas secando minhas lágrimas, desejando que ela não tivesse nos interrompido.

— Está tudo bem? — a segunda voz era de Ulrich.
— Sim. — respondeu em seu habitual tom sério e firme.
— Acabamos de chegar Freya, acho que devemos nos acomodar. — sugeriu Ulrich.
— Freya. — uma terceira voz surgiu ao lado, de Evelyn — Minha filha querida, não sabia que já havia chegado.
— Acabamos de desembarcar da carruagem, ordenei aos criados levarem nossas bagagens aos quartos. — respondeu ela com um tom de satisfação, já que eles estavam voltando de sua viagem de lua de mel aos Estados Unidos.
— Como está sir Ulrich?! — perguntou Evelyn — A viagem lhe fez muito bem.
— O casamento me fez muito bem. — corrigiu ele.
— Oh, senhor Winchester e , o que fazer aqui? — perguntou minha madrasta.

permaneceu em silêncio pegando em minha mão.

— Já estávamos de saída. — sempre de poucas ele me guiou para frente.

Nem me dei ao trabalho de dizer uma só palavra a eles, segui meu marido para a direção que ele estava disposto me levar. Caminhamos um pouco mais a diante até chegarmos ao campo de lavandas, era meu lugar favorito da Lewis Castle, de alguma forma me fazia querer lembrar de uma parte de minha vida que havia se perdido em meu acidente.

— Gosto daqui. — sussurrei de leve vendo os flocos de neve que cobria toda a extensão do campo — Sinto que é um lugar especial para mim, só não sei o motivo.

Ele permaneceu em silêncio. Voltei meu olhar para ele e vi que a tristeza ainda permanecia em seu olhar, me senti um pouco chateada por isso.

— O que houve, disse algo errado?! — perguntei.
— Não. — ele deu um sorrido de canto — Estou feliz por estar aqui com você, neste lugar especial.

Seu olhar ficou um pouco mais feliz, eu o abracei novamente.

— Por mais que não consiga me lembrar o motivo de gostar daqui… — sorri de leve — Agora formarei uma nova lembrança para torná-lo ainda mais especial.

envolveu seus braços em mim e logo senti uma gota cair em meu ombro, certamente era uma lágrima sua que caíra sem permissão, o que me fez querer saber ainda mais seus sentimentos e emoções que demonstrava com tanta facilidade quando estávamos a sós. Declarei internamente que aquele lugar seria o pedaço em toda a Lewis Castle, que nos representaria.

Fechei os olhos sentindo o perfume dele envolvendo meus sentidos, pensando como poderia uma pessoa me amar tanto assim, amar alguém com tantos defeitos como eu. Internamente e externamente, não era como as belas moças da Inglaterra, possuía várias cicatrizes que jamais se apagariam, mas que me ajudavam a lembrar que mesmo tendo perdido algumas memórias naquele acidente de quando criança, algo importante havia acontecido.

já sabia sobre o acidente e minha perda de memórias, também e principalmente que Ulrich havia me salvado de afogar, pois estava inconsciência após ter batido a cabeça em uma pedra. Nem mesmo me lembrava de como eu tinha caído, só sabia que havia sido um pouco depois que ganhei as cicatrizes nas minhas costas, por que Margareth me contou em segredo.

Talvez por causa daquele acidente, me sentia incompleta, até que me casei com ele.

- x -

— Feliz natal. — disse meu pai ao me abraçar.
— Feliz natal papai. — retribui o abraço — Agradeço por nos convidarem.
— Lewis Castle sempre será seu lar. — disse ele com um olhar carinhoso — Apesar de ter tantos lares.
— Lar é onde está nosso coração. — sorri para ele — Um pedacinho do meu está aqui também.
— Minha querida. — ele parecia mais emocionado que o normal — Sinto-me tão aliviado por estar feliz com o senhor Winchester.
— Deixe esses sentimentos de lado, sei que ainda se sente culpado por um casamento arranjado, mas estou grata a Deus por esse casamento. — segurei em sua mão — Apenas se sinta feliz, por sua filha.

Voltei minha face para o lado sentindo alguém se aproximar, era e seu olhar de sempre.

— Feliz natal. — senti que sua voz estava direcionada a mim, aparentemente meu pai também sentiu, tanto que se retirou discretamente.
— Feliz… — sorri automaticamente mantendo meu olhar nele — Eu te amo.

Ele deu um sorriso singelo, seu olhar se encheu de alegria e parecia estar emocionado. Eu ainda não sabia como reagir, quando ele demonstrava com tanta clareza em suas expressões faciais os seus sentimentos, somente conseguia sorrir na mesma proporção de seu espontâneo sorriso.

— Pronto Freya, já saboreamos a ceia e logo abriremos os presentes, já pode nos contar sua surpresa. — disse Margareth de forma impaciente por todo o mistério que nossa irmã estava fazendo.
— Não seja tão apressada assim criança. — repreendeu nosso pai rindo — Deixe que sua irmã diga a seu tempo.
— Freya sempre faz suspense com suas notícias. — reclamou Marg se colocando ao lado de Pierre que segurava o riso.
— Confesso que estou um pouco curiosa também. — disse Evelyn ao pegar outra taça de vinho — Freya não quis contar nem para sua própria mãe.
— Bem, é que ainda haviam algumas dúvidas, porém agora podemos afirmar para todos. — explicou ela com aquele sorriso desagradável de superioridade em sua face — Estamos esperando nosso primeiro herdeiro.

Seu olhar veio diretamente em minha direção, fazendo-me sentir um gosto amarga na boca.

— Oh querida! — Evelyn a abraçou de forma carinhosa — Um herdeiro, estou tão emocionada.
— Meu parabéns Ulrich, vamos torcer para que venha um menino forte e cheio de saúde. — disse meu pai um pouco surpreso.

Certamente papai esperava ter seu primeiro neto vindo de mim, porém após tantos alarmes falsos comecei a pensar que não havia nascido para isso, estava quase completando um ano de casada e não havia engravidado. Por outro lado, Freya com poucos meses já daria a Ulrich um herdeiro, isso me fazia novamente lembrar de minhas cicatrizes, em instantes senti segurar minha mão como se estivesse demonstrando estar ao meu lado sempre, e encostando sua face em meus cabelos, meu corpo se arrepiou.

— Deseja sair daqui?! — sussurrou ele.

Assenti em silêncio.

me guiou até a porta e subimos as escadas até nosso quarto. Todos já sabiam da minha dificuldade em engravidar, por um deslize da senhora Poppy que acabou comentando com Evelyn. Assim que entramos no quarto, me direcionei para a janela, mas não soltando minha mão, me puxou para mais perto aninhando-me em seus braços, seu gesto me fez sentir ainda mais segura e protegida.

— Obrigado. — sussurrei segurando minhas lágrimas.
— Sua dor também é a minha dor. — sussurrou de volta com carinho — Nós ficaremos bem, apenas descanse em meus braços.

Deus era mesmo bom comigo, por ter me dado alguém como para me apoiar e me alegrar, meu marido mesmo com toda a sua intensidade no seu amor, me transmitia paz e tranquilidade, a calmaria que sempre desejei ter em minha vida. Estava começando a gostar de todas as noites dormimos juntos no mesmo quarto, era um dos lados dos burgueses que eu mais apreciava.

— Estarei sempre em seus braços. — sussurrei novamente dando um suspiro aliviado.
— É o lugar que eu sempre desejo que esteja. — ele acariciou meus cabelos — Eles sempre estarão abertos para você, somente você.

Outro arrepio veio-me ao corpo, senti-me aquecida por dentro juntamente com o pulsar mais forte de meu coração.

As horas se passaram…

No meio da madrugada decidi me levantar, já estava a um tempo sem conseguir voltar a dormir e decidi procurar por algum livro que pudesse me fazer sentir sono. Eu poderia até mesmo terminar minhas últimas páginas de O conde de Monte Cristo, mas estava tão encantada com a riqueza daquela história que não queria terminá-la assim com tanta rapidez. Assim que me levantei da cama, voltei meu olhar para que dormia em seu sono profundo, sorri um pouco e vesti o longo casaco francês que havia ganhado de de presente.

Desci as escadas com calma devido ao escuro, só estava segurando um castiçal de prata com uma vela que já pequena não iluminava muito. Foi um pouco confuso minha coordenação ao definir em que direção eu ia, à noite era um pouco mais complicado para conseguir encontrar a biblioteca. Entretanto, quando cheguei ao corredor certo, comecei a ouvir alguns risos vindo de mais ao fundo.

Assim que adentrei silenciosamente a biblioteca, paralisei com a cena que estava diante de mim. Ulrich estava deitado no tapete em frente ao sofá, com seu corpo sobre o de uma das criadas que trajava somente as peças íntimas, sua face ao olhar para trás e me ver, ficou rígida assim como seus olhos surpresos.

. — sussurrou ele.

Mesmo meu corpo congelado pelo impacto, de ver meu cunhado tendo intimidades com uma serviçal na casa onde fui criada, minhas pernas conseguiram se mover para fora daquele lugar. Segui pelo corredor de forma apressada, porém senti uma mão me segurar de forma forte.

— Espere , eu posso explicar. — disse ele como se estivesse traindo a mim e não a sua esposa — Por favor.
— Não deve-me nada. — disse me soltando — Não é a mim, que precisa se explicar.

Dei alguns passos para trás e voltei o mais rápido que pude ao meu quarto. Assim que entrei fechei a porta e a tranquei, elevei a mão em meu coração e olhei para cama, não estava deitado, voltei meu olhar para a janela e lá estava ele olhando o lado de fora, pensativo.

— Achou o que procurava?! — perguntou como se soubesse de algo.
— Não. — sussurrei direcionando meu corpo para a direção da cama — Vou me deitar.

Permaneci em silêncio sobre aquilo durante todos os outros dias em que ficaríamos em Derbyshire, não sabia se contava ou não para Freya, pois a mesma poderia dizer que era mentira de minha parte. Porém Ulrich não se conteve em sempre tentar me abordar em algum canto para se explicar, por isso sempre mantinha Sophie por perto para que ele não se aproximasse de mim.

Finalmente o dia de nosso embarque para o Japão chegou, o navio já nos aguardava no porto de Liverpool, onde possuía seus maiores investimentos e empreendimentos. Felizmente Margareth conseguiu a autorização de meu pai e evelyn, após estrategicamente meu marido a convidar para ir, seus pedido para meu quase valiam como uma ordem. Sophie como minha dama já iria, assim como a família de , a surpresa seria com a companhia de Pierre que resolveu não voltar para Paris e seguir viagem conosco.

Assim que adentramos o navio, segurei meu riso, já imaginava que minha viagem jamais poderia ser com privacidades, mas pelo menos teriam momentos de alegria e diversão, burgueses tinham um humor mais leve que os nobres, apesar dos exageros em suas gargalhadas.

— Espero que esteja se sentindo bem acomodada. — disse ao entrar na nossa cabine que era a cabine do capitão.
— Sim, estou. — assenti mantendo meu olhar para o vidro que compunha um pequeno vitral no meio de toda aquela armação, forros e estruturas — Imagino que seja pela vista que tenha reservado a cabine do capitão para nós dois.
— Pode se dizer que sim, além do conforto. — admitiu ele dando mais alguns passos até mim.
— Hum. — continuei com minha atenção ao mar.
— Estava mais silenciosa do que eu no jantar. — observou ele ao chegar atrás de mim e colocar suas mãos frias em minha cintura — Aquilo ainda te preocupa?!
— Aquilo o que?! — perguntei confusa.
— Não precisa mais agir como se eu não soubesse. — explicou ele — Aquela noite não foi a primeira dele fora de seu quarto, e sabemos que não seria a última.

Céus! também sabia da traição de Ulrich, o que me faz sentir que sua frase quando entrei no quarto naquela noite, era sobre isso, explicava o motivo dele não ter insistido em perguntar onde eu estava como sempre.

— Não está assim por causa de Freya, não é?! — perguntou ele — Está assim porque acha que farei o mesmo com você.
— Perdoe-me por pensar tal coisa. — mantive meu olhar para frente, envergonhada por não conseguir encará-lo — Durante toda a minha vida, vi sempre esta parte dos casamentos entre os nobres, os senhores traindo suas esposas sem a menor preocupação, até mesmo o meu pai, o vi uma vez quando criança, estava às portas fechadas na biblioteca com uma amiga de Evelyn, estávamos comemorando o aniversário de um nobre com um baile de máscaras.

Lembrar de todas as cenas que havia presenciado quando pequena, de senhores que traiam suas esposas, fazia meu coração se encher de receio e tristeza. De repente, os abraços de envolveram em minha cintura, senti seu tórax encostar em minhas costas e um breve porém significativo beijo em meu pescoço, que fez meu corpo se aquecer.

— Jamais pense tal coisa de mim novamente. — sussurrou ele — Assim como meus olhos e pensamento estão sempre em você, és a única com direitos e deveres sobre meu coração e meu corpo.

Eu ri baixo daquelas palavras, um pouco engraçadas, mas no fundo sérias e sinceras.

— Sou teu, mesmo em dias que não me queira. — sussurrou ele.
— Sempre irei te querer. — voltei meu olhar para ele — Eu te amo.

Não que estivesse mais fácil dizer que o amava, porém aquela pequena expressão de três palavras, era a única forma que conseguia expressar verbalmente o que meu corpo já expressava.

Eu que era egoísta e só sabia de mim mesmo
Eu que era negligente e desconhecia os seus sentimentos
Eu não consigo acreditar que eu tenha mudado assim
O seu amor continua mexendo comigo assim."
- Miracles in december / EXO



12. Indestructible

Tóquio (Japão) - Primavera de 1848

ver.:

Eu estava encantada com cada detalhe da arquitetura de Tóquio, visitar o oriente era realmente uma oportunidade única, o que me fazia ficar ainda mais curiosa em saber sobre como havia feito amizade com aquele tal nobre japonês. Em Tóquio nos hospedamos na casa de um comerciante, que era representante dos negócios do meu marido em toda a Ásia Oriental, o senhor Kagami era muito gentil e tinha uma esposa adorável chamada Sakura.

A senhora Sakura além de dócil, havia me aconselhado bastante sobre o que eu deveria comer para me ajudar a engravidar, e assim como todos que eu conhecida, ela também era muito curiosa para me conhecer.

— Vamos. — disse assim que terminei de despedir de Margareth.
— Sim. — assenti me distanciando um pouco de minha irmã — Tenha juízo Marg.
— Pode ir tranquila. — a senhora Poppy pegou na mão de Marg e colocou em seu braço — Vou cuidar muito bem de sua irmã, como se fosse minha filha.

Eu tentei dar um sorriso despreocupado, mas não sabia se era algo positivo ou não, afinal a senhora Poppy era um tanto liberal demais. segurou em minha mão e me olhou com tranquilidade, o que me fazia me sentir um pouco mais segura em deixar minha irmã para trás. Assim entrei na carruagem e seguimos, os outros ficariam mais dois dias em Tóquio, assim poderia comparecer a um evento da nobreza em que havia sido convidado, mas como sempre não queria participar.

Enquanto isso, nós dois seguimos na frente com destino a Kyoto, onde uma casa que havia sido finalizada de sua construção recentemente, já nos aguardava. Alguns dias na estrada, até que finalmente chegamos diante daquela linda e encantadora casa, extremamente diferente da francesa e da londrina, a arquitetura japonesa era bem mais vibrante, principalmente em suas cores.

— O que achou?! — perguntou ele ao segurar minha mão.
— Não encontro palavras para expressar-me. — sim, eu não encontrava mais nada — Sinto-me ainda mais admirada.
— Imaginei. — ele sorriu — Assim como as outras, esta também é a sua, sinta-se à vontade para fazer dela o que quiser, só não poderá vendar.

Raramente ele brincava em seus comentários, o que me fez rir um pouco.

— Não a venderia. — sorri um pouco voltando meu olhar para a porta por onde entramos — Aqui é tudo tão diferente.
— Ainda não viu nada.

O olhei surpresa! Ainda havia mais coisas para se ver?!

— Venha ver o seu jardim! — disse ele me puxando para a lateral da sala.

Eu já havia visto alguns quadros retratando os delicados porém exuberantes jardins orientais, mas nunca em toda a minha vida, imaginei que teria um feito exclusivamente para mim, era ainda mais do que um sonho. Certamente eu era a mulher mais feliz do mundo, mais até que a pŕopria rainha Victoria.

Aquele jardim era ainda mais bonito e envolvente que as pinturas, o aroma que exalava deixava todo o ambiente perfumado, certamente era proposital estarmos ali em plena primavera. Logo mais a frente, após os pequenos bonsais, estava uma grande árvore de cerejeira, toda florida com suas flores rosas abertas.

— Sakura. — disse ele.
— O que?! — o olhei.
— Aqui esta árvore recebe o nome de Sakura. — explicou ele.
— É linda. — voltei meu olhar para a árvore — Tudo aqui é incrível.
— Sim. — ele sorriu — Venha, precisamos descansar um pouco para amanhã.
— Amanhã? — eu comecei a seguí-lo de volta para a casa — O que faremos amanhã?! Não ficaremos em Kyoto?
— Sim, mas não aqui. — respondeu ele tranquilamente — Quero te levar a um lugar especial, o meu lugar especial.
— Hum. — sorri levemente curiosa para saber que lugar era esse — Pensei que esta casa fosse o seu lugar especial aqui.
— Não, entenderá quanto estiver lá. — explicou ele.
— E quanto aos outros? — perguntei — Vão também?!
— Não. — respondeu ele — Eles virão para esta casa e ficarão aqui, o lugar que te mostrarei, só você poderá ir.

Assenti sem fazer mais perguntas, mesmo que pudesse me preocupar com Margareth, confiava ou pelo menos tentava confiar que a senhora Poppy cuidaria bem de minha irmã deslumbrada.

Na manhã seguinte acordamos bem cedo, ao sair por uma passagem que ficava atrás do jardim, seguimos em uma outra carruagem um pouco mais simples até um certo ponto da estrada. Como havia me presenteado com algumas roupas da cultura japonesas, havia me vestido com um de seus presentes e estava me sentindo um pouco mais confortável, com aquele quimono com o tecido de linho já que a seda era um tanto quanto mais quente.

Apesar de estranhar um pouco, estava me divertindo ao usar roupas mais simples do que costumava vestir, ver trajando o mesmo tipo de roupa me deixava ainda mais intrigada, pois ele continuava charmoso e atraente ao meu olhar. Assim que descemos da carruagem, eu me afastei um pouco olhando para o horizonte o sol já estava caminhando para se por. Ao se aproximar de mim, segurou em minha mão e me guiou bosque a dentro.

