Postada em: 30/10/2020

Verão Sollary

Esta é a história de como nos tornamos amigas e fizemos a esperançosa promessa de nos casar em um ano. As quatro donzelas mais encalhadas e desafortunadas de Londres, na busca pela tão sonhada aliança no dedo e um amor verdadeiro. 

Mia Fletcher, Sollary, Jenie Sollary e Nalla Miller.

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Londres - 1847

Toda a casa estava um alvoroço pelo baile que meus pais resolveram oferecer para os nobres e grandes comerciantes da cidade. Não contava nem duas semanas que saímos de Liverpool para Londres. Mas enfim, esse era o sonho de minha mãe, ser reconhecida pela sociedade e dar grandes festas. Bufei um pouco assim que a criada abriu as cortinas do meu quarto a mando de minha mãe que já tagarelava em meus ouvidos. Tentei me cobrir mais, porém os cobertores foram arrancados de mim, com o olhar repreensivo dela.

, como podes ficar nesta cama quando o sol brilha do lado de fora? — seu tom alto era o habitual de sempre.
— Acordei sentindo-me indisposta, por isso não me levantei. — argumentei a olhando chateada.
— Pois trate de se levantar e tomar um banho de sol, sua irmã já se encontra no jardim. — disse num tom de ordenança.

Me levantei bufando novamente e com a ajuda da criada me troquei. Coloquei-me em frente ao espero e ajeitei o decote do vestido. Tinha que admitir que meu corpo não era tão pequeno quanto das donzelas de minha idade, e meus fartos seios sempre chamavam a atenção por onde caminhava. Mesmo, fazendo de tudo para mantê-los discretos. Retirei-me do quarto e segui até o jardim, antes pedi para que fosse servido meu desjejum ao ar livre. Jenie minha irmã já se encontrava sentada à mesa, com um livro na mão lendo. Seu hobbie favorito. 

— Jenie. — disse seu nome ao me aproximar e me sentar na cadeira a sua frente.
— Bom dia, flor do dia. — ela moveu seu olhar para mim e sorriu com graça — Caiu da cama?
— Nem mencione tal coisa, parece-me que a diversão de nossa mãe é mandar e mandar. — reclamei chateada com a situação que sempre se repetia.
— Nossa mãe sempre foi assim. — ela voltou o olhar para o livro.
— Mas agora que temos posses, está pior. — movi meu olhar para o mordomo que se aproximava com a bandeja de brunch.
— Senhorita Sollary, seu desjejum. — disse ele a colocar a bandeja sobre a mesa. 

Esperamos ele se retirar e voltei meu olhar para Jenie.

— Você pensou sobre o que conversamos no jantar de ontem? — perguntei.
— Sobre casamento? Ainda não estou inclinada a este assunto. — respondeu ela mantendo a atenção no livro.
— Mamãe disse que já estamos na idade de casar, bem, no meu caso segundo ela, estou quase ultrapassando a idade. — peguei uma uva e coloquei na boca, saboreando-a — Ter 20 anos não significa estar velha demais para se casar. 
— Diga isso aos nossos pais. — Jenie riu — E a sociedade em que vivemos.
— Ah, que pressão. — bufei de leve — Pelo menos você não me pressiona a isso já que não está ávida para se casar.
— Bem, se a pessoa cujo meu coração acelera fosse o noivo, casaria-me amanhã mesmo. — sua voz soou esperançosa.
— Deveria ter se declarado ao Demeter antes dele entrar para o serviço militar. — comentei continuando a saborear meu brunch — Agora, ele conheceu outra dama e está noivo, perdeu a chance.
— Bom, agora terei que me contentar em ser somente a amiga de infância. — seu olhar ficou triste.

Jenie tinha sua paixonite pelo seu amigo de infância. Algo que nunca me permitir sentir por nenhum homem que se aproximasse. Ao contrário de minha irmã mais nova emotiva, para mim o amor era algo racional e não sentimental. Não se ama com palavras e sim com atitudes, demonstrações práticas e sutis de lealdade e fidelidade. Algo que não via dentro de minha própria casa, entre meus pais. Por isso, não acreditava no amor. E menos ainda me iludia com palavras doces de cavalheiros oportunistas.

As horas se passaram com os últimos preparativos para a recepção de meus pais, sendo supervisionados por minha mãe de fora detalhista. Mantive-me em meus aposentos até que os convidados começaram a chegar. Rostos que nunca tinha visto em minha vida, mas que seus nomes na lista da entrada tinham significado. Desci as escadas de forma pomposa, olhando algumas pessoas passando pela porta da frente. Um dos rostos conhecidos era do sr Baker e seu filho de reputação duvidosa. Já tinha ouvido rumores sobre o libertino mais cobiçado pelas donzelas da cidade.

