Última atualização: 07/07/2019

Spotlight

Após sete anos longe de casa, eu não me imaginava voltando para a cidade de Austin no Texas agora, não nessas circunstâncias, porém a necessidade faz oportunidade e estava mesmo sentindo que deveria tirar umas férias merecidas. Não queria mais ocupar minha cabeça com tantos problemas, menos ainda com paparazzi e a mídia querendo saber sobre minha vida privada.

Tudo culpa do Josh.

— Ainda não entendo o motivo de estar tão preocupada Clair. — voltei meu olhar para minha assessora de imprensa — Nós duas sabemos que meu suposto romance com o Josh era puro marketing.
— Eu sei que você está bem com esse término conturbado, mas querendo ou não as idiotices que ele vem fazendo pode respingar em sua carreira. — ela parecia ainda mais preocupada que meu empresário.
— Não vai, e se mais uma revista ou site de notícia ligar, diga que como sempre não falarei sobre minha vida pessoal. — me virei novamente para minha cama e comecei a revirar minha bolsa procurando o celular — Já desativei algumas redes sociais, a única coisa que quero funcionando é meu site, em breve começaremos a promoção do meu novo filme e…
— Como está minha atriz favorita? — perguntou Dimitri, ao adentrar meu quarto — Está pronta para voltar para casa?
— Sim. — respondi.

Dimitri era um homem sensato e mesmo em casos extremos, sempre concordava comigo, era um sonho de empresário, além de pai de família, muito honesto e gentil. Já Clair era a assessora de imprensa mais estressada que eu conhecia, sempre preocupada com minha imagem e com a opinião pública sobre mim.

Como se eu me preocupasse.

Dei mais algumas recomendações para Clair, principalmente o ponto em que ninguém deveria saber para onde eu estava indo, para todos os efeitos, minhas férias seria em um resort nas Bahamas. Dimitri concordava comigo, seria bom para minha mente ficar longe de todos os holofotes e especulações sobre meu rompimento com Josh, afinal, agora a vida do meu ex-namorado era problema só do mesmo.

- x -

— Minha querida! — disse minha mãe, assim que eu desci do carro em frente à casa principal da fazenda.
— Oi mãe. — a observei descendo os três degraus e vindo ao meu encontro.

Ela me abraçou forte e calorosamente.
Parecia que não me via há séculos, mas ela sempre foi assim comigo, atenciosa e carinhosa.

— Ah querida, estava com tanta saudade. — ela me olhou com brilho nos olhos — Quando o senhor Fox disse que passaria um tempo em casa, meu coração pulou.
— Calma mãe. — ri baixo dela — Eu também estava com saudade, mas a senhora me viu mês passado.
— Sua ingrata. — ela deu um tapa forte em meu braço.
— Ai mãe. — reclamei.
— Saudade de mãe é diferente. — reclamou ela — Agora venha, eu fiz um bolo de milho para sua chegada, receita da vovó Somália.
— Bolo era tudo que eu mais queria. — assenti a acompanhando.
— Steve, por favor, leve as malas para o quarto dela. — ordenou minha mãe ao funcionário que havia me buscado no aeroporto particular.

Assim que entramos na casa, uma sensação de nostalgia me invadiu por completo. Lembranças da minha infância, misturadas a parte da adolescência foram surgindo em minha mente, eu estava realmente de volta ao lar.

— Onde estão todos? Essa casa está muito vazia. — reclamei ao perceber o silêncio dos cômodos.

O que me lembrava de sete anos atrás era a casa cheia de amigos e música alta vindo do quarto de Freya. Minha irmã mais velha sempre foi fã das clássicas divas do pop, então a casa vivia ao som de Madonna, Toni Braxton, Celine Dion e Whitney Houston.

— Freya está de plantão no hospital, então só a veremos à noite. — explicou minha mãe retirando a forma de bolo no forno — Sua sobrinha está na escola, estamos na semana de provas, e está cuidando de alguns assuntos administrativos da fazenda.
?! — tossi de leve — Ele ainda trabalha aqui?!
— Claro que sim, quem mais ajudaria sua mãe a administrar tudo isso e gastar com sabedoria. — ela me olhou surpresa por minha pergunta — Além do mais, você sabe muito bem que ele prometeu ao seu pai que cuidaria da gente.
— Claro, ganhando 120 mil por ano, até eu trabalharia aqui. — retruquei de forma racional.
— Então é assim que você me vê? Como um mercenário? — a voz grossa e firme, que eu não ouvia há uns três anos veio da direção da porta.

Voltei meu olhar para sua direção, ele estava encostado na porta de braços cruzados me olhando também, um sorriso disfarçado no rosto, camisa xadrez e uma calça jeans desbotada com rasgos na região do joelho. Eu me lembrava vagamente daquela bota camurça surrada da última vez que o vi, dois meses após o enterro do meu pai.

era o que eu chamava de passado mal resolvido.
Quando saí de casa para seguir meu sonho de ser atriz, ele foi o primeiro a me apoiar, mesmo sabendo que a distância nos afastaria. Eu tinha 14 anos naquela época e uma oferta de ter um pequeno papel em Genie, um seriado famoso daquele ano. Foi a oportunidade que a vida me deu para conquistar o público e obter mais papeis notórios na televisão, até chegar o meu primeiro filme de comédia romântica: Photobook. Algo que me rendeu prêmios como o Oscar de melhor atriz principal.

Mas foi este meu sonho e o sucesso inesperado em minha carreira que garantiu o pagamento das dívidas da fazenda, que vinham se arrastando desde quando meu avô era vivo. Eu não imaginava que poderia dever por tantos anos uma hipoteca. Mas enfim, ali estava eu, novamente em casa, olhando para a pessoa que mais me deu forças para me mudar para Manhattan.

— Vamos combinar que 10 mil dólares por mês é um salário tentador. — retruquei lançando um sorriso sapeca.
— Bem-vinda ao lar. — ele se afastou da porta, adentrando a cozinha — Senhora Penny…
— Já disse para me chamar de tia Penny. — minha mãe o repreendeu como sempre — Eu e sua mãe somos amigas e eu a ajudei a te criar.
— Eu trabalho para a senhora, não acha que fica estranho? Para os outros funcionários? — questionou ele.
— Os outros funcionários não são da família. — ela colocou a mão na cintura e o olhou séria.
— Tudo bem, tia Penny. — ele riu baixo.
— Comem com moderação os dois, eu vou levar esses pedaços para o John, e quando voltar nos falamos. — ordenou ela pegando um prato coberto com uma toalhinha floral.
— Eu acabei de chegar e a senhora vai sair? — reclamei.
— Já volto, tenho que levar para ele enquanto ainda está quente. — ela saiu pela porta dos fundos que dava para o jardim de trás da casa.

Ficamos em silêncio por alguns segundos, até que me moveu e pegou um pedaço do bolo.