Caminhamos muito e um pouco mais, até que chegamos a uma pequena e escondida trilha, naquela altura do dia eu já estava me perguntando se meu marido estava perdido em seu senso de direção. Porém mantive-me em silêncio e continuei o seguindo, fazendo algumas paradas pelo caminho para retomar o fôlego, logo ao escurecer senti minhas pernas bambearem um pouco e me apoiei nele, foi neste momento em que encontramos o que ele tanto procurava.

?! — disse uma voz desconhecida no meio de todo aquele breu.
— Por um momento pensei que estivesse perdido. — disse ele ao segurar firme em minha cintura para me dar mais segurança.
— Eu também. — sussurrei de forma que ele não pudesse ouvir.
— Venha comigo. — o homem que também tinha traços japoneses riu um pouco — É uma surpresa vê-lo aqui.
— É bom estar de volta. — disse num tom mais suave, ao começarmos a andar novamente.
— E vejo que está acompanhado. — comentou o homem indo na frente — O ancião vai ficar feliz em vê-la.

Me ver?! Mais uma pessoa que me conhecia antes mesmo de eu saber sobre. Seguimos aquela trilha até chegarmos no que parecia um pequeno vilarejo, que se estendia em tendas sobre toda a colina. Olhei para tentando entender que lugar era aquela e que relação eu teria com nossa visita ali, não estava conseguindo ver nada de especial até aquele momento.

— Jovem Taikyu. — disse um senhor ao se aproximar de nós — Algo me dizia que o veria em breve.
— Takashi sensei. — disse curvando de leve sua cabeça como modo de respeito — Eu disse que voltaria.
— Sim, você disse. — o homem desviou seu olhar para mim — Seja bem vinda... Daichi os levará para a tenda, certamente estão cansados.

Assenti de leve e voltei meu olhar para meu marido, parecia confortável naquele lugar, seu rosto transparecia uma tranquilidade fora do comum, o que me fez sentir que  estávamos bem e seguros ali. Ao entrarmos, me guiou até uma cama feita de almofadas e futon, com um suporte de bambu por baixo de uma baixa altura, assim como as mesas daquele país.

— Que lugar é este?! — perguntei assim que ficamos a sós.
— Meu lugar especial. — respondeu ele ao se encostar em um pequeno armário de madeira que tinha aos pés da cama — Perdoe-me por trazê-la em um lugar tão simples…
— Qualquer lugar estando com você, me sinto confortável. — disse o interrompendo — Seja em um luxuoso castelo ao sul da Rússia ao aqui, nesta tenda.

Ele sorriu com alegria de imediato, seu olhar carinhoso veio de encontro ao meu.

— Fico aliviado por isso. — ele respirou fundo — Passei pouco mais de um ano aqui, mas sinto que de todos os lugares do mundo, este é o que mais desejava estar com você.
— Sinto-me por completo honrada por estar aqui. — sorri com leveza — Mas devo confessar que estou muito cansada, chegar aqui foi…
— Eu sei. — ele riu baixo — Confesso que perdi-me em um trecho do caminho, mas felizmente chegamos.
. — disse uma mulher ao adentrar a tenda, seu sorriso era delicado assim como os traços de seu rosto — Fiquei feliz ao saber que estava aqui, trouxe um pouco de chá para relaxá-los.
— Agradeço a gentileza Michimiya. — disse ele ao pegar a bandeja de sua mão — Ficaremos bem.
— Tenham uma boa noite. — a mulher suavizou um pouco mais seu sorriso e olhou para mim com gentileza e curiosidade, certamente deveria saber sobre mim.
— Cada vez fico mais curiosa por ver que pessoas que nunca vi, sabem tanto sobre mim. — comentei assim que a mulher saiu.
— Devo enfatizar ainda mais o quanto você é importante para mim?! — ele me olhou com serenidade e se ajoelhando em minha frente, colocou a bandeja entre nós — Aceita cha?!
— O que mais devo saber sobre você?! A cada dia me supreende mais. — comentei mantendo meu olhar nele.
— Confesso que gostaria… — ele se calou.
— Gostaria?! — insisti.

Ele sorriu e me beijou de leve, um toque suave e doce que mesmo sabendo que o propósito era me distrair de minhas perguntas, consenti na mesma proporção. Nossa noite naquele lugar foi um tanto admirável de minha parte, e a cada momento em que ele me interrompia com um beijo, pude perceber o quão à vontade aquele lugar o deixava, tanto que na manhã seguinte nem me lembrava se havíamos ou não lembrado de desfrutar do chá.

— Suponho que seu nome seja . — disse a mulher ao adentrar na tenda.

Eu havia acabado de acordar e não estava lá, terminei de me espreguiçar e voltei meu olhar para ela, não entendia o porquê, mas sempre sentia-me incomodada quando uma mulher sorria para meu marido. Bem, eu sabia o porquê, tinha ciúmes dele, por mais que não gostasse de admitir tal sentimento, porém algo que me deixava ainda mais frustrada é por sempre aquelas mulheres como Michimiya e Belle, ou até mesmo Louise, parecerem conhecer ele bem mais do que eu.

— Sim. — sorri de leve — Sou lady Winchester.
— Então ele finalmente conseguiu ficar ao seu lado. — comentou ela.
— O que quer dizer com finalmente?! — aquilo me deixava por de modo confusa.
— Michimiya?! — entrou — O que faz aqui?!
, vim saber se havia dormido bem. — ela voltou seu olhar para ele — Estava conversando com meu pai?!
— Sim. — ele respirou fundo voltando seu olhar para mim — Michimiya, poderia nos deixa a sós?!
— Claro. — ela sorriu meio sem graça e se retirou apressadamente.

Voltei meu olhar para a bandeja de frutas que ele havia deixado aos pés da cama, para mim.

— Tudo bem?! — perguntou ele num tom preocupado.
— Ficará quando eu realmente descobrir a verdade. — voltei meu olhar para ele — Por que sinto que sempre está escondendo algo de mim? Algo que seja muito importante?
— Perdoe-me por isso. — ele respirou fundo — Posso te convidar para um passeio após o café?!

Assenti em silêncio. Ele sorriu estendendo sua mão para a bandeja e me fez sentar novamente ao seu lado na cama, após o café saímos da tenda e me deparei com o lugar lindo e fascinante onde estava, a claridade do dia realçava a beleza da natureza em nossa volta. Antes de nos distanciarmos do vilarejo, trocou algumas poucas palavras com o ancião e o homem que nos trouxera, de nome Daichi. Havia descoberto que o nobre japonês a quem nos enviou aquele presente era ele, um velho amigo que havia salvado há anos.

Logo seguimos por uma trilha diferente da que viemos, subindo um pouco a colina, adentramos um pequeno túnel formado por grandes rochas e assim que passamos por um estreito rio, chegamos a uma escadaria.

— Onde estamos?! Isso parece ser um templo. — perguntei observando aquelas paredes em ruínas, mas que certamente possuía muitas histórias a serem contadas.
— Você disse que queria me conhecer, com mesma intensidade da qual eu te conheço. — disse ele ao segurar em minha mão — É por isso que estamos aqui, este lugar é parte do que sou hoje.

Mantive meu olhar nele.

— Desejo mais do que tudo que saiba quem eu sou… Porém, mesmo não conseguindo dizer claramente, permita-me mostrá-la. — seu olhar parecia esperançoso — Ainda que aos poucos.
— Será um prazer. — assenti dando um leve sorriso — É o que mais quero.

Este indestrutível e inquebrável,
Vínculo que nunca vai se quebrar,
Nossas almas são almas gêmeas,
Por exemplo,
Mesmo se parecer que você está prestes a cair de um penhasco,
Eu definitivamente não vou soltar a sua mão.

Indestrutível...
Porque eu vou proteger você até o fim."
- Indestructible / Girls' Generation



13. Keep Your Head Down

Londres - Primavera de 1844

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Finalmente eu estava de volta a Londres, após todos aqueles anos fora, estava com saudade e minha família além de curioso por notícias de lady . Porém, antes de voltar para casa tinha que me estabelecer naquela sociedade onde os aristocratas achavam que eram os superiores.

— O que pretende fazer de início senhor? — perguntou Lee, um leal amigo que conheci recentemente e se tornou meu braço direito.
— Mostrar aos nobres que Londres possui um novo hóspede. — voltei meu olhar para frente e sorri de canto, estava ansioso por aquele momento — Vamos começar com o melhor imóvel da cidade.
— Disso eu já cuidei. — assegurou ele — O corretor está a nossa espera senhor.

Seguimos até a carruagem alugada que nos levou ao lugar combinado pelo corretor. O homem trajava um terno aparentemente desgastado, consegui notar um pequeno rasgo nos punhos da manga direita. Seu modo de falar era de uma pessoa apressada, típico de corretores de imóveis que já havia encontrado.

— É um imenso prazer lhe conhecer senhor Winchester. — disse ele esticando a mão em cumprimento.
— Igualmente. — respondeu Lee por mim aceitando o cumprimento em meu lugar — O senhor Winchester está ansioso para ver seu imóvel.
— Ah, sim claro. — o homem logo recolheu sua mão envergonhado pela minha reação — Sigam-me por favor, verão que separei a melhor propriedade de Londres para o senhor.

O homem começou a caminhar em nossa frente. Eu sabia que depois daquela compra, muitas pessoas iriam saber sobre mim, meu nome correria não somente naquela cidade, mas em toda a Grã-Bretanha. Por isso, continuaria agindo de forma fria e silenciosa, não demonstraria nenhuma reação muito chamativa e cativante entre as pessoas, mas faria com que toda a sociedade me respeitasse.

— A entrada desta casa é por aqui senhor, vai perceber que mesmo sua construção sendo antiga, a estrutura é muito boa. — comentou ele assim que nos aproximamos da grande porta de madeira.

Estrutura boa, observei cada detalhe do lugar. A casa estava caindo aos pedaço, além das várias teias de aranha que se destacavam mais que aquela decoração antiquada do período renascentista.

— Eu por curiosidade andei ouvindo um pouco sobre seus negócios senhor Winchester. — comentou o corretor como se quisesse tirar alguma informação mais importante sobre mim — Estou admirado que um britânico tenha conquistado laços econômicos com o oriente, suas mercadorias e frotas estão ficando muito famosas e mencionadas...
— O senhor Winchester agradeceria se não fizesse perguntas ou comentários que não estejam relacionados a propriedade. — disse Lee o interrompendo.
— Ah, sim claro. — ele respirou fundo — Então, o que achou senhor?

Olhei para Lee e assenti com o olhar para que seguisse com o planejado, eu já sabia qual propriedade ele estava me mostrando, a quem pertencia e o quão importante era a localização, a parte mais nobre e rica da cidade.

— O senhor Winchester gostou do lugar, está interessado tanto na propriedade como em sua localização, já imaginávamos que nos traria aqui. — comentou Lee.
— Como?! — o homem pareceu surpreso.
— Tenho certeza que podemos fechar o negócio, meu senhor aqui presente faz questão de pagar pela propriedade a vista e em raras moedas de ouro. — continuou meu mordomo fiel.
— Ficarei honrado em preparar todos os documentos necessários. — o corretor deu um sorriso aliviado.

Por certo ele estava mesmo precisando vender aquele imóvel, já que a família de nobre a qual pertencia estava na falência e precisava urgente do dinheiro. Para minha surpresa os documentos ficaram prontos de forma rápida e precisa, como Lee tinha muitos conhecimentos de leis e direito, serviu a ele o dever de analisar cada linha da escritura e documentos. Assim que tudo foi oficialmente transferido, registrado e a propriedade passou para meu nome, Lee entregou ao corretor o pagamento pela vendo, assim como uma pequena bonificação pela sua discrição.

— O senhor acha mesmo que ele ficará em silêncio?! — comentou Lee assim que entramos no quarto em que eu estava hospedado no luxuoso Hotel Kingdom Mont’ Blanc.
— Após gastar seu bônus com bebidas e prazer, tenho certeza que não. — caminhei até a janela — Vamos para o segundo passo, contrate o melhor e mais requisitado arquiteto, quero colocar aquela casa a abaixo e construir uma melhor e mais luxuosa ainda.
— Como quiser senhor. — assentiu ele.
— Não me importo quando o valor que irá gastar, quero que a construção se inicie o mais rápido possível. — suspirei fraco olhando as carruagens que passavam pela rua — Prepare também nossa partida para amanhã, vamos para Nottinghamshire.
— Voltará para casa senhor?! — sua voz era de ansiedade.
— Sim, além da saudade, sinto que tenho bons negócios a fazer por lá. — ri baixo — Sinto-me ainda mais preparado para mostrar aos nobres que seus títulos não valem mais nada nos dias de hoje.
— Devo concordar que a burguesia está mesmo sendo notória, principalmente em Londres.
— Os farei desejar conhecer o dono do sobrenome Winchester. — disse com firmeza e segurança.

Lee riu baixo, ele sabia parte do meu propósito inicial, tinha certa confiança em contar-lhe algumas coisas, já que me devia sua vida, sabia que a sua lealdade era real e eterna. Mais dias se passaram até que finalmente cheguei ao meu antigo lar, não me preocupei em me instalar os ser anunciado perante a nobreza local, meu foco era minha família.

Assim que a carruagem parou em frente aquele humilde casebre, que já mostrava traços ainda mais fortes de desgaste, meu coração se apertou em ver que minha família passava por uma situação ainda pior do que quando eu havia partido. Estava ansioso para saber se ainda moravam ali e como haviam passado todos aqueles anos em que estive fora.

— Anjo?! — disse uma voz feminina e trêmula, certamente de minha mãe.
— Mãe. — me virei para trás e a olhei, estava um pouco suja de barro — Sou eu.
— Meu . — ela veio ao meu encontro e sem se importar com a roupa, me deu um forte abraço — Minha criança, que saudade.
— Sinto o mesmo, minha amada mãe. — segurei as lágrimas de saudade que se formaram no canto de meu rosto.
— Onde esteve todo esse tempo?! — ela passou a mão em minha face v Oh, céus como está bonito! E eu estou te sujando.

Ela se afastou um pouco pela vergonha de estar suja.

— Não, seu abraço me aquece. — eu a puxei novamente e a abracei, como sentia falta do seu colo — Senti falta disso.
— Ah, minha criança, deve ter sofrido tanto longe de casa. — sussurrou ela em lágrimas.

Sim eu sofri um pouco longe do amor dela, mas meu sofrimento valia pelo resultado que hoje havia em minha vida. Minha mãe me convidou para entrar novamente em casa, ela me contou detalhadamente algumas coisas importantes que haviam acontecido enquanto eu estava fora, e enfatizou várias vezes que se fez forte e permaneceu viva para me ver novamente. Ela dizia que todas as noites pedia a Deus para cuidar de mim e me trazer de volta para casa, certamente ele ouviu sua oração.

— Então todos esses anos não serviu para que ele aprendesse. — concluí ao ouví la dizer sobre as inúmeras dívidas do meu pai — Os nobres que deviam a ele, não o contrário.
— Sei pai sempre teve medo da aristocracia, por isso… — ela limpou suas lágrimas — Sinto por não tê-lo ajudado como deveria.
?! — disse uma voz conhecida e muito surpresa — é você mesmo?!
— Sim. — voltei meu olhar para porta, era Aidan com seu olhar curioso e espantado para mim — E você está bem crescido.
— É claro que estou. — ele veio ao meu encontro e me deu um abraço de irmão caloroso — Por onde andou todo esse tempo? O que fez? de onde veio aquela carruagem, essas roupas, são tecidos finos.
— Você conhece de tecido? — perguntei me interessando.
— Sim, um pouco.
— Bom saber. — sorri de canto já pensando em alguns negócios que poderia fazer e envolveria Aidan nisso — Eu estive bem todo esse tempo, estava conquistando meu espaço na sociedade.
— E conseguiu?! — perguntou ele curioso.
— Logo saberão. — respirei fundo — E o papai?! Onde está?
— Indo para o matadouro. — disse minha mãe num tom dramático de sempre.
— Como assim?! — olhei para Aidan, a fim de que me explicasse melhor.
— Meu tio foi entregar sua última criação de javali a um nobre que insiste em cobrá-lo por uma dívida que não existe. — ele suspirou fraco — Aqueles filhotes são nossa última ninhada, os pais também foram mortos e levados por outro nobre.
— Você sabe ao certo onde fica a casa deste nobre?! — perguntei.
— Sim, conde Dominos. — assentiu ele.
— Então me leve até lá. — disse.
— Mas assim querido?! — minha mãe segurou em meu braço — Está todo sujo por minha causa.
— Tenho roupas limpas na carruagem, eu ficarei bem. — sorri gentilmente para ela e voltei meu olhar para meu primo — Vamos, quero chegar lá o mais rápido possível.

Aidan assentiu e seguiu para a porta. Aidan iria na frente com o cocheiro para mostrar-lhe o caminho, Lee me acompanhou do lado de dentro da carruagem me ajudando a me trocar para ficar apresentável novamente. Assim que chegamos ao castelo do tal nobre, já avistei meu pai ajoelhado ao chão aparentemente pedindo desculpas, tive que respirar fundo várias vezes antes de sair e ir ao seu encontro.

— Não deveria cobrar uma dívida de alguém cujo a mesma não pertence. — disse em um tom mais firme e elevado.

A partir daquele momento eu seria o que jurei ser diante dos nobres.

— Quem é você criança, para falar assim com um nobre como eu. — o homem todo pomposo me olhou com arrogância.
— Eu sou o dono desta dívida. — mantive meu olhar nele — Por isso, devolva os filhotes que erroneamente aceitaste.
— E sob qual direito pensas que pode exigir isso? Quem és para dizer tais afirmações? — insistiu o tal conde.
Winchester. — assim que falei, senti o olhar do meu pai vindo em minha direção — Este é meu pai, portanto sua dívida é mim, e vim quitá-la.

Eu estalei minha mão e Lee que estava atrás de mim jogou um pequeno saco de moedas de ouro.

— Creio que isto seja o bastante, para uma dívida que nem existe. — entonei meu tom com arrogância — Agora, vamos falar da vossa dívida comigo.
— Minha dívida?! — o olhar dele que já estava crescido no saco de moedas, se voltou para mim com espanto — Não lhe devo nada.
— Como disse, este senhor é meu pai e tudo o que deve a ele, deve a mim também. v sorri de canto com prepotência — E terei o imenso prazer de cobrar cada moeda.