— Boa noite senhorita Sollary. — disse ao se aproximar de mim, e fazer uma breve reverência pegando minha mão direita e beijando-a com suavidade — Está mais radiante esta noite.
— Agradeço o elogio, lord Baker, mas guarde seus adjetivos para as outras donzelas do salão. — o olhei com firmeza — Não sou iludida como elas.
Me afastei dele sem importar com o que pensaria de mim e aproximei-me de minha irmã que se encontrava ao fundo do salão de dança. O olhar triste, rastros de frustração estampados em seu rosto. Parei diante dela e analisei sua má postura, enquanto se mantinha sentada na cadeira.

— Por que me olhas assim? — perguntou ela, limpando discretamente uma lágrima no canto do olho esquerdo.
— Está tudo bem? — perguntei sentando-me na cadeira ao seu lado — Aconteceu algo?
— Acabo de ver a noiva de Demeter com seus tios. — respondeu ela, num tom mais baixo.
— Jenie, nem sei como consolá-la, sabes o que acho a respeito deste seu sentimento, quanto mais o nutrir, mais ficará machucada. — chamei-a a razão.
— Eu sei, mas não consigo deixar de amá-lo. — ela se voltou para mim com os olhos marejados de lágrimas — Amo Demeter, mas ele nem mesmo sabe desse sentimento, e dizê-lo neste momento só tornaria tudo mais difícil e nossas vidas mais distantes.
— Bem, terá que deixar de amá-lo, pois agora que nossos pais querem nos casar, será bem mais complicado poder escolher. — voltei meu olhar para os casais dançando de forma divertido ao som dos músicos — Não quero me casar com qualquer um, sabes que sou exigente em minhas escolhas.
— Sei muito bem. — ela riu baixo.

Passei meu olhar por todos os rostos dali, até que notei uma jovem dama olhando em nossa direção, achei estranho a primeiro momento. Parecia tão sozinha e descolada quanto nós, mas pelo menos esta era nossa casa. A passos lentos e desconfiados, a senhorita se aproximou de nós, parando a nossa frente.

— Boa noite senhoritas. — disse ela com um sorriso delicado no rosto, já se sentando na cadeira vaga, ajeitando seu vestido rosê para que não amassasse.

Quem a havia convidado a se sentar ali?

— Fale por você. — disse a ela voltando meu olhar para frente.
— Não seja mal-humorada , ela só nos cumprimentou. — Jenie me repreendeu e certamente sorriu para a moça com seu jeito meigo — Boa noite, bem-vinda a nossa casa.
— Sua casa? — a moça parecia impressionada pela revelação de minha irmã — São filhas dos anfitriões?
— Sim. — bufei um pouco voltando meu olhar para ela — E nem assim os bons cavalheiros nos convidaram para dançar, nem mesmo uma pequena valsa, é frustrante não ter bons partidos nesse baile.
— Os convidados ainda estão nos conhecendo, . — Jenie me olhou — Você é muito pessimista.
— Jenie, e você é tão otimista. — cruzei os braços.
— Bem, se serve de consolo para vosso coração, eu sou conhecida na cidade e nenhum cavalheiro teve a decência de me tirar para uma dança. — desabafou a moça ponderadamente.

Não me contive em soltar uma gargalhada.

— Está pior que nós. — comentei.
— Nós percebemos quando o cavalheiro puxou sua amiga para o centro do salão e você ficou como um vaso de planta na porta. — Jenie deu uma risada mais tímida — Você é nova na cidade? Como diz que a conhecem?
— Eu não sou nova, somente estava afastada de Londres e retornei recentemente. — explicou ela — Sou Mia Fletcher, vim morar com meus tios.

Ela apontou discretamente para eles, do outro lado da sala.

— E porque retornou? — perguntou Jenie com olhar curioso.
— Porque preciso me casar para curar minha honra diante da minha família. — explicou Mia.
— Você não é mais pura? — lancei lhe um olhar malicioso.
— Não, não é isso, sou pura sim. — sua voz soou estar ofendida por minha indagação — Eu estou viúva, só isso.
— Viúva? E pura? — uma das criadas contratadas para a recepção que estava próximo adentrou na conversa, ela tinha uma bandeja em sua mão.
— Criada, o que está fazendo ouvindo a conversa alheia? — a repreendi de imediato.
— Desculpe-me senhorita. — a moça abaixou o olhar envergonhada.
— Ah não, não brigue com ela, certamente sua situação está pior que a nossa, sendo da classe trabalhadora, não deve ter um pretendente. — disse Jenie em sua defesa.
— Errada a senhorita não está. — confessou a moça — Pelo menos, ambas as senhoritas são de famílias importantes, por certo, até o final desta recepção terão olhares dos cavalheiros para vós.
— Não estou muito certa disso. — bufei novamente — Mas a considerar meus padrões para um bom cavalheiro, prefiro que nenhum deles se aproximem de mim.