— Tia Penny… — eu ri da cara dele, então me aproximei e peguei o pedaço que estava em sua mão — Você ainda reluta em não chamá-la assim?
— Aish. — ele fez uma careta — Esse pedaço era meu sua folgada.
— O bolo foi feito para minha chegada, então o primeiro pedaço é meu. — retruquei mordiscando a beirada do pedaço.
— Teoricamente o primeiro pedaço foi naquele prato para o senhor John. — ele segurou de leve em minha mão e deu uma mordida grande no pedaço.
— Ei! — reclamei.
— Agora sim. — ele sorriu de canto.

Nos olhamos mais um pouco, até que senti que deveria desviar meu olhar para outro lado. Ele também pareceu ficar sem graça. Talvez por estarmos tentando agir como no passado.

— Você sabe como anda esse namoro disfarçado da minha mãe com o velho John? — perguntei curiosa.
— Eles não costumam falar muito sobre isso. — ele riu — Mas já tive o prazer de pegá-los agarrados em alguns lugares da fazenda.
— Eu não acredito que minha mãe está agindo como uma colegial. — ri junto.
— Eles se gostam, então, acho que vai dar certo. — ele soltou um suspiro alto — Sempre dá certo quando tem que dar.
— Além de fazendeiro também é filósofo. — brinquei com ironia.
— E você?
— Eu o que?
— Como está? — perguntou.
— Bem, terei dois meses de férias, então, estou muito bem. — respondi, voltando meu olhar para ele.
— Não foi exatamente isso que quis perguntar. — ele engoliu seco.
— Eu estou bem, é só isso que importa. — eu peguei outro pedaço do bolo e saí da cozinha.

Tinha a plena certeza que ele estava falando sobre meu termino com o Josh e tudo mais que envolvia o assunto. Subi para meu quarto ainda me deliciando do bolo de milho. Outro choque de nostalgia veio assim que meus olhos viram a colcha de retalhos em cima da minha cama. Minha mãe sabia mesmo como me deixar assim. Estava tudo em seu devido lugar, do jeito que eu havia deixado sete anos atrás, meu livros nas duas prateleiras ao lado da porta, a escrivaninha ao lado da janela, a cama na outra lateral do quarto.

— Bem-vinda ao lar, . — sussurrei para mim mesma.

As horas se passaram comigo tendo inúmeras reflexões sozinha no jardim dos fundos. Ao final da tarde…

— Tia ! — Margareth desceu do carro e veio correndo em minha direção e me abraçou.
— Pequena! — retribui o abraço, sorrindo olhei para minha irmã — Boa tarde, Freya.
— Oi miss Texas. — disse ela, com aquele apelido que adorava me batizar — Chegou quando?
— Hoje pela manhã. — respondi — Estava caminhando um pouco pelo jardim.
— E pensando na vida, acho que todo mundo que vem aqui faz isso nesse jardim. — ela riu — Vamos entrar que estou morrendo de cansaço, e você mocinha direto para o banho.
— Mas mãe, eu quero ficar com a tia . — reclamou Marg.
— Depois do banho. — reforçou Freya.

Eu as acompanhei rindo da cara emburrada de Margareth. Não sabia muito sobre a vida amorosa de minha irmã, lembro que quando saí de casa, Margareth estava fazendo um ano. Foi um ano conturbado para nossa família, principalmente pelo ex-namorado de Freya, tê-la deixado para ir para faculdade.

Eu nunca fui com a cara de Carl, mas depois daquela atitude, só piorou meu conceito sobre ele. Mas estava satisfeita por pelo menos não ter abandonado cem por cento a filha.

- x -

Toc… Toc… Posso entrar? — disse Freya da porta do meu quarto.
— Sim.

Ela entrou e fechou a porta.

— Pode até tentar esconder, mas todo mundo sabe o motivo de voltar para casa. — direta e precisa como sempre.
— Freya, eu sinceramente não quero falar sobre isso. — suspirei fraco — Estou cansada pela viagem e por brincar com Marg após o jantar, preciso dormir.
— Você não vai fugir dessa conversa. — disse ela.
— Eu quero fugir dessa conversa, preciso. — a olhei com sinceridade — Não se preocupe que eu estou muito bem com relação a isso.
— Tem certeza?
— Sim, eu conversei com a mamãe pouco antes do jantar, só quero um tempo de paz e uma rotina normal.
— Rotina normal você não vai encontrar aqui.
— Ah não por favor, eu preciso.

Nós rimos.

— E o ?! — perguntou ela.
— O que tem ele?! — fiquei confusa.
— Tudo bem pra você, ele estar morando aqui?
— Como assim ele está morando aqui? Que história é essa?
— A mamãe não falou?!
— Não.

Certamente havia muita coisa que eu não sabia rolando naquela casa, e dois meses seria pouco tempo para saber sobre tudo, ou talvez não. Na manhã seguinte acordei bem cedo como de costume, eu odiava quando isso acontecia comigo, mas já estava acostumada a dormir pouco e trabalhar muito. Era final de outono, e estranhamente o nascer do dia estava com ares de frescor, saí do quarto me espreguiçando, ainda com o pijama lilás de bolinhas brancas que havia encontrado no fundo do guarda-roupa.

— Olha, a cinderela acorda cedo. — disse assim que entrei na cozinha.

Ele estava encostado na bancada da pia, com um xícara de café na mão e sem camisa. Por que?

— Você acha que artistas acordam meio dia e ganham um milhão por mês? — senti um leve tom irônico da minha voz — E você não tem camisa não?
— Derrubei café na que estava em meu corpo. — respondeu tranquilamente me olhando, parecia segurar o riso — Está servida?
— Eu não…
— Bebe café. — completou ele antes de mim — Eu fiz chá de camomila, está na garrafa vermelha.
— Obrigado. — caminhei até a mesa e peguei a xícara, despejei um pouco do chá nela e adocei com açúcar mascavo que estava em um pote branco.

Ele permaneceu em silêncio me observando.

— Estou impressionada que ainda lembre. — comentei.
— Existem coisas que são difíceis de esquecer, principalmente quando tem um grande valor para nós. — explicou.
— Saber que eu odeio café tem valor para você?! — perguntei.
— Talvez, para você tem?! Soube que é uma das coisas mais importantes que alguém deve saber sobre você.
— Hum… Olha só quem andou lendo minhas entrevistas para a Vogue.
— Freya que comentou uma vez. — retrucou — Não preciso ler nada sobre você, eu já sei tudo que deveria saber.

Ele colocou a xícara na bancada e passou por mim seguindo para sala.
Fiquei estática? Sim. Sem reação? Também. Respirei fundo e me voltei para a porta, mamãe e Freya entraram na cozinha aos risos, estava torcendo para que os comentários maldosos não fossem sobre mim.

— Bom dia, miss Texas. — disse Freya indo se sentar na cadeira — Dormiu bem sob os macios lençóis de linho fino?

Ela e mamãe riram.