O nobre engoliu seco.

Sim, felizmente todos aqueles anos fora, Aidan e minha mãe haviam cumprido a promessa de anotar cada dívida que os nobres faziam com nossa família. Eu não estava ali somente para fazer justiça, estava também para deixar gravado meu nome naquela província e começaria tomando aquele castelo para mim.

Mesmo que não tivesse como comprovar que aquele nobre me devia, eu tinha o Lee que conseguiria fazer isso legalmente sem nenhum problema. Assim, da mesma forma em que meu pai foi humilhado todos aquele anos pelo conde Dominos, a humilhação voltou dobrada ao ser despejado de seu majestoso castelo, porém a facada final foi ter todos os outros bens confiscados e ainda saber que meus pais morariam ali.

Era o início de uma nova vida para eles e continuação dos meus planos. Rapidamente a notícia em que o filho bastardo do pobre açougueiro, tinha voltado para casa rico e cheio de influência. Isso acabou por desencadear uma série de convites para festas e recepções, formalidades estas que não me contive em enviar meus pais como meus representantes.

— Queria ser uma mosca para ver a cara daqueles nobres interesseiros ao verem meus pais no meu lugar. — ri baixo imaginando — Eles sempre humilharam minha mãe por tudo, agora terão que conviver com eles.
— O senhor está seguindo muito bem o curso de seu propósito. — comentou Lee — Após duas semanas aqui em Nottinghamshire conseguiu adquirir três propriedades rurais, dois castelos e muitas riquezas em obras de arte e mobília. O que fará agora?!
— Ainda não terminei de cobrar a todos as dívidas que tinham com meu pai. — respondi — Primeiro vou reaver o que deveria ser da minha família a muito tempo, depois irei estabelecer meu investimento aqui, esta cidade é a melhor em termos rurais e preciso expandir o açougue, já que agora pertence a mim oficialmente.
— Quando voltaremos para Londres, senhor? — perguntou ele.
— Em breve. — virei meu olhar para ele — Já contactou com o arquiteto?
— Sim senhor, Monie François é um dos melhores arquitetos que existe atualmente, é muito conhecido na França. — Lee ponderou um pouco em continuar a falar — Ele sugeriu que somente uma reforma e restauração fosse feita, já que a construção dispões de um alto valor histórico.
— Não gosto muito da ideia de reformar. — disse relutante.
— Senhor, ele me garantiu de o projeto ficará tão moderno quando possível e que a reforma só valorizaria ainda mais a propriedade, mesmo que a decoração possa ser diferente da original, tudo ficará ao seu gosto. — assegurou.
— Bem, se o valor de minha mansão será aumentado, tem minha autorização para a reforma, mas ao final de tudo não quero nem por um momento me lembrar daquela visão de como está agora. — o olhei sério e inexpressivo.
— Será como ordenado. — Lee assentiu e se retirou da sala.
— Oh meu querido. — minha mãe adentrou com um largo sorriso no rosto — O que achou de minhas roupas?!
— Está linda mamãe. — sorri para ela gentilmente.
— Fiquei tão emocionada quando entrei na biblioteca e aquela estilista francesa, estava lá me esperando, senti-me tão importante meu anjo. — ela deu um suspiro de alegria.
— A senhora é importante. — continuei a olhando com carinho.

Estava feliz em poder finalmente ver minha mãe confortável e com um brilho no olhar, o mesmo brilho de quando eu a salvei.

— Ando curiosa para saber como ficou tão rico. — comentou ela, seu olhar estava mesmo curioso.
— Passei por muitas coisas até conseguir o que tenho hoje, mas a motivação de todas foi a senhora e ela. — confessei.
— Lady ?!— seu olhar de curiosidade deu lugar para a admiração — Depois de todos esses anos, ainda pensa nela?!
— Sim. — adimiti — Depois de todos esses anos, meu coração ainda a deseja mais do que tudo o que poderia desejar nesse mundo.
— Oh meu querido. — ela me abraçou — Desejo que conseguia realizar este sonho que parece ser tão distante.
— Sempre terei esperanças. — sorri.
— E tenho orgulho disso, principalmente o que está fazendo por seu pai. — ela acariciou minha face — Você é mesmo o nosso anjo.
— Eu só quero minha família em segurança.

Minha mãe me abraçou novamente, me senti agradecido por tudo o que havia conquistado longe de casa, além da riqueza que um dia poderia acabar, eu tinha algo que nem os nobres poderia tirar de mim: conhecimento e perseverança.

Por que você é assim? Por que você é assim?
Já sou o cara mau da história."
- Keep Your Head Down / TVXQ



14. Love Again

Londres - Outono de 1848

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Acordei no meio da madrugada e percebi que não estava no quarto, me levantei com certa dificuldade, estava sentindo um estranho desconforto em meu corpo. Me apoiei de leve na parede respirando fundo, até que tudo se estabilizou dentro de mim, então saí do quarto e segui pelo corredor até chegar às escadas. Logo o som do piano começou a surgir, era ele que estava tocando na sala.

?! — sussurrei ao descer o último degrau, voltando meu olhar para ele sentado em frente ao piano.

Tinha que admitir que ele tocava ainda melhor do que eu, era algo que sempre me surpreendia, um burguês possuir tanta sutileza ao tocar as notas de um piano, um instrumento tão delicado. Assim que ele terminou a sonata de Mozart que estava tocando, seu olhar veio de encontro a mim, como se soubesse de minha presença.

— Perdoe minha ausência em nossa cama. — disse ele dando um sorriso singelo — Senti uma breve agitação dentro do meu peito, não quis acordá-la.
— Confesso que foi estranho despertar e não vê-lo no quarto, mas ouvi-lo tocar é reconfortante. — assim que dei o primeiro passo para sua direção, senti uma forte pontada em meu ventre, levei a mão nesta região encolhendo um pouco meu corpo — Ai…
?! — logo se levantou e veio me amparar.
… — fechei os olhos sentindo a dor ficar ainda mais intensa, minhas pernas ficaram um pouco bambas.
— O que foi?! O que está sentindo? — ele tentou me apoiar um pouco mais, porém meu corpo desfaleceu até chegar ao chão.
— Estou… — não conseguia falar de tanta dor, quando os abri olhos novamente ergui minha mão e a vi com sangue, desci meu olhar e minha camisola já estava ensanguentada.
— Lee… — gritou ele ficando um pouco mais preocupado com meu estado — Lee…
… — neste momento eu já somente sussurrava seu nome como um pedido de socorro.

Não conseguia distinguir mais sua voz ou o que acontecia ao meu redor, somente senti sendo envolvida em seus braços e carregada até o quarto, porém perdi a consciência no meio do caminho devido a intensidade da dor que sentia. Eu despertei com a claridade do sol em meu rosto, ao invés do meu marido, a pessoa que estava sentada ao meu lado era a senhora Poppy, que segurava com carinho minha mão.

Confesso que nunca havia provado do amor de uma mãe, Evelyn nunca havia me visto como uma filha, principalmente quando pegava escondido as traições de meu pai, ela sempre descontava em mim sua raiva. Mas a senhora Poppy estava me mostrando que carinho de mãe era independente do sangue, assim como ela havia adotado , também já me considerava sua filha de coração.

— Oh minha querida. — seu olhar gentil ainda tinha algumas lágrimas presas no canto — Está melhor agora?
— Estou sim senhora Poppy. — tentei sorrir, mas não consegui — Onde está ?
— Conversando com o doutor Green. — ela respirou fundo — Lamento o que esteja passando — Sei como se sente.

Sim, ela sabia. A senhora Poppy era a que mais me entendia, ela também havia sofrido muito ao perder tantos possíveis filhos com abortos espontâneos, aquele era mais um que eu perdia, mais um pelo qual meu coração chorava e me fazia sentir ainda mais inútil. Apesar de sempre dizer que herdeiros não importavam, eu sabia que se tivéssemos um ele ficaria feliz também, todos estavam ansiosos por isso, principalmente minha sogra que sempre dizia orar a Deus para que lhe desse netos.

… — sussurrei ao olhar para a porta e vê-lo.
— Fico mais aliviado que tenha acordado. — disse ele num tom moderado, mas sentia sua aflição no olhar.

Sorri fracamente para ele.

— Poderia nos deixar à sós?! — disse ele para sua mãe.
— Claro querido. — a senhora Poppy se levantou e me dando um beijo de leve na testa, se afastou em direção a porta — Vou estar lá em baixo orientando os empregados.
— Não precisa, pode ir para casa. — disse ele.
— Precisa sim. — seu olhar firme para ele, o deixou um pouco pensativo — Não pode abraçar o mundo todo.

Ela saiu do quarto como se estivesse segura de que ele não a contestaria mais tarde, não conseguia entender o que ela havia dito com aquela expressão, mas estava somente feliz por ele me abraçar.

— Como está se sentindo?! — ele se aproximou da cama e se sentou na beirada, ao lado onde eu estava.
— Estou… Sobrevivi fisicamente. — eu definitivamente não estava bem por dentro.
— Não isso que perguntei. — ele me conhecia mais do que eu mesma me conhecia.
— Não me sinto bem. — tentei segurar, mas uma lágrima escorreu de meus olhos — Me perdoe…
— Por que pedes isso?! — ele acariciou minha face secando a lágrima — Acaso tenho te cobrado algo?
— Não… — sussurrei deixando meu olhar baixo — Mas me sinto mal por não conseguir nem mesmo te dar um herdeiro, casaste com uma mulher estragada.
— Aos meus olhos, és a melhor mulher do mundo. — ele tocou em meu queixo, me fazendo olhar para ele — Jamais repita isso.
— Mas…
… Tudo o que mais quis no mundo todo eu já tenho. — ele sorriu com carinho, seu olhar de ternura me tranquilizava — Seu amor.

Ele se levantou e deu a volta na cama, então se deitou em cima da colcha ficando perto de mim, delicadamente me fez pousar minha cabeça em seu peito, me aninhando em seus braços. Fechei meus olhos e tentei deixar meu corpo relaxado em seus braços, mesmo com todas as dores físicas, meu coração se apoiaria em meu amado marido, além de sua família que sempre fazia de tudo para me deixar ainda mais distraída e confortável em situações como essa.

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— Mi lady . — disse Sophie ao entrar em meu quarto.
— Sim. — eu estava sentada em frente ao espelho penteando meus cabelos — O que deseja?
— Sua irmã Margareth está na biblioteca, deseja ter uma audiência com a senhora. — explicou ela.
— Margareth?! — eu estava estranhando aquela atitude de minha irmã — Ela nunca foi tão formal assim comigo.
— Bem, devido de sua recuperação… — Sophie deu uma breve pausa — Mi lady, ela parece muito aflita.
— Peça a para vir em meu quarto, melhor conversarmos aqui. — ordenei a Sophie.
— Como queira, mi lady.

Sophie se retirou do quarto, passei aqueles minutos de espera terminando de pentear meus cabelos, até que Margareth finalmente adentrou o quarto. De imediato pude perceber sua aflição, até mesmo seus olhos inchados não conseguiam ser escondidos pela suave maquiagem, me deixando ainda mais preocupada.

— Marg o que aconteceu? Andou chorando? — me virei para ela, lançando um olhar sereno porém preocupado.
, perdoe-me… — antes mesmo que ela conseguisse terminar a frase, desabou sobre o chão em lágrimas, como uma criança arrependida de alguma travessura.
— Margareth?! — me aproximei dela com cuidado e segurando sua mãos, a fiz se levantar, guiando-a até minha cama para que ficássemos mais confortáveis — Minha irmã, o que aconteceu? Nunca fostes assim? Sempre exalou alegria por onde andastes.
— Estou a um passo da forca. — disse em ainda em lágrima, começando até a soluçar, abaixou a cabeça olhando para seus dedos que se cruzavam.

Margareth sempre teve um lado dramático em suas palavras quando estava triste ou jurada de castigo por Evelyn, mas nunca a vi daquela forma tão abalada e desamparada, o que me fazia temer que havia feito algo ainda mais grave.

— Marg, olhe para mim. — disse num tom mais sério — O que você fez?

Ela ergueu sua face lentamente e me olhou com seus olhos marejados de lágrimas, pelo seu olhar eu já começava a cogitar que seria algo extremamente sério.

— Margareth, se não me disser, não poderei te ajudar. — insisti.
… Você sabe que eu e o lord Pierre, nos tornamos bem próximos. — ela começou em sussurros — Principalmente após nossa viagem ao Japão…
— Margareth, o que vocês dois fizeram?! — a esta altura de sua demora em dizer o que estava acontecendo, eu já temia pelo pior.
, eu juro… Eu juro que não queria te preocupar com meus problemas, principalmente uma semana depois de você ter perdido seu bebê, mas… — ela começou a chorar novamente.
— Eu sei Margareth, sei que só podes contar comigo, Freya jamais te apoiou em todo esse tempo. — respirei fundo — Agora me diga o que vocês fizeram…
— Sabe aquela noite, no baile de máscaras que a família do senhor Kohaku nos ofereceu em Kyoto…
— O que tem aquele baile?!
— Eu pedi para que me retirasse mais cedo e voltei para casa junto com você e … — ela começou a explicar, me deixando ainda mais inquieta por dentro — Eu não retornei ao meu quarto.
— O que? — a olhei com um pouco de indignação.
— Esperei para que vocês apagassem as luzes e como sabia que não sairiam do quarto, eu saí novamente para me encontrar com Pierre no jardim. — ela suspirou fraco, deixando mais algumas lágrimas.
— Não… Não… Margareth, por favor, me diga que não é o que estou pensando. — me repreendi em pensar que minha irmã faria algo tão imprudente.
— Mas é… Não sou mais… — ela voltou a chorar com mais intensidade se deitando em meu colo — Perdoe-me por trair sua confiança.

Eu não consegui ter nenhum tipo de reação. Respirei fundo ao sentir uma breve tontura e desci meu olhar para ela, que mais e mais chorava em meu colo, agora estava explicado em partes sua aflição e porque só poderia contar comigo. Porém, perder sua pureza antes do casamento não havia sido a parte mais grave do momento, as regras de Margareth estavam atrasadas e estava começando a desconfiar que estava grávida.

— Margareth, aquela não foi a única vez, não é?! — perguntei de forma mais séria ainda, a fazendo erguer seu corpo — Diga-me tudo, sem mais segredos.
— Não, não foi. — respondeu em sussurros — A última vez foi na noite anterior a sua partida no final do verão.
— Não acredito. — me levantei da cama respirando fundo novamente — Você passou todo o inverno e verão mentindo para mim, para todos?! Margareth sua traição passou dos limites aceitáveis, se é que existe algum.
… Por favor, não conte ao papai, ele me mataria, minha mãe me esquartejaria. — sua voz ficou ainda mais aflita e seu olhar de piedade.
— Eu deveria fazer isso mesmo, mas não o farei. — passei a mão em meus cabelos tentando me acalmar, pois ainda estava debilitada de saúde — Por certo que estou começando a ter ainda mais certeza de que está grávida, e quando a barriga aparecer? O que pretender fazer?
— Fugirei de casa. — disse ela de forma impensada — Melhor isso do que ele me colocar em um convento ao sul da Itália e jogar a chave fora.
— Deixe de ser ainda mais imprudente e dramática. — desviei meu olhar para a porta, após ouvir alguns toques — Entre...
— Perdoe-me atrapalhá-las. — Sophie adentrou com uma bandeja de chá nas mãos — Mas imaginei que quisessem um pouco de chá para acalmar os nervos.
— Obrigada Sophie, sua percepção é sempre bem-vinda. — disse a elogiando por sua atitude — Podes deixar em cima da escrivaninha, caso chegar, peça-o para não vir ao quarto agora.
— Oh, o senhor Winchester já chegou, mi lady. — comentou ela — Eu o informei da visita de Margareth, ele está no escritório neste momento.
— Agradeço, pode se retirar.

Ela fez uma breve reverência e saiu do quarto, enquanto isso eu servi as xícaras com o chá e entreguei uma para Marg.

— Tome, ficar chorando agora não resolverá esta desventura que causaste a si própria. — disse enquanto ela pegava a xícara.
— Obrigada, . — disse ela em sussurros.
— Já que viajou de Derbyshire até Londres, passei o resto do dia aqui e volte para casa amanhã. — a aconselhei.
— Não posso voltar para casa, não sem uma desculpa convincente. — retrucou ela se preocupando ainda mais — Minha mãe tem me perguntado muito sobre meus dias com você, principalmente sobre a amizade que fiz com Pierre.
— Então Evelyn já está desconfiando. — imaginei — Precisamos pensar no que fazer, acho melhor que passe alguns dias aqui então.
— Mas e o senhor Winchester?! — perguntou ela receosa.
— Tenho certeza que ele não negará um pedido meu.

De fato, nunca me negava um pedido, até mesmo quando o pedia para ficar em casa tendo reuniões importantes, havia acontecido isso na semana passada, eu estava tão triste e enfraquecida que não queria me afastar dele nem um momento sequer. Pela primeira vez meu marido havia passado cinco dias consecutivos em casa, e a maior parte deles ao meu lado, acariciando meus cabelos.

— Ficará tudo bem, Margareth. — assegurei, só poderia contar com uma pessoa para me ajudar a salvar a garganta de minha irmã caçula.

Eu a levei até o quarto que geralmente se hospedava e pedi a Sophie para enviar uma criada que organizasse o lugar para minha irmã ficar mais confortável. Desci até o escritório e bati na porta antes de entrar, estava desenhando algo em um pequeno caderno de bolso.

— Te incomodo? — perguntei num tom baixo, dando suaves passos até ele.
— Nunca. — ele fechou o caderno e o guardou na gaveta que estava aberta — O que desejas?
— Você. — sorri de leve.
— Suas palavras sinceras estão acelerando meus batimentos. — ele se levantou da cadeira — Apesar do sorriso, seu que não está tranquila, pelo seu olhar.
— Como posso esconder algo de um marido assim?! — ri um pouco, porém voltei a suavizar minha face a deixando um pouco séria — Me conheces mesmo.
— Você nem imagina o quanto. — confirmou ele — O que a está preocupando?
— Sei que já fez muita coisa por minha família, nem mesmo tenho o direito de fazer algo a mais… — comecei tentando escolher as palavras certas.
— Sabes que não gosto de rodeios, sei que não está aqui somente para pedir que Margareth fique alguns dias. — disse ele num tom mais sério ainda, seu olhar de segurança me fazia sentir ainda mais confiante em compartilhar aquele problema com ele.
— Sim. — assenti — Minha irmã foi muito imprudente...

