Bella Donna
Cingapura - Inverno de 1842
:
E lá estava ela, arrumando mais uma de suas confusões ao levantar a espada para um pirata bêbado. Eu permaneci no canto ao fundo da taverna, a observando em silêncio.
— Está mudo agora pirata?! — disse ela em voz alta.
— Vou te mostrar sua meretriz. — gritou o homem barbudo que a enfrentava.
Tinha que admitir que era uma das melhores espadachim que conhecida, além do seu forte temperamento que mostrava realmente que era uma indomável pirata, assim como o mar. O barbudo avançou contra ela com sua espada empunhada, fazendo uma careta esquisita como se amedrontasse alguém, mas ela não se deixou acovardar e o enfrentou cruzando a lâmina de sua espada com a dele. Vê-la duelar com alguém se igualava a observar uma pintura que te conduzia a contemplação.
As espadas continuaram a cruzar suas lâminas com precisão e rapidez, eles rodearam quase toda a taverna com aquela pequena briga. era astuta e sagaz, principalmente ao utilizar a força do seu adversário ao seu favor, quem achava que ela era uma mulher frágil, não imaginaria sua habilidade de vencer qualquer disputa. No final, com um piscar de olhos e distração do barbudo, ela chutou um dos bancos o fazendo tropeçar, aproveitando lançou sua perna na mão do homem que segurava a espada no momento da queda. Assim, ela deu dois passos se aproximando dele e encostou a ponta de sua espada na garganta do homem.
— Espero que tenha aprendido pirata. — disse num tom autoritário — Da próxima vez, saiba tratar melhor uma mulher.
Ela guardou a espada na bainha e se virou. Então o homem se levantou ainda mais furioso já retirando uma pistola do coldre da calça. Foi então, que silenciosamente saí de trás da pilastra que me escondia e caminhei sorrateiramente até ele.
— Foi te mostrar como um homem deve tratar meretrizes como você. — ele apontou a arma para ela.
Assim que se virou, fixou seus olhos na pistola do homem.
— E eu vou lhe mostrar o que acontece quando alguém a chama assim. — eu encostei minha arma na cabeça dele, destravando o gatinho — Peça desculpas para dama a sua frente.
Senti que o homem engoliu seco, então tombei minha cabeça e logo vi o sorriso de satisfação formado no rosto dela. O sorriso que fazia meu coração acelerar sem muito esforço.
— Perdoe-me… — disse o homem tentando não gaguejar, enquanto os outros que assistiam tudo riam dele.
— Vou pensar. — ela riu e pegou a pistola do homem, em um piscar de olhos socou a cara dele.
Para ajudar no efeito do soco dela, eu chutei sua perna do homem disfarçadamente para que caísse. Ao olhar para frente, os olhos de estavam fixos em mim, o sorriso de canto em sua face e a sensação de ter se divertido muito naquela noite.
— Eu não posso te deixar sozinha por um minuto que acaba arrumando confusão. — comentei rindo baixo.
— Este covarde estava sendo desonrado com uma das moças. — explicou ela, pulando o homem ainda caído no chão e continuou seguindo em direção a saída — Ele precisava aprender a ser um cavalheiro.
— E você é ótima para ensinar etiqueta a piratas. — continuei rindo.
— Aprendi com o melhor. — disse ela se referindo ao pai.
A relação pai e filha de e do capitão Salazar não era das mais divulgadas entre a sociedade pirata, todos sabiam que ele tinha uma filha, mas não ousavam comentar o assunto. Talvez pelo capitão sempre mencionar sua vontade de ter tido um filho homem, ou pela mãe de não ser a mulher que o capitão tanto amou na vida, e sim apenas uma breve companhia de uma noite de prazer. Mas o fato era que ela sempre se empenhava em dobro para conquistar o respeito e admiração dele, algo que por um breve tempo havia sido ameaçado tanto por mim quando me juntei a tripulação, quanto por Sebastian quando foi capturado no porto de Liverpool.
— Vocês demoraram, o capitão vai nos esfolar vivos. — comentou Sebastian ao nos ver saindo dos fundos da taverna.
— E você está falando demais, se o meu pai descobrir que você sabe falar, vai cortar sua língua e aí ficará mudo de verdade. — retrucou ela prontamente.
— Pare de implicar com ele, Sebastian é nosso amigo, por isso guardamos o segredo dele. — o defendi — Além do mais, é engraçado ver todos o tratando como um mudo.
Nós rimos.
— Agradeço por não contarem a ninguém. — disse Sebastian ao pegar o saco que estava ao seu lado.
— Nós fizemos um juramento, e piratas não quebram seus juramentos. — frisou ela.
sorriu para ele, não era novidade que desde que Sebastian apareceu em nosso navio, ela se interessou por ele. Talvez por seu ar misterioso, ou por ter se comportado de forma discreta e enigmática, mas para minha sorte, nosso mascote já tinha alguém em seu coração. Uma nobre chamada lady Nalla Lewis.
— Vamos então, antes que Gibbs e Sid venham atrás de nós. — disse pegando o outro saco que estava perto da porta — Já pegamos tudo que viemos buscar.
— Que pena, queria me divertir mais um pouco. — ela olhou para Sebastian — O que acha de fazermos algumas apostas no Folks? pode levar a carga para o Bella Donna.
— E levar chicotadas do capitão depois, me lembro da última vez. — ele fez careta — Além do mais, aquele navia fede a ratos.
— É porque a tripulação é composta por isso. — comentou ela rindo.
Eu me mantive em silêncio, senti meus punhos se fechando involuntariamente com aquilo. sabia desde criança que eu gostava dela, mas se mantinha indiferente a mim e meus sentimentos, então tive que aprender a conviver com isso. Assim que subimos a bordo do Bella Donna, entreguei os dois sacos pessoalmente para o capitão que se encontrava em sua cabine.
— Podes explicar-me o motivo da demora? — perguntou ele mantendo seu olhar no grande mapa sobre sua mesa.
— Tivemos alguns contratempos no percurso capitão, mas o que importa é que está tudo aqui, e o navio já se encontra carregado, podemos zarpar de Cingapura. — garanti.
— Então avise a todos que iremos partir, vamos passar o inverno na ilha Junta. — ordenou ele — E peça ao Mascote para vir em minha cabine, pretendo continuar com seu treinamento.
— Sim capitão. — assenti seguindo para a porta.
— .
— Capitão. — me voltei para ele.
— … Como se comportou?
— Como a melhor pirata que existe capitão. — respondi com segurança.
Ele sorriu de canto. Eu conhecia todas as expressões por menores possíveis do capitão, mesmo que ele não admitisse, ele tinha muito orgulho da filha. Assim que saí da cabine, dei a ordem a todos, me aproximei de sebastian que estava já com a escova esfregando o chão e passei a ordem do capitão. Fiquei distraído o observando se afastar, até que a aproximação de me despertou.
— O que você falou ao meu pai? — perguntou ela se apoiando do beiral do barco.
— Não se preocupe, não mencionei sobre suas aulas de etiqueta. — ri baixo, me virando para o interior do navio e apoiando minhas costas no beiral — Já disse que pode confiar em mim.
— Não disse que não confio. — ela soltou um suspiro fraco, sua face estava séria e parecia irritada — Só fico chateada por ter tantos segredos com o capitão.
— Não acredito que depois de tantos anos ainda tem ciúmes de mim. — mantive meu olhar nela, que se mantinha olhando para o horizonte — Já passamos dessa fase.
— Sabes que não és fácil para mim. — ela me olhou — Primeiro ele te tratou como um filho quando chegou e agora faz o mesmo com Sebastian.
Era nítido sua amargura e tristeza pela situação. Era algo que me entristecia também.
— Quando ele vai me ver como sua filha?! — soou em forma de pergunta, mas sabia que era um desabafo — Eu só queria que ele se orgulhasse de mim, .
Me mantive em silêncio olhando-a, então voltou sua atenção para o horizonte, desviei meu olhar para frente, vendo os marujos se movendo pelo convés. Ficamos um tempo ali, olhando as estrelas esperando o treinamento noturno do nosso Mascote acabar. Enquanto isso, os outros começaram a se recolher descendo para a galeria principal.
O Bella Donna era o segundo navio pirata mais cobiçados dos setes mares, perdíamos somente para o lendário Black Pearl, desaparecido há décadas. Ainda me lembrava bem de quando minha mãe pediu para um favor ao capitão Salazar, eu tinha oito anos e estava tão fascinado com a ideia de ser um pirata que não percebi que ela estava doente demais para cuidar de mim, e o favor era exatamente que eu ficasse aos cuidados do capitão.
— Estavam me esperando? — disse Sebastian ao se aproximar de nós.
— Fale mais baixo, Bella Donna têm ouvidos. — brinquei rindo.
— Este navio jamais me trairia. — assegurou ele.
— E como foi o treino com meu pai? — perguntou .
— Mais uma vez com cortes e arranhões. — respondeu ele mostrando o corte no braço que estava sendo escondido com um pedaço de pano.
— E você diz nessa tranquilidade? — ela se irritou com ele — Vou pegar algo para limpar isso.
Assim que se afastou de nós, Sebastian me olhou como se quisesse se desculpar por algo de errado que havia feito.
— Não é culpa sua, se é isso que pensas. — virei meu olhar para o lado, olhando o reflexo da lua que se formava no mar.
— Me sinto mal por ela gostar de mim, estou aqui a poucos meses, você é o primeiro amigo que tenho e gosta dela. — declarou ele.
— Já me basta saber que gostas de outra. — assegurei — Um dia, conseguirei conquistá-la.
— Estou torcendo por você. — ele se sentou no chão ao meu lado — Espero conseguir o amor de lady Nalla também.
— Ainda fico admirado quando menciona ela. — me sentei também — Seu amor por ela é impressionante, mas faria o mesmo em seu lugar.
— Já fazes meu amigo. — Sebastian olhou para frente, me fazendo entender suas palavras.
Então voltei meu olhar junto, retornava com um cântaro em sua mão e alguns panos brancos.
— Vou cuidar de seu braço. — disse ela se ajoelhando ao seu lado.
— Ai. — reclamou ele assim que ela descolou o velho pano ensanguentado de seu braço — Isso dói.
— Deixe de ser marica, és um pirata, pare de reclamar. — ela riu.
Mantive-me em silêncio olhando-a cuidar dele, mesmo sabendo que meu amigo mascote jamais lhe daria alguma chance, eu não conseguia conter o ciúmes dentro de mim. Ansiava que tratasse-me da mesma forma em que se dedicava a tratar ele.
— Para onde vamos agora? — perguntou Sebastian — Estou a meses com vocês e até agora não atracamos em lugar nenhum a não ser em Cingapura.
— Ilha Junta. — disse — Vamos para lá todos os anos no inverno.
— É a ilha de vocês?! — indagou ele.