— Não tem graça nenhuma. — dei de ombros — Mas eu dormi bem sim, para ser honesta, assim que deitei na cama meu corpo se lembrou do colchão e desmaiei.
— Aff… — Freya me olhou com uma pontinha de inveja — Você sempre foi boa quando o assunto é dormir em qualquer lugar, que raiva.
— Desculpa irmãzinha se meu problema é acordar e não dormir! — ri da careta que ela fez.
— Ah vocês duas. — mamãe nos olhou — Sabia que eu estava sentindo falta dessas trocas de amores.
— Por favor mãe, não chore. — disse Freya servindo sua xícara com café.
— Não vou. — ela respirou fundo reprimindo as lágrimas — Hum… Parece que além do café, andou fazendo outras coisas.
— Ele se lembrou que odeio café. — expliquei.
— Isso te deixou surpresa?! — o olhar curioso da minha mãe me deu medo.
— Um pouco. — suspirei fraco.

Deixei elas na cozinha e fui para sala, Margareth estava descendo as escadas ainda sonolenta.

— Tia , onde está a mamãe? — perguntou ela esfregando seus olhos.
— Está na cozinha, vai lá tomar café. — eu bati de leve na bunda dela, rindo — E cuidado para não tropeçar.

Subi as escadas ainda rindo, e entrei em meu quarto. Caminhei até a janela, me encostando nela, olhei para o horizonte enquanto bebericava o chá. A vista era linda e o nascer do sol mais ainda, já não me aguentava mais de saudade daquele lugar, da minha família e talvez até de . Certamente lá no fundo eu tinha uma saudade incubada dele, mas não queria admitir.

— Cinderela. — disse ao bater na porta do quarto que deixei entreaberta.
— Entra. — me voltei para sua direção, ele já estava com uma camisa lisa azul marinho vestida no corpo.
— Estou indo até o estábulo, quer me acompanhar e ver como seu funcionário que ganha 10 mil por mês trabalha? — perguntou ele com um tom de ironia.
— Meu Deus, que garoto rancoroso. — eu ri dele.
— Não sou rancoroso, só estou repetindo suas palavras. — ele sorriu de forma presunçosa.
— Você já foi mais humilde. — retruquei fazendo bico.
— Agora eu ganho 120 mil por ano.
— Céus, que monstro eu criei. — o olhei impressionada.

Havia me esquecido esse seu lado.

— Me desculpe pelo comentário de ontem. — disse em rendição — Prometo não tocar mais no assunto. Ok?!
— Ok, cinderela.
— Mercenário.

Nós rimos.

— Me dê cinco minutos para trocar de roupa.
— Não demora. — ele saiu do quarto fechando a porta.
— Sem graça. — sussurrei rindo.

Não havia levado tanta roupa.
Pior, todas que estavam na mala eram de grifes famosas, ou seja, meu coração até doía ao imaginar elas sendo sujas ou surradas pela vida no campo. Abri novamente o guarda-roupa olhando as poucas peças que haviam sido deixadas para trás, seria estranho vesti-las novamente, mas se estava ali. Encontrei minha velha blusa dos Backstreet Boys, faziam tanto tempo que não os ouvia que até deu vontade, coloquei uma calça jeans com rasgos no joelho e o all star amarelo desbotado. Lembro-me que era o preferido para ir à escola.

— Que demora. — disse encostado na parede do corredor.
— Por que ficou parado aí me esperando? — perguntei enquanto prendia meu cabelo em um rabo de cavalo — Eu ainda sei onde fica o estábulo.
— Mal agradecida. — o tom de ofendido soou dele, que seguiu na frente.
— Desculpa. — falei num tom debochado, juro que tentei não soar assim — E obrigado por me esperar.

Ele deu um suspiro forte e permaneceu calado.
Prendi o riso e o segui até o estábulo. Pelo que me lembrava havia muita coisa nova e formada, o lado externo estava pintado de vermelho escuro com as portas e detalhes brancos. Vermelho era a cor favorita do papai. Do lado de dentro toda a madeira parecia ter sido tratada e envernizada, estava tudo organizado e bem limpo, já tinha dois funcionários cuidando dos animais e fazendo a manutenção do espaço.

— Fizemos a reforma no ano passado. — comentou seguindo em direção a uma das baias, logo acariciou uma vaca de pele malhada — Oi menina, como está nossa cria?
— Ficou bonito, a reforma foi bem feita. — tentei elogiar.

Ele voltou o olhar para mim.

— Isso foi um elogio?!
— Sim, foi um elogio. — confirmei para ele — E farei outro, parabéns, pelo que vejo está cuidando muito bem da fazenda do meu pai.
— Você chegou ontem, tem certeza das suas palavras? — ele riu.
— Eu sei que você faz um bom trabalho aqui.
— 120 mil por ano.
— Seu chato, eu ia dizer isso em segundos.

Nós dois rimos.

— Apesar de não ser minha, eu gosto de trabalhar aqui, cresci nesse lugar, sabe que amo o que faço. — seu olhar sincero parecia querer me despedaçar.
— Essa fazenda é tão sua quanto minha. — retruquei — Talvez mais sua que minha.
— Não é o que diz o testamento. — ele riu.
— Testamentos podem ser mudados.
— Está dizendo que vai compartilhar sua herança comigo.
— Não foram essas minhas palavras. — ri também — Então, quem é a moça?

Disse me referindo a vaca que ele acariciava, me aproximando.

— Você se lembra da Tulipa?! — perguntou ele.
— Não acredito, desse tamanho e já é mamãe. — abri um largo sorriso voltando meu olhar para a vaca — Tulipa, não acredito que cresceu tanto.

Toquei em seu rosto de leve e espichei o pescoço para ver o pequeno bezerro que se alimentava do leite da mãe.

— Já deram um nome para ele? — perguntei curiosa.
— Ainda não, sua mãe disse para esperar você escolher.
— Eu? Que honra. — me alegrei — Hum… Que tal .

Brinquei.

— Engraçadinha.
— Desculpa, não podia perder a piada. — ri — Acho que pode ser Algodão.
— Algodão?! Por favor, você já foi mais criativa.
— Eu ia falar Bambi, mas né… Não dá, direitos autorais. — retruquei.
— Escolhe logo.
— Yah, seu chato, pare de me apressar, senão eu deixo .

Ele me olhou sério.

— Que tal Cookie? Você gosta de cookies. — sugeriu ele.
— Gostei. — sorri de leve — Então o nome desse mocinho será Cookie.

Eu voltei meu olhar para o pequeno bezerro, mas consegui notar que mantinha seu olhar em mim. Ficamos mais algum tempo ali, com ele me mostrando detalhadamente tudo que havia sido reformado, e nitidamente eu via seus olhos brilhando.

— Uau, para quem não está acostumada, você ainda leva jeito com a ordenha. — disse ele.
— Eu cresci fazendo isso, se lembra? — retruquei.

Ele logo foi pegando os dois baldes que tiramos de Lavanda, Azaléia, Camélia e Catléia, nossas outras vacas que também possuíam nomes de flores.

— Quer ajuda? — me ofereci.
— Não precisa, já estou acostumado com isso. — respondeu seguindo para o portão.

Eu o acompanhei até chegar do lado de fora e ver Margareth brincando no pequeno lago com os patos, caminhei até ela e agachei ao seu lado.