Assim que comecei a contar toda a história para ele, sua face continuou a mesma, como se já desconfiasse, como de fato era verdade.

— Não deixarei que nada de ruim aconteça a Margareth. — disse ele pegando em minha mão e me puxando para mais perto dele — Fique tranquila, ainda está convalescendo do que houve.
— Vou tentar. — sussurrei me aninhando em seu tórax, sentindo seus braços me envolvendo — O que pretende fazer.
— Primeiro trarei o responsável para que arque com o que fez, depois falarei com seu pai. — respondeu ele com segurança.
— A parte do meu pai é que me preocupa, ele preza sua honra acima de tudo, além do orgulho também. — nesta parte estava minha insegurança.
— Desde o dia em que nos casamos até hoje, houve algo que e pedistes e não tenha sido realizado? — perguntou ele.
— Bem… — mordi o lábio inferior — Eu ainda não te conheço por completo.
— Por isso todas as noites eu conto algo sobre mim que ainda não sabe. — respondeu ele — Acaso não disse que seria aos poucos?
— Odeio quando me confronta assim. — ele estava certo — Admito então.

Senti ele rindo baixo de mim.

— Apenas espere por mim. — sussurrou ele.
— Irá para Paris?! — me afastei um pouco para poder olhar em seus olhos.
— Sim e retornarei a tempo para o baile de aniversário de sua madrasta. — assegurou.
— Então falará com o papai lá?! — presumi.
— Estamos lidando com algo urgente. — confirmou — Tenho certeza que seu pai não faria algo tão impensado no aniversário de sua esposa.
— Que mente… — ri baixo — Como consegue pensar em todos os detalhes com tanta rapidez?
— Hum… Esta é outra parte de mim que vou lhe contar algum dia. — respondeu ele dando um sorriso enigmático.
— Poderia ser hoje. — sugeri.
— Hoje, irei ler um livro para minha linda esposa. — retrucou ele — Apesar de ser um tanto quanto difícil estar ao seu lado e não poder tocá-la com mais intensidade.
— Sabes que ainda estou me recuperando… — o repreendi por suas palavras e intenções.
— Sabes que te esperarei o tempo que precisar. — ele piscou de leve, me fazendo rir — Sonho com o dia em que poderei te beijar com mais paixão ainda.
… — eu ri um pouco mais — Devo lhe aconselhar a se banhar em águas geladas?!
— Ainda não cheguei nesse nível, mas devo confessar que só de olhar para minha esposa, meu corpo se arrepia.
— Pare de dizer essas coisas, me deixa sem graça.
— São meus mais profundos e sinceros sentimentos. — ele aproximou seus lábios dos meus, me dando um breve e suave beijo.
— Será que o jantar está pronto?! — perguntei me afastando um pouco dele.
— O que aconteceu? — ele me olhou estranhamente.
— Nada. — me afastei um pouco mais.
— Pare e diga.
— Não irei confessar que meu corpo também se arrepia ao se aproximar do meu marido. — disse indiretamente seguindo em direção a porta — Vou para a biblioteca, nos vemos no jantar.

Saí rindo do escritório, mas tinha certeza que ele também riria das minhas palavras.

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Foi difícil esperar o retorno de ? Sim, foi muito difícil, apesar de saber que ele não deixaria Pierre fugir da responsabilidade, principalmente por ser uma pessoa tão importante para os negócios do conde Remi. Margareth estava ainda mais aflita e ansiosa do que eu, principalmente após recebermos uma carta dele avisando para irmos a Derbyshire na frente, para mim era mais do que normal sempre era o último a chegar nas festas, ele gostava de uma entrada triunfal, porém Marg.

— O que será que ambos estão falando?! — perguntou ela pela décima vez olhando para o corredor da Lewis Castle que dava para o escritório.
— Poderia ficar um pouco mais calma Margareth, assim vai levantar suspeitas de sua mãe. — disse.
— Até o final da noite ela saberá mesmo. — retrucou.
— Mas não precisa ser agora. — a repreendi — Olhe para todos esses convidados e se distraia.
— Não consigo . — ela me olhou com piedade.
— Tudo bem. — eu a peguei pelo braço e juntas fomos pelo corredor até chegar na porta do escritório.

Ficamos em silêncio, tentando ouvir o que se passava lá dentro.

— Você pode mandá-la para um convento, deixar seu neto a própria sorte e causar ainda mais sofrimento a sua família, ou poder aceitar minha ideia e casá-la com o responsável por isso.
— E achas que tenho dinheiro para o dote? Quem pagaria?
— Eu, acaso não paguei o de Freya?!

Tudo ficou em silêncio e logo a porta do escritório se abriu, saiu tranquilamente como se soubesse que eu estava ali os ouvido, ele sorriu de canto para mim disfarçadamente e seguiu pelo corredor. Então nosso pai saiu do escritório, seu olhar foi diretamente em Margareth que estava se escondendo atrás de mim, era um olhar de decepção e tristeza.

— Entre Margareth, precisamos conversar. — disse ele num tom frio.
— Pai… — tentei interceder.
— Já interferiu demais nesta história , volte para seu marido, garanto que não farei nenhum mal a sua irmã. — garantiu ele.
— Sim senhor. — fiz uma breve reverência contrariada e me retirei de lá.

Por um breve momento me perdi em meus pensamentos, meu pés seguiram em uma direção incerta até que cheguei no jardim, continuei caminhando um pouco mais pela lateral do castelo até que me deparei com a cena mais inesperada, considerando aquele momento. Freya estava parada pouco mais a frente com seu corpo estático, eu dei um passo para o lado e inclinei meu pescoço, logo meu olhos viram Ulrich agarrado a uma criada do castelo.

Levei a mão em minha boca tentando segurar minha reação, ele percebendo que havia alguém perto, se afastou da criada e olhou em nossa direção, seu olhar atravessou Freya como se ela não existisse e veio direto para mim. Minha irmã percebendo isso, se virou, seu corpo entrou ainda mais em choque ao me ver ali, antes mesmo que qualquer tipo de lágrima, seja raiva ou frustração, caísse de seus olhos, ela se retirou.

. — mesmo Ulrich sussurrando, conseguia entender nitidamente meu nome, algo que me fez recuar um pouco.

Então, naquele instante, senti alguém pegar em minha mão entrelaçando nossos dedos.

— Vamos querida. — disse com um tom um pouco mais intenso — Não há nada para você aqui.

Ele estava certo, Ulrich não era problema meu e eu estava grata a Deus pelo marido que eu tinha, era o homem que conseguia a cada dia superar minhas expectativas.

Quero me levantar novamente e ver você de novo, que esperou por mim
Quero voltar e dizer que eu te amo.”
- Love Again / SM The Ballad



15. Back Seat

Londres - Verão de 1850

ver.:

— Mi lady… — disse Sophie ao adentrar o quarto.
— Sim, desejas algo? — me afastei do espelho e a olhei — voltou?
— Não senhora… Há uma visita na sala de estar, desejando uma audiência com a senhora. — respondeu ela ponderadamente.
— E quem deseja isso? — perguntei curiosa.
— Sua irmã, lady Meagher. — respondeu.
— Freya? Freya está aqui? — por essa eu não esperava.

Sophie confirmou com a face. Respirei fundo tomando coragem, não sabia a razão de sua visita e estava com receio de saber, desci até a sala e a recebi cordialmente, então a convidei para tomar um chá na biblioteca, assim poderíamos conversar com mais privacidade ainda.

— Confesso que estou surpresa por sua visita. — disse num tom baixo me sentando na poltrona perto da janela, ela havia se acomodado na poltrona ao lado da minha — Como estão as coisas em Limerick?! Estive lá no final do outono passado, mas não pude ficar muito tempo.
— Está tudo igualmente como sempre esteve. — seu tom de voz estava estranhamente baixo e sem traços da sua habitual prepotência.
— E como está a pequena Emilly? Aposto que fazendo muita bagunça como fazíamos quando criança. — ri baixo me lembrando de nossa infância.
— Ela é uma doce filha… — Freya suspirou fraco.
— Freya?! Está tudo bem com você? — a olhei um pouco mais preocupada, então toquei de leve em suas mãos e pegue carinhosamente — Somos irmãs, pode desabafar se quiser.
— Perdoe-me. — sussurrou ela.
— Pelo que te perdoaria? Você não me fez nada, nem me lembro.

Eu realmente não me lembrava de nada que ela já havia me feito, estava tão feliz com e meu casamento, que as dores do passado haviam ficado no passado, eu somente dedicava meus dias em ser feliz no meu casamento.

— Por tudo. — explicou ela — Por todos os anos que eu tentei te atacar e te fazer sofrer, principalmente por ter me casado com Ulrich para te afrontar.
— Pensei que gostasse dele. — sussurrei de volta meio confusa — Mas não me importo com isso, eu já não sentia mais nada por ele quando se casaram.
— Percebi... Eu não gostava dele naquela época, mas sob influência da minha mãe acabei me casando. — confessou ela permanecendo em seu tom baixo — Só hoje eu sei o quanto está me custando isso.
— O que está acontecendo?! Freya?!
— O que sempre aconteceu desde o início, nunca fui amada de verdade. — admitiu ela segurando as lágrimas no canto dos olhos — Pensei que seria mais feliz depois que a Emilly nasceu, mas novamente estava enganada…

Eu não sabia o que dizer, mas já imaginava do que ela estava falando.

— Sei que já faz muito tempo, mas juro que depois daquela noite do baile de aniversário da mamãe, pensei que não aconteceria mais… — ela levantou seu olhar — Como sou inocente no amor…
— Lamento por aquele dia… — disse num tom ainda mais baixo — Confesso que já sabia sobre as traições de Ulrich, mas… Fiquei com medo de contar que sabia.
— Imagino, me conhecendo bem… — ela suspirou fraco novamente — Te trataria com arrogância…
— Esqueça essa parte do passado, você está aqui e sempre serei sua irmã. — a tranquilizei, dando um sorriso suave — Vou te ajudar no que puder.

Sabia que Freya estava passando por muitas brigas em seu casamento, principalmente pelas traições de seu marido e o aparecimento de alguns possíveis bastardos, toda a sociedade sabia sobre isso e comentava pelas suas costas. Minha irmã estava sofrendo muito e eu permanecia triste por ela, nunca imaginei que isso ocorreria e Ulrich se mostraria tão medíocre e sem caráter.

— Você veio a Londres sozinha?! — perguntei.
— Não, felizmente Emilly pode vir comigo, vamos ficar por pouco tempo e irei para Derbyshire visitar minha mãe. — explicou ela.
— E Ulrich?! Está em Limerick?
— Não… Não vamos mais morar em Limerick. — respondeu ela — Estamos de mudança para Liverpool.
— Não entendo, lady Lira nunca cogitou a ideia de deixar seu castelo. — estava estranhando aquilo — Mesmo após a morte do conde.
— Estamos cortando alguns gastos. — admitiu ela com certa dificuldade.
— Imagino o motivo.
— Margareth andou contando algo? — indagou ela.
— Oh não, já tem alguns meses que não vejo Margareth, agora que é uma mulher casada, nossa caçula só tem olhos para o marido, ou melhor, para a vista do seu quarto em Paris. — brinquei a fazendo rir um pouco.
— Verdade, sempre quis morar na França, acabou se casando com um francês para realizar o sonho. — comentou ela.
— Todas sonhamos um pouco, e realizamos algo em nossas vidas. — disse de forma sentimental — Apesar de tudo, seu olhos brilham quando menciona o nome de Emilly.
— Minha filha é um presente de Deus. — ela sorriu com alegria, finalmente — Queria trazê-la porém anda um pouco resfriada, infelizmente sua saúde é frágil.
— Desejo melhoras a ela, aquela pequena é muito graciosa. — abaixei meu olhar em direção a sua barriga que já estava volumosa — E como está este bebê?! Sinais de que é um menino forte?!
— Pelo contrário, é um ser quieto e calmo. — ela tocou em sua barriga — Tenho desejado tanto que seja um menino.
— Estou torcendo por você. — sorri de leve.
— E você?! — ela me olhou — Sinto que está mais tranquila sobre esse assunto.
— Verdade… No início, até estava ansiosa e temerosa por causa dos meus abortos espontâneos, mas me apoiou muito naquele tempo, sinto-me mais leve e conformada se caso não conseguir engravidar mais. — confirmei — Apesar de lá no fundo querer dar-lhe um herdeiro.
— Também torço para que consiga… Você merece. — ela suspirou — Perdoe-me novamente…
— Pelo que?! — a olhei assustada.
— Senti uma ponta de inveja agora. — ela parecia um pouco constrangida por admitir — Para ser sincera sempre senti, mas é que seu casamento parece ser tão perfeito, me fez perceber que nem todos os nobres são dignos de serem nobres.
— Nenhum casamento é perfeito, às vezes eu perco para o trabalho dele. — brinquei.
— Mas mesmo assim, o olhar do senhor Winchester permanece em você. — ela limpou delicadamente uma pequena lágrima no canto do olho esquerdo — Quem me dera que isso acontecesse pelo menos uma vez.

Novamente não sabia o que dizer para ela, mas a única coisa que poderia fazer não me negaria, me aproximei dela e a abracei confortavelmente para que se sentisse um pouco amada, mesmo que por sua irmã. Terminamos de tomar nosso chá tranquilamente, Freya me contou algumas coisas sobre a nova casa deles em Liverpool, Ulrich estava investindo uma pequena parte de sua herança em construções ferroviárias.

Eu a acompanhei até a porta e assim que retornei para a sala, dei algumas instruções sobre o jantar para Isla, queria algo especial para esta noite, já que meu marido havia deixado um bilhete acompanhado de uma rosa, dizendo que chegaria cedo para o jantar. Passei a maior parte do meu dia lendo na biblioteca, acho que já tinha lido todos aqueles livros pelo menos umas duas vezes, apesar de sempre ganhar mais alguns ao longo dos meses.

— Mi lady. — disse Sophie perto da janela, estava tentando me fazer companhia — Desconfio que o senhor Winchester esteja chegando.
— Hum?! — voltei minha atenção para ela — Mais cedo do que eu esperava.

Fechei o livro e me levantei da poltrona, estava curiosa pelo motivo que meu marido estava em casa mais cedo, assim deixei o livro em cima da poltrona e saí da biblioteca. Assim que cheguei na sala, estava conversando com Lee, por certo dando suas ordens finais do dia. Esperei silenciosamente até que ele terminou e se virou para minha direção.

. — ele deu um sorriso carinhoso.
— Pensei que demoraria mais um pouco. — comentei.
— Estava ansioso para te ver. — assim que ele deu o primeiro passo em minha direção, seu corpo despencou ao chão já perdendo a consciência.
?! — eu elevei minha voz indo até ele e me ajoelhando o peguei em meus braços —
— Senhor… — Lee se abaixou também, demonstrando o mesmo nível de preocupação que eu — Senhor…
fala comigo… — eu abracei de leve, sentindo sua pele um pouco fria como se estivesse sem vida — .
— Deixe-me ver… — Lee segurou em seu braço para medir o pulso — Ainda está batendo, temos que levá-lo para o quarto.
— Sim. — assenti sem saber o que fazer nem como reagir, eu só queria que meu marido voltasse a consciência.
— Isla. — gritou Lee com urgência.
— Oh… Senhor Winchester… — assim que ela encontrou na sala acompanhada de Sophie, ambas ficaram assustadas.
— O que aconteceu mi lady?! — perguntou Sophie me ajudando a me levantar, enquanto Lee erguia o corpo de ainda desacordado.
— Eu não sei… — disse já me desesperando um pouco.
— Isla, mande Liam buscar o médico com urgência. — ordenou Lee para ela — Prepare toalhas limpas e água quente, temos que manter a temperatura equilibrada em seu corpo.

Isla assentiu com a face e saiu apressada em direção à cozinha, sem demoras ajudei Lee a levar para o nosso quarto, eu estava tão agoniada com sua situação que não queria nem por um minuto ficar longe dele. Assim que Lee o colocou sobre a cama, pedi para Sophie esperar pelo médico no sala e o acompanhar até o quarto, enquanto isso ajudei Lee a tirar aquela roupa pesada de , o deixando com roupas mais leves e confortáveis.

A cada vez que eu tocava seu corpo frio, o meu se arrepiava de medo que algo mais sério pudesse estar acontecendo com meu marido, não queria nem mesmo imaginar que ele não acordaria. Permaneci sentada ao seu lado todo o tempo, fiz questão de eu mesmo trocar os panos úmidos de sua testa, não me importava com mais nada, somente com ele.

— Então doutor Gale?! — perguntei ansiosa assim que o médico terminou de examiná-lo — O que aconteceu com ele? Quando vai acordar?
— Bem, mi lady pode ficar despreocupada, felizmente o senhor Winchester ficará bem. — garantiu ele com convicção — Mediante aos relatos de seu dia a dia, a forma em que tudo ocorreu e seu estado físico atual, não há dúvidas que ele teve um breve ataque de exaustão.
— Exaustão?! — eu não sabia muito bem o que era, mas já estava ainda mais preocupada.
— Acontece muito entre os burgueses, principalmente aquele que como o senhor Winchester trabalham muito. — explicou ele — O corpo não consegue acompanhar o ritmo acelerado que o trabalho exige, poucas horas de sono, refeições incorretas e nenhum tempo para descanso, tudo isso vai acumulando de uma forma até que o corpo não resiste e se sobrecarrega, causando isso.
— Mas ele vai ficar bem mesmo?! — indague.
— Ficará mediante a muito repouso e pouco estresse. — recomendou confirmando — Então, recomendo que ele fique por algum tempo afastado do trabalho.
— Como pedirei a um burguês para se afastar dos seus negócios? — ainda mais , o mais requisitado e rico dentre todos.
— Fácil ou não, mi lady se não desejas perder a vida de vosso marido, recomendo que ele fique afastado te todo o estresse. — assegurou o médico de forma séria e alarmante.
— E quando ele vai acordar?! — perguntei.
— Quando o seu corpo estiver mais estável e forte. — respondeu prontamente.

Assenti o agradecendo por suas precauções e pedi a Lee para acompanhá-lo até a porta e certas os valores da sua visita, pedi a Isla que preparasse uma bandeja com algumas frutas frescas para que ele comece ao acordar. Sophie se ofereceu para ficar no quarto em companhia comigo, mas preferi ficar sozinha com ele, minha preocupação era tão grande que só pensava em ficar ao seu lado até acordar.