— Sim, onde guardamos o nosso tesouro. — respondi.
— E onde aproveitamos para treinar mais um pouco. — completou ela.
— Treinar no inverno em uma ilha no meio do nada?!
Ele nos olhou estático.
— Por isso o Bella Donna é o melhor navio pirata. — eu sentia o orgulho dela exalando pelo ar.
— O segundo melhor. — a corrigir.
— O Black Pearl é só uma lenda. — retrucou ela.
— Uma lenda que ainda vive. — disse — Tenho certeza que esse navio está atracado em algum lugar remoto.
— No fundo do oceano com certeza. — ela continuou limpando o corte no braço de Sebastian.
— Vocês podem me contar mais sobre isso? O que é esse Black Pearl?
— O melhor e mais valioso navio pirata que existe. — respondi — Dizem que é o mais veloz também.
— E já viram ele pessoalmente?
— Não. — respondemos juntos eu e ela.
— E como sabem que existe? Através de lendas?
— O capitão do Hunter viu uma vez há muito tempo. — respondeu — Eu sempre achei que fosse mentira, mas o filho dele garantiu que seu pai não brincaria com isso.
— Piratas mentem. — retrucou Sebastian — Aprendi com o capitão.
— Não há como negar. — concordei.
Nós rimos daquilo. Era verdade, não havia pessoas mais mentirosas e trapaceiras que piratas, mas existiam alguns como o capitão que ainda mantinha sua honestidade, talvez por ter origem nobre seus princípios não haviam sido afetados. Ficamos mais um tempo conversando, até que Sebastian se retirou para dormir. Eu me afastei dela e caminhei até a proa do barco, onde me sentei ao lado das grossas cordas que estavam ao chão, fiquei olhando as estrelas por um tempo.
— Tem andado muito silencioso ultimamente. — comentou ela se aproximando de mim — Alguma coisa te preocupa?
— Eu ouvi algumas coisas que estão me deixando preocupado, mas não importa agora.
— Tem certeza? — retrucou se sentando ao meu lado — Me conte, o que tem ouvido?
— Andam dizendo em algumas tavernas de Cingapura, que um navio de velas vermelhas tem atacado vários navios piratas, mas não de forma tradicional. — respondi a sua curiosidade.
— Piratas atacando piratas? — ela me olhou espantada.
— Sim.
— E como eles atacam?
— Estão persuadindo as tripulações, fazendo motins e matando os capitães. — expliquei.
— Você contou ao meu pai?
— Foi ele próprio que me pediu para investigar. — contei — Me pediu sigilo.
— E você não me contou. — ela bufou daquele jeito de sempre.
— Assuntos internos. — brinquei.
— Não tem graça nenhuma.
— Não queria te alarma, e como disse, não importa. — assegurei — O capitão confia em nossa tripulação.
— E você? Meu pai te colocou como o segundo no comando, queria que fosse eu, mas… Confia neles?
— Só existe uma pessoa em quem eu confio. — eu a olhei — Estou olhando para ela.
Pude ver nitidamente as pulpilas de seus olhos dilatarem e brilharem com a ajuda da luz da lua, lá no fundo ela queria sorrir com minha declaração, mas claro que não daria esse gosto para mim.
She’s my black pearl.
- Black Pearl / EXO
Junta Islands
Ilha Junta - Inverno de 1842
:
Demorou duas semanas para finalmente chegarmos na Ilha Junta. Não aguentava mais tanto tédio em ver aquele marujos se divertindo enquanto faziam suas apostas em jogos de queda de braço enquanto se embebedavam com rum.
— Agora sim! — disse ao avistar a ilha — Não aguentava mais o inverno.
— Ainda é inverno, só que no hemisfério norte. — brincou ao se aproximar junto de Sebastian — Por isso viemos para o sul.
— Grande coisa. — dei de ombros e mantive meu olhar na ilha — Ainda acho que poderia ter escolhido uma ilha no caribe.
— Pare de reclamar, seria fácil demais nos acharem no caribe. — retrucou .
Sebastian riu de nós dois e se virou para trás, Sid o chamava para que ajudasse a juntar as cargas que seriam guardadas na gruta. Atracamos na ilha, deixando o barco ancorado em local estratégico para nossa partida, era o início de algumas semanas de descanso enquanto a Companhia das Índias Ocidentais desdobrariam os sete mares a nossa procura.
— Finalmente o paraíso! — disse animada abrindo os braços ao pisar em terra firme sentindo o doce aroma da natureza.
— Fala como se não gostasse de viver no mar. — comentou baixo Sebastian.
— Volte a ser mudo e vá carregar algumas caixas, Mascote. — o olhei com desdém.
começou a rir de nós dois, enquanto carregava dois sacos de tecido com os mantimentos.
— E você não vai fazer nada? — perguntou — Até eu que sou o primeiro imediato estou ajudando.
— Eu sou uma dama. — expliquei.
— Agora você é uma dama? O que aconteceu com a pirata forte e destemida?
— Está de férias. — eu passei por eles indo em direção a mata fechada.
Não estava animada para fazer serviços braçais, já que não conseguiria mesmo chamar a atenção do meu pai, agora viveria a minha vida sem me importar se seria ou não a filha do ano. Segui pela trilha principal até chegar nas duas rochas que demarcavam minha trilha secreta, então segui pelos arbustos e mais rochas até chegar ao meu pequeno refúgio da ilha. O que eu chamava de jardim secreto, era a mais bela parte daquela ilha, totalmente cercada de altos rochedos e imensas árvores, a parte mais silenciosa e escondida.
Caminhei tranquilamente até chegar na cabana que havia construído com a ajuda de há dois anos, tudo estava em seu devido lugar, do jeito que eu deixei da última vez que passamos o verão ali. Passei alguns minutos contemplando a paisagem, o som dos pássaros cantando nas árvores e o suave cheiro das flores nativas, aquilo me fazia esquecer por um breve momento de toda a adrenalina que eu vivia no mar.
— Ah, então foi aqui que te deixei. — disse ao ver minha pistola de estimação em cima da rede ao lado da janela — Senti sua falta todos esses meses.
— Conversando com objetos novamente? — a voz de Sebastian soou atrás de mim — Que espécie de pirata é você?
— Uma espécie única. — ri me voltando para ele — Como encontrou meu refúgio?
— me disse o caminho. — respondeu ele — Esse lugar é muito bonito.
— É minha parte na ilha. — expliquei — Ser a filha do capitão tem seus privilégios em alguns momentos.
— Sei. — ele riu — E vamos passar os próximos dois meses aqui mesmo?
— Sim. — andei até a janela e me sentei no beiral — Se quiser pode dormir aqui.
— Acho melhor não. — ele se voltou para a porta — E já sabe porquê.
— Não acredito que ainda pensa nessa tal lady. — tentei amenizar meu tom frustrado.
Sebastian sabia que eu nutria certos interesses por ele, e não me importava de seu passado, ao contrário, permanecia esperançosa para que ele gostasse da vida de pirata e permanecesse para sempre conosco.
— Ela é a única em meus pensamentos. — confirmou ele mais uma vez com seriedade e firmeza — Não existe mais espaço em meu coração, tudo pertence a ela.
— Não acho que deveria nutrir algo por uma mulher que nem deve se lembrar de você. — girei meu corpo e joguei minhas pernas para o lado externo da cabana, olhando para o lago — Aposto que até você se tornar uma pessoa rica, ela já vai estar casada e com sete filhos.
— Os nobres não costumam ter esse tantos filhos. — ele brincou rindo.
Eu dei um pequeno impulso e pulei, permanecendo de pé.
— Isso é verdade. — ri junto.
— Mas não me importo. — ele me olhou de forma profunda — Ela sempre será a única.
Bufei de leve, ainda mais frustrada.
— Ahhhh, finalmente consegui escapar dos olhos do capitão. — disse ao vir com um sorriso de canto pelo caminho de seixos que levava a cabana — Nossa, que cara feia.
Certamente falava de mim.
— O que você fez para ela Sebastian? — perguntou ele, segurando o riso.
— Não a nada aqui. — ele se sentou no assoalho da cabana — O que piratas costumam fazer no verão?
— Os outros não sei, mas nós, curtimos o descanso. — riu — Mas acho que no nosso caso, o capitão quer que eu treine com você, Mascote.
— Por que?! — perguntei curiosa.
— Missão secreta. — piscou de forma sagaz.
— E eu não estarei incluída? — cruzei meus braços — Já imaginava.
— E desde quando te privamos de uma boa aventura, milady pirata. — retrucou .
— Prefiro que me classifique como futura capitã do Bella Donna. — descruzei os braços e caminhei até ele, já empunhando minha espada.
Ele fez o mesmo, assim nossas lâminas se cruzaram.
— Acha mesmo que vou deixar um de vocês dois levarem meu navio em meu lugar? — disse com propriedade — Eu serei a capitã.
— Interessante. — ele deslizou de leve a lâmina — Mas vai precisar mais que isso para convencer os outros.
Deu uma breve gargalhada e o ataquei novamente. Era divertido nossos momentos de pequenos confrontos em que me forçava a duelar com ele, só pelo simples prazer de me irritar com seus comentários inoportunos sobre eu não estar preparada para ser a capitã. Somente nós dois sabíamos que meu pai estava doente, na frente de todos os capitão Salazar continuava destemido e forte, porém debaixo de suas vestes de pirata, seu corpo morria por dentro lentamente.
Teoricamente, eu seria a capitã por ser a filha dele, ou por ser o primeiro imediato, porém havia uma pequena chance de alguém liderar um motim na esperança de estarmos desestabilizados. Não era confiável confiar em piratas, menos ainda nos que tripulavam o Bella Donna.
— Foco. — gritou , assim que percebeu uma breve distração de minha parte — Acha mesmo que vai conquistar o Bella Donna assim.
— AHHHH! — joguei meu corpo mais para frente cruzando novamente minha espada contra a dele — Eu não estava distraída.
— Tem certeza?! — seu olhar sério estava ali.
Tinha que admiti, que mesmo não tendo interesses em , toda vez que ele me olhava daquela forma, sentia meu corpo querer corresponder de alguma forma. Em um piscar de olhos, ele girou a mão e em uma sincronia impecável como se girasse a fechadura de um baú e movendo as lâminas, fez com que sua espada travasse a minha lançando-a para o alto.
— Eu acho que não. — concluiu ele, assim que minha espada caiu em meu lado, com a lâmina se fincando em terra — Para ser a capitã, precisa de mais concentração.
Ele voltou seu olhar para Sebastian, como se indicasse o motivo da minha distração.
— O fato de nunca tê-lo ganhado, não quer dizer nada. — retruquei pegando minha espada — Ainda sou a melhor pirata que existe.
— Claro que é. — ele não se deu ao trabalho de discordar e se aproximou de Sebastian — Então Mascote, o que está achando?