— O que está aprontando mocinha? Tomou seu café?
— Sim tia . — ela sorriu sapeca e voltou seu olhar para o filhote de pato — Agora estou brincando com o Kiko.
— Hum… Oi Kiko. — disse ao patinho — E onde está a mãe dele?
— Com os outros filhotes ali na frente. — Marg apontou.
— E você não foi a aula hoje, por que? — perguntei.
— Tia, hoje é sábado. — respondeu ela.
— Ah, verdade.

Acabei de chegar e já perdi a percepção do tempo. Pensei comigo.

— E por que acordou tão cedo?! — perguntei a ela.
— Vou passar o final de semana com o papai. — respondeu ela.
— Ele vai vim aqui te buscar?!
— Sim.

Não demorou muito tempo até que uma caminhonete parasse em frente à casa e dela saísse Carl acompanhado de uma mulher. Eu avisei a Marg e juntas seguimos até lá.

. — disse Carl surpreso ao me ver.
— Papai. — Margareth o abraçou.
— Oi querida. — ele retribuiu o abraço.
— Bom dia Carl. — o cumprimentei, desviando meu olhar para a mulher ao seu lado.
— Bem, esta é minha noiva. — apresentou ele — Hilary.
— Prazer, eu te vejo na tv, nunca imaginei que a conheceria pessoalmente. — disse ela.
— Ah, bem, aqui estou eu. — sorri meio sem graça — Só peço que não conte a ninguém que estou aqui no meu refúgio particular.
— Então é assim que você chama a sua casa? — reclamou minha mãe descendo os degraus da varanda.

Eu dei um sorriso e pisquei para ela, então me despedi de Margareth e entrei dentro de casa, Freya passou por mim na porta, consegui observar em seu rosto que não estava confortável com a ideia de Marg ir com o pai.

— Ah!!! — me espreguicei de leve seguindo em direção a cozinha.

Minha mãe já estava preparando o almoço, tão cedo. Pouco antes de sentar na cadeira para esperá-la, me lembrei que havia deixado meu celular debaixo do travesseiro. Voltei para o quarto e chequei as inúmeras mensagens de Clair no whatsapp, ela queria saber sobre meu primeiro dia em casa e se eu precisava de algo. Lhe enviei outra mensagem para tranquilizá-la e garantir que estava tudo bem.

Os dias foram se passando lentamente.
Eu tentava seguir o ritmo da vida no campo, algo que me fazia lembrar de uma personagem que tinha feito em um filme para a Netflix, chamado Spotlight. Logo após o almoço eu cismei de dar uma volta pelos arredores da fazenda, como a enfermeira Freya estava no hospital de plantão e minha mãe na casa de uma amiga com Margareth. Não quis incomodar que parecia ocupado analisando alguns documentos e muitas faturas no escritório.

O céu estava razoavelmente nublado naquele dia, não tinha previsão de chuva, por isso não me preocupei com proteção, somente peguei uma blusa de tricô, pois ventava um pouco. Já no final da tarde, percebi que estava meio longe da trilha que costumava pegar para chegar a clareira. E dava para piorar? Claro que dava, pela primeira vez eu estava perdida, tanto tempo longe de casa que nem me lembrava mais de alguns detalhes daquela área.

Foi o som de um forte trovão, que fez com que meu corpo congelasse, me fazendo ficar em estado de choque.

! ! — a voz de me despertou.

Seu rosto diante de mim me fez assustar, como ele havia chegado ali?!

está tudo bem? — seu olhar preocupado fixado em mim.
— Não, eu não consigo me mover. — disse sentindo agora as gotas de chuva cair em meu rosto.
— Temos que sair da clareia, estamos expostos. — ele segurou em minha mão.
— Não. — me retrai um pouco.
— Confie em mim, vai ficar tudo bem.

Por um breve momento senti segurança em suas palavras.
Eu não sabia o quão longe estávamos da fazenda, não até chegarmos na trilha e eu ver sua caminhonete. Assim que entramos ele deu a partida, poucos metros depois ela atolou na lama, o fazendo sair novamente para o lado de fora. Outro som de trovão me fez ficar ainda mais em pânico.

— Não podemos ficar aqui. — disse ele abrindo a porta do meu lado.
— Eu não vou sair daqui. — sussurrei.
— Eu conheço essa região, tem uma velha cabana aqui perto, era do clube das escoteiras, mas está abandonada agora. — ele olhou para trás, observando as árvores balançando devido à forte ventania.
— Eu não vou sair daqui. — disse mais alto — Não vou.
— Não vou te deixar sozinha no meio da trilha e não podemos ficar aqui, estamos vulneráveis.

sabia do medo, ou melhor, pavor que eu tinha de trovões, relâmpagos e tudo que a chuva trazia consigo. Ele me olhou com carinho e vindo para me abraçar, aproveitou a deixa e me pegou no colo.

— Fecha os olhos e confie em mim. — sussurrou ele em meu ouvido.

Assenti fechando os olhos e me agarrei em sua jaqueta.
Contei os minutos até que finalmente chegamos na tal cabana e entramos. Ele me colocou sentada em uma poltrona e retirou sua jaqueta para me entregar.

— Você está molhada demais, tem que tirar pelo menos essa blusa. — disse ele se voltando para a porta.
— Aonde você vai?! — perguntei pegando em sua mão.
— Preciso voltar para a caminhonete, não vou demorar.

Assenti mesmo com medo de ficar sozinha no meio daquela tempestade. Não demorou muito, até que ele voltou com uma sacola nas mãos, eu já estava vestida com sua jaqueta e havia deixado minha blusa pendurada no encosto de uma cadeira.

— Viu, eu disse que não demoraria. — ele sorriu e deixou a sacola no chão.
— O que vamos fazer? — perguntei.
— Esperar a chuva passar. — respondeu ele, enquanto vasculhava o lugar.
— O que tanto procura?
— Madeira seca, para acender a lareira. — respondeu.

Não tinha nada nos armários, nem ao lado dos móveis, ele foi encontrar a madeira em um alçapão escondido embaixo da poltrona. Assim que ele acendeu a velha lareira, empurrou a poltrona para frente e me mandou sentar nela. Antes que eu me movesse, um raio caiu próximo a cabana, nos dando a oportunidade de ver o clarão formado.

— AHHHHH!!! — soltei um grito, me encolhendo.
— Calma, eu estou aqui. — me abraçou forte.

Aquele era o abraço do qual eu me lembrava. Me fazia sentir segura e confortável. Após tantos anos eu não havia superado o meu medo da chuva, mas estava aliviada que era ele ali, me abraçando.

— Você também está molhado. — sussurrei.
— Não se preocupe comigo. — disse ele.
— Claro que vou me preocupar com você. — o olhei séria.

Ele sorriu de canto e retirou a camisa molhada.
Então abriu o zíper da sua jaqueta que estava em meu corpo e retirou, me deixando apenas com meu sutiã, então vestindo-a logo depois, sentou na poltrona e me lançou um olhar sugestivo.

— Não está pensando que…
— Pare de forçar sua mente e vem logo, nós dois sabemos que calor humano aquece mais rápido. — explicou ele.

Outro estrondo de trovão soou, me fazendo me sentar rapidamente entre suas pernas.