Arranquei risadas delas.

— Como se chama criada? — perguntou Jenie.
— Nalla Miller, senhorita Sollary. — respondeu ela.
— Ah, sem muitas formalidades Nalla, pode me chamar de Jenie. — minha irmã sorriu de leve para ela — E pode ficar por aqui se quiser, observei que tens trabalhado muito.
— Agradeço senhorita, mas não quero levar uma bronca da senhora Moodle. — disse acanhada.
— Eu direi a ela que está nos servindo particularmente. — a solução de Jenie parecia convincente.

Nalla assentiu com o olhar agradecido.

— Bem. — olhei para Mia — Ainda estou curiosa, como pode ser viúva?
— Estava noiva de um casamento arranjado, porém meu noivo faleceu, passei esse tempo em luto. — respondeu Mia.
— E ele morreu a quantos dias? — perguntou Nalla.
— Há um ano. — continuou ela.
— Você está de luto a um ano? — Jenie ficou boquiaberta com suas palavras.
— Sim, mas agora virei a página. — assegurou Mia em um suspiro — Sinto que não posso esperar por mais tempo, quero viver o amor e com minha idade, estou quase sem esperanças.
— Quantos anos tem? — Jenie me olhou atenta.
— 20.
— Com 20 anos você fica um ano de luto? Como pode? — me mostrou indignada. 

A vida era curta para passar um ano de luto.

— Você também tem 20 anos e está solteira . — retrucou minha irmã.
— Estou solteira porque não quero me casar com qualquer homem, além do mais, em Liverpool nunca tivemos muito prestígio, por isso viemos a Londres. — expliquei — Pior é você que chora por um homem comprometido.
— Ele é casado? — Mia perguntou curiosa.
— Não, mas está noivo. — explicou Jenie e continuou em sua defesa — Ele é meu melhor amigo desde a infância, não me culpem por amar meu melhor amigo.
— Vocês parecem tão encalhadas quanto eu. — comentou Nalla em sussurro.

Nós a olhamos.

— Perdoe-me pelas palavras duras. — Nalla se encolheu.
— Eu deveria te repreender agora, mas suas palavras são honestas. — disse — Estamos mesmo assim.
— É deprimente. — comentou Jenie — Não se preocupe Nalla, a verdade é cruel para todos.
— Estou cansada disso. — Mia se pronunciou — Eu proponho uma promessa.
— O que? — Jenie me olhou intrigada.
— Vamos nos ajudar e encontrar nossos futuros maridos, partiremos em busca do amor e nos casar no próximo ano. — ela explicou sua ideia olhando-nos empolgada — O que me dizem?
— Acho que podemos começar avaliando as possibilidades. — dei um sorriso malicioso — Você conhece muitas pessoas em Londres, Mia?
— Não, mas sei de uma pessoa que pode nos ajudar. — sorri de volta.

Nossa conversa foi produtiva e muito divertida, Mia parecia ser uma pessoa muito bem informada, e Nalla era uma garota tímida que não tinha sonhos grandes e mantinha-se na realidade sempre. Em Liverpool eu e Jenie não tivemos muitas amigas, ou melhor, não tivemos nenhuma. A entrada de Mia e Nalla em nossas vidas era uma novidade positiva.

— Não há muitos jovens atraentes na cidade, mas aqui temos alguns nomes bem promissores. — disse a sra Fletcher ao se reunir conosco.

Consegui notar em seu olhar discreto para Mia, que não aceitava muito bem a presença de Nalla por ser de classe inferior a nossa. Conhecendo bem os nobres, certamente ela não aceitava nem mesmo a minha presença e de minha irmã, somente tolerava pelo fato do nosso pai ser o novo banqueiro da cidade.

— Para ser honesta, atualmente ando mais interessada em como terei dinheiro para comer no dia seguinte, do que ter uma corte. — confessou Nalla ao se sentar na cadeira ao lado da janela.
— Está sem trabalho? — Mia perguntou, soou um tom preocupado.
— Sim, fui dispensada pela senhora Moodle. — respondeu.
— Nós até te poderíamos oferecer um emprego em nossa casa, porém, nossos pais não podem empregar mais pessoas. — disse Jenie.
— Não se preocupem, eu vou tentar na confeitaria, dizem que estão contratando. — ela se mostrou otimista.
— Eu tenho uma vaga lembrança de estarem precisando de uma tutora para cuidar de uma criança. — a senhora Fletcher se pronunciou — Se não me engano, o senhor Sebastian Bellorum ficou viúvo e não se casou novamente, precisa de pessoas para cuidar da filha doente.
— Viúvo?! — não consegui conter meu olhar de malícia para Nalla — Este é o ponto chave da informação.
— Oh não, , não me olhe assim. — Nalla se encolheu com vergonha — Se eu conseguir o emprego, já me darei por satisfeita e ficarei muito grata. 
— Nalla, deixe de bobeira, nossa promessa é para nos casar e não arranjar um emprego. — Mia disse chamando-a ao propósito inicial.
— Eu não tenho família para me amparar como vocês Mia, preciso ser realista. — disse com firmeza.
— Não se preocupe minha jovem, se este for o caso, eu mesma lhe darei uma carta de recomendações para que consiga o emprego. — a sra Fletcher se mostrou solidária a ela.
— Então, voltemos ao assunto inicial, a lista de nomes. — disse empolgada — O amor tem pressa para mim também.