— Que a pirataria não é mesmo para mim. — ele riu — Mas posso me acostumar por um tempo, se for isso que me ajudará a ficar rico.
— Se depender daqueles piratas, você nunca ficará rico. — o olhou — Mas, você está indo bem com seus treinos, está ganhando a confiança do capitão e poderá fazer parte de uma missão.
— E para onde vamos? — perguntou Sebastian.
— Xangai. — respondeu ele.
— O que meu pai pretende? — me aproximei deles.
— Há cinco dias nós passamos pelo Ciganos, e o capitão teve alguns minutos de conversa com a capitã Nairóbi... — respondeu ele.
— Duvido que tenha sido somente conversa. — o interrompi, dei de ombros com certo desinteresse naquela parte da explicação.
— Pois ela contou que a China assinou um tratado que está liberando seus portos, sabe o que isso significa?! — ele sorriu de canto.
— Seda. — sorri também — Papai sempre quis isso.
— Seda… O tecido que os nobres se matam para ter? — perguntou Sebastian.
— O próprio, e logo teremos um fácil acesso. — respondeu .
— Mal posso esperar para que o verão termine aqui. — disse de forma empolgada.
Seria mesmo empolgante novas aventuras em mares orientais, já que nossa parada sempre era Cingapura, saber que teria mais uma cidade me deixava animada. E assim passamos aqueles dois longos meses, em treinos, conversas aleatórios e um pouco de diversão, além de repassar umas cem vezes o plano que meu pai havia traçado para a missão.
— Eu ainda não consigo entender, de onde vossa mãe tirou esse nome. Precious.
Comentei ao me sentar ao lado de , que estava ao topo de um dos rochedos olhando o mar.
— Minha mãe sempre gostou de chamar atenção, não recrimine-a. — disse ele mantendo sua atenção no mar.
— Ainda assim, ela gostava de mitologia grega, porque não Afrodite? — retruquei — É um nome ineteressante.
— Vai mesmo implicar com o nome da minha mãe agora? — ele me olhou.
Aquele olhar sério.
— Não estou implicando, só comentei. — desviei meu olhar dele e voltei para frente.
Por mais que eu tentasse, não conseguia encará-lo, era como seu ele lê-se me por inteira, de uma forma inexplicável.
— O que faz aqui?! — perguntou ele — Se cansou de correr atrás do Mascote?
— Hum… Que cheiro de amargura. — brinquei.
— Se veio para debochar ou algo assim, volte pela mesma trilha. — ele se levantou — E deixe-me sozinho.
— Calma marujo, só estava brincando. — disse me levantando também — Sebastian está treinando com meu pai, e eu…
— Você? — ele olhou-me com certa frieza, algo que nunca havia acontecido.
— Não precisa ficar com raiva de mim. — cruzei os braços — Só vim fazer-lhe companhia, se não o quer.
Me desviei dele para me afastar.
— Espere. — segurou em minha mão.
Aquilo me fez prender um sorriso que insistia em sair, mas permaneci séria e o olhei.
— O que?
— Me desculpe, só não estou bem hoje. — explicou ele.
— Continua pensando em sua mãe? — perguntei.
— Sim. — assentiu ele — Hoje faz sete anos de sua morte.
— Pelo menos tem boas lembranças dela. — disse tentando lhe reconfortar — Pior sou eu, que nunca vi a minha e só sei que era uma... Nem sei o que ela era.
— Se está tentando amenizar, não deu certo. — ele riu — Mas sim, sua situação é bem pior.
— E nem estou preocupada. — me sentei novamente no chão — Mesmo que meu pai nem me considere sua filha e às vezes ignore minha existência, não me importo mais.
Senti seu olhar em minha direção, ele permaneceu em silêncio por um tempo.
— Não é pela seda. — disse ele.
— O que? — o olhei.
— Vamos partir primeiro daqui dois dias, pegaremos carona no Hunter. — explicou ele.
— E para onde vamos?
— Outro navio pirata foi vítima de motim, já é o quarto em menos de um ano. — respondeu prontamente — Há relatos que um navio de velas vermelhas foi visto acompanhado de uma pequena frota, os mesmos que navios.
— Mas quem estaria montando um exército pirata? — perguntei confusa.
— Não sabemos, mas seu pai quer descobrir, por isso, voltaremos a Cingapura no Hunter, e de lá partimos para nossa aventura.
— Sebastian vem com a gente? — estava curiosa até onde ele estava pronto.
— Não, o capitão disse que quanto menos pessoas envolvidas, melhor. — ele voltou o olhar para o horizonte — Está decepcionada por isso?
— Não. — me levantei novamente e o olhei, fazendo-o olhar para mim — Eu resolvi que não vale a pena, o Mascote jamais será um pirata, além do mais… Eu sempre ganho dele, que desafio há nisso.
Ele sorriu de canto, mantendo-se como estava.
Mas, no final, você não pode me rejeitar,
Você vai se esconder e roubar olhares meus
- Monster / EXO
Hunter
Oceano Pacífico Sul - Primavera de 1843
Nós seguimos de barco até a coordenada do oceano em que o navio Hunter estaria a nossa espera. O capitão Servis não era tão cavalheiro ou receptivo quanto o capitão Salazar, mas como tinha alguns débitos com o Bella Donna, não poderia negar este favor. Minha preocupação não era com sua tripulação ou seu frequente mau humor, mas sim um único nome: .
— Buon giorno, capitão. — disse assim que subimos ao convés.
— Buon giorno, marujo, senhorita. — ele voltou seu olhar para , surpreso por vê-la.
— Capitão. — ela moveu de leve sua face em cumprimento, olhando ao redor os detalhes do navio.
— Não faça cara de nojo. — brinquei com ela num tom baixo.
— Admita, já estivemos em lugares mais limpos que esse navio. — ela fez outra careta.
— Agradeça por não ser o Folks, aquele navio sim é nojento. — rimos de forma discreta, pois os marujos os olhavam com cara feia.
O Hunter não possuía os luxos que o Bella Donna nos proporciona, apesar do capitão Servis ter sido um nobre no passado, um de seus segredos guardados pelo capitão Salazar. Pelo menos seus marujos não cheiravam a peixe podre, como os ratos do Folks.
Duas semanas ao mar e já estava se sentindo entediada. Mas não a recriminava, não estávamos em nosso navio, eles não eram amigáveis. Talvez eu estivesse mais preocupado com nossa missão que não percebia isso. Era preocupante o fato que vários navios piratas estarem fazendo motim logo após avistarem um navio de velas vermelhas. Quanto mais eu pensava nesse assunto, mais me perguntava como tudo começou e quem seria o próximo. Minha preocupação era com o Bella Donna e o capitão Salazar. Ele se fazia de durão para os marujos, mas tinha um coração mole.
— Não devia estar dormindo? — perguntou-me ao se aproximar de mim na proa do navio.
— Estou sem sono. — mantive meu olhar ao mar, olhando o reflexo que a lua formava sob as águas.
— Preocupado com algo? — ela se colocou em meu lado.
— Sempre estou preocupado com algo. — soltei uma risada fraca.
— Podes me contar ou é vosso segredo com meu pai?
— Olhas o ciúmes. — brinquei rindo dela.
— Não é ciúmes, só curiosidade.
— Nossa preocupação é com o tal navio de velas vermelhas. — respondi diretamente a olhando.
— Você sempre menciona tal navio, porém não relata toda a história. — resmungou ela fazendo bico disfarçado.
— Começou no verão passado, quando o Mademoiselle do capitão Dong foi atacado, era o que achavam, quando apareceu um sobrevivente em uma ilha desconhecida dizendo que um navio de velas vermelhas havia aparecido, e em minutos todos os marujos declararam motim. — expliquei voltando meu olhar para o mar.
— Como isso pode acontecer? É estranho pensar em tal situação… Será que é um navio com bruxas?
— Não sei. — eu ri de sua suposição.
— Não ria. — ela bateu em meu ombro — Estou falando sério.
— Desculpa-me, mas não consigo imaginar nada sobre isso, apenas que devemos tomar cuidado.
— Então não vamos atrás dele?
— Claro que não, iremos investigar sobre. — voltei-me para ela, estava com um olhar decepcionado.
— Que pena, já estava a imaginar nosso ataque surpresa. — seu olhar brilhou um pouco — Lâminas cruzadas, piratas sendo jogados ao mar...
— Você e sua mente fértil. — ri dela — Vamos para Cingapura primeiro.
— Hum... Cingapura é divertido, às vezes.
— Cingapura é sempre divertido para mim. — senti um olhar malicioso saindo de mim.
Ela fez uma cara de nojo disfarçada. Certamente por se lembrar do que seria a minha diversão. Confesso que tinha algumas "amigas" espalhadas pelas tabernas, e com elas eu me divertia muito pelas noites calorosas da cidade. Algo que a irritava profundamente, por mais que dissesse não amar-me, sentia ciúmes quando outras mulheres se aproximavam de mim, e eu gostava disso de um jeito estranho e bobo.
— Andem marujos, não temos o dia todo, zarpamos ao anoitecer. — ordenou o capitão Servis assim que atracamos no porto leste de Cingapura.
— Capitão nos dispersamos aqui. — disse ao me aproximar dele.
— Desejo sorte em sua busca e se descobrir algo…
— Saberei onde estará vosso navio. — assenti.
— E não se esqueça de passar o recado para…
— Não me esquecerei. — eu me afastei dele e segui em direção , que já encaixava vossa espada na bainha.
— Que recado deves passar para ele? — perguntou ela.
— Leitura labial? Está se tornando muito curiosa. — ri de leve.
— Se sou assim é porque vós sentes prazeres em esconder-me as coisas. — ela colocou a mão na cintura e me olhou atravessado.
— Tudo bem. — eu ri — Vou te contar onde irei estar noite e com quem estarei.
— Que nojo. — ela fez gestos que vomitaria — Esse tipo de coisa passo de saber, não me importa em que quarto e com que meretriz passarás a noite.
— Que mente pecaminosa é a vossa, quem disse que estava falando de tal assunto. — mantive certa ironia em minha voz.
— Seu olhar vos denuncia... Piratas. — ela deu de ombros, fazendo-me rir.
Eu comecei a caminhar em direção ao fluxo de pessoas na rua principal da cidade, rindo de seus comentários sobre minhas aventuras noturnas. Nossa primeira parada foi o mercado de Vallare, que pertencia a família mais poderosa de Cingapura: os Dominus. Vallare era o local onde acontecia todo o tipo de comércio entre os piratas, lugar onde as cargas piratas se transformavam em produtos diretamente legalizados pela Companhia das Índias Orientais. Expliquei a minha companheira de aventura o motivo de estarmos naquele lugar, nossa missão era conseguir um navio. Adentramos a grande estalagem, seus funcionários já trabalhavam arduamente carregando as pilhagens dos navios que atracaram essa manhã.