— Não pense que fiz isso por… Foi o barulho. — expliquei com ele rindo de mim — E não vai achando que pode tirar proveito da situação.
— Por quem você me toma?! — ele se fez de ofendido — Não sou tão mercenário assim.

Ri baixo mantendo meu olhar no fogo que ardia na lareira, sentindo o calor do seu corpo, meu coração foi acelerando gradativamente, assim como os pêlos do meu corpo arrepiando-se. Talvez fosse eu a me aproveitar da situação naquela noite, me aninhei em teus braços e fechei os olhos, assim que ele começou a acariciar meus cabelos.

— Me lembro da primeira vez que te vi. — comentou ele — Em um dia de chuva, você se escondeu debaixo da mesa.
— Eu era uma criança boba… E continuo sendo boba.
— Eu não acho, você apenas precisava de alguém para estar ao seu lado. — ele suspirou.
— Como agora. — completei — Você também ficou ao meu lado debaixo daquela mesa.
— Me perguntou como você consegue gravar cenas debaixo da chuva.
— Simples, não há barulho no estúdio, somente a água. — expliquei.

As horas se passaram bem devagar.
Tanto que adormeci em seus braços, no início da manhã a chuva havia cessado, deixando uma densa neblina.

— Acho que já podemos ir para casa. — disse ele vestindo sua camisa já seca.
— Mesmo com a neblina? — perguntei enquanto ajustava minha blusa em meu corpo, estava quentinha por causa do calor da lareira.
— Você quer esperar?! — ele me olhou.
— Se for mais seguro, prefiro esperar. — respondi — A menos que queira voltar rápido, porque minha companhia é desagradável.
— Deixe de bobagens, sua companhia jamais foi desagradável. — ele sorriu.
— Obrigado. — eu o abracei em um impulso louco vindo de mim — Por vir atrás de mim e tudo mais.
— Não precisa agradecer. — ele envolveu seus braços em minha cintura, retribuindo o abraço — Eu prometi ao seu pai que a protegeria.
— Você prometeu que protegeria minha família. — me afastei de leve e o olhei.
— Você faz parte da família.

Faz sentido.
Quanto mais nos olhávamos, mais meu coração acelerava. Eu ainda sentia algo por , e visivelmente ele também sentia por mim. Mas será que valia a pena remexer em algo que estava aparentemente ajustado? Ele acariciou minha face e sorriu.

— O que foi? — perguntei.
— Por que você faz isso comigo?!
— Isso que? — confusa eu estava.
— Vai embora e agora volta agindo como se estivesse tudo bem entre nós. — respondeu ele.
— E não está?! — questionei.
— Você realmente não imagina o que está causando em mim.

Em um piscar de olhos me beijou com intensidade.
Todas as vastas lembranças de nós dois juntos no passado invadiram minha mente, eu já não sabia mais o que estava acontecendo comigo, só queria parar o tempo e não voltar para fazenda. Ele parecia querer o mesmo, envolvendo-me ainda mais em seus braços, e isso durou alguns minutos até que voltamos a realidade.

— Me desculpe. — disse ele se afastando de mim, como se tivesse cometido o maior crime da vida — Eu não deveria ter feito isso.
— Calma, está tudo bem. — eu falei retomando o fôlego — , foi só um beijo, eu não vou te processar por isso.

Brinquei.

— Não é isso, eu… — ele respirou fundo — Acho melhor voltarmos.

Eu não quis argumentar, para ser honesta, só queria manter o gosto do beijo dele por mais tempo em minha boca. Devo admitir que era o que mais sentia falta, do amor de .

- x -

, graças a Deus voltaram. — disse minha mãe assim que entramos em casa — Fiquei preocupada com você assim que a chuva começou.
— Está tudo bem agora. — respondi num tom baixo.

Voltei meu rosto para uma mulher desconhecida, parada ao lado de Freya.

— Nos abrigamos na antiga cabana dos escoteiros, ficamos lá até agora, quando a chuva parou. — explicou .
— Que bom que tudo saiu bem. — a mulher caminhou até ele e lhe abraçou — Temi pelo pior meu amor.

Meu amor?! Senti um nó na garganta.

— Hum. — me olhou — , esta é minha namorada, Taylor.
— Futura noiva, só falta ele fazer o pedido oficial. — completou a mulher.
— Taylor. — respirei fundo, tentando processar a informação.
— É um prazer conhecê-la. — a mulher sorriu para mim.
— Queria poder dizer o mesmo. — me mantive serena por fora, com um daqueles sorrisos falsos que projetava em muitos papeis que atuei.

Desviei meu olhar para , que parecia ainda mais desconfortável com a situação e minha reação aparentemente boa, o que explica seu arrependimento em ter me beijado na cabana. A quanto tempo ele estava com outra mulher? E porque não havia me contado?

— Taylor, você ficará para o almoço? — perguntou minha mãe, certamente por educação.
— Não, hoje infelizmente não, eu tenho que resolver os últimos preparativos para o festival da folha seca, eu fiquei responsável este ano. — explicou ela.
— Quer que eu te leve? — perguntou .
— Claro, se não tiver muito cansado. — respondeu a ele acariciando seus cabelos — Minha mãe queria mesmo falar com você sobre aquele assunto.

Fingi não me importar com eles e fui para cozinha, estava mesmo com fome e já planejando em não participar do almoço em família, não hoje.

. — a voz de Freya soou atrás de mim, ao entrar na cozinha.
— Eu estou bem, se é isso que lhe preocupa. — a olhei com segurança.
— Pode me lançar este olhar falso, que não acredito. — ela cruzou os braços.
— O problema é seu. — me voltei para o armário e peguei um pacote de cookies — Vou descansar um pouco, talvez não me vejam no almoço.

Passei depressa pela sala, porém consegui ver Taylor se despedindo de minha mãe com um abraço. Não deixei me importar e segui para meu quarto, por mais que quisesse encher meus pensamentos de outros assuntos, havia uma palavra que me assombrava: noiva.

Algumas horas depois...

. — Freya deu alguns toques na porta.
— Entra. — eu estava sentada na janela olhando o céu, segurando algumas lágrimas que queria cair.
— Você não desceu mesmo. — ela entrou e fechou a porta — Nem adianta se fazer de forte, sei que não tem nada bem.
— O que quer que eu diga então? — a olhei deixando a primeira lágrima escorrer — Noiva, Freya, noiva.
— Você achou que ele iria te esperar para sempre?! — ela mantinha seu olhar de compaixão, mesmo com a afirmação sincera.
— Sei que ele não ia me esperar para sempre. — limpei aquela lágrima — Sei que não posso cobrar nada, já que também tive meus relacionamentos.
— Eu acho que seus namoricos nem podem ser considerados, já que todos foram golpes de marketing. — ela colocou a mão na cintura — Mas, isso não vem ao caso.
— Por que não me disseram?! Por que me deixaram no escuro?! — eu não sabia se sentia chateada ou com raiva — Eu merecia saber pelo menos.
— Essa era uma notícia que deveria saber por ele, não por nós. — explicou — Talvez essa seja a deixa para vocês colocarem um ponto final nessa história.
— Que legal, estou aqui a quase dois meses e ele não disse nada. — prendi o grito de indignação.