As horas foram se passando e sem perceber acabei adormecendo em seus braços, despertei com ele acariciando meus cabelos, a primeiro momento fiquei sem reação, mas após a cena no seu corpo caindo ao chão voltar a minha mente, meus olhos se encheram de lágrimas. Ergui meu corpo me sentando novamente e o olhei, aquele sorriso fofo estava em seus lábios com um olhar confuso e arrependido.

— Perdoe-me por fazê-la se preocupar comigo. — disse ele em sussurro, parecia ainda estar cansado.
— Não me peça desculpas, só prometa-me que não irá se matar de tanto trabalhar. — o olhei ainda temerosa por tudo que havia acontecido — Não suportaria a ideia de te perder por minha causa.
— Não se sinta…
— Só me prometa isso. — insisti — Sei que tudo o que faz é por mim, mas prefiro uma vida sem luxos e com você, do que está rodeada de joias e sem o homem que amo.

Seu doce sorriso se firmou ainda mais no rosto.

— O que falou é sério. — assegurei com firmeza.
— Eu sei, está no seu olhar. — consentiu ele — Só me sinto inútil por não poder beijá-la agora após essa declaração.
— Bobo. — eu ri de leve — Está melhor agora?!
— Sim. — ele suspirou fraco — Acho que entendo porque tive vontade de voltar ainda mais cedo hoje.
— E por qual motivo?
— Precisava ver seu rosto para me lembrar que tenho que ser forte. — disse ele se remexendo um pouco — Mas, vamos deixar estes acontecimentos de lado, o que importa é que agora posso olhá-la novamente.
— Quase morri de susto, e você fala sobre isso com tanta tranquilidade. — suspirei — Agradeço a Deus por não ter sido nada grave, você é o melhor presente que Ele me deu, não quero perdê-lo.
— Jamais me perderá. — ele segurou em minha mão — Você também é o meu presente.

Ele sorriu novamente para mim e voltou seu olhar para a bandeja de frutas que estava na mesa ao lado da cama, então desviou o olhar para mim novamente com uma intensidade sugestiva.

— Devo acreditar que estas frutas são para mim?! — indagou.
— Sim. — eu sorri de volta — E deves comer tudo.
— Oh, não sou tão vegetariano assim para comer todas estas frutas sozinho. — ele riu — Além do mais, uma pessoa adoentada não deve comer tanto assim.
— Você sabe que não vou deixá-lo sair daqui. — comentei em relação a sua possível intenção de voltar ao trabalho.
— Sou o seu marido, não precisa me sequestrar. — brincou ele tranquilidade.
— Você sabe o que eu quis dizer. — me mantive séria, mesmo com aquele olhar fofo em minha direção — , seguirei com todo cuidado as recomendações médicas para você, não me arriscarei a deixá-lo se sobrecarregar novamente.
— O que quer dizer com isso?! — ele ergueu um pouco mais seu corpo.
— Que não o deixarei trabalhar, até que se recupere totalmente, nem que eu tenha que me trancar neste quarto e jogar a chave fora. — disse com toda a ousadia que possuía naquele momento.
— Jogar a chave fora?! — me fez um olhar malicioso para mim, dando um daqueles sorriso de canto — Não é uma má ideia.

Eu comecei a rir por causa daquele olhar.

— Deixe de pensamentos maliciosos senhor Winchester. — o repreendi tentando ficar séria — Deves tirar este tempo para descansar.
— Achas mesmo que conseguirei ficar somente deitado nesta cama, estando com você aqui?!
— Prefiro não comentar sobre seus pensamentos. — ri um pouco mais pegando a pequena tigela de porcelana em que estava algumas frutas cortadas — Que tal se alimentar agora.
— Você me acompanha?!

Assenti dando um sorriso suave.

- x -

— Pensei que estivesse dormindo. — disse assim que entrei no quarto.
— Já estava me preparando. — ele fechou aquele pequeno caderno que sempre usava para fazer alguns esboços e o colocou embaixo do travesseiro.
— Então, irei te acompanhar. — caminhei até a cama retirando hobby de seda e me deitando ao seu lado — Eu vi quando o Lee saiu do quarto com alguns papeis…
— Fique tranquila, ele sabe que eu não posso ficar estressado. — assegurou ele já imaginando que eu estava preocupada, e com razão.
— Digo exatamente sobre isso, mas sei que mesmo seguindo meu pedido, sua mente em alguns momentos se transfere para seus problemas. — admiti.

Uma vez burguês sempre burguês e era um dos homens mais responsáveis que eu já havia conhecido em minha vida.

— Viu, você está começando a me conhecer melhor. — ele me aninhou em seus braços — Deixemos as preocupações de lado e vamos dormir, tê-la em meus braços todas as noites é o que me realiza.

Assenti e fechei os olhos, não demorou muito até que eu pegasse no sonho… Porém no meio da madrugada despertei e percebi que estava acordado, além de não estar deitado ao meu lado, me remexi na cama e discretamente aproximei minha mão por debaixo do seu travesseiro, constatei que o pequeno caderno não estava lá. Mantive meu olho fechado todo aquele tempo, fingindo estar dormindo, então senti a movimentação dele em direção a cama.

Logo seu corpo se encostou no meu e suavemente passou seu braço por debaixo de mim, para me aninhar a ele, assim o fiz me mantendo como se estivesse adormecida, me encolhendo um pouco e respirando tranquilamente.

— Eu te amo… — sussurrou ele de leve, começando a acariciar meus cabelos.

Eu tentei não deixar que meu corpo me denunciasse, mas meu coração se acelerou um pouco com suas palavras sinceras.

— Desejo tanto que possa se lembrar de mim um dia… — continuou ainda em sussurro — Queria conseguir mostrá-la o quanto é especial para mim…

Ele continuou sussurrando mais algumas coisas, enquanto acariciava meus cabelos. Mas durante todo aquele tempo que ainda fiquei acordada, minha mente só conseguia pensar em uma coisa que ele tinha dito: Que eu pudesse me lembrar dele um dia. Aquilo me fez imaginar que antes do nosso casamento, antes de seu retorno a Londres, talvez lá no fundo da minha memória perdida, minha vida já havia cruzado seu caminho.

Conforme os dias foram passando com se recuperando em nossa casa, seus problemas iam ainda mais se acumulando no trabalho, mesmo com Lee sendo seu representante, não era a mesma coisa. Porém sob meu pedido, ele nem cogitava a ideia de quebrar a promessa que havia me feito.

— As coisas continuam um pouco delicadas com os funcionários, além dos muitos comentários sobre a saúde do senhor, acham que seus negócios estão decaindo. — explicou Lee para ele, havia me pedido para ficar no quarto enquanto Lee e ele se reuniam para tratar dos seus negócios.
— Então Londres acha que fiquei doente por supostamente estar em falência?! — riu de forma espontânea — Esta sociedade realmente quer me ver na pior.

Me mantive em silêncio, mas por dentro estava mais do que indignada por desejarem o pior de .

— Senhor, creio que tenhas que comparecer a esta reunião com estes comerciantes. — insistiu Lee — Sei que ainda está em recuperação, mas eu sou somente um empregado aos olhos destes homens.
— Eu…
— Eu irei. — disse num tom um pouco mais elevado, porém seguro.
— O que?! — me olhou surpreso.
— Se aqueles comerciantes insistem que precisam ver você para assinar esses papeis, eu irei em seu lugar. — expliquei — Como sua representante direta, Lee cuidará de tudo como sempre.
— És uma dama minha querida, não acho que ficarás confortável diante daqueles homens… — ele me olhou com carinho — Não precisas fazer isso por mim.
— Faço por nós dois, sei que este negócio é muito importante para você, tenho visto o quanto seu olhar continua preocupado. — insisti — Sei que se parar nem que por um instante seu tratamento, algo de pior pode lhe acontecer, desde de antes de nos casarmos você tem me dado várias demonstrações de amor… — respirei fundo com toda a minha coragem escondida — Deixe-me fazer isso, desta vez.

"Não fique nervosa
Está tudo bem, garota
Você não deve ter medo neste momento."
- Back Seat / JYJ



16. Stand by Me

Nottinghamshire - Outono de 1846

ver.:

Passei aqueles últimos dois anos cobrando as dívidas dos clientes do meu pai, a cada nobre que passava pela minha lista, meu patrimônio na região de Derbyshire só aumentava, ver o olhar de ódio de cada um daqueles aristocratas para mim, enquanto tomava suas poucas riquezas era como ver uma obra de arte.  Enquanto isso, em Londres o arquiteto François continuava a reforma e restauração da mansão, o que estava me custando uma boa quantia, porém segundo suas palavras ao final da obra, toda a sociedade ficaria se corroendo de inveja.

— Senhor Winchester. — disse Lee ao adentrar meu escritório com uma pasta na mão — Aqui estão os documentos finais de todas as propriedades, mobiliário e obras de arte que agora pertencem ao senhor.
— Agradeço a agilidade e competência. — desviei meu olhar do jornal The Times para ele.

Lee assentiu brevemente com a face e depositou a pasta na mesa em minha frente.

— Felizmente agora com o selo real, as pessoas não poderão mais dizer que o senhor… — ele parou por um momento — A dívida daqueles lordes se tornou oficial aos olhos da família real britânica.
— Pelo menos uma boa notícia. — suspirei fraco ao me lembrar de breves boatos, que minha mãe havia contado sobre lady Lewis, em sua forma não discreta no jantar passado.
— Seu olhar de preocupação me faz pensar que deseja algo a mais. — observou ele como se estivesse analisando minhas expressões — O que ainda lhe incomoda senhor?
— O boatos sobre a possível corte entre ela e um tal conde de Limerick, preciso saber se é verdadeiro. — engoli seco minhas próprias palavras, ao imaginar que poderia mesmo ser real.
— Irei pessoalmente investigar senhor. — assegurou.
— Não. — me levantei de minha poltrona e olhei brevemente para a pasta — Agora que temos toda esta fortuna, preciso continuar concentrado no que farei a seguir, seus serviços aqui são mais necessários.
— Mas, senhor… — ele tentou insistir, sabia que também era um assunto importante.
— Isla. — decidi, apesar de tê-la contratado recentemente, Lee a conhecia de alguns anos e confiava nela, então eu sabia que poderia depositar esta tarefa — Tenho certeza que ela será tão discreta quanto você.
— Como queira senhor, mandarei Isla em meu lugar. — assentiu ele prontamente — Mais alguma ordem?
— Prepare todas as coisas para o leilão das propriedades e dos móveis, decidi que ficarei somente com as obras de arte por enquanto. — ordenei dando alguns passos até a estante de livros.
— Sim, senhor.
— Sobre o banquete que minha mãe está preparando para seu aniversário de casamento, se certifique de que tudo saia como ela quer. — o olhei novamente — Principalmente a presença dos convidados.

Lee deu um sorriso discreto como se soubesse o peso de meu pedido, aquela seria a primeira vez que abriria os portões do nosso castelo para dar um banquete aos nobres de Nottinghamshire. Eu achava desnecessário alimentar os nobres que sempre os humilharam, mas se isso deixaria minha mãe feliz e cicatrizava o orgulho ferido do meu pai, era um dinheiro bem gasto. Meu fiel mordomo se inclinou com suavidade e depois saiu em direção aos seus afazeres, iniciaremos naquele momento a segunda parte do meu plano, triplicar meus lucros com toda a dívida arrecadada.

Meu pai já havia se dado por vencido, a ideia de se aposentar dos negócios e viver tranquilamente com minha mãe naquele castelo lhe agradava, felizmente eu tinha Aidan para me auxiliar nos negócios locais. Transformaria meu primo em um sábio homem de negócios como eu, afinal ele ficaria ali com meus pais administrando o açougue e a nova loja de tecidos, da qual havia lhe presenteado.

Todo o meu progresso financeiro era bom, finalmente havia me estabelecido no topo da sociedade inglesa, porém uma grande parte de mim se sentia incompleta, essa parte já tinha definido a causa e o nome: Lady Lewis. A cada vez que pensava nela sentia meu coração doer, algo que consumia por dentro de uma forma descomunal.

— Ah… — soquei a parede sentindo uma leve raiva tomar conta de mim ao me lembrar daquele boato.

Um nó se formou em minha garganta, me voltei para a pequena mesa ao lado da janela e despejei um pouco de vinho no cálice, fiquei olhando aquele líquido por um tempo até que o engoli, parecia uma brasa acesa descendo dentro de mim. Imaginar comprometida a outro homem me dilacerava por completo, não conseguia mais entender até que proporção aquele sentimento que havia nutrido todos aqueles anos por ela me levaria. Só havia a visto raras duas vezes e atualmente já estava entregue a ela sem que soubesse.

Ela certamente nem se lembraria mais da pobre criança que um dia alimentou, enquanto eu revivia aquele dia todas as noites em meus sonhos. O gosto amargo logo invadiu minha boca e em um surto de raiva e frustração apertei o cálice de vidro que estava em minha mão o quebrando.

— Oh, querido. — disse minha mãe ao adentrar o escritório — O que aconteceu?
— Estou bem. — abaixei minha mão fingindo e a olhei com suavidade.
— Oh. — ela se aproximou de mim já pegando em minha mão ferida — Pode mentir para si mesmo, mas não para sua mãe.

Sorri de canto, ela realmente me conhecia, mesmo depois de anos longe de casa, o amor de minha mãe só havia aumentado, talvez fosse seu carinho a base que me mantinha ainda de pé.

— Não estou mentindo. — estava sim.
— Eu te conheço, anjo. — ela sorriu enquanto continuava a retirar os cacos de minha mão — Sei que não é somente sua mão que está ferida, mas também este coração aí dentro. — sempre sincera e direta comigo, nenhum detalhe lhe passa despercebido — Hum…
— O que foi?
— Eu e minha boca grande, não deveria ter comentado aqui no jantar. — ela parecia rígida em sua auto repreensão, enquanto limpava o sangue com seu lenço — Deus sabe o quanto peço para me ponderar nos comentários.
— Fique tranquila em seu coração. — a tranquilizei mantendo minha voz suave mesmo sentindo as dores dos seus cuidados com minha mão — Preciso saber a realidade, para poder me preparar de forma correta.
— Ainda vai insistir neste sentimento? — ela me olhou admirada — Não sei se devo ficar preocupada com isso ou aliviada por não desistir deste amor, apesar de ser o único lado de ama… Bem, perdoe-me querido.
— Por dizer a verdade? Não há nada para se perdoar, a senhora está correta em suas palavras, sou o único que ama e devo ser o único que se lembra. — suspirei fraco.
— Ainda me fascino com a história que contou. — ela sorriu — Por isso ainda acredito que vai dar certo, oro todas as noites para que dê.
— Agradeço o apoio minha mãe. — sorri de volta.

Estava feliz por tê-la comigo agora. Minha mão iria cicatrizar sem problemas, mas meu coração só o tempo iria dizer, o rasgo era grande e parecia que não se fecharia tão cedo, algo me dizia que más notícias viriam.

- x -

— Tenho que admitir, esta festa está saindo melhor do que imaginava. — disse Aidan ao adentrar no meu quarto — Principalmente depois de dois meses de planejamento, pensei que tia Poppy jamais marcaria a data da grande noite.
— Que bom que todos estão se divertindo. — disse mantendo meu olhar voltado para a janela, vendo os convidados espalhados pelo jardim — Afinal, este banquete é para isso mesmo.
— Vejo que não está de fato animado com tudo. — observou ele — Algo te preocupa?! Algo relacionado a carta que recebeste há três dias?
— Não consigo esconder nada de minha família?! — sorri de canto direcionando meu olhar para minha mãe que estava rindo, enquanto conversava com algumas damas esposas dos comerciantes locais.
— Pode até ser enigmático com os outros, mas conhecemos suas mudanças de humor pela forma de olhar para as coisas. — explicou ele de forma clara e objetiva — Depois que recebeu aquela carta ficou ainda mais sério e silencioso do que já é, poderia até apostar que é algo relacionado a sua lady e obviamente ganharia.
— Certamente ganharia. — concordei — Esta vem sendo minha única preocupação atualmente.
— Você deveria relaxar mais… — aconselhou ele erroneamente — Não querendo ser pessimista, mas já sendo… E também, existem mais mulheres neste mundo.
— Eu poderia até perder meu tempo te explicando que ela é a única para mim, mas sei que sua mente de libertino promissor não iria entender. — desviei meu olhar para ele finalmente, meu primo estava com uma taça de champanhe na mão — Então, deixarei que aproveite seus dias, até ser esfaqueado por este sentimento.
— Que isso. — ele fez uma careta estranha — Fala do amor como se fosse algo mortal.
— Para mim está sendo, um doce veneno que me mata aos poucos a cada dia.
— Está bem melancólico hoje, tem certeza que não quer se divertir no banquete? — insistiu.

Recusei apenas com o olhar, voltando minha atenção a janela. Ali estava a imagem que queria, Isla passando discretamente pelos convidados. Respirei fundo e me virei.

— Aproveite a festa por mim. — disse a Aidan ao passar por ele e abrir a porta — Mas tenha cuidado, deve ser responsável pelos seus atos no dia seguinte.
— Não se preocupe , jamais traria problemas ao meu primo favorito. — ele piscou de leve e tomou o último gole do champanhe.
— Sou seu único primo. — ri baixo ao saírmos do quarto.

Seguimos juntos até o corredor que dava para o salão principal, desviei meu caminho em direção ao escritório, assim que entrei Isla e Lee já estavam me aguardando como se soubesse que iria para lá. Estava aflito pelo que Isla havia escrito em sua carta, mesmo que fosse confirmar suas palavras, eu estava pronto para aquilo.

— Diga, sem rodeios. — engoli seco mantendo meu olhar nela.
— Senhor Winchester, é verdade. — confirmou os boatos — Infelizmente lady vem mantendo a corte com Sir Ulrich Meagher do condado de Limerick, suas famílias são próximas há muitas gerações, além de se conhecerem desde criança, descobri que sir Ulrich a salvou de se afogar no rio há alguns anos.

Então era isso. Fechei meus olhos sentindo minha mente paralisada com aquilo, um sentimento de derrota tomou conta de mim, fazendo aquela raiva voltar ainda mais intensa. Fechei meus punhos por um instante me imaginando frente aquele homem e socando sua cara, logo me virei para trás e abrindo os olhos peguei o vaso de decoração, que estava na mesa ao lado da minha poltrona e o lancei contra parede.

