Finalizada em ou Última atualização: 04/01/2022

Copa do Mundo

Moscow, verão de 2018

Há quem diga que o xadrez surgiu na Europa, no período do renascimento. Outros, que foi originado na Índia e depois se espalhou pelos outros países. Para mim, o berço do meu jogo favorito é a Rússia. O que me deixava ainda mais animada pela ideia da Copa do Mundo da FIFA de 2018 ser neste país. Não pelo esporte, pois não tinha tanta afinidade assim com o futebol, quanto tenho pelo vôlei. Contudo, era a minha oportunidade de aproveitar a ocasião, então faria um pequeno intercâmbio na temporada do evento, parcialmente bancado pela minha poupança, orgulhosamente economizada durante meu ensino médio. Como também, graças aos meus dois últimos anos de competição, eu tive alguns créditos com a embaixada brasileira por uma representatividade positiva do Brasil, me gerando a hospedagem gratuita no prédio da embaixada na capital russa.

Agora com 18 anos, não tinha empecilhos para viajar, exigindo a presença de um adulto responsável. E já até morava sozinha em outro estado, por causa da minha universidade. Por mais que o xadrez fosse razoavelmente rentável, meus pais não me deram paz até eu escolher uma profissão mais concreta e sólida para seguir. Não que eles tivessem concordado de imediato com a minha escolha por design gráfico, mas era isso ou nada. Com direito a uma vaga na Escola de Design da UEMG.

— Bom dia, Moscow!!! — disse num tom empolgado, ao abrir as cortinas do quarto em que estava hospedada.

Sendo verão no hemisfério norte, o sol estava pleno ao entrar pela janela do quarto, em conjunto com um toque de frescor proporcionado pelo jardim da fachada. Fiquei por alguns minutos debruçada na sacada olhando o movimento dos carros na rua, o país estava completamente colorido não somente pela natureza, como também por algumas bandeiras dos turistas devido a Copa. Eu me lembrava nitidamente a última competição esportiva que acompanhei, foi um marco na minha vida ter sido voluntária do Jogos Olímpicos Rio 2016.

— Alô?! — disse ao atender o telefone, numa chamada internacional — Mãe?! Por que está me ligando? Nos falamos ontem à noite.
— Oi querida, que bom que está acordada, quero te pedir um favor já que está aí na Rússia. — disse ela, com seu tom meloso de quem queria o impossível — Esqueci de falar ontem.
— O que você quer, mãe? — indaguei meu receosa — Eu já disse que vou te levar presente.
— Bem, eu troco esse presente russo, por um autógrafo do Neymar. — pediu ela, me fazendo rir de nervoso.
— A senhora está brincando né? — eu fiquei em reação, apenas tentando assimilar seu pedido.
— Claro que não. — disse ela, com um tom sério também — Você está na Rússia, ele está na Rússia, ele te conhece por causa daquele jogador famoso de vôlei, é só pedir um autógrafo.
— Mãe?! — eu respirei fundo — Não vou usar minha mínima amizade com o Bruninho para te conseguir um autógrafo do Neymar.
— Nossa, mas nem pra isso esse xadrez me serve. — ela resmungou.
— O que o meu xadrez tem a ver com isso? — indaguei ela, confusa.
— Foi ele que te fez conhecer o jogador de vôlei e agora te levou pra Rússia. — explicou ela, num tom chateado.
— Ok, mãe, eu vou tentar, não prometo nada. — disse a ela.

Minha mãe era um tanto na defensiva quando o assunto era o xadrez, nunca me impôs limites, mas também nunca me apoiou cem por cento como meu pai e o tio Giovanni. Porém, ao seu modo, sempre torcia pelo meu sucesso e vibrava com as minhas vitórias, principalmente contra os irmãos Koblova. E agora, eu tinha uma missão, conseguir o tal autógrafo. Eu estava na Rússia. Ok! Mas não era pela copa, apenas aproveitei o momento e a oferta das passagens de um amigo de um amigo que desistiu de ir na última hora. 

— Ah… — disse bufando de leve, assim que encerrei a ligação — E agora? O que eu faço?