Voltei meu olhar para a janela, me lembrando do beijo que ele havia me dado.

?!
— Poderia me deixa sozinha Freya. — pedi — Por favor.

Ela não disse mais nada e logo ouvi o barulho da porta se fechando.
Um aperto veio sobre meu coração e as lágrimas tomaram força para cair. Todos esses anos elas nunca me disseram nada sobre a vida amorosa de , talvez eu realmente não tivesse o direito de me achar injustiçada, mas um mínimo de consideração por mim já valia. Como Freya comentou, tive mesmo alguns rápidos relacionamentos com atores e cantores famosos, todos por motivos de marketing em benefício mútuo, nenhum dos meus relacionamentos depois de foram intensos e verdadeiros.

Pela primeira vez naquelas férias me senti triste e vazia por dentro, como se algo importante tivesse sido arrancado de mim para sempre. Esse algo tinha nome: .

— Posso entrar? — disse do corredor, ao bater na porta.

Já estávamos no final da tarde, e eu não tinha saído do quarto até o momento.

— O que você quer? — perguntei limpando as lágrimas.
— Saber se está bem. — respondeu.
— Eu estou bem, pode ir.
— Me deixa entrar. — insistiu.
— Para que?
, por favor.

Respirei fundo e caminhei até a porta.

— Satisfeito?! — indague ao abrir a porta para que ele entrasse.
— Sabe que não. — ele entrou, voltando seu olhar para minha cama — O que está fazendo?!
— Arrumando minhas malas.
— Para que?!
— Recebi um e-mail da Clair, vou precisar voltar antes do previsto. — passei por ele e cheguei até minha cama, então peguei meu celular — Algum problema?!

Irônico, pois só tinha usado três peças que havia levado.

— Acha mesmo que acredito nisso?! — ele segurou a minha mão — Não precisa voltar por minha causa.
— Não estou voltando por sua causa, já disse o motivo. — soltei minha mão da dele — Acha mesmo que meu mundo gira em torno do seu?
— Se não fosse, sua voz não estaria áspera. — retrucou.
— Ok, serei sincera então, por que não me contou?!
— Me desculpe. — ele abaixou o olhar para o chão — Eu estava tentando encontrar a melhor hora para isso.
— Ah sim, e seria antes ou depois de me beijar?!  — o confrontei indignada — Você me fez pensar que…

Me virei para a janela, e respirei fundo.

— E sei que nada que eu disser vai consertar as coisas, mas acredite, estou tão confuso quanto você. — ele pegou novamente em minha mão — Me desculpe, mais uma vez.

Me esforcei para me manter indiferente aquilo.

— Não precisa se desculpar, não me deve nada.
— Fique, pelo menos até o final da semana, até o festival da Folha Seca.
— O que vou ganhar com isso? — coloquei a mão na cintura.
— Seu pai sempre foi um dos patrocinadores sabe disso, e esse ano Taylor estava organizando uma homenagem póstuma para ele, por favor, fique.
— Não prometo nada, mas posso tentar.

Ele deu um sorriso fechado e se voltou para porta.
Soltei um suspiro fraco assim que ele fechou a porta pelo lado de fora, meu coração estava na mão, uma sensação de impotência por não conseguir dizer a ele o que deveria. Que ironia ao pensar que minhas personagens era mais corajosas nos assuntos do coração que eu. Deixei minha mala na beirada da cama e troquei de roupa colocando meu pijama verde de bolinhas amarelas, não demorou muito até que Marg bateu na porta do meu quarto me pedindo para dormir comigo, seu olhar doce e meigo foram o auge para que eu não recusasse. Resultado, dormimos juntinhas ao som da trilha sonora de Tarzan, já que adormecemos antes mesmo de chegar ao final do desenho.

A semana passou, comigo evitando ficar sozinha com no mesmo ambiente, pior era vê-lo conversando com sua namorada que até agora não existia, passou a ser muito presente na minha casa.

— E você , vai voltar quando? — perguntou Taylor enquanto era servida por minha mãe.
— Após o festival, eu pretendia voltar antes, mas soube da homenagem ao meu pai. — respondi.
— Sim, seu pai foi um grande homem, e um exemplo para todos. — disse ela.

Eu tentava puxar da minha mente quem era, e não conseguia nem por um segundo me lembrar do seu rosto. Talvez pelos anos que passei longe de casa, poderia me lembrar só dos moradores mais velhos e mais próximos a minha família, mas nada dela.

— E você faz o que da vida, Taylor? — perguntei.
— Professora de literatura do ensino fundamental. — respondeu ela.
— Legal. — disse ao sorrir.
— Taylor é uma excelente professora. — comentou minha mãe — E já me ajudou várias vezes na barraca de quitutes que eu faço nos festivais.

Minha mãe me olhou de forma provocativa, certamente queria me instigar a conversar com ela sobre tudo, já que me mantive indiferente na maior parte do tempo.

— Bem, eu agradeço muito pelo café, senhora Penny.
— Disponha, e pode reservar o local da minha barraca. — disse minha mãe ao abraçá-la em despedida.
— Sim, colocarei ao lado da barraca do senhor John. — ela sorriu e pegando sua bolsa ajeitou no ombro — Foi um prazer vê-la novamente .
— Igualmente. — retribui a gentileza com um sorriso simpático.

Assim que ela saiu, voltei meu olhar para minha mãe.

— Curioso, com ela não tem nada de tia Penny?! — deixei sair de forma irônica.
— Taylor é uma garota muito gentil, mas não é da família. — respondeu minha mãe.
— Então, acho melhor a senhora ir se acostumando, já que em breve ela se casará com seu sobrinho. — retruquei.
— Só se certas pessoas deixar. — ela colocou a mão na cintura — Vai esperar ser tarde demais para dizer a ele que o ama?
— Não sei do que está falando mamãe.
— Sabe sim. — ela revirou os olhos — Como os jovens de hoje são tão teimosos e orgulhosos.
— Eu não sou orgulhosa, e se quer saber, essa história já acabou faz tempo. — disse me enganando.

Ela deu de ombros e se dirigiu para a escada e subiu. Eu me voltei para cozinha, já que havia prometido que a cozinha do almoço era minha, não enrolaria, a pia estava cheia de vasilhas sujas e eu sem a menor vontade de lavar um garfo.

— Se continuar olhando elas assim, não vai haver nada limpo no final da tarde. — comentou ao entrar e me ver prostrada na mesa olhando a pia.
— Estou me concentrando mentalmente para enfrentar tudo isso. — expliquei.
— Essas celebridades... — ele riu e caminhou até a pia, então começou a ensaboar as vasilhas.
— Esse serviço é meu. — disse em protesto me levantando — Não quero que me acuse de nada depois.
— Eu venho te ajudar e recebo desconfianças em troca? — ele me olhou indignado — Pegue o pano e venha secar, pare de reclamar.
— Hum...
— Anda logo, em dupla é mais rápido não acha?
— Tudo bem. — concordei pegando o pano para enxugar as vasilha e me coloquei ao seu lado.