Olhei para discretamente para a lateral direita, e avistei um rosto conhecido: Finley Baker. O capitão Salazar já havia mencionado sobre tal homem. Mas o que estaria fazendo em meio a escória da sociedade, um nobre inglês?
— Ora ora… A que devo a honra de receber o aprendiz do Bella Donna. — a sinuosa voz de Ravena soou na estalagem — Pelo que sei, já fizemos negócios com vocês este ano.
Olhei para trás e a vi descendo a escadaria principal de acesso ao segundo andar da estalagem, no qual pertencia a famosa taverna de Vallare, uma das mais frequentadas pelos piratas.
— O que nos traz aqui são outros assuntos. — mantive meu olhar nela, porém percebi uma certa áurea de fúria vinda do meu lado.
Claro que não gostava de Ravena, não só pela sua arrogância como também por seus interesses em mim. Mas o que eu poderia fazer? Precisávamos de uma certa aliada em nossa busca e um navio capacitado para dois tripulantes.
— E o que a princesinha veio fazer junto? — Ravena a olhou com superioridade.
— A quem achas que pode chamar de princesa? — tocou de leve em sua espada.
— Não estamos aqui para isso. — segurei de leve em seu braço — Sabes que ela só quer te provocar, deixe isso comigo.
— , sei muito bem o que ela quer. — me olhou séria, pude ver uma ponta de ciúmes saindo de vosso olhar.
Respirei fundo, engolindo minha sensação de vitória.
— Ravena, o assunto é sério e de vosso interesse. — voltei meu olhar para frente — Podemos ir para um lugar mais reservado?
— Só nós dois? — ela soltou um sorriso malicioso.
— Não. — segurei-me para não rir da situação, mantendo-me focado em nossa missão.
— Vamos ao meu escritório. — ela soltou um suspiro decepcionado e se virou mostrando-nos o caminho.
Assim, seguimos até uma grande porta em que adentramos. Um de seus funcionários mais fiéis já aguardava lá dentro, parecia estar fazendo a contagem de algo.
— Então, digam, o que seria de meu interesse? — Ravena sentou em cima de sua mesa de madeira maciça, cruzando as pernas, deixando que os rasgos em vosso vestido mostrasse parte de vossa perna.
Ela gostava mesmo de provocar.
— Ela realmente precisa fazer isso? — sussurrou para mim em indignação.
— Sabes dos vários ataques que navios piratas vem sofrendo. — iniciei não dando vazão às reclamações da dama ao meu lado — E que um navio de velas vermelhas tem sido o causador disso.
— Sim, ouvi alguns rumores… Mas... O que eu e minha família nos relacionamos a isso? Se vocês piratas não conseguem se defender…
— Sabes que estamos bem longe da era de ouro dos piratas, e agora a cada dia menos navios tem atracado em Cingapura, o que significa que a cada dia você e vossa família terão menos mercadorias e menos dinheiro. — disse mantendo seu tom firme, convicta de vossas palavras.
Essa era a minha pirata.
— Sabes que pode perder muito, se todo o mar estiver sob o comando de um único capitão. — reforcei para que refletisse.
— Não seria bom para os negócios. — ela mordeu os lábios inferiores, como se analisasse o que acontecia — E sabem quem é o capitão do tal navio?
— Não, sabemos que ele vem provocando motins, mas não sabemos como. — respondi.
— Se não sabem, em que eu poderia ajudar? — ela cruzou os braços.
— Precisamos de um navio. — disse prontamente — Que possa ser tripulado por duas pessoas.
Ela se levantou da mesa e virou o corpo caminhando em direção a janela.
— Te darei um… Porém, ele será tripulado por três pessoas. — disse ela.
— Senhora, não está pensando em ir? Está? — seu funcionário a questionou.
— Não Fox, mas você irá com eles. — ela me olhou — Preciso defender meu investimento.
— Não iremos te roubar, se é isso que vos preocupa. — contestou.
— Eu sei que não, mas isso não me obriga a confiar em vocês. — ela deu outro daqueles sorrisos superiores — Bem, não sou eu quem precisa de ajuda aqui…
— Nós assentimos. — disse antes que questionasse novamente — Partiremos em três dias.
— Em três dias o navio estará pronto. — Ravena se aproximou de mim para sussurrar em meu ouvido — Te espero à noite?
Me fiz de desentendido e assim que ela saiu do escritório, voltei meu olhar para com seus braços cruzados e seu olhar mortal.
— Não acredito que aceitou. — reclamou ela.
— Precisamos de um navio, deverias estar contente.
— Não passas de um vendido. — ela estava mesmo irritada, virou para sair do escritório.
— Pares de recriminar-me, temos muito a fazer. — retruquei seguindo-a.
— Muito a fazer? — ela parou e olhou-me indignada — Nem mesmo me conta por completo nossa missão, nunca divides nada comigo, mas com… — ela respirou fundo.
— O que mais queres que eu conto? — agora eu estava sem entender.
— Ficarei no Black Bart, fique à vontade para se divertir o quanto quiser com quem quiser.
Ela saiu em fúria. Tinha sempre o mesmo humor confuso em Cingapura, em horas animada e em outras brigando comigo. Os próximos dias não seria de diversão para mim, apesar daquele bobo coração achar que mim. Precisava descobrir mais sobre o navio de velas vermelhas e sabia que uma pessoa poderia falar sobre isso. Assim que saí de Vallera, dei algumas voltas pelo mercado, uma sensação estranha surgiu dentro de mim, como se eu tivesse sendo seguido. Segui por algumas ruas aleatórias até que parei em frente ao ferreiro, do lado de fora já ouvia o barulho do homem com seus instrumentos.
Toquei na porta que estava entreaberta e adentrei, deslizei minha mão direita pelas paredes de barro por um momento, me lembrando das estações que passei ali quando criança. Era difícil esquecer algumas memórias que tinha de infância em Cingapura, a cada ano eu morava em um lugar diferente sendo arrastado por minha mãe, até que finalmente acabei no Bella Donna.
— Veio para ficar lembrando o passado? — perguntou Shakar mantendo sua atenção na espada que batia com tanta força a marreta.
— Vim em busca de algumas respostas. — me pronunciei o observando minuciosamente.
— E onde está a dama pirata? — sua pergunta soou com ironia — Ambos nunca estão separados.
Isso é verdade.
— Não sei, deve estar arrumando algum tipo de confusão pelas tavernas da cidade. — respondi.
— Quais respostas veio buscar aqui? Não está achando que sou um vidente… — ele soltou uma gargalhada estranha.
— Não, tenho certeza que não é, mas sei que deves saber sobre o navio de velas vermelhas. — introduzi o assunto.
— Esta história vem tirado o sono de muitos aqui em Cingapura. E há outros que poderia matar alguém só por mencionar tal assunto. — ele soltou um suspiro forte — Mais do que no tempo em que vossa mãe ficou a vossa espera no ventre.
Ainda não entendia o motivo dele sempre voltar no assunto de quando minha mãe estava grávida de mim.
— Todos queriam saber se eram vosso pai. — ele riu — No entanto, lady Precious jamais revelou quem era.
— Não me importa sobre isso, apenas diga o que sabe sobre o navio.
— Não sei de muita coisa, meus contatos ainda não obtiveram nada… — ele parou de martelar e me olhou — Mas, sei de alguém que podes te contar algo interessante.
— Quem?! — perguntei.
— Dizem que há um raro sobrevivente na baía de La Vinóis, que foi resgatado pelo Exodus. — ele começou a analisar a lâmina da espada e seu peso — O nome do marujo é Kim, está sob os cuidados de um ancião chamado Klaus.
— Agradeço pela informação. — me virei para sair.
— . — ele me chamou.
— Sim?! — o olhei.
— Tome cuidado, a vida no mar pode ser traiçoeira. — deste vez seu olhar sério parecia preocupado.
— O mar é tudo que tenho.
— Não, não é tudo.
— E o que achas que tenho a mais?!
— Devias perguntar isso ao capitão Salazar.
— O que quer dizer com isso? Shakar?
— Que ele sabe quem é vosso pai. — ele se virou e voltou a martelar a lâmina da espada que estava em vossa mão.
Peguei-me paralisado por suas palavras, mas logo voltei a realidade. Por mais que pudesse ser verdade e o capitão soubesse disso, não me importava em descobrir, minha vida era no mar e eu seria pirata para sempre. Voltei meus pensamentos para a nova informação que eu tinha, eram poucos os piratas que sabiam a localização correta da baía de La Vinóis, e eu conhecia uma que certamente me ajudaria.
- x -
Que minha noite teria sido interessante nos aposentos de Ravena, eu não poderia duvidar. Mas eu havia jurado para mim mesmo que não tocaria nenhuma outra mulher a não ser a que meu coração pertencia. Talvez por uma louca influência de Sebastian com seu amor incontestável pela tal lady Lewis, que fez-me repensar todos os meus princípios. Passei o dia na casa do ferreiro, avaliando o mapa e algumas anotações que havia feito sobre os ataques do navio de velas vermelhas. Os cursos das viagens dos navios abatidos e o fato de todos estarem cheios de carga era no mínimo curioso a pensar que poderiam ter informantes.
Ao pôr-do-sol segui para a Taverna Sins. O lugar certo para encontrar a capitã Nairóbi, ou pelo menos alguma bela pirata de vossa tripulação. Para minha sorte, lá estava ela com mais sete mulheres bebendo em uma mesa aos fundos, pareciam comemorar algo. Eu nunca havia notado que a maioria das tavernas eram semelhantes, mal iluminadas com suas mesas e cadeiras de madeiras contrabandeadas de ilhas desconhecidas, cheirando a rum e cheias de piratas querendo se divertir em todos os sentidos possíveis. Porém, a Sins era diferente, talvez por pertencer a madame Fleur, que sempre deixava seu charme e bom gosto francês exalar pelo lugar.
Dei alguns passos até uma mesa que estava vazia e sentei-me, logo fui servido pela filha de Fleur, que juntamente com a caneca de rum, deixou também um bilhete, que logo guardei no bolso para ler mais tarde. Passei algum tempo ali, observando as belas piratas do navio Ciganos se divertirem em meios as garrafas de rum.
— Estava me perguntando se terias coragem de se aproximar de minha mesa ou eu teria que vir até vós. — disse a capitã Nairóbi ao se aproximar e virar a cadeira para se sentar, debruçando-se sobre as costas da mesma — Salazar o mandou aqui?
— Sim e não. — respondi.
— Hum… — ela arqueou a sobrancelha — Enigmático como vosso mestre, odeio e não mesmo tempo é o charme de vocês.
Sorri de canto.
— Preciso de alguém que me explique como chegar a baía de La Vinóis. — direto e preciso.
Ela soltou uma gargalhada debochada.
— Não se explica como chegar, simplesmente se chega lá. — ela manteve seu olhar sereno de sempre, mas com uma ponta de malícia — O que desejas encontrar lá?