Me espreguicei um pouco e caminhei até o closet, onde deixei minhas malas. Como ficaria apenas cinco dias, havia retirado apenas as peças que possivelmente mais usaria. Ao trocar de roupa, vesti uma jardineira de jeans com uma blusa branca por dentro, all star preto, minha bolsa transversal e um coque frouxo. Após um ano deixando meu cabelo curto, resolvi deixá-lo crescer mais um pouco e agora estava tentando lidar com isso.

Saí do quarto tentando me animar com o dia, e já bolar uma estratégia para conseguir um ingresso do próximo jogo do Brasil. Pelo que sabia, estávamos na segunda semana da copa, em meio a rodada de grupos. Seria difícil? Sim, e muito. Retirei os fones do bolso, coloquei no ouvido e dei o play na playlist do BTS que uma amiga tinha me indicado a ouvir, estava abrindo meu coração para as músicas coreanas, assim como me abri para os animes japoneses.

I need you girl… — comecei a cantarolar a música enquanto eu descia alguns lances da escada principal da área leste do prédio, onde ficavam os quartos. 

Seguindo pelo corredor, cheguei ao jardim lateral onde era servido o café da manhã. Nada mais convidativo para aquele momento, que a beleza da natureza à minha volta, respirar ar puro e sentir o aroma do café torrado na hora. E sim, a cozinheira era brasileira de raiz mineira e tinha seus talentos na cozinha.

?! — de repente eu ouvi uma voz me chamar ao longe.

Não tão longe assim, pois o volume estava alto. Assim que retirei os fones do ouvido e me virei, a pessoa que eu menos esperava ver na minha vida, estava diante de mim, e desta vez não se tratava dos irmãos Koblova.

? — eu estava muito surpresa, principalmente por sua aparência ter continuado a mesma.

Aquele cabelo charmoso caindo nos olhos e o sorriso fofo e atraente. Fonseca era o que chamamos de garoto dos sonhos. O aluno mais popular do Colégio Particular Vincente Brigadeiro, nos meus anos do ensino médio, havia se mudado na metade do terceiro ano para treinar na categoria de base do Santos. Depois disso, nunca mais ouvi falar dele, por motivos óbvios de não me interessar pelo esporte. Mas olhando-o ali, naquele mesmo jardim que eu, havia ficado curiosa.

— Você se lembra de mim?! — ele perguntou meio confuso e com um sorriso bobo.
— Sempre vou me lembrar de cada pessoa pra quem passei cola nas provas. — respondi com naturalidade.
— Realmente, você me salvou só o ensino médio todo, senti muito quando me mudei. — brincou ele.
— Você era o único garoto do grupinho dos populares que falava comigo, mas também, sempre fui a louca do xadrez. — brinquei de volta, fazendo-o rir.
— Era o que eu achava mais legal em você. — contou ele, com um olhar mais profundo — Principalmente quando encarava o tabuleiro nos intervalos, jogando sozinha.
— Ah… — eu ri meio sem envergonhada por suas palavras — Mas, o que está fazendo aqui?
— Acredite ou não, fui convocado para seleção. — contou ele, sua conquista profissional, me deixando boquiaberta — Não sou um titular, mas só de estar na lista para mim é uma honra, se eu jogar meia partida, já terei zerado a vida.
— Que legal. — disse ainda surpresa — Meus parabéns… Depois que você se mudou com sua família, ninguém não teve mais notícias suas. 
— Pois é. — ele coçou a cabeça, meio envergonhado — Não sou tão famoso no futebol quanto era na escola.
— Mas é o suficiente para ser convocado. — retruquei com positividade.
— Verdade. — concordou agora dando um sorriso cativante — Você está hospedada aqui?
— Sim, méritos do xadrez. — assenti.
— Imaginei, eu vi algumas coisas sobre você e suas vitórias memoráveis. — contou ele, me deixando mais surpresa ainda.
— Você acompanha o xadrez? — indaguei curiosa.
— Acompanho as conquistas da garota do xadrez. — respondeu ele, relembrando a forma em que ele me apelidava.