Como nos velhos tempos, que me corroiam por dentro em certos momentos, lá estava nós dois nos divertindo simplesmente por fazer algo juntos.

— O que foi? O que está passando por essa mente fértil aí? — perguntou ele ao me dar o último prato que tinha lavado.
— Ando curiosa sobre algo. — disse.
— O que?
— Onde ela estava todo esse tempo? Sua namorada?
— Por que a pergunta? — ele me olhou confuso.
— Por um mês e meio eu fiquei aqui sem saber da existência dela, e agora a vejo quase todos os dias. — guardei os pratos e o olhei — Curioso não?
— A mãe da Taylor estava internada no hospital universitário de Houston, por isso estava ausente da cidade. — explicou ele.
— Hum... — mordi os lábios inferiores e me virei.
— Mais alguma coisa?
— Não. — o olhei — A mãe dela está bem agora?
— Sim.
— Que bom.

Eu passei por ele para voltar para sala, mas segurou em minha mão.

— Se eu não te devo nada, por que está agindo assim comigo? — perguntou ele.
— Assim como?
— Com essa falsa indiferença. — ele suspirou, me conhecia muito bem — , você está me evitando todos esses dias e agora me pergunta sobre a Taylor.
— Eu disse que era somente uma curiosidade.
— E qual mais curiosidade você tem sobre isso?
— Olha aqui, não fui eu que fiquei escondendo que tinha uma namorada, você sempre soube dos meus relacionamentos. — o confrontei.
— Ah sim, através de sites de fofocas. — retrucou ele.
— Foi você quem disse que deveríamos dar um tempo, foi você quem disse que ficaria tudo bem se eu fosse para Califórnia e me tornasse atriz. — joguei em sua cara.
— Sim eu disse, porque não queria atrapalhar seu sonho, mesmo sabendo que não viveria com você. — revidou — E por mais que eu quisesse, não sabia se poderia te esperar para sempre.
— Por que não perguntou?
— Por que... — ele olhou para o teto — Tive medo que tivesse me esquecido, a cada namoro novo que sua agencia anunciava, era uma certeza que...
— Seu bobo, eu sempre te amei.

Não me contive em calar ele com um beijo para prova-lo que sempre o amei, mesmo com todos aqueles anos longe. Uma loucura que me fez esquecer que ele tinha uma namorada por alguns minutos, até que a sensação de estarmos sendo observados tomou conta de mim e me afastei.

— Taylor. — sussurrou ele ou olhar para a porta dos fundos da cozinha.
— Eu... — ela saiu correndo.
— Taylor espera... — saiu atrás dela.

Eu continuei estática, tanto pelo beijo que eu havia lhe dado, como por ela ter visto. Sempre que eu agia no impulso, algo que errado acontecia, era um fato, sai depressa da cozinha e fui até meu quarto, eu já havia mesmo passado muito tempo longe de Manhattan, já era hora de voltar antes que eu cometesse mais alguma loucura. No final da tarde, foi até meu quarto, ver se estava tudo bem, já que minha mãe lhe comunicara que eu ia viajar na manhã seguinte.

— Conseguiu falar com ela? — perguntei.
— Não, mas vou tentar amanhã após sua partida.
— Me desculpe, eu não deveria ter te beijado, nem falado aquelas coisas.
— Eu te beijei primeiro lembra? — ele sorriu — Além do mais, foi bom saber o que sente, apesar de tudo...

Ficamos alguns minutos nos olhando em silêncio, até que me rendi as lágrimas e deixei a primeira rolar em minha face, logo senti o abraço confortável de me envolver, seus braços fortes me fizeram aninhar-me a ele enquanto continuava a chorar. Tudo estava silencioso entre nós, exceto seu coração que permanecia tão acelerado quanto o meu.

— Então é assim que vamos terminar?! — perguntei em sussurro.
— Temos nossas vidas agora. — respondeu ele, engolindo seco.
— Seria egoísta demais se eu te pedisse para não ficar com ela?! — eu o olhei.

Ele sorriu singelamente, limpando a lágrima que escorria.

— Nossos sonhos não se cruzam . — disse ele ainda me acariciando — Aqui é sua casa, mas sua vida está em Manhattan, e eu…
— Ela não é a mulher da sua vida, é?!
— Não. — respondeu com sinceridade — Mas é a pessoa que compartilha do mesmo sonho que eu.

Doeu ouvir suas palavras, mas sabia que eram o melhor caminho para nós dois.
Aquele era o fim.
Não estava sendo fácil para minha mãe se conformar com a minha volta para Manhattan, mas ela sabia que uma hora isso aconteceria, eu tinha uma vida longe de casa. Freya me ajudou a conter as lágrimas da pequena Margareth, que só se convenceu após minha promessa dela passar as próximas férias de verão comigo em Malibu.

A volta foi monótona e fria, talvez pelo início do inverno, que trazia consigo uma certa tristeza para mim. Mesmo com a recepção calorosa de Clair e Dimitri, e as semanas que seguiram com a notícia de que o lançamento do meu filme estava próximo e as expectativas eram boas, eu não tinha nem mesmo ânimo para celebrar nada.

— Seu olhar está triste... — comentou Clair se sentando ao meu lado no sofá.

Estávamos na sala do meu apartamento duplex na cobertura, em Upper East Side.

— Desde que voltou da viagem. — continuou ela.
— Não é nada. — mantive minha atenção na lareira que permanecia acesa esquentando o ambiente.
— Tem certeza que não quer conversar?
— Já disse que estou bem. — dei um sorriso forçado — Pode ir para casa, seu namorado está te esperando e eu não quero ser acusada por estragar o relacionamento de ninguém.
— Tem certeza que não quer passar o feriado com a gente? — insistiu ela — Já que não quis voltar para o Texas e ficar com sua família.
— Tenho, não estou no clima para o natal. — me levantei e caminhei até a escada — Tranque a porta quando sair.

Eu iria me isolar nas próximas semanas, mas sabia que após o ano novo, teria que mostrar o sorriso mais convincente para a mídia. Foi o que aconteceu na segunda semana de janeiro, quando meu filme Havana estreou nos cinemas do país e do mundo, e minha maratona de entrevistas e holofotes começou.