Elas riram e continuamos com a sra Fletcher nos apresentando aos cavalheiros solteiros e mais cobiçados de Londres. Enquanto nossa esperança se mantinha acesa com nossos encontros semanais e cartas compartilhadas de motivação, a vida se encarregou de mudar todos os planos para nós quatro. Começando por Mia que precisou viajar novamente para Limerick. Segundo sua carta, seus pais tinham uma notícia para dar-lhe a respeito de um novo noivado. 

Enquanto as semanas se passavam, as coisas estavam se tornando um pouco mais complicadas para mim, ser a filha mais velha tinha seus pontos positivos e negativos. A parte ruim veio logo ao jantar oferecido ao sr Baker e seu filho Baker. Minha mãe forçou-me a colocar o vestido mais provocativo que havia encomendado na costureira para mim. Mantive-me em silêncio ignorando os olhares intensos de lord para meu sinuoso decote. Se era algum plano maluco de minha mãe, certamente estava funcionando para meu desespero.

Após o jantar nos reunimos na sala de música, para ouvir Jenie tocar um pouco de piano para nós. Foi então que o assunto da presença dos Baker em nossa casa foi esclarecido.

— Bem, mais uma vez agradeço pelo convite. — introduziu lord Baker — Sinto-me honrado por meu filho finalmente ter encontrado a noiva perfeita.
— Noiva?! — disse num tom alto, fazendo até mesmo minha irmã parar de tocar.
— Sim, minha querida. — meu pai me olhou com orgulho — Hoje pela manhã aceitei um acordo com lord Baker, e seu filho a partir de hoje é vosso noivo.
— Já está ficando velha para se manter solteira querida. — reforçou minha mãe, sentada ao meu lado, sussurrando para mim — Por isso, eu e vosso pai encontramos o melhor pretendente para vós.

Um grito ficou preso em minha garganta, ao voltar meu olhar para o sorriso debochado de . Aquele era o destino mostrando a realidade da minha vida. Para a nossa sociedade, uma mulher se casar após os 20 anos era considerado quase uma desonra, porém para os homens, estar solteiro aos 32 anos era sinônimo de liberdade. E era está liberdade que poderia perder ao se casar comigo. Isso começou a deixar-me sufocada.

Como poderia eu casar-me com um libertino? Pior, doze anos mais velho que eu!

— Está feliz com a notícia? — disse ao aproximar-se de mim na entrada da casa.

Seu pai o aguardava na carruagem.

— Feliz em casar-me com um homem como vós? Jamais. — voltei meu olhar para rua — Se pudesse escolher, o convento certamente ganharia.
— Bem, acho que terás que acostumar te com a nova realidade. — ele manteve seu olhar em mim — Pois mesmo se eu não quisesse, devo me casar-me com a filha do banqueiro para saldar as dívidas do meu pai.

Voltei meu olhar para ele. Em choque e ao mesmo tempo confusa.
Ele afastou-se seguindo para a carruagem e partiu. Assim que retornei para dentro, coloquei-me frente ao meu pai, firme e séria, demonstrando a decepção em meu olhar.

— Como podes papai? Comprar-me um marido? — a indignação transbordava dentro de mim.
— Do que estás dizendo ? — perguntou Jenie com sua inocência.
— Que nosso pai está usando-me em seus negócios, e que lord Baker se casará comigo para saldar as dívidas do pai. — cuspi ríspida a verdade para todos ouvirem, até mesmo os criados.
— Abaixe esse tom . — disse minha mãe com firmeza — Vosso pai só está fazendo o que é melhor para as filhas.
— Ah sim, então o que é melhor para mim? Ter um casamento como o vosso? Arranjado e por conveniência, onde vosso marido dorme todas as noites no quarto da criada? — não me contive em jogar em sua cara a realidade de nossa família.

Minha mãe deu-me um tapa em minha cara, sem piedade.

— Mãe! — Jenie tentou conter sua reação, levando a mão na boca, assustada com a cena.
— Nunca mais ouse pronunciar tais palavras. — ordenou ela, se segurando para não olhar para a governanta.
— Já chega as duas. — meu pai elevou sua voz, levantando-se do