— Ah… — Isla soltou um pequeno grito de susto, mas logo tampou a boca com as mãos.
— Senhor este vaso… — Lee tentou, porém desistiu.
— Eu não me importo com o vaso. — alterei minha voz voltando meu olhar para Isla — Continue.
— Senhor, acho melhor deixar isso para amanhã, está começando a ficar fora de si.
— Eu mandei ela continuar. — senti meu olhar de fúria atravessar Isla, como se ela fosse a causa do meu problema.
— Isla, saia. — ordenou Lee.
— Não. — retruquei.
— Saia agora. — insistiu Lee, num tom mais alto.

Sem pensar duas vezes ela saiu já assustada com minha reação.

— O que você pensa que está fazendo? — fechei meu punho novamente sentindo ainda mais raiva — Quem você pensa que é?
— Eu estou fazendo o meu trabalho. — ele se impulsionou vindo em minha direção e socou minha cara sem receio — Lembre-se, antes de ser seu mordomo, sou seu amigo.
— Não é mais. — eu o soquei de volta, descarregando tudo de ruim que estava dentro de mim.

Sim, Lee era meu amigo, ele devia sua vida a mim por tê-lo salvo nos meus tempos de pirata, mas o principal é que ele era oficialmente minha consciência. Eu sabia que tinha um lado negro cheio de revolta dentro de mim, o ódio que sentia dos nobres me cegava em alguns momentos, sentimento que me acompanhava desde o tempo em que vivia na workhouse do senhor Cooper. Precisava de alguém que me ajudasse a controlar toda aquela raiva, e após uma boa briga cheia de socos e verdades jogadas em minha cara, ele sempre conseguia me fazer voltar a razão.

A verdade é que eu não estava preparado para nada daquilo, nunca havia cogitado a ideia de não tê-la em meus braços, isso aumentava ainda mais minha agonia e frustração. Ingênuo de minha parte achar que ser o homem mais rico da Inglaterra me daria a chance de estar com ela, lá no fundo eu ainda era a pobre criança que entrou em sua cozinha e depois a viu partir com as costas machucadas.

Toda vez que me lembrava que havia se machucado por minha causa, meu desejo de ter estado em seu lugar aumentava ainda mais. Metade do meu escritório estava quebrado, tanto eu como ele sentados ao chão agora rindo de tudo aquilo, a última vez que havíamos brigado nem lembrava mais.

— Imagino sua dor. — disse ele jogando o lenço que estava no seu bolso para mim.
— Agradeço, meu amigo. — peguei o lenço e logo limpei o sangue que escorria de minha boca.

Lee havia passado por uma desilusão amorosa há alguns anos, a mulher que enfeitiçara seu coração era casada, após muitas coisas em sua aventura amorosa ele descobriu que seu marido existia, em um jantar de negócios em que eu era o convidado principal. Ah, sim, me lembrava perfeitamente daquele dia, foi o último que brigamos, e ele era a pessoa da vez que precisava voltar a razão.

— Mas ainda não acabou. — disse ele, de forma tranquila — Se voltar a pensar com calma e frieza.
— Como não acabou?! — o olhei confuso, sentia fortes dores no maxilar.
— É somente uma corte. — explicou ele — Ela ainda não se casou com o tal…
— Não ouse repetir o nome dele. — o interrompi já entendendo, suspirando fraco — Você está certo, me deixei levar pela frustração e raiva, tenho que pensar com calma.
— Agora meu amigo está de volta. — ele riu, inclinando seu corpo até deitar no chão.
— Certamente não deixaria Isla voltar aqui para contar o resto, não é?
— Não. — afirmou ele rindo novamente — Isla ficará longe de você por tempo indeterminado.
— Eu jamais faria algo contra ela. — o olhei meio ofendido — Sabe minha opinião sobre tal ato.
— Sim eu sei, não é pela Isla, ela sabe se defender. — ele respirou fundo — É por você, já estava ansioso pela carta, acha mesmo que não percebi suas oscilações de humor?
— Já entendi que você e minha família me conhecem bem. — admiti.
— Vamos agir com cautela, temos que conhecer o inimigo e saber bem quão afundo é esta ligação entre as famílias. — sugeriu ele sabiamente — Além do mais, cortes estão relacionadas a dotes, o que me faz ficar interessado nas finanças do pai dela, não deve ser fácil manter um castelo, principalmente em tempos onde a maioria da nobreza anda endividada.
— Boa observação. — me acheguei um pouco mais para perto da parede e encostei minhas costas nela — Seria sorte se o pai dela estivesse com dívidas.
— Seria um milagre meu amigo, e vamos atrás disso. — ele ergueu seu corpo e sorriu de canto — Mantenha este coração firme e tranquilo, ainda podemos reverter essa situação.
— Como posso agradecer por ser minha consciência? — o joguei de volta seu lenço.
— Continuando a ser a minha também. — ele riu ao se levantar — Vou pedir para prepararem um chá para você, precisa descansar.
— Eu estou bem. — disse me levantando junto — Este lugar que parece mal.

Nós rimos como dois bobos.

— Vamos sempre nos lembrar que brigar é feio. — disse a ele indo em direção a porta.
— Concordo. — ele saiu primeiro e olhou para o corredor à frente — Acho melhor passar por este lado, assim evitará esbarrar nos seus pais e ter que explicar os hematomas.
— Não precisava me socar com tanta força. — levei a mão em meu queixo.
— Vá para o quarto e durma um pouco, logo a dor passa. — aconselhou.
— Não me importo com a dor física, sabe disso. — ignorei um pouco, porém segui para o corredor.

Os dias se passaram e alguns problemas surgiram com os carregamentos que chegaram de minha frota no porto de Liverpool, era a primeira vez que me ausentava tanto tempo de casa desde havia retornado. Porém, passar aqueles dias longe do castelo e afundado nos negócios, preencheram minha mente com assuntos importantes e afastando pensamentos sobre e o tal sir.

— Com isso resolvemos todos os problemas futuros. — disse ao examinar a assinatura do antigo proprietário da área exclusiva que eu havia comprado no porto para que meus navios pudessem atracar.
— Ainda me surpreendo com o valor dessas pessoas. — comentou Lee permanecendo de pé diante da minha mesa.
— Para você ver que todos tem um preço, só é preciso saber qual. — expliquei como satisfação.
— Bem, então devo lhe dar mais uma boa notícia. — pelo seu tom de voz, parecia algo que iria me animar ainda mais.
— Surpreenda-me. — levantei meu olhar para ele.
— Digamos que tenho o valor do lord Isaac Lewis, conde de Carnarvon e pai da sua amada lady.

Agora ele havia despertado tanto o meu interesse, como o meu coração congelado pela frustração. Eu gostava quando Lee ativava seu lado detetive, não sabia de onde tirava tanto informante que lhe trazia fatos precisos sempre, algo que me beneficiava muito. Lord Isaac Lewis era um nobre importante na região de Derbyshire, seu perfil de homem equilibrado para a sociedade aristocrata era somente fachada, seu pequeno vício em jogos já havia consumido grande parte de sua fortuna e lhe causado muitas dívidas.

Outra curiosidade é que lord Lewis possuía uma longa lista de amantes, supostamente responsável pela outra parte da fortuna perdida, com suspeitas de dois filhos bastardos, certamente o valor do silêncio de suas amantes havia sido bem alto. Mas não era somente isso, além de , a primogênita do primeiro casamento, ele se casou novamente e teve mais duas filhas. Um nobre que mantém quatro mulheres não deve gastar pouco, principalmente para manter as aparências.

Quanto mais Lee me relatava todos as informações sobre a família Lewis, mais minha mente trabalhava em como poderia usar aquilo em meu favor, até que chegamos ao ponto certo. O pai de poderia estar com os dias contatos por atrair dívidas com uma perigosa família do sul da Itália. Aconteceu há alguns meses em uma de suas viagens com a família pelo país, segundo meu mordomo, lord Lewis perdeu uma quantia considerável para eles em uma aposta de corrida de cavalos, sua maior fraqueza.

— Bem, estou inclinado a pensar que faremos um desviou em nossa rota. — comentou Lee já entendendo meu olhar.
— Vamos para Derbyshire, tenho uma leve sensação que uma corte será desfeita.
— Mal posso esperar para vê-lo realizar seu desejo. — disse ele num tom satisfatório — Esperou muito por isso.
— Você não imagina o quanto. — concordei.

Sim. Eu havia esperado por aquilo, o momento em que poderia finalmente me aproximar de , porém agiria com mais cautela ainda. Para um nobre orgulhoso como Isaac Lewis deveria ser, não seria fácil ouvir de um burguês a proposta que eu já estava articulando em minha mente. Entretanto a faria sem receio, ele precisava salvar o pescoço da guilhotina que a tal família italiana estava preparando, algo que somente o meu dinheiro o ajudaria.

— Agora sim, meu coração voltou a bater de verdade. — sussurrei ao me voltar para a janela e olhar as carruagens passando pela rua — Consigo sentir lá no fundo que ela será minha.

- x -

— O que? Como ousa me fazer essa proposta? — lord Lewis elevou seu tom de indignação — Me convidou a sua casa para isso?
— A escolha é sua. — mantive meu olhar sereno sentado em minha poltrona — Porém, reforço que deveria pensar em sua família, uma esposa e três filhas, na sociedade em que vivemos as mulheres não ficam com a herança quando os maridos morrem. Certamente suas propriedades iriam para seu primo, não é mesmo?!

Era um tanto cruel fazer aquilo, mas estava fazendo lembrar sua realidade, o que deu certo, pois senti que estava tentando acalmar-se por dentro.

— Não posso estragar assim os planos de minha família, o noivado já está acertado e com data marcada. — retrucou ele — Dei minha palavra.
— Sim, e já sabe como pagará o dote? Certamente a família Meagher mesmo sendo amiga, são inteiramente tradicionais quanto a isso. — sorri de canto disfarçadamente — Já pensou nos custos do casamento? Acho que é a família da noiva quem cuida disso.
— Por que ela? — ele me olhou intrigado — Tenho três filha, por que a ?
— Não importa. — respirei fundo e me levantei — Não deveria estar feliz? Pagarei uma fortuna em dívidas e a única coisa que peço, é a mão de vossa filha em casamento.
— Estarei vendendo a minha filha. — retrucou ele — Sou um cavalheiro, minha consciência…
— Deveria ter pensado nisso antes, mas em uma coisa eu concordo, não quero comprá-la como se fosse um objeto. — o interrompi.

Jamais queria transformá-la nisso e subjetivamente, aquela proposta estava fazendo isso, eu a amava sim, havia passado todos aqueles anos desejando tê-la em meus braços, mas não faria de forma obrigada.

— O que propõe então? — agora o seu olhar ficou confuso.
— Eu pagarei toda a sua dívida. — afirmei com segurança — Com uma simples condição.
— Qual? — perguntou.
— Assimilando agora minhas palavras iniciais, jamais forçaria lady a se casar comigo, entretanto…
— Entretanto?!
— Em troca de minha benevolência, você não deixará que ela se case com nenhum outro homem. — finalizei minhas condições de forma plausível.

Eu poderia estar sendo egoísta demais com aquilo, mas tinha um motivo, não conseguiria e nem teria forças suficiente para vê-la nos braços de outro homem.

“Podia este sentimento ser amor
Ainda agora, sou bastante tímido
Nem consegui dar um passo para perto de você
Então por favor, espere pelo meu amor”
- Stand By Me / SHINee


17. Need U

Derbyshire - Primavera de 1847

ver.:

Durante todo o inverno tive que me ausentar, a estação mais fria do ano e eu estava longe de casa, longe de todos. Lee havia me acompanhado naquela viagem até Paris, meu segundo objetivo seria estabelecer meus negócios na França, nos hospedamos na casa de Remy Chermont, meu mais novo amigo. Ele, assim como lady , de certa forma era o que me fazia suportar os nobres.

— Bonjour, . — disse Belle, ao adentrar a biblioteca com seu jeito eufórico de ser — Senti sua falta na mesa do café.
— Não queria atrapalhar uma comemoração em família. — respondi tranquilamente, mantendo minha atenção ao livro que estava lendo.
— Como se você também não fosse. — ela se aproximou se forma sinuosa — Papai o considera como um filho quase.

Eu ainda me sentia um pouco desconfortável com a forma que as moças francesas se comportavam, eram bem mais ousadas e que as inglesas. Não podia negar que Belle era uma moça atraente, seus lábios delicados estavam sempre destacados pelo batom vermelho, acompanhado pelos decotes chamativos de seus vestidos.

Eu como sempre fingia não notar suas suaves investidas em mim, mesma que já houvesse discretamente declarado seus sentimentos em cartas. Em meus olhos a via como uma criança mimada que não aceitava perder, primeiro que eu não seria como um brinquedo em suas mãos, segundo meu coração já pertencia a outra pessoa, jamais olharia para Belle. O que me deixava preocupado, pois minha amizade com vosso pai era de suma importância para meus negócios no país.

— Eu aprecio muito a amizade de vosso pai, mas eu já possuo uma família. — fechei meu livro e a olhei suavemente — Não deveria estar em outro lugar?
— Que outro lugar seria mais interessante que estar aqui em vossa companhia?! — ela mordeu o lábio inferior, era natural de sua forma de tentar seduzir-me.
— Um passeio pelas ruas de Paris, pelo que vi o dia está lindo hoje. — respondi desviando meu olhar para a janela — Você não estava ansiosa para fazer compras?
— Meu desejo por gastar o dinheiro do meu pai já se foi. — ela se aproximou ainda mais de mim — Sabe que quando está na cidade, não consigo fazer mais nada, além que querer lhe fazer companhia.
— Agradeço a gentileza e hospitalidade, mas sabe minha posição quanto a isso. — voltei meu olhar mais sério para ela.

— Não voltemos a este assunto. — a interrompi antes que pudesse fazer todo o seu drama, sobre eu não corresponder seus sentimentos — Meu coração sempre irá pertencer a outra.
— Lady ?! — ela cruzou os braços, sua face se preencheu de decepção e frustração — E se ela não o quiser? Como ficará?
— Não importa, mesmo se isso acontecer, ela é a única a quem eu quero. — deixei que toda a minha sinceridade, transparecer em meu olhar de segurança — Sinto-me mal por ter que lhe dizer isso novamente, não a quero nenhum mal e menos ainda machucá-la, mas o que busca em mim, jamais terá. Espero que entenda desta vez.

Eu respirei fundo, vendo em seu olhar algumas gotas de lágrimas se formarem, deixei o livro na poltrona em que estava sentado e me voltei para a porta. Assim que retornei para o hall de entrada da mansão, Remy e Pierre conversavam perto da porta de entrada.

— Aqui está ele, o homem mais silencioso da Inglaterra. — brincou Remy rindo um pouco.
— Em minha concepção, és o mais silencioso do mundo. — reforçou Pierre.
— Ao longo dos anos, percebi que se pode aprender muito com o silêncio. — retruquei de forma singular.
— Eis aqui um sábio homem de negócios. — Remy olhou para seu filho — Aprenda com ele.
— Prefiro me divertir a gastar meus anos com preocupações, sou um nobre meu pai. — Pierre riu e se dirigiu para entrada da sala.
— Ah, essas crianças. — ele deu um suspiro e desviou o olhar para mim — Vejo algumas preocupações em seu rosto.
— Não tente me decifrar. — sorri de canto e voltei meu olhar para a porta — Mas tenho algo a dizer.
— Por que será que já imagino o que seja. — ele parecia pensar um pouco sobre — Belle.
— Não quero que nenhum mal entendido fique entre nossa amizade. — disse prontamente.
— Sei o quanto minha filha está obcecada por você, também tenho conhecimento sobre seu posicionamento quanto a isso. — ele suavizou seu olhar — Belle sempre foi uma criança mimada, não vamos nos preocupar com seus sentimentos volúveis, temos assuntos importantes para tratar.

E tínhamos mesmo, antes de voltar para Londres eu queria finalizar todos os meus assuntos comerciais na França, Lee como meu advogado nas horas vagas, estava encarregado de todas as partes jurídicas como sempre. E como esperado, meu nome já era famoso e conhecido por toda Paris, concluindo a fase três dos meus planos.

— Silencioso e pensativo. — comentou Lee enquanto analisava alguns contratos com os comerciantes da cidade — Posso saber o que anda confabulando em sua mente?
— Você não consegue me decifrar?! — o olhei de forma irônica — Me diga você, o que eu estou pensando?
— Duas palavras. — disse ele segurando o riso — Lady .
— Cinquenta por cento sim. — respirei fundo — Confesso que estou inconformado com a resposta dela…
— Foi o senhor mesmo que lhe deu duas opções. — suas palavras soaram com ironia também — Ela escolheu não se casar, apesar da outra condição.
— Não iria me sentir bem a obrigando se casar comigo. — mantive meu olhar sincero para ele.
— De alguma forma, não está mais em dívida com ela. — Lee tentou me levar ao lado positivo de tudo isso, porém não via aquilo como uma dívida — Você salvou a vida do pai dela, assim como ela salvou a sua.
— Queria que fosse simples assim. — suspirei fraco me levantando da poltrona — Apenas pagar a dívida do pai dela e me esquecer de tudo.
— Então, após essa temporada aqui, quando voltaremos? Já estamos no início da primavera. — indagou ele — Ainda temos a parte final do seu plano.
— Acho que está mesmo na hora de voltar para casa. — assenti dando alguns passos até a janela — Não está sendo confortável me hospedar aqui na casa de Remy.
— Isso me leva a crer que vai comprar uma casa em Paris. — constatou com exatidão.
— Gostaria que cuidasse disso antes de partirmos. — confirmei meu desejo — Da próxima vez que vier a Paris, quero passar em minha própria mansão.
— Seu desejo é uma ordem senhor. — ele sorriu de canto e desviou o olhar para os documentos novamente.

Mais dias se passaram com a preparação para minha partida, decidi não fazer uma despedida demorada antes do embarque, pois sabia que em breve retornaria a França para fazer mais negócios ainda. Sentia que aquele ano o progresso havia chegado de vez em toda a Europa, eu certamente me beneficiária de todas as formas possíveis, já que a melhores mercadorias estavam sendo sem comercializadas através das minhas embarcações.