— E como foi para você filmar ao lado do ator Sebastian Winchester?! — perguntou Charlie, a entrevistadora.
— Foi tranquilo e um grande momento de aprendizado para mim, apesar de todos esses anos, ainda me considero uma novada perto de atores como ele. — respondi desviando meu olhar para Sebastian sentado ao meu lado e sorri.
— E você Sebastian?!
— Eu ainda estou tentando entender a parte que ela se considera uma novata perto de mim. — brincou ele arrancando risadas de todos que estava no estúdio — Foi um prazer trabalhar com uma profissional como , tenho certeza que todos vão gostar de nos ver juntos em Havana.
— O lançamento de Havana está sendo um sucesso, e tenho certeza que ficará em cartaz por mais algumas semanas. Vocês já possuem outro projetos em vista? — Charlie nos olhou curiosa.
— Bem, eu falo, você fala? — Sebastian me olhou.
— Pode falar primeiro. — eu disse.
— Daqui a dois meses vamos iniciar as gravações do meu próximo filme Chicago, é um romance policial meio sobrenatural também. — respondeu Sebastian.
— Eu ouvir dizer que será seu primeiro filme participando da produção. — indagou Charlie.
— Sim, meu primeiro desafio como produtor executivo também, vamos torcer para que dê certo. — brincou ele.
— E você ? — Charlie me olhou.
— Hum, eu estava pensando em tirar férias novamente, mas amo minha vida de atriz e as gravações da segunda temporada de My Little Thief vão começar na próxima semana. — respondi prontamente — E tenho o prazer em dizer que terei que conciliar a série com as gravações do novo filme em parceria com a Netflix que fui convidada para o elenco.
— E você poderia nos dizer o nome do próximo filme? — perguntou Charlie.
— O nome provisório está sendo Mixtape: I Am The Best. — respondi.
— Foi um prazer essa entrevista com você e gostaria de dizer que todos estão encantados com Havana! — disse Charlie encerrando a entrevista — Gostariam de deixar um recado para os fãs?!
— Continuem nos apoiando e se divirtam com Havana. — disse Sebastian.
— E agradecemos o carinho! — completei mandando um beijo para a câmera.
— E corta. — disse o diretor.

Os staffs começaram a se locomover.

— Muito obrigado por aceitarem a fazer a entrevista. — disse Charlie já se afastando de nós.
— Nós que agradecemos. — Sebastian se levantou da cadeira — Eu estou de carro, quer uma carona?
— Ah não, obrigado. — mantive meu olhar em Charlie que ia falar com um dos staffs — Eu vim de carro também.
— Está preocupada deles acharem que estamos juntos? — perguntou Sebastian.
— Talvez. — sorri meio sem graça — Mas pelo que vi nas filmagens, você está muito bem acompanhado agora, seus olhos estão brilhando.
— Ah, sim. — ele riu — É incrível quando estamos apaixonado, e por quem menos esperamos.

Nos despedimos e ele se afastou retirando o celular do bolso.
Eu peguei minha bolsa que estava guardada com Dimitri que havia chegado ao final da entrevista para ver como eu estava. Agradeci a preocupação e segui até o estacionamento, assim que entrei no carro, peguei meu celular e verifiquei algumas mensagens de Clair. Eu tinha mais três entrevistas para aquela semana e uma sessão de fotos para a revista Elle. Mandei uma mensagem de volta dizendo que estava seguindo para casa e a encontraria no dia seguinte na empresa, após o almoço. Já era noite e não imaginava que a entrevista iria demorar tanto para terminar.

— Senhora . — disse Carmen assim que entrei no meu apartamento — Que bom que chegou.

Era estranho ela estar ali até aquela hora.

— Carmen, era para você estar em casa. — disse retirando a bolsa do ombro e deixando sobre a mesa de apoio ao lado da porta — O que faz aqui até tão tarde?
— A senhora tem visita. — explicou ela.
— Como assim visita?! — a olhei confusa.
— Um senhor chegou à tarde após a hora do almoço, eu tentei entrar em contato, mas seu celular estava no silencioso. — respondeu — Ele está no terraço.
— Obrigada Carmen. — me afastei dela e segui para a escada.

Todos os meus funcionários sabiam que era restrito o número de pessoas que podiam entrar no meu apartamento. Então, certamente era uma pessoa conhecida e de confiança.

— A quem devo a honra da visita?! — perguntei ao sair no terraço e ver o homem debruçado no guarda-corpo de vidro.
— Ao funcionário do ano. — ele se afastou e se virou.
. — meu coração pulsou mais forte.

Estava surpresa.

— O que faz aqui?! — perguntei.

Ele não disse uma só palavra, somente seguiu em minha direção e me beijou. Doce e suave no início, foi ficando intenso e malicioso. O que estava fazendo? Ele queria me enlouquecer de vez?

. — eu me afastei de leve dele, respirando fundo — O que faz aqui?!
— Você me bateria se eu dissesse que me pergunto a mesma coisa? — brincou ele — O que eu faço aqui?
— Não tem graça. — bati no braço dele — Nenhuma graça.
— Me desculpe, não podia perder a piada. — sorriu de canto.
— Por que veio até Manhattan?! — insisti.
— Porque você é a única que consegue abalar minhas estruturas. — ele segurou em minha mão — Eu não consegui deixar de pensar em você durante todos esses anos, e depois dos dias em que ficou na fazenda, só me fez ver o que eu não queria enxergar.
— Mas, e a Taylor?! — perguntei.
— Nós conversamos, depois que voltou para cá. — respondeu ele — Eu também lhe contei sobre o beijo na cabana, pedi desculpas a ela e expliquei sobre nós e nossa história inacabada, então ela me perguntou o que eu ainda sentia por você.
— E o que você respondeu?
— O que você acha?
— Responde logo.
— Que ainda te amava, com a mesma intensidade de sete anos atrás. — ele respirou fundo — Não posso me enganar mais, nem a ela e nem a você.
— Vocês terminaram então. — concluí.
— Sim.
— Tudo isso depois que voltei para Manhattan.
— Sim.
— E só agora você veio atrás de mim? — eu o empurrei ficando um pouco irritada.
— Yah. — ele gritou — Eu atravesso estados para me declarar e você me bate?
— Porque você demorou. — retruquei.
— Se quiser eu posso voltar daqui alguns meses, quando estiver mais calma. — ele se afastou para sair.
— Espera. — segurei em sua mão — Me desculpa.

Respirei fundo.

— Eu… — pensei em minhas próximas palavras.

Mas ele me puxou para perto me abraçando forte, antes que eu pudesse completar a frase.

— Eu te amo, apesar da distância, sempre vou te amar. — sussurrou ele.
— Eu também te amo. — sussurrei de volta — Apesar da distância, sempre vou te amar.

E agora tinha a certeza que mesmo com todos os desafios que enfrentaríamos a mais, eu sempre voltaria para seus braços, onde me sentiria segura e amada. Ainda que todos os holofotes nos distancia-se, eu manteria meus olhos nele.

“Meus sentimentos brilham para você
No meu coração, mantenha seus olhos em mim,
Eu quero te levar embora agora.”
- Spotlight / MONSTA X

Amor: O amor não se alegra com a injustiça, mas se alegra com a verdade. Tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta. - 1 Coríntios 13:6-7” - by: Pâms



The End?!



Nota da autora:
Bom dia!!! Então, tenho um carinho especial por essa fic, pois ela sofre influências fortes da fic da minha linda Ray, No Coração da Fazenda [QUERO TODO MUNDO LENDO], então Ray, aí vai minha homenagem a você, é a primeira vez que faço isso com a fic de alguém!! Te amo miga!! Essa fic tbm seria de um ficstape que acabou não rolando, mas pelo menos me rendeu uma boa história. Espero que tenham gostado e até a próxima cidade na categoria Originais do FFOBS!!! Bjinhos...
By: Pâms!!!!
Jesus bless you!!!




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