De forma espontânea eu sorri meio tímida e feliz, por saber sobre aquilo. Pois, naquela época eu era a única garota da escola a jogar um esporte composto pela maioria sendo homens, assim como também não me interessava tanto pelos assuntos do universo feminino gerado a esmalte, maquiagem e passeios no shopping. As únicas amigas que conquistei foram Bruna e Olívia, após conhecê-las nos campeonatos de xadrez feminino na adolescência. No ensino médio, eu mediava meus gostos e hobbies em xadrez, assistir animes e ler revistas em russo, o que certamente aumentava minha fama de esquisita.

— Agora você me deixou sem palavras. — confessei ainda tímida.
— Que tal um café? Nada melhor que a comida para retornar as palavras. — brincou ele, me fazendo rir.

Assim de imediato e nos aproximamos da mesa em que o café estava servido, para montar nosso prato. Como meu segundo dia ali, decidi que cada manhã comeria uma coisa diferente, então coloquei um pedaço de broa de fubá no prato, com dois pães de queijo, e uma bisnaguinha doce com patê de frango dentro acompanhando do meu irresistível copo de café com leite. já tinha alimentação regulada e controlada pelos nutricionistas do Juventus, time italiano em que jogava.

— E como está sendo você morando fora do país? — perguntei a ele, ao sentarmos à mesa.
— É legal, tirando os momentos em que sinto falta de casa. — contou ele, com um olhar meio caído — Pelo menos tenho o Boris para me consolar.
— Quem é Boris? — perguntei curiosa.
— Meu cachorro, pastor alemão. — disse ele, ao tomar um gole do seu suco de laranja — Ainda é filhote, mal acabei de ganhar e já tive que deixá-lo em casa para trabalhar.
— Que pai desnaturado, poderia ter trago ele. — brinquei rindo.
— Esse lugar já estaria abaixo. — disse ele, em risos também — Você veio para ver a copa? Ou para o torneio não oficial?
— Torneio não oficial?! — essa era nova — Não estou sabendo de nada.
— Alguns jogadores aposentados organizaram um torneio para essa semana, em comemoração a Copa. — revelou ele, com o olhar confuso — Achei que estivesse aqui por isso.
— Na verdade, eu meio que inventei um intercâmbio para cá apenas para passeio, mas agora que sei disso, me passa a ficha completa e o endereço. — pedi de imediato.

Alguém para jogar comigo. Tô salva.

— Claro, te passo sim. — assentiu ele — Eu até me arriscaria a ir com você, mas uma eu tenho obrigações com a seleção, e duas, eu não sei jogar.
— A primeira não posso te ajudar, mas posso te ensinar a jogar. — disse com um sorriso nebuloso no canto do rosto, ao remexer minha bolsa e retirar meu mini tabuleiro.
— Você ainda tem isso? — ele o reconheceu — Uau, é o mesmo do ensino médio.
— Sim. — assenti rindo baixo — E ainda tem o seu muito obrigado escrito aqui embaixo, eu não apaguei.
— Que bom, agora fiquei mais animado em aprender com você. — ele manteve o olhar sereno com um sorriso de canto — Se lembra quando escrevi isso?
— Claro, terceiro bimestre no segundo ano, te fiz passar em matemática. — afirmei orgulhosa do meu feito — Nunca fiz tanta prova diferente na minha vida de uma única matéria no mesmo dia.
— Sempre foi boa com algoritmos, salvou a sala toda. — ele manteve seu olhar fixo em mim — E sendo honesto, acho que nunca vou conseguir te pagar por todas as provas que me ajudou.
— Talvez você possa… — disse ao refletir a situação e já me lembrar da promessa de um autógrafo.

Se foi o destino que fez minha vida esbarrar em novamente, eu não sei, mas estava feliz por vê-lo, feliz por saber sobre o fato dele acompanhar minhas conquistas e querer aprender a jogar, e mais ainda…

Suas palavras, por ainda estar em dívida comigo, me renderia aquele autógrafo.

I'm into that, I'm good to go
I'm diamond, you know I glow up.
- Dynamite / BTS

Coragem: A única forma de vencer é nunca desistindo.” - Pâms



FIM?!



Nota da autora:
Bom dia gente. Olha eu aqui no desafio de novo, aos 45 do segundo tempo, achando que já tinha acabado nas olimpíadas. Espero que tenham gostado, em breve mais.
Bjinhos...
By: Pâms!!!!
Jesus bless you!!!




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