— Um homem que sobreviveu ao navio de velas vermelhas.
De sereno seu olhar ficou sério.
— Não devias falar sobre isso tão abertamente, alguns piratas não acreditam nessas histórias.
— Deveriam, já são quatro navios em três estações. — comentei.
— Por isso Salazar o mandou? Para investigar? Muito previsível. — ela mordeu seu lábio inferior.
— Vais me ajudar ou não? — mantive meu olhar fixo nela, porém atendo a movimentação de suas piratas.
— Talvez. Venha ao meu navio amanhã ao pôr-do-sol, assim talvez faremos um acordo. — disse se levantando — E podes levar a aprendiz de capitã.
— Como sabe que está aqui?!
— Intuição feminina. — ela riu.
Eu voltei meu olhar para a caneca de rum e terminei de tomar. Assim que saí da taberna segui para o mercado, devia uma convincente explicação a Ravena por não ter comparecido a nosso encontro. Nem mesmo havia chegado perto e já ouvi da rua uma movimentação vinda de dentro da estalagem, seguido de gritos. Respirei fundo pedido a Deus para que aquilo não tivesse participação de .
Dito e feito. Lá estava ela cruzando lâminas com Ravena, em meio aos destroços do lugar. Pensei pacientemente se deveria intervir naquilo até que Fox passou correndo por mim para segurar sua senhora, tive que tomar impulso e ir até para pará-la.
— O que achas que está a fazer? Estás louca? — disse cruzando a minha espada com a dela.
— Saia da minha frente, vou cortar esta em dois. — retrucou investindo contra mim.
— Pois venha, aprendiz de pirata. — Ravena soltou uma gargalhada.
Eu sabia os pontos fracos e fortes de em uma luta, e como sempre conseguia desarmá-la, principalmente em seus momentos de descontrole, o fiz sem a menor dificuldade. Jogando sua espada para longe, segurei-lhe pela cintura imobilizando-a.
— Acalme-se, por favor. — sussurrei em vosso ouvido.
— Me solta. — ela se remexeu em meus braços sem sucesso.
— Não, até se acalmar.
— Solte-me, Fox. — Ravena se afastou de seu funcionário — Não me importo com navio de velas vermelhas ou se os piratas estão sendo extintos, nosso acordo está acabado.
Ela virou-se e subiu as escadas. Eu não sabia o que fazer com .
— Poderia soltar-me agora? — sussurrou ela.
A soltei permanecendo em silêncio, peguei minha espada e guardei.
— Não vais dizer nada? — perguntou ela.
— O que queres ouvir de mim?
— Não sei… Brigues comigo, diz que estraguei tudo, melhor isso do que teu silêncio.
Era certo que ela odiava quando eu a ignorava e não dizia nada.
— O que te fez travar um duelo com Ravena? — perguntei.
— Ela insultou-me, não deixaria passar.
— Insultou-te?
— Sim.
— Brigastes com ela por insultar-te? Sabes que precisamos de um barco e tínhamos um acordo, não podia deixar vosso orgulho de lado pelo menos uma vez? — percebi minha voz alterada, então me controlei — Não deverias nem para estar aqui.
— Não aparecestes o dia todo, pensei que estivesse…
— Ah, então foste por isso? Se não gostas de mim, porque a preocupação com onde ou com quem estou?
Ela silenciou-se. Afastei-me saindo pela porta, estava em uma mistura de frustração e irritação dentro de mim, porém não queria discutir mais.
— . — gritou ela.
— Não me siga. — gritei de volta.
Eu já não sabia mais se queria ou não entender o que se passava na mente de . Continuei dando meus passos desgovernados sem direção, até que a sensação de estar sendo seguido retornou. A cada instante seguia por ruas ainda mais escuras, afim de encurralar a pessoa que perseguia-me. Ao virar a esquina para entrar em outra rua, encostei-me na parede e esperei a pessoa que estava atrás de mim passar, então a peguei pelo braço e empurrei para a parede, puxando da outra bainha uma adaga e encostando em seu pescoço.
— Quem é... — fiquei um pouco estático ao reconhecer aquele olhar — Dara Lotwook.
— É assim que trata uma velha amiga de vossa mãe? — perguntou ela.
— Você era amiga da minha mãe, não minha. — afastei-me dela.
— Cresceste e tornaste um belo homem. — elogiou ela, seu olhar de víbora era o mesmo.
— O que fazes em Cingapura? — perguntei sem dar vazão a suas palavras — A última notícia que tive, era de estar em Londres.
— Estou de passagem. — explicou ela — A propósito, gostaria que me chamasse de lady Evans agora.
— Encontrou um nobre para roubar-lhe tudo?
— Sinto-me ofendida por vosso pensamento sobre mim. Meus sentimentos por meu marido são puros.
Suas palavras não me convenciam.
— Lady Evans, meus dias estão sendo turbulentos, não tenho tempo para dar-lhe. — me afastei dela.
— Espera. — ela segurou em minha mão — Sei que não gostas de mim, mas por favor, ouça-me.
— Diga e depois eu irei.
— É sobre o vosso pai. — disse ela.
— Não quero saber. — me soltei de sua mão.
— Mas deveria, jurei a vossa mãe que ajudaria-lhe a se encontrar com ele. — insistiu.
— Eu não quero, não faz nenhuma diferença para mim.
— Eu respeito sua decisão, mas quero que sabia que ele ainda vive, e mora em Londres.
— Como disse, não me importa. — recusei.
— Mas deverias. — a voz de soou próximo.
Ouvi seus passos até nós.
— Eu disse para não vir atrás de mim. — a olhei.
— E a vi te seguindo e achei que precisaria de ajuda. — explicou.
— Olha, a filha do capitão Salazar. — Dara a olhou admirada.
— Dara Lotwook. — manteve seu olhar indiferente.
— Lady Evans agora. — corrigiu-a.
— Um título de nobreza não lhe fará melhor que nós, nem apagará vosso passado. — fez uma careta — Para mim continuará sendo só mais uma das muitas que meu pai já conheceu.
— Ainda com esse rancor no coração pequena criança. — Lotwook retrucou.
— Eu não sou mais uma criança. — a confrontou.
— Não é o que vejo em seus olhos.
— Nosso assunto termina aqui. — coloquei-me entre ambas para evitar mais discussões — Não deverias ter vindo lady Evans, não me interesso por este passado.
Peguei na mão de e puxei comigo para fora de lá.
— Você gosta mesmo de entrar em confusão. — comentei.
— É mais forte do que eu. — ela riu — Mas…
— Eu não vou atrás dele.
— Deveria, é seu pai.
— Se vossa mãe aparecesse? Irias atrás dela?
— Talvez. — respondeu rapidamente — Para saber o motivo de ter me deixado pelo menos, ou se algum dia ela me amou.
— Eu não quero saber disso. — soltei um suspiro.
— Bem… — ela se espreguiçou — Tenho uma sugestão.
— Qual?
— Descansarmos. — ela me olhou — Precisamos nos preparar.
— Lembras que não temos mais navio? — a lembrei.
— Não precisamos de um navio.
— Como podes falar com tanta segurança?
— Soube que a capitã Nairóbi está em Cingapura, pensei… Melhor dever para ela do que para Ravena.
— Nós dois sabemos o motivo de não gostar de Ravena. — sorriu de canto maliciosamente.
— Se achas que tenho ciúmes de vós, está enganado. — ela olhou para frente.
— Não deveria contar-lhe, mas eu não estive com Ravena. — retruquei.
— Como assim? — ela parou no meio da rua e me olhou confusa — Ravena disse…
— Acredita mais nela que em mim?
— Bem, o olhar dela é mais falso que os piratas da Ilha de Pena. — nós rimos de vosso comentário — Mas… Não fostes mesmo?
— Não. — segurei em sua mão — Aprendi algumas coisas com Sebastian, decidi que assim como meu coração, meu corpo também pertencerá a somente uma mulher.
Meu olhar intenso para parecia constrangê-la, mas estava sendo honesto com nós dois. desviou seu olhar para o lado, parecia sem reação por minhas palavras. Então, houve um largo silêncio entre nós.
— O que será que está acontecendo no Bella Donna agora? — disse ela aleatoriamente.
— Não consigo imaginar. — mais uma vez frustrado por não corresponder-me — Espero que o capitão consiga chegar na China e fazer muitos acordos.
Apesar da taverna Black Bart ser um atrativo, ponderei em passar as próximas horas na casa do ferreiro com , assim não atrairíamos atenção e ela não causaria mais nenhuma confusão. Ao cair da noite do nosso terceiro dia em Cingapura, subimos ao Ciganos para fazer nosso acordo com a capitã Nairóbi. Poderia dizer que seria difícil convencê-la a nos ajudar, porém um golpe do destino a fez se juntar a causa. Uma de suas espiãs havia noticiado o motim contra o capitão Manphs. Mais um navio havia sido abatido e desta vez era o Exodus.
— Cinco navios, cinco navios em quatro estações. — disse a capitã ao avaliar suas cartas de navegação — Ainda não acredito.
— É por isso que estamos a dois meses no mar em busca da baía de La Vinóis. — eu comentei ao observá-la controlando o timão — Todos os navios tomados estavam com grandes cargas, não é coincidência capitã.
— Quanto mais nos afastamos do Bella Donna, mais me preocupo com meu pai. — permanecia sentada na escada com a atenção voltada para o pingente na gargantilha em vosso pescoço.
— Pretende permanecer na baía capitã? — perguntei.
— Se existe mesmo alguém tomando os navios, devo proteger o Ciganos e minhas meninas. — respondeu — Não posso correr este risco, mas sei de uma pessoa em La Vinóis que pode fornecer um barco a vocês.
— Agradeço a ajuda.
Voltei meu olhar para o horizonte.
Mais algumas semanas ao mar até que finalmente chegamos a famosa baía de La Vinóis, a casa de todos os antigos piratas, onde puderam se esconder após a era de ouro da pirataria.
— Diz a lenda que os navios que formam a grande muralha, são da primeira frota da Companhia das Índias Orientais. — disse — Eu amava quando meu pai contava-nos essas histórias.
— Eu também. — concordei.
A capitã Nairóbi nos apresentou o ancião Klaus. Um velho barbudo e aparentemente rabugento, tinha um irritante gosto em mencionar assuntos sobre minha mãe.
— Parece que os sete mares conhece sua mãe. — brincou rindo de mim — Não fique assim, aquele velho só continuou repetindo porque ficou irritado da primeira vez.
— Não me importo mais.
— Não é o que diz seus olhos. — ela segurou em meu braço me virando para ela — Olhe para mim.
— O que?
— Não achas que deveria resolver logo este assunto sobre vossa mãe e o passado dela?
— O que eu ganharia sobre isso?
— Não sei, talvez algo mais que somente ser um pirata. Dara disse que seu pai está vivo.