— Oh meu anjo. — minha mãe veio ao meu encontro, assim que eu e Lee adentramos minha nova residência em Londres.
— Como sabiam que eu estava retornando? — perguntei após ser abraçado por ela.
— Para ser sincero, não sabíamos. — respondeu meu pai da porta de entrada para a sala — Recebemos uma carta do arquiteto avisando do término da obra, então viemos para ver como ficou.
— E o que acharam? — perguntei curioso.
— Esplêndido! — minha mãe soltou um sorriso de animação e se aproximou do meu pai — Deveríamos fazer uma comemoração por isso.
— Não. — disse num tom sóbrio e sério.
— Mas…
— Não quero nobres na minha casa. — continuei não a deixando insistir — A senhora já obteve uma grande festa de aniversário de casamento, não é o bastante?
— Ah, mas aqui é Londres. — ela cruzou os braços como uma criança mimada, era fofo aquele seu lado, eu queria vê-la feliz, mas não cederia desta vez.
— Não irei repetir. — me mantive sério e virei para as escadas.

Estava cansado demais e frustrado demais para isso. Assim que entrei no meu quarto que era o principal da mansão, Lee entrou em seguida com outros dois empregados que carregavam minha bagagem. Assim que eles saíram, Lee me entregou uma carta antes de fechar a porta, a primeiro momento achei estranha, mas meu coração acelerou ao ler que era o remetente.

— Lady Lewis… — sussurrei sentindo um pouco de falta de ar.

Caminhei até a janela, mesmo ainda não sabendo o conteúdo da carta, já sentia minhas pernas um pouco bambas. O que ela queria naquela carta? Abri a gaveta da escrivaninha e peguei a lâmina para cortar a aba do envelope, assim que retirei o papel senti um breve e suave perfume feminino, provavelmente dela. Respirei fundo, ao desdobrar aquele papel e comecei a ler.

Para minha surpresa, era uma carta de agradecimento por tudo que eu estava fazendo por sua família, principalmente por não obrigá-la de fato a se casar comigo. Meu olhos percorriam cada uma daquelas palavras um tanto intrigado e surpreendido, várias coisas se passaram por minha mente enquanto lia. Principalmente por ela ter escrito um trecho do livro Pride and Prejudice, ao final da carta.

— Cordialmente lady Lewis. — sussurrei novamente — Qual o propósito desta carta? Você quer me enlouquecer?

Sim, certamente ela queria me enlouquecer ainda mais. As palavras de gratidão que percorria por toda aquela carta ficaram gravadas em minha mente, algo que tomou parte do meu pensamentos por dias e mais dias. O que não me deixava concentrar nos negócios e menos ainda assuntos familiares.

— Senhor Winchester. — disse Lee ao entrar em meu escritório.
— Me lembro vagamente de tê-lo enviado a uma missão. — desviei meu olhar do jornal para ele curioso pelo seu retorno rápido.
— Acredito que o que me traz aqui é ainda mais importante. — retrucou ele.
— Surpreenda-me.
— Lord Lewis em pessoa está no hall desta casa, pedindo uma audiência com o senhor. — seu olhar sereno me fazia pensar que aquilo era algo bom e positivo.
— Ele adiantou o assunto?! — mesmo com a segurança de meu amigo, fiquei um pouco receoso — Será que ele quer mais dinheiro e está cogitando a ideia de usar sua filha desta vez?
— Não sei senhor, mas parece importante. — ele respirou fundo — Acho que deveria recebê-lo, tudo é possível.
— Seguirei seu conselho. — sorri de canto — Diga-o para entrar e peça Isla que traga um chá, acho que os nobres gostam disto.
— Sim senhor.

Lee se retirou prontamente. Não demorou muito até que retornasse anunciando a entrada de lord Lewis e nos deixando à sós. Seu ar parecia menos superior do que da primeira vez que nos encontramos em Derbyshire, um breve silêncio se instalou entre nós, até que ele deu alguns passos para mais perto de minha mesa.

— Acredito que já tenha recebido a carta de minha filha. — iniciou ele, com uma certa dificuldade.

Assenti com o olhar.

— Mesmo que minha filha tenha escrito aquela carta a próprio punho, ainda me senti na obrigação de agradecer novamente em pessoa. — ele curvou a face levemente como uma cordial reverência — Sinto que devo minha vida agora, ao senhor.
— Não me deve nada. — mantive a seriedade em minha face, analisando as suas expressões — Cumpri minha palavra, basta cumprir a vossa.
— Este é mais um dos motivos de minha visita — acrescentou ele — Haverá um casamento.
— Como?! — eu me levantei da minha cadeira confuso.
— Minha querida voltou em sua decisão. — ele respirou fundo, senti um certo peso em sua voz — Ela aceitou vosso pedido de casamento.

Ao ouvir aquelas palavras, todo o frio do inverno que ainda mantinha meu coração congelado, deu lugar ao sol e calor da primavera. A esperança estava retornando para minha vida.

- x -

ver.:

. — Marg deu alguns toques na porta e entrou — Atrapalho vossa leitura?
— Não. — voltei meu olhar para ela na porta — Pode entrar, tenho tido insônia há algumas noites, somente os livros me acalmam.
— Por causa da carta que enviou para o senhor Winchester? Ou pela vossa decisão de se casar com ele? — ela adentrou um pouco mais a biblioteca e veio se sentar ao meu lado — Seu olhar parece preocupado.
— Não consegui pensar em outra coisa durante todo o inverno. — suspirei fraco fechando o livro — Por que um homem como ele, que poderia ter qualquer mulher de Londres, insistiria em me ter?!
— Te assusta ser desejada por alguém?! — Freya, apareceu misteriosamente encostada na porta.
— O que faz aqui? — Marg perguntou.
— Você nunca soube ser silenciosa em suas escapadas na madrugada. — explicou ela — Mas estou surpresa por não ter ido a cozinha desta vez.
— Estávamos conversando. — explicou Marg não dando importância às palavras de Freya.
— Não me respondeu. — reforçou Freya desviando o olhar para mim.
— Não sei, para ser honesta o que me motivou a voltar em minha decisão foi a curiosidade. — respondi de forma sincera.
— Devo admitir que também estou curiosa. — Marg disse de forma empolgada — Ouvi dizer que o senhor Winchester é um homem muito reservado, misterioso e que nunca comparece nas recepções que é convidado, ele sempre manda a família no lugar.
— Uau, Margareth, meus parabéns, só falta mostrar a árvore genealógica dele. — Freya riu debochadamente — Ah,me esqueci, ele é bastardo não é?! Talvez seria mais interessante se ele fosse um daqueles velhos burgueses que estão a um passo da morte.
— Ai Freya, não seja desagradável. — Marg fez uma singela careta para ela — Está com inveja porque ele não a quis, o senhor Winchester pagou uma fortuna só para ter a oportunidade de se casar com a , nenhum homem faria isso por você.
— O senhor Winchester é um burguês, que honra tem em uma nobre se casar com pessoas dessa classe? — Freya intensificou seu olhar se superioridade, algo que sempre me incomodava de sua parte.
— Pare de as duas com essas trocas de carinho. — disse mantendo meu tom suave — Agradeço por sua pesquisas Marg, fico feliz que tenho você para me contar sobre as pessoas, e Freya, sei que também está curiosa para saber quem ele é… Afinal, ele nunca se mostrou de fato para a sociedade desde que voltou a Inglaterra.
— Seria engraçado se ele não aparecesse na igreja no dia do casamento. — brincou Marg rindo, mas depois ela me olhou séria — Será que ele a aceitará? Afinal, você o rejeitou primeiro.
— E o senhor Winchester for uma pessoa rancorosa… — Freya sibilou um pouco, mordendo seu lábio inferior — Será que ele ficou furioso ao ser rejeitado pela desejada lady .

Eu não havia pensado desta forma, mas lá no fundo as insinuações de Freya tinham fundamento. Talvez tê-lo rejeitado de início, poderia ter sido um gatilho para despertar-lhe uma ira sobre minha família, afinal, não conhecia de fato o senhor Winchester, nem imaginava do que ele poderia ser capaz de fazer.

— Freya, por favor, não devemos encher a mente de com isso. — Marg a repreendeu — Se analisarmos bem, um homem quando está rancoroso por ser rejeitado não iria esperar o inverno passar, certamente ele teria nos expulsado do castelo como fez com muitos nobres após seu retorno.
— Vai me dizer que estamos aqui no conforto ainda por causa da ?! — ela me olhou com desdém, querendo ignorar a suposta realidade.
— Sim. — Margareth assentiu com firmeza — Vamos pela lógica, ele pagou todas as dívidas do papai, não porque é um homem bom, mas porque seu desejo era se casar com a , mesmo ela tendo o rejeitado, o senhor Winchester cumpriu com sua palavra e não nos fez nenhum mal. Não há outra resposta para isso.
— Por que um homem que nem conheço faria tal coisa por mim?! — desviei meu olhar para Margareth.
— Esta de fato é uma boa pergunta. — disse Freya suspirando fraco —
— De qualquer forma, não voltarei atrás agora. — disse com firmeza — Mesmo que inicialmente seja por curiosidade, irei me casar com o senhor Winchester, somente assim conseguirei as respostas que preciso.

Eu estava mais que decidida, ainda que todos achassem que fosse pelo dinheiro, eu me casaria com ele para saber os motivos de seu interesse por mim. Senhor Winchester, o homem que a pouco tempo já estava tomando meus pensamentos para si.

“Venha para mim.
Me aceite, eu preciso de você.”
- Need U / Monstar X



18. What Is Love

Manhattan - Verão de 1852

ver.:

Finalmente estávamos desembarcando no porto de New York City, segundo o senhor meu marido, os Estados Unidos da América era o país do progresso e novas oportunidades, para minha não surpresa, ele já estava planejando nossa mudança há muito tempo. além de silencioso, também era cauteloso e estrategista em seus negócios, mesmo que arriscando em alguns caso, nunca jogava para perder.

Assim que olhei para o céu azul da nova cidade, senti que iniciamos uma nova fase em nossas vidas, na primavera passava havia se completado cinco anos de nosso casamento. Segundo ele, meu presente estaria aqui nesta nova cidade.

— Bem-vinda a América. — disse ele ao se colocar em meu lado — Não é tão tranquilo quanto Londres, mas aos poucos vamos nos acostumar.
— Se acha que podemos ter uma boa vida aqui, então tudo ficará bem. — voltei meu olhar para ele — Desde que fiquemos juntos.
— Jamais sairia do vosso lado. — ele sorriu de canto mantendo seu olhar em mim — Vamos para sua surpresa?!
— Confesso que estou com um breve frio na barriga. — me encolhi um pouco segurando em seu braço — Apesar de saber que vossas surpresas para mim, sempre me deixam sem fôlego.
— Por favor, não deixe de respirar então. — ele riu discretamente, me fazendo rir também.

Seguimos na carruagem, do porto até o bairro chamado Upper East Side. Seus planos de mudança para um novo país, já completavam três anos sem que eu soubesse, o motivo para a demora era a propriedade que ele havia comprado na parte residencial do bairro. Pelo que percebi, teríamos a elite de Manhattan como vizinhos, algo que não me admirava, jamais deixaria de viver em um ambiente assim, principalmente por sua importância no mundo dos negócios.

Vendo as ruas da cidade, era óbvio o contraste do luxo de Londres para a vagarosa construção de Manhattan, passamos por um extenso terreno onde obras aconteciam a todo vapor, segundo , estavam construindo algo grande que no futuro seria um parque em meio a cidade, assim como o Hyde Park em Londres. A carruagem parou em frente a uma luxuosa mansão que ficava a esquina da rua, assim que desci acompanhada por Sophie, senti um tanto fascinada pela beleza que compunham a fachada do lugar.

— Bem-vinda a Camellia House. — sussurrou ele em meu ouvido de forma maliciosa.

Me encolhi sentindo meu corpo arrepiar, voltei meu olhar para ele.

— Deu o nome da minha flor favorita para nossa casa? — sorriu suavemente.
— Pensei em dar o da sua mãe, mas sei que a flor representa ela também. — explicou ele — Espero que…
— Eu adorei. — o interrompi de forma suave e respeitosa — Você sempre me surpreende.
— Ainda é pouco, para tudo que… Seu amor vale mais que tudo o que faço por você. — ele sorriu de volta.

Contive minha emoção em forma de lágrima.

— Podemos entrar?! — perguntei ansiosa.
— Por favor. — ele estendeu a mão.

Sorri novamente e segurei em sua mão, meu coração já estava inteiramente acelerado, não só pela surpresa, mas também por suas palavras. Seu amor era real, não somente declarações vazias ou presentes caros, a cada abraço, beijo e carícia, sentia intensamente a verdade em seus sentimentos por mim.

Como esperado, a mansão era tão linda por dentro, quanto havia visto por fora. Muitos quartos, uma biblioteca só para meus momentos de leitura, duas salas de estar minuciosamente decoradas com luxo, requinte e valiosas obras de arte, além dos outros ambientes que seguiam a mesma linha de riqueza. Certamente, era a mansão mais bonita de toda a cidade, se tratando do meu marido.

— Tudo aqui é lindo. — disse ao entrarmos em nosso quarto, que por sinal, era mais amplo que da Wincher House.
— Que bom que gostou. — ele permaneceu perto da porta me observando.
— Eu amei. — virei minha face para ele, dando um sorriso tímido — Obrigado.
— Pelo que?! — sua face suavizou um pouco.
— Por me amar. — dei alguns passos para ele — Mesmo não podendo te dar filhos…
— Já conversamos sobre tal assunto. — ele segurou em minha mão e me guiou para mais perto me abraçando — Não quero que volte a ter pensamentos que te deixam triste, apenas construa mais lembranças felizes comigo.
— Sei exatamente o que pensa… — sussurrei depois de um longo suspiro — Mas lá no fundo, sabemos que faria diferença se tivéssemos filhos… Sinto como se fôssemos incompletos.
— Não sinta isso… — ele se afastou um pouco de mim e tocando de leve em minha face, me fez olhá-lo — Permita-se sentir o meu amor, assim não sentirá estes vazios.

me beijou suavemente no início, porém ao envolver seus braços em minha cintura, começou a intensificar mais. Em cinco anos de casados, seus beijos não haviam mudado, meu corpo ainda se incendiava a cada toque seu, minha mente paralisava com suas intensas demonstrações de amor. Realmente não imaginava que nossa primeira entrega de amor na nova casa, seria naquele momento, talvez por querer afastar todos os maus pensamentos de mim, a única forma disso era com seu amor e carinho.

Meu corpo não parava de arrepiar, sempre correspondendo ao seu, meu coração acelerado que aquecia meu corpo e sim, meus pensamentos se voltaram para ele, como estar em seus braços me faziam sentir segurança. Felizmente, eu era a mulher mais abençoada de todo o mundo, estava grata a Deus pelo meu marido, certamente após longos anos me culpando pela morte de minha mãe em meu parto, a vida havia me dado de presente.

Se eu não podia ser completa dando-lhe um filho, havia outra coisa que me faria completa. Saber quem realmente ele representava em minha vida, antes de nosso casamento.

— Eu ainda não me esqueci. — sussurrei ao apoiar minha cabeça em seu tórax.
— Não se esqueceu?! — ele continuou acariciar meus cabelos — Do que fala?
— De quem você é. — ergui meu corpo e o olhei — Você ainda não me disse, fizemos um acordo lembra.
— Terei que beijá-la para lhe fazer esquecer? — ele sorriu de canto, com um olhar malicioso.
… — o olhei séria, puxando mais um pouco o lençol para me cobrir — Você me levou ao templo em Tóquio, me apresentou aos seus amigos piratas, me mostrou aquela velha casa em Nottinghamshire… Mas, eu sei que ainda falta o ponto principal.
— Somente saber que eu te amo, não é o bastante?! — ele manteve o sorriso em sua face, seu olhar mostrava a satisfação por minha insistência.
— Sabe que não, consigo sentir que me ama a muito mais de cinco anos… Desde a nossa primeira noite, sua intensidade, seu toque como se conhecesse cada pedaço de mim. — fechei meus olhos — Isso me deixa louca.
— Gosto de saber que está louca pelo seu marido. — ele se aproximou, aproveitando minha fragilidade momentânea, me beijou novamente.
… — sussurrei o afastando de leve — Sei o que planeja, confesso que seus beijos me deixam em paralisia, não deixarei ter controle da situação desta vez.
— Engano seu. — seu olhar intenso sobre mim estava lá, algo que me tonteava — É você, sempre você quem está no controle de tudo, acredite, todo o meu corpo reage a partir do seu.

Respirei fundo.

— Pare de dizer tais coisas. — desviei meu olhar para o lado envergonhada.
— Tudo o que tenho, conquistei porque meu objetivo era alcançá-la. — mais uma vez a sinceridade em sua voz era nítida.
— É isso que me deixa louca. — voltei meu olhar para ele me sentando na cama — Como pode uma pessoa que nunca vi, nunca toquei, me amar tanto a ponto de passar por tudo o que passou para me ter.
— Tem certeza que nunca me viu?! — ele ergueu mais seu corpo se sentando também, então se aproximou mais e passando sua mão por baixo do meu braço, tocou em uma das minhas cicatrizes das costas — Como isso aconteceu?
— Minhas cicatrizes… — toquei em sua mão a afastando um pouco, eu sempre sentia algo diferente quando ele as tocava — Você as conhece, sempre as conheceu, não é?
— Elas deveriam ser minhas. — um tom amargo saiu de forma natural dele, o fazendo desviar o olhar — Estão aí por minha causa.

Meu coração acelerou novamente. Como poderia? Como?


— Pode não se lembrar, pelo acidente que teve… — ele suspirou fraco.
— Quando eu caí no rio e sir Ulrich me salvou, o médico disse que eu havia batido minha cabeça e provavelmente perderia algumas memórias que pudessem ser importantes ou dolorosas. — sussurrei ao me lembrar daquele dia, então voltei meu olhar para ele — Você fazia parte não é?!
— Sim. — ele voltou seu olhar para mim — Éramos crianças quando aconteceu, eu havia fugido de uma workhouse, havia dias que não comia, foi quando encontrei o Lewis Castle… — ele riu de leve — Tentei me esconder, mas você estava em cima de uma árvore.

Eu ri baixo, aquilo confirmava que era realmente eu, lady aventureira.

— Pensei que fosse a filha da empregada, ou coisa assim, até que me deu a chave da cozinha e…
— E?! — toquei de leve em uma cicatriz que tinha perto do ombro direito, de imediato constatei o resultado final de minha pequena tentativa de ajudá-lo — Não deu certo.
— Não… De madrugada, você voltou a plantação de lavanda, deixou uma trouxa com comida. — ele respirou fundo — Foi quando eu vi as marcas de sangue em suas costas.
— Senhorita Moore. — conclui respirando fundo também — Não foi culpa sua,
— Foi sim, você tentou me ajudar e…
— Aquela mulher nunca gostou de mim, não foi a primeira vez que apanhei, mais tarde descobri que era por causa da minha mãe, ela nutria um amor platônico por meu pai nos tempo que eram mais jovens, ela sonhava se casar com ele. — segurei as lágrimas que se formaram no canto dos olhos — Evelyn sempre se fez de cega, por eu ser a filha da mulher que meu pai tanto amou, por ele trair ela com as empregadas, não se importava se eu apanhava da senhorita Moore…

Ele limpou de leve uma lágrima que escapou de meus olhos.