— Não quero saber sobre ele.
— Pois eu quero, e se Dara sabe, com certeza meu pai também sabe quem é. — insistiu ela.
— Temos outras preocupações .
— Pois deixaremos isso em segundo lugar na nossa lista de prioridades. — declarou — Não deixarei que perca a oportunidade de saber quem é o homem que ajudou a trazer-lhe ao mundo.
Assenti para que não gerasse mais insistência de vossa parte e então seguimos para o navio em que o tal sobrevivente havia se hospedado. Kim tinha traços orientais e um forte sotaque, de olhar temeroso, começou a nos contar os momentos de ataque ao navio Marie, que vivenciou.
— Sinto-me perplexa pela história. — comentou assim que subimos ao convés — Como pode? Como este tal Revenge poderia ser um navio tão superior assim? E quem é esse capitão Scar?
— Precisamos voltar ao Bella Donna, o capitão Salazar precisa saber sobre isso. — conclui.
— Como voltaremos?
— A capitã Nairóbi disse que poderia nos arranjar uma carona, vamos esperar.
E realmente esperamos. Passaram algumas semanas até que o navio Octavis levantou âncora e seguiu mar a dentro. Era nossa embarcação rumo as coordenadas onde possivelmente o Bella Donna estaria a nossa espera.
— Oh não! — ouvi o sussurro do contramestre e segui seu olhar.
Avistei no horizonte seis navios bombardeando um. Pegando o binóculo, constatei pelas velas que era o Bella Donna.
— Capitão… — olhei para que já havia entendido o significado de minha expressão.
— Capitão Cutler, temos que ajudá-los. — disse .
— Eu não posso, são seis navios contra um. — o homem se mostrou acovardado pelo medo de talvez também perder seu navio.
— Não podes dizer isso, é o Bella Donna e precisam da nossa ajuda. — reforcei alterando-me — Capitão Cutler, deve isso ao capitão Salazar.
— Salazar é meu amigo, mas não deixarei que levem meu navio. Se quiserem podem ir em um dos barcos.
Minha vontade inicial era de tirar minha espada e enfiar em suas entranhas, mas minha preocupação com o capitão Salazar era maior. Assim, desesperadamente, descemos um pequeno barco e na esperança de sermos capazes de salvá-los, seguimos mar a dentro em direção ao fogo cruzado. Foi quando gritou ao ver nosso navio ser tomado e logo depois nosso capitão ser atirado ao mar totalmente amarrado.
— Pai! — soltou outro grito tomando impulso para se jogar.
Então eu a segurei e pulei em seu lugar. Mesmo que soubesse nadar, eu sempre fui mais rápido que ela. Prendi meu ar o máximo que pude seguindo em direção ao capitão que afundava cada vez mais, tentava não me levar pelo desespero ou pela força que começava a me faltar.
Ainda que aquilo me custasse a vida, eu salvaria o capitão Salazar.
“Às vezes ser corajoso demais pode ser ruim.”
- Face / Nu'Est
Scar
Baía de La Vinóis - Outono de 1845
Eu recobrei a consciência assim que o ar voltou em meus pulmões. Estava tudo rodando em minha cabeça, um zunido forte no ouvido e o caos ao meu redor. Aos poucos fui voltando ao sentido e logo a voz da capitã Nairobi começou a ficar ainda mais nítida.
— Carregar os canhões… — seu grito parecia fazer aquele navio tremer com as águas agitadas do mar.
Uma guerra estava acontecendo naquele momento e eu só conseguia manter meus olhos focados em uma pessoa: . Ela estava ajoelhada ao meu lado, encharcada de água e apreensiva para que eu desse algum sinal de vida.
— Seu idiota… O mundo desabando e você não me responde. — ela segurou em minha camisa me sacolejando.
— Estou tentando me recuperar. — sussurrei apertando meus olhos para que minha visão se estabelecesse — O que está acontecendo?
— Os navios da Bahia vieram em nosso socorro. — respondeu — Estamos na melhor das batalhas.
— E o que está fazendo sem sua espada? — perguntei abrindo meus olhos novamente — Me ajuda a levantar?
— Claro. — ela se levantou e esticou a mão, de leve mostrou sua espada — Quem disse que não estou preparada.
Sorri com satisfação, aquela era a minha pirata.
— Onde está o capitão? — perguntei ao olhar as mulheres do Ciganos se movendo de acordo com as ordens recebidas.
— Na cabine se recuperando, ele está muito machucado. — respondeu.
— Então vamos fazer isso pelo capitão. — sorri de canto.
Naquele momento os olhos dela brilharam ao som dos canhões, como uma música aos nossos ouvidos, até mesmo o mar estava a nosso favor. Foi admirável saber que o tiro de socorro havia sido feito pelo navio do capitão Cutler, o que alertou os outros navios a virem em nosso socorro. Estava o Mademoiselle, Marie, EXODUS, nosso precioso Bella Donna e o Queen Anne’s Revenge do lado inimigo, e do nosso lado o Ciganos onde estávamos, o Octavis, Hunter, Folks e curiosamente o Atlas e Videl, ambos dos piratas mais antigos da Bahia de La Vinóis.
Por mais que pudesse achar tudo aquilo fascinante, meu coração pulsava por mais, eu queria subir a bordo no navio do homem que ousou tomar o Bella Donna, como o nome de seu navio, eu queria vingança.
— Capitã. — gritei para Nairóbi — Preciso subir a bordo daquele navio.
Apontei para o Queen Anne’s Revenge.
— Você está louco? — a capitã me olhou surpresa — Já estamos a todo vapor, iremos vencê-los.
— Eu também irei. — disse — Preciso enfrentar aquele pirata.
— Capitã. — insisti.
Eu não iria contra em sua decisão, pois a minha loucura era a mesma e nada me faria mais feliz que enfrentar o tal capitão Scar. A capitã Nairóbi deu um sorriso de canto de satisfação, e ordenou que todas as suas piratas se preparassem para um confronto direto, então gritou para o capitão Servis para que seu navio também emparelhassem. Assim, seriam dois contra um e poderíamos ter mais chances.
Tudo aconteceu de forma rápida, porém para mim foi como uma leve tarde na ilha Junta onde o tempo passava lentamente. Com os navios emparelhados, eu e conseguimos passar para o Queen Anne’s Revenge, e lá estava o tal capitão Scar bem ao centro perto do mastro principal com sua espada na mão, parecia nos esperar. Olhei de relance para , seu olhar fixo no inimigo só conseguiu me indicar uma coisa: seríamos vitoriosos.
Cruzar lâminas com o inimigo foi ainda mais emocionante que mil pilhagens dos navios da Companhia das Índias Orientais, e tanto eu como duelamos contra ele juntamente até desarmá-lo, devo admitir que o tal Scar era um bom espadachim. Ao final de sua queda, assim que cravou sua espada no peito dele, em um piscar de olhos, todos os marujos dos barcos inimigos pararam o ataque.
Ficamos estáticos sem entender nada.
- x -
Novamente na Bahia de La Vinóis, estávamos à espera de notícias do capitão Salazar, que permanecia sob os cuidados da filha do ancião Klaus. andava de um lado para o outro, enquanto eu me mantinha sentado em um banco observando os curativos em meu corpo. Ainda me sentia atordoado por tudo que havia acontecido conosco naquela batalha, era surreal imaginar que o tal capitão Scar tomava os navios a base de hipnose.
— Seu capitão os aguarda. — disse a mulher ao sair da cabine.
Logo eu e entramos, nossa preocupação era visível.
— Capitão. — mantive-me um pouco afastado da cama olhando-o — Como está.
— Agora estou bem, graças a você marujo. — ele tossiu fraco.
— Só pulei antes de nossa pirata corajosa. — disse voltando meu olhar para ela.
O capitão sorriu. Certamente sabia que o salvaria se eu não a impedisse e fosse em seu lugar.
— Tem certeza que está bem?! — o olhou preocupada, se aproximando mais e sentando ao seu lado — O senhor está muito magro, o que lhe fizeram?
— Para minha surpresa, o capitão Scar me manteve vivo e preso. — sua voz estava baixa e meio fraca — Foi nesse tempo que eu observei como os marujos se comportavam de uma forma estranha, descobri semanas depois que ele usava um tipo de hipnose egípcia para controlar e dominar os navios.
— Deve ter sofrido muito capião. — disse ainda estático com os fatos.
— Mas o que importa é que sobreviveu. — disse — Pai, em todo aquele momento de confusão e agora também, nem eu e nem vimos o Mascote, o que aconteceu com ele?
— Felizmente antes de sofrermos o ataque, deixei o nosso Mascote na costa do Japão. — respondeu o capitão — Já era a hora dele seguir seu caminho, afinal ele não nasceu para ser um pirata.
O capitão estava certo, o objetivo de Sebastian sempre foi se tornar um dos homens mais ricos e poderosos de toda Inglaterra, assim poderia finalmente ter o amor de sua lady Lewis.
— E agora, como ficamos com o Bella Donna todo destruído? — perguntou .
— Vocês irão reconstruí-lo. — respondeu ele.
— Nós?! Mas e o senhor pai?
— Eu vou me aposentar. — respondeu com segurança — Minha vida no mar já obteve muitas aventuras que agora vocês dois terão que continuar.
— Tem certeza disso capitão? — perguntei.
— Sim, eu tenho, acho que preciso de umas férias prolongadas aqui na Bahia de La Vinóis. — ele riu baixo — E quanto aos navios roubados, quem matou Scar será o novo capitão.
— Então teremos uma nova capitã. — olhei para — Foi a vossa espada que perfurou o peito dele.
— A nossa espada. — corrigiu ela — Foi você quem o derrubou para mim.
— Tenho certeza que ambos com esta frota controlarão os sete mares.
— Quem sabe. — riu.
— . — o capitão me olhou diretamente — Preciso falar te uma coisa importante.
— Sobre?
— Vosso pai. — ele olhou para a filha — Poderia nos deixar a sós.
— Não há segredos entre eu e . — disse convicto.
— Hum… — ela se levantou e me olhou — Acho que você precisa resolver este assunto sozinho.
Era estranho, pela primeira vez não se mostrava curiosa o suficiente para ficar e ouvir toda a conversa como das outras vezes, seu olhar estava sereno e logo um sorriso singelo saiu em sua face. Eu sabia que ela desejava que eu me rendesse ao passado e procurasse meu pai, mas ainda continuava relutante.
— O que desejas me dizer? — perguntei assim que ela saiu.
— Marujo, quando sua mãe lhe colocou sob minha proteção, prometi a ela que contaria tudo o que sabia caso quisesse conhecer o homem que ajudou a trazer-te ao mundo. — começou.
— Se este homem se preocupasse comigo, já teria vindo atrás de mim. Não acha?
— Não deixe que esta mágoa te impeça de descobrir suas origens.
— Minha origem é o mar.
— , sabes que não é. — insistiu ele — Vosso pai é um nobre, curiosamente eu o conheço, é um bom homem, e talvez nem saiba o motivo de sua mãe ter fugido.
— Minha mãe fugiu?
— Sua mãe era a mulher mais independente e indomável que eu conhecia, mas ela amava seu pai, porém não teve coragem de contar-lhe que possuía um filho com ela.
— E com isso, me deixou sendo jogado por todos os lados.
— Ela te amava também, só não sabia demonstrar-lhe.
— Não acho que mudará minha decisão nossa conversa, não sei se neste momento de minha vida quero ter um pai. — fui sincero em minhas convicções — Já tenho um capitão.
— Mas este seu capitão jamais conseguirá dar-lhe o que precisa. — retrucou — Por isso…
— Por isso?!
— Lord Silar Allen, este é o nome de vosso pai. — ele respirou fundo — Tudo o que precisa para provar que és filho dele, está guardado na Ilha de Junta, existe um baú enterrado embaixo da casa de , a chave que abre está com Dara Lotwook.
— Não sei se eu quero saber sobre ele, mas… Agradeço sua preocupação, capitão.
Me afastei dele e saí da cabine. estava na proa do Ciganos olhando o mar. Me aproximei dela e fiquei ao seu lado em silêncio por um tempo.
— Como foi a conversa com meu pai? — perguntou, ainda era a mesma curiosa de sempre.
— Lord Silar Allen. — sussurrei — Este é o nome dele.
— Do seu pai?! — presumiu ela.
— Sim. — confirmei — Mas não quero saber sobre ele, não quero proximidades.
— Então não se aproxime. — ela se virou para mim e pegando em minha mão — O que importa é que estou aqui, não é?
— Sim. — sorri de canto, entrelaçando nossos dedos — E juntos ficaremos.
Se aquele era o momento certo ou não, não sabia, mas aproveitaria a oportunidade. Dei impulso no meu corpo e a beijei com toda a intensidade que guardava dentro de mim, eu a amava mais que o mar em dia de tempestade. Foram segundos de paralisia até que cedeu e retribuiu na mesma intensidade o beijo, fazendo meu corpo arrepiar-se ainda mais.
— Vão com calma, este é um navio pirata de respeito. — a voz da capitã Nairóbi soou próximo nos interrompendo.
— Perdoe-nos. — disse num tom baixo, ainda em êxtase.
— O que pretendem fazer agora? — perguntou ela para nós — Salazar disse que irá se aposentar do mar.
— Nós duas sabemos que ele quer é ter tempo para velejar com você. — a olhou como se soubesse dos planos do seu pai.
— Sabemos que os dias que pirataria estão acabando, a era de ouro dos piratas já passou e agora o que temos são migalhas apreendidas pela Companhia das Índias Orientais. — continuei — Vamos reconstruir o Bella Donna, pegaremos os outros navios construiremos uma grande frota de navios de transporte.
— Está pensando como os burgueses das grandes cidades. — comentou a capitã.
— Estou pensando em nosso futuro. — respondi segurando na mão de .
Sebastian não era o único que ansiava ser rico e poderoso. Se seu desejo era dominar a Inglaterra, o meu era estar no controle de todo o mar, mesmo que tivesse que legalizar todos os navios piratas transformando-os em um negócio de respeito.
Não hesite, você não precisa se sentir estranha
Você não precisa trazer nada, apenas segure minha mão, minha dama.
- Tempo / EXO
Black Pearl
Londres - Primavera de 1847
Ainda me lembrava da primeira vez que tinha visitado Londres, e somente Sebastian para me fazer voltar àquela cidade, porém, mesmo desprezando aqueles nobres soberbos, não perderia a oportunidade de ver meu amigo se casando com a mulher amada. Não me contive em observar cada detalhe de vossa casa no local mais cobiçado da cidade, o luxo era presente em cada detalhe, principalmente nos quadros que um dia pertenceram a famílias da nobreza.
— Tenho que admitir, lady Lewis realmente é uma dama que vale a pena esperar. — comentei num tom baixo segurando o riso.
Sabia que meu amigo era bem ciumento quando o assunto era sua dama.
— Agora é lady Winchester. — corrigiu Aidan rindo do primo.
— Mais respeito ambos. — Sebastian me lançou um olhar mortal.
— Calma meu amigo, sei muito bem o que é esperar pela mulher que faz seu coração acelerar. — voltei meu olhar para que se comportava ao conversar com a senhora Poppy.
— Eu é que estou curioso para saber como conquistou a indomada pirata. — Sebastian riu disfarçadamente.
— Não mais pirata, agora somos pessoas de bem, totalmente dentro das leis marítimas. — adverti — E por falar em leis, temos um assunto para resolver após seu casamento.
— Deixe-me pelo menos ter uma noite em paz com minha esposa. — pediu Sebastian — Falamos sobre negócios nos próximos dias.
— E por falar em negócios, ouvi rumores que conheceu muitos comerciantes na Índia. — comentou Aidan.
— Sim, quando se viaja demais e conhece os sete mares, descobre muitos produtos que sua nobreza real se mataria para ter. — comentei fazendo-os rir.
— Sebastian. — um homem se aproximou de nós, parecia um nobre com sua roupa engomada e muito bem passada.
— Senhor Baker. — Sebastian fez um breve cumprimento a ele — Agradeço vossa presença.
— Somos amigos e sócios, não precisa ser tão formal assim comigo. — o homem nos cumprimentou com um gesto singelos com a cabeça.
— Bem, Cedric, gostaria de apresentar , um amigo de tempos. — disse Sebastian — Em breve teremos muitos acordos com ele e sua frota de navios.
— Ah… Então este é o famoso capitão do Bella Donna?! — perguntou o tal Cedric.
— Não sou o único capitão. — respondi com serenidade — Aquela bela mulher conversando com a mãe de Sebastian é a capitã , nós dividimos o comando.
— E presumo que não a divide com ninguém. — retrucou Cedric.
— Digamos que é ela quem não me divide com ninguém. — brinquei os fazendo rir.
— Devo imaginar que possui a mesmo saga de conquista que Sebastian? — perguntou Cedric.
— Oh não, Sebastian sempre estará à frente. Em meu caso, pelo menos ela sabia de minha existência.
— O que importa é o resultado final e não o sofrimento passado. — o olhar de Sebastian continuava todo aquele tempo fixo em sua agora esposa — Lady Winchester agora me terá para sempre.
— Não seria o contrário meu primo. — Aidan riu.
— E você Aidan? Já encontrou o amor? — perguntou Cedric.
— Não, resolvi que meu coração não pertencerá a ninguém, mas as minhas noites serão de todas.
Nós rimos dele.
— Geralmente o homem que fala isso é o que mais sofre por amor. — comentei — Tenho muitas histórias piratas que vai gostar de ouvir.
— Ah não, Sebastian já me contou algumas que são muito tristes, acho melhor continuar sem saber. — Aidan recusou com seu sorriso malicioso.
— Estou curioso para saber como é a vida no mar. — disse Cedric.
— Em certos momentos consegue ser tão agitada como a vida na cidade. — respondi.
— Em outros é mais perigosa. — completou Sebastian.
— Ainda está atento a conversa senhor recém-casado. — brinquei.
— Apesar do meu olhar estar em outro lugar, vocês ainda possuem minha audição. — respondeu ele.
— Você realmente não se cansa de olhá-la?! — perguntou Aidan.
— Passei muito tempo imaginando como ela havia ficado após tantos anos, agora a única coisa que realmente quero é mantê-la a vista. — assegurou ele.
— Seu amor por ela me deixa admirado. — comentou Cedric.
— Ainda não viu nada. — assegurei — Foi amor dele pela sua lady que me motivou a não desistir da minha pirata.
— E agradeço por não desistir de mim. — se aproximou com um sorriso no rosto.
— Não consegue ficar um minuto sem ler meus lábios?! — perguntei.
— Acho a conversa dos homens mais interessante que das senhoras do outro lado. — ela riu — Parabéns Mascote.
— Não sou chamado assim há muito tempo. — disse Sebastian.
— E como as pessoas te chamam aqui? Senhor Winchester?! — perguntou ela.
— Exatamente. — respondeu Aidan — Parece que toda Inglaterra conhece nosso sobrenome por causa dele.
— Estou admirada. — ela o olhou — Papai ficaria orgulhoso.
— Como está o capitão Salazar? — perguntou Sebastian.
— Disse que se aposentaria para descansar, mas não ficou nem dois meses na Bahia de La Vinóis e já foi velejar com a capitã Nairóbi a bordo do Ciganos. — respondeu ela.
— O capitão sempre foi apaixonado por ela. — comentei sem cerimônias.
Foi interessante estar ali na presença de alguns nobres da família Lewis, mais ainda me diverti com a espontânea senhora Poppy, que não hesitou em nos agradecer por cuidar de Sebastian em seu tempo como pirata. Porém, a parte que mais me deixou intrigado foi a presença de algumas mulheres com o sobrenome Allen, talvez pudesse ser uma louca coincidência do destino, talvez pudesse ser outra família sem nenhuma relação com o homem que o capitão disse ser meu pai. Quanto mais eu pensava sobre isso, mais eu não queria pensar, até que outro rosto conhecido apareceu aos meus olhos. Me afastei daquela roda de conversa e caminhei pelos convidados da sala até sair para o jardim, haviam muitos pensamentos que começavam a me consumir por dentro.
— E olha onde encontro quem eu menos esperava. — a voz de Dara Lotwook soou atrás de mim.
— Estou surpreso por estar aqui também. — comentei mantendo meu olhar na fonte diante de mim.
— Seu pai não está aqui, mas a família dele sim. — ela deu mais alguns passos até ficar do meu lado — Sim, lady Allen e suas duas filhas, Annia e Molly, são a família do lord Silar Allen.
— Como sabe que este nome tem significado para mim? — perguntei não movendo meu olhar.
— Por que assim como o capitão Salazar, eu sou a única pessoa que sabe quem é seu pai. — senti uma movimentação vindo dela — Sei que não quer saber nada sobre, mas isto te pertence.
Ela esticou a mão com uma correntinha contando uma chave nela.
— A chave. — peguei a correntinha e olhei — Quem diria que ela viria até mim.
— Suponho que esteja de posse do baú. — disse ela.
— Sim. — respondi — Por mais que quisesse manter enterrado, fez questão de se apropriar dele.
— Vocês finalmente estão juntos. — ela suspirou — Fico feliz por isso, vocês combinam.
— Agradeço, lady Evans. — me virei para ela — Preciso me retirar agora.
Me afastei dela e retornei para a sala, estava cumprimentando lady Winchester que se mantinha ao lado de Sebastian, me aproximei deles.
— Foi uma honra Sebastian, ser convidado para o vosso casamento. — disse a ele segurando na mão de — Lady Winchester, foi um prazer conhecê-la.