— Eu, não sei o que dizer…
— Sobre?!
— Você me ama desde aquele dia?! — aquela sim, estava sendo a maior de todas as surpresas que ele poderia ter me dado — … Como?! É… Como uma pessoa é capaz disso? Esperar tanto tempo por outra?
— Aquela não foi a nossa única vez. — disse ele ao acariciar minha face novamente — Quando fugi de casa, não era minha intenção virar um pirata… Em Liverpool.
— O ataque ao baile… — disse ligando algumas peças de forma precisa.
— Você se lembra disso?!
— Sim, foi o dia em que mais tive medo. Era você? O garoto que me protegeu. — o olhei ainda mais surpresa e agora sem fôlego.
— Sim, era eu. — assentiu com um sorriso — Eu havia lhe visto mais cedo, sabia que era você pelo seu sorriso, então ao cair da noite quando vi que atacariam aquela mansão, não consegui pensar em nada, a não ser te proteger.
— Foi aí que virou um pirata. — conclui.
— Ocasionalmente sim, não havia planejado entrar para a pirataria. — concluiu ele se levantando da cama.

Permaneci em silêncio o observando caminhar até sua maleta, retirando de dentro um pequeno caderno, voltou para cama e me entregou.

— Eu me lembro disso… Por várias vezes o vi mexer nele, mas nunca me deixou ver. — comentei ao pegar o objeto um tanto desconfiada.
— Com isso, não há mais nenhum segredo de minha parte. — ele se sentou de frente para mim e permaneceu me olhando tranquilamente — Abra e veja.

Voltei meu olhar para o caderno e o abri, logo na primeira havia um desenho meu, cada detalhes do meu rosto feitos perfeitamente, passei algumas páginas e vi outros desenhos de quando eu era criança. Meu corpo se aqueceu novamente, voltei meu olhar para e a única coisa que conseguia pensar, era como iria retribuir a ele todos esses anos que me amou em silêncio.

Impulsionei meu corpo em direção ao dele já fechando meus olhos, deixei que meus lábios encontrassem os dele por si só, automaticamente toda aquela intensidade havia retornado em seus beijos e carícias, fazendo meu corpo estar em perfeita sincronia com o dele sem o menor esforço. Desta vez minha entrega seria completa, eu sabia a verdade, mesmo não me lembrando, eu sabia a razão por ele ter se casado comigo. Ele já me amava primeiro.

- x -

— Não deveria estar de pé. — disse ele ao adentrar o quarto.
— Contei as horas desde que Isla mandou aquela carta. — disse ao me virar para ele — Isso me deixou ansiosa, o que me fez ficar na janela a sua espera.
— Fiquei preocupado. — ele fechou a porta e se aproximou de mim — Não imagina o que me passou pela cabeça quando li.
— Me desculpe, te fiz vir correndo, certamente atrapalhei seus negócios. — me senti um pouco culpada por aquilo.
— Jamais atrapalharia algo em minha vida. — ele sorriu e acariciou minha face — O que importa é que está melhor agora.
— Sim, felizmente… Não só melhor, como tenho uma notícia, não sei dizer se é boa ou ruim. — ponderei um pouco nas palavras, ainda não sabia como contar a ele, poderia ser mais uma preocupação em nossas vidas.
— Apenas diga, depois veremos como classificar. — retrucou ele tranquilamente.
— Já tem alguns meses que minhas regras estão atrasadas… Não quis falar nada, poderia causar tumulto sem necessidade… — respirei fundo — Até que viajou há algumas semanas para a Flórida e eu comecei a ter alguns enjoos, foi se intensificando e Isla teve que lhe enviar a carta.
— Então, é o que estou pensando… — ele respirou fundo, parecia confuso em seus sentimentos, talvez estivesse temendo que algo mais grave pudesse acontecer comigo desta vez — Eu não…
. — segurei em sua mão e encostei em minha barriga — Só tem quatro meses que estamos aqui, a maior parte do tempo você ficou longe de casa por causa dos negócios, seria um milagre pensar que isso é resultado da nossa primeira noite em Manhattan.
— Seus olhos estão brilhando. — ele me olhou um pouco fascinado.
— Talvez, Deus esteja olhando para nós desta vez. — sorri espontaneamente — Sinto que desta vez seremos abençoados e… Ele vai nascer.

Eu acreditava fortemente nisso… Novo país, nova vida… Há três anos eu não engravidava mais, era sim um milagre, minha esperança de ser mãe havia retornado ainda mais forte. Nossa família seria completa!

— Vamos esperar por ele então. — disse sorrindo com suavidade e acariciando minha barriga — Não sairei de perto de vocês desta vez… Nem por um minuto.

Eu me aninhei em seu corpo, deixando algumas lágrimas de felicidade rolarem pelo meu rosto.

— Não chore… — sussurrou ele envolvendo seus braços em minha cintura com cautela.
— São lágrimas de alegria… Minha felicidade está multiplicando hoje. — expliquei deixando as lágrimas rolarem.
— Isso me deixa ainda mais feliz também. — sussurrou novamente apoiando seu queixo no alto da minha cabeça — Eu te amo.
— Eu também te amo. — sussurrei de volta.

Os meses se passaram e como prometido, parou sua vida de burguês para ficar em tempo integral perto de mim. Divertido estar com meu marido todo o dia sem ter que disputar mesmo de sem necessidade, sua atenção com os negócios, porém neste tempo percebi que todos os momentos em que estava longe de mim, fazia meu desejo em tê-lo novamente aumentar ainda mais.

Foi então que entendi finalmente os segredos sobre o casamentos dos burgueses serem um sucesso, que a senhora Poppy me contou há tempos atrás. Segundo suas palavras, a distância era uma forte arma para o casamento, pois gera saudade, algo crucial para manter a chama do amor acesa. Quando ficamos longe de quem amamos por um determinado tempo, a única coisa que pensamos em fazer quando estamos perto, é sempre transmitir nosso amor e receber na mesma proporção.

Entretanto, se tratando de , nossa chama jamais apagaria, principalmente por ele não poder me tocar mais intensamente, neste período de minha gravidez.

Finalmente o grande dia havia chegado, de forma surpresa e inesperada, havia ido ao porto buscar meu pai e Margareth que decidiu vir sem seu marido, a família de meu marido havia desembarcado há duas semanas para acompanhar os possíveis momentos finais de minha gravidez. Felizmente quando aquele alarmante líquido começou a escorrer de mim, estava em meu quarto conversando com Sophie, que desesperada começou a gritar por ajuda a Isla e a senhora Poppy.

— Poppy... Está doendo… — disse ao me deitar na cama com a ajuda de Sophie.
— Eu sei querida, mas dar tudo certo, não se preocupe. — ela se virou para Isla — Mesmo que Zachary saiu às pressas para buscar socorro, o médico não vai chegar a tempo.
— Então faremos o parto?! — Isla a olhou preocupada.
— Sim. — assentiu minha sogra.
— A senhora sabe fazer isso?! — a olhei assustada.
— Sim, fui eu quem fez o parto do Aidan. — ela virou seu olhar para Isla — Traga toalhas limpas, água quente, uma bacia, tesoura e faca.
— Sim, senhora. — Isla saiu às pressas do quarto.

Senti uma forte dor que me fez gritar de imediato, foi neste momento em que entrou correndo no quarto.

. — sua face parecia mais pálida ainda, seu olhar preocupado e ansioso ao mesmo tempo.
— AAHHHHHHHHH!! — eu não conseguia respirar direito por causa da dor, tudo que me minha a mente era gritar para conseguir suportar aquilo.
— Tirem ele daqui. — disse a senhora Poppy se referindo ao filho — Quero todos os homens fora deste quarto.
— Não. — protestou, mas Lee o segurou pelo braço o arrastando para fora.
— Segure a mão dela Sophie, para ajudá-la.
— Sim. — ela virou seu olhar para mim e tentou suavizar seu rosto com um sorriso singelo — Fiquei tranquila senhora, vai dar tudo certo.

Como eu poderia ficar tranquila naquele momento, tudo que eu sentia era dor e mais dor… Teria que ser forte pelo meu filho, para trazê-lo ao mundo, mas aquilo estava a cada segundo me deixando sem forças. Logo Isla adentrou o quarto, antes de fechar a porta vi de reflexo a face de estático do lado de fora, mais um grito de dor saiu de mim de forma instantânea, o atormentando ainda mais do outro lado.

— Agora preciso que faça toda força que conseguir, precisamos colocar esta criança para fora. — disse a senhora Poppy — Isla, quero que pressione a barriga dela para ajudá-la a empurrar esse bebê.
— Sim senhora. — prontamente Isla subiu em cima da cama e começou a forçar sua mão em minha barriga me ajudando.

Certamente eu jamais esqueceria aquele momento, aquela sensação, aquela dor… Quanto mais força eu fazia, mais dor eu sentia, meus gritos estavam ficando cada vez mais altos e nem imaginava como que a mão de Sophie estava sobrevivendo a mim. Assim que finalmente meu filho nasceu, senti que ainda estranho ainda acontecia dentro de mim.

— Ainda está doendo. — disse recuperando o fôlego que ainda me restava.

A senhora Poppy me olhou como se já soubesse a resposta e entregando o bebê para Margareth que havia entrado no quarto após o primeiro choro do bebê, voltou seu olhar para mim.

— Eu sabia que sua barriga estava grande demais para uma criança só. — explicou ela.
— Não pode ser… — disse sentindo-me cansada.
— Querida, você precisa ser ainda mais forte, temos outra criança aí dentro. — encorajou minha sogra — Não pode desistir agora.
— Oh céus… Ela estava grávida de gêmeos. — Marg soltou um suspiro de euforia misturado a preocupação.
— Eu continuo aqui senhora, estamos com você. — disse Sophie ainda segurando minha mão.

Assenti pedindo a Deus para me ajudar, se o milagre era duplo, não iria recusar depois de cinco anos frustrada. Respirei fundo e ao comando de minha sogra, Isla de ajudou a empurrar meu segundo bebê. Eu estava cansada, fraca, mais ainda buscava fôlego para não desistir dele, mais uma vez soltei outro grito de dor, algo que certamente faria enlouquecer do outro lado ao imaginar que havia outra criança dentro de mim.

Assim que ouvi o segundo grito de choro, senti as lágrimas descerem em meu rosto. Neste momento não tinha nem mesmo mais forças para segurar a mão de Sophie, minha visão foi ficando embaçada e escura, a última coisa que vi foi a porta se abrindo.

- x -

… — foi a primeira palavra que consegui sussurrar ao recobrar a consciência.

Meu corpo ainda não respondia às ordens da minha mente, era como se cada músculo meu estivesse adormecido, aos poucos a sensação de dor foi retornando, certamente tudo em mim ainda não havia voltado ao eixo normal. Após longos momentos de dor, seria óbvio ainda sentir cada pedaço de mim dolorida. Forcei meus olhos se abrirem sem um pouco sucesso, mas na quarta tentativa finalmente a claridade que entrava pela janela atingiu minhas fracas pupilas.

… — sussurrei novamente.
— Estou aqui, meu amor. — ele logo segurou em minha mão, senti o movimento do seu corpo se sentando ao meu lado.
— Como eles estão?! — minha maior preocupação eram meus filhos.
— Deveria querer saber como você está. — disse ele tentando me repreender.
— Somente me diga. — senti que minha voz estava baixa, minha fraqueza não me permitia fazer esforço para nada, me perguntava como ainda conseguia respirar, estava cansativo até mesmo puxar o ar para mais pulmões.
— Eles estão bem, Margareth e minha mãe estão cuidando deles. — respondeu , senti sua outra mão acariciar meus cabelos.
— Você disse eles?! — minha visão foi se ajustando aos poucos, permitindo-me ver com clareza a face dele
— Sim. — assentiu dando um sorriso singelo — São dois fortes meninos.

Soltei um suspiro de satisfação e felicidade!

— A espera valeu a pena… Temos dois lindos herdeiros… Somos uma família completa agora. — ergui lentamente minha mão e toquei sua face, deslizando meus dedos em seus lábios — Acho que quero um beijo, em comemoração.

Ele abriu um largo sorriso.

— Não está fraca demais para isso?! — brincou ele beijando de leve minha mão e a segurando.
— Seu beijo me dá energia. — retruquei.
— Por que não disse logo. — ele foi se aproximando mais e mais de mim, até que seus lábios tocaram os meus de forma suave por um longo tempo.

Fisicamente minha teoria não havia dado certo, mas por dentro me sentia sim mais forte, ele estava ao meu lado. De certa forma, sempre esteve todo o tempo, mesmo na época que eu nem mais me lembrava dele, eu estava em seus pensamentos, subjetivamente seu amor estava comigo.

Agora, completamente eu viveria aquele amor para sempre.

“Eu perdi minha mente, no momento em que te vi
Exceto você, tudo ficou em câmera lenta
Diga-me, se isso é amor
Compartilhando e aprendendo,
Incontáveis emoções todos os dias com você
Brigando, chorando e abraçando
Diga-me, se isso é amor.”
- What is Love / EXO



Epílogo

Manhattan - Primavera de 1863

ver.:

Eu estava curiosa para saber o que levou a viajar as presas para Flórida, principalmente pelo país estar iniciando uma tortuosa situação com os rumores de uma Guerra Civil. Minha preocupação com ele, fazia-me passar horas em frente à janela do quarto olhando rua, esperando seu retorno.

— Mamãe. — disse meus filhos em um coral adentrando o quarto sem a menor formalidade.
— Crianças. — voltei meu olhar para eles — O que disse sobre entrarem assim no quarto das pessoas? Devem ser educados e formais.
— Nós somos mamãe. — Simon deu um sorriso bobo — Mas só cinquenta por cento de nós.
— O que?! — ri sem entender o motivo — Por que somente a metade?
— Porque na outra metade somos burgueses. — explicou Dimitri tranquilamente, seu olhar sereno me lembrava o de .
— Burgueses também são educados. — retruquei em repreensão novamente — Seu pai jamais entraria no quarto das pessoas sem bater.
— Por que ele bateria? Tudo aqui é dele.
— Simon. — o olhei profundamente, porém desviei meu olhar para a janela novamente ao ouvir o barulho de uma carruagem.

Senti meu coração pulsar mais forte. Os meninos se aproximaram da janela em curiosidade, certamente também estavam com saudades do pai silencioso e observador que possuíam. Assim que os cavalos pararam em frente a entrada de nossa casa, desde primeiro sendo seguido por Lee, então quando pensei que já entrariam na casa, duas crianças desceram logo após.

Haviam tristeza em suas faces, pareciam acuadas. A garota parecia ser mais velha, aparentava ter a mesma idade que meus filhos, sua pele curiosamente era mais bronzeada que o normal, não chegava ao tom dos negros recém-libertos que trabalhavam na fábrica de . Porém o menino mais novo tinha a pele clara como a neve, ele estava encolhido se agarrando ao braço da garota, certamente assustado.

Me afastei da janela e disse para as crianças ficarem me esperando em seus quartos, desci depressa para a sala de estar, precisava saber o que estava acontecendo.

. — disse assim que terminei de descer as escadas e vê-lo entrar pela porta.
— Bom dia. — ele manteve seu olhar sério.
— Fiquei preocupada, não sabia mais no que acreditar, os jornais dizem muitas coisas. — desabafei dando um suspiro fraco.
— Me desculpe lhe causar este transtorno, mas… — ele olhou para as crianças — Não podia deixá-los lá.

Quando ele me contou a fundo o motivo, senti meu coração apertar pelo sofrimentos deles. Aquelas duas crianças tinham perdido sua única família, eram filhos de um velho amigo de , que ele havia conhecido no tempo em que estava em Xangai, um comerciante que tentou novas oportunidades na América e convenceu meu marido a fazer o mesmo.

Jenie e seu pequeno irmão Will estavam sozinhos em meio ao fogo cruzado que a Guerra Civil estava causando ao sul do país. Após vosso pai ser morto cruelmente por apoiar a abolição, foram amparados por conhecidos até meu marido resgatá-los.

— Bom dia crianças. — sorri de forma gentil — Estão com fome?

Jenie olhou para seu irmão que assentiu com o olhar, então ela voltou sua atenção para mim, ainda receosa.

— Não tenha medo. — estendi minha mão para ela — Venha, vou preparar para vocês um delicioso brush.

O pequeno Will se afastou um pouco de sua irmã e se aproximou de mim. Eu me senti um pouco estranha naquele momento, como se minha mente estivesse me fazendo lembrar algo que já tinha vivido antes. De forma inesperada, flashes passaram em minha cabeça como um filme, me fazendo lembrar do dia em que conheci Sebastian.

Logo um forte sentimento de conforto e acolhimento tomou conta de mim, assim como no passado eu senti uma enorme vontade de ajudar meu marido e mantê-lo tão seguro quanto eu me sentia. Eu também estava sentindo neste momento que cuidaria daquelas crianças com o mesmo amor que cuidava de minha família...

"Não há ninguém como você,
Mesmo se eu olhar em volta é tudo igual
Onde mais procurar?
Uma boa pessoa como você,
Uma boa pessoa como você,
Um coração bom como o seu,
Um presente bom como você"
- No Other / Super Junior

"Amor: A caridade gerou a gratidão, a gratidão gerou o amor, o amor mudou duas vidas."
[Nós amamos porque Ele nos amou primeiro. - 1 João 4:19] - by: Pâms

The End...




Nota da autora:
[Postada de 08.2017 - 07.2018]
Hello... Finalmente terminou nossa continuação do Conto do dias dos namorados, vimos a vida dos recém-casados cheia de descobertas e segredos revelados. NOVIDADES!!! Ando bastante in love com o século XIX, então decidi que em breve escreverei a sequência de BatB, contando as aventuras dos gêmeos Dimitri e Simon, além de descobrir um pouco mais sobre a história de Jenie e do pequeno Will. Espero que tenham gostado, me desculpem qualquer erro de gramática ou betagem, não desistam de mim, kkkk...
Críticas e elogios sempre serão bem-vindos! Bjinhos...
By: Pâms!!!!
Jesus bless you!!!




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