— Agradeço senhor por ter vindo. — ela sorriu de leve.
Seu olhar estava uma mistura de assustado e estático. Certamente ela não tinha visto tantos burgueses reunidos em um mesmo ambiente.
— Nos vemos em dois dias , para tratar daquele assunto. — confirmou Sebastian.
— Não se preocupe, estarei lá pontualmente. — garanti — Mais uma vez, meus parabéns.
— Conte com minha presença também Sebastian. — sorriu.
Ela não tinha receios de dizer o nome do nosso amigo, não se importava com regras de etiqueta ou coisas do tipo, para ela Sebastian sempre seria o nosso Mascote corajoso.
— Imaginei que não deixaria de ir. — comentou Sebastian.
— Vamos agora. — olhei para — Temos outros assuntos para tratar.
— Sim. — ela assentiu.
Era estranho quando minha pirata concordava comigo, ela sempre gostava de me questionar, o que tornava nossa relação ainda mais divertida. Seguimos na carruagem alugada para o hotel em que nos hospedamos, assim que entramos no quarto, tirei o paletó e coloquei apoiado sobre a cadeira perto da janela, ao olhar para rua os pensamentos sobre a família Allen vieram novamente me assombrar.
— O que te preocupas? — perguntou ela ao se aproximar de mim.
— Muitas coisas.
— Diga-me uma.
— Se algum dia iremos nos casar também. — a olhei sério.
— Já disse, nos casaremos quando decidir vossa vida.
— O quer que eu decida mais?
— Quero que se aproxime de vosso pai. — respondeu ela.
— Então ficaremos assim? — insisti.
— Sim. — ela se afastou e me olhou com autoritarismo — Juraste ao meu pai que não me tocaria até nosso casamento, e só me caso se resolveres isso.
Respirei fundo, ela era mesmo teimosa.
— Tudo bem. — retirei a correntinha com a chave do bolso e entreguei a ela — Assim como o meu coração, tudo que tenho pertence a ti.
— O que é isso?! — perguntou a pegar — É a chave do baú?
— Sim, e o baú está de vossa posse.
— O deixei muito bem guardado na Ilha de Junta. — afirmou.
Permaneci em silêncio, óbvio que internamente relutava com seu pedido.
— . — ela segurou em minha mão — Não estou te pedindo algo que te machuque, pelo contrário, precisas fechar essa página de vossa vida para que possamos escrever outras mais.
— Eu te amo. — disse de forma direta — Se achas que devo fazer isso, eu farei.
— Obrigado. — ela me abraçou, aninhando-se em meus braços.
— Deverias dizer que me ama também.
— Tudo ao seu tempo.
— Pirata.
Nós rimos.
Passamos os próximos dois dias em passeios pelas ruas de Londres, admirados com as lojas luxuosas da capital, e com a soberba da nobreza local. Aquilo me fazia sentir saudades de Cingapura e das tavernas que cheiravam a rum o ano todo, não tinha do que reclamar, em nossa cidade éramos a própria nobreza, já que agora o Mercado de Vallare pertencia a mim. Uma das notícias que interessou muito meu amigo em questão de negócios.
Assim, finalmente havia chegado a hora de reunir com Sebastian e Cedric, juntamente com , as portas fechadas em seu prédio no porto de Londres, às margens do rio Tamisa.
— Agora que estamos aqui, falaremos de negócios. — disse Sebastian ao se sentar em uma das cadeiras.
A mesa era redonda, me fazia lembrar as histórias de Artur e os cavaleiros da távola redonda.
— me disse que estão com problemas com os carregamentos e transportes. — mencionou se sentando também — Os ingleses não sabem trabalhar direito?
Ela não se continha em seu deboche.
— Infelizmente dois de nossos carregamentos foram misteriosamente saqueados enquanto eram transportados para a América. — respondeu Cedric permanecendo de pé, olhando pela cortina da janela — Ainda estou tentando entender.
— Sabe que são poucas as pessoas que confio. — Sebastian me olhou — Devo minha vida a vocês e sei o quanto tens esforçado para que sua frota pirata seja bem vista aos olhos da Companhia das Índias Orientais.
— Continue. — disse analisando suas palavras iniciais.
— Conheço pessoas que conhecem pessoas que devem favores. — continuou Cedric — Podemos ajudar com isso.
— Em troca? — arqueou a sobrancelha.
— Uma sociedade. — propôs Sebastian — Precisamos de navios rápidos, seguros e uma tripulação confiável, um, ou melhor, dois capitães confiáveis, e só confio em vocês.
— Atualmente controlamos diretamente cinco navios piratas… Mademoiselle, Marie, EXODUS, Bella Donna e o Queens. — contou — Mas podemos contar com a lealdade de mais três navios aliados, Octavis, Ciganos e Hunter.
— O capitão Cutler ainda está vivo? — perguntou Sebastian.
— Sim, vivo e agora apaixonado por uma francesa. — riu.
— Com isso contamos oito navios. — disse Cedric voltando ao assunto que interessava.
— Oito navios é o suficiente para vocês? — perguntei.
— Mais do que suficiente. — Sebastian me olhou — Tenho certeza que agora, nossos concorrentes não terão mais a oportunidade de roubar o que é nosso.
— Nossa, vocês são tão invejados assim? — brincou .
— Bem vinda a Inglaterra. — disse Cedric — Eu e Sebastian somos os homens mais ricos da cidade, acho que estamos quase chegando perto da família real em fortuna, acha mesmo que os outros burgueses vão nos aplaudir?
— Isso me lembra nos tempos em que havia muita disputa entre os piratas. — comentou .
— Quanto aos lucros com nossa frota? — olhei para meu amigo.
— Não se preocupe, sabe que sou justo quando o assunto são negócios. — Sebastian garantiu — Outro acordo é sobre o Mercado de Vallare.
— O que tem?
— É o mercado mais influente entre os países do oriente, seus produtos são muito cobiçados também, farão muito sucesso aqui. — continuou ele — Podemos ter exclusividade?
— Você realmente não quer dar espaço para seus inimigos. — ri de leve.
— Não. — afirmou.
— Em troca, tenho certeza que há produtos ingleses que podem ser do interesse de vocês. — Cedric se virou para nós — Todos aqui nessa sala tem influências em diversos países e muito a ganhar.
— Soube que tem alguns amigos egípcios. — comentou — Os tecidos de lá são de boa qualidade.
— Assim como a seda chinesa da qual vocês vendem no mercado de vocês. — retrucou Cedric.
— Tenho que admitir que conhecemos muitas famílias chinesas importantes. — olhei para meu amigo — Mas Sebastian conhece alguns nobres japoneses.
— Não mais que você. — retrucou ele — As especiarias da Índia, só você sabe a localização das melhores.
— Tudo bem, acho que já entendemos que todos temos algo a oferecer. — se levantou e dando dois passos ficou atrás da cadeira onde me sentava — Acho que podemos selar o início de uma próspera sociedade. Não é?!
— Claro que sim. — Sebastian sorri discretamente.
Era o início de um novo ciclo em nossas vidas, novas conquistas. Ficamos por mais um tempo conversando, até que pedi para conversar a sós com Sebastian, pedi para que ele investigasse sobre a família Allen. Contei-lhe sem detalhes sobre o assunto e de como eu havia descoberto sobre meu… pai.
- x -
— Aqui está. — disse assim que abriu o baú — Está cheio de cartas.
— Cartas? — perguntei me aproximando.
— Sim, cartas e documentos. — assentiu ela.
— Será que tudo isso é…
— Com certeza tem a prova de que você é filho deste tal lord Allen.
— Queria continuar na dúvida, mas já que insisti. — respirei fundo — Vamos até o final.
Ela assentiu. Começamos a analisar tudo que estava dentro do baú, havia algumas cartas escritas de próprio punho pelo pelo lord contendo seu selo, documentos e mais documentos que realmente garantia que eu era seu filho. Senti minha perna estremecer um pouco e me afastei saindo da cabana, precisava respirar o ar puro que só a Ilha de Junta poderia me proporcionar. Caminhei por um tempo sem rumo pela trilha leste, seguindo até o topo da colina que tinha vista para o mar.
— . — disse vindo atrás de mim — O que houve?
— Preciso respirar um pouco. — respondi para ela.
— Tem certeza que é somente isso? — insistiu.
Eu a olhei e sem pensar em mais nada, a beijei com todo o meu amor. Eu é quem deveria fazê-la sentir segura em meus braços, mas era o contrário, era com ela, perto dela que eu sentia forças para continuar. Quanto mais eu aninhava-a em meus braços, mais ela retribuia seu amor.
— Vai ficar tudo bem. — sussurrou ela.
— Eu sei que vai, porque você está aqui comigo. — sussurrei de volta — Eu te amo.
Ela sorriu e me olhou fixamente.
— Sabe o que vamos fazer depois do nosso casamento? — perguntou ela.
— Não. O que?
— Tenho guardado uma coisa a um tempo. — ela se afastou um pouco e pegou um tecido velho na gaveta da sua escrivaninha — Meu presente de casamento antecipado.
— Presente de casamento?
— Os ingleses chamam de dote. — ela riu.
— O que é?
— Um mapa.
Eu abri para ver realmente o que eram as coordenadas.
— Isla de Muerta. — sussurrei — Isso é real?
— Sim. — seus olhos brilhavam — O Black Pearl é real. Que tal uma viagem de lua de mel para os confins do mundo atrás do navio mais cobiçado de todos os tempos?
— Então, vamos mesmo nos casar?
— Não vejo a hora de ser uma senhora pirata casada. Eu te amo. — ela me beijou novamente.
Meu coração acelerou de imediato, meu corpo arrepiou. Já estava em nossos planos, assim que retornássemos para Londres, reaveria meu lugar de direito na família Allen, mas antes nossa parada seria em Cingapura, onde seria realizado nosso casamento em grande estilo na taverna Sins.
Eu sabia que teria muitas aventuras pelas frente, mas agora tinha certeza que viveria todas com ao meu lado. Eu a amava e ela também me amava.
Eu não preciso de um mapa, meu coração me leva a você
Mesmo que o caminho seja perigoso, eu não posso parar agora.
- Black Pearl / EXO
FIM?!
E lá vamos nós novamente, na loucura de mais uma fic de época e de piratas. Como disse em Londres, essa também é do universo de Beauty and de Beast, e posso dizer que esta é a única desse universo que tem um pouco da festa de casamento do casal Winchester. Espero que tenham gostado!!! Eu não sabia como terminar essa fic, mas acabei finalizado ela assim, gosto de finais em aberto, quem venham as teorias... e se estão curiosos para ver como nosso pirata recupera seu lugar nos Allen, leiam Londres para descobrir!!! Muito obrigado por lerem minhas fics.
Bjinhos...
By: Pâms!!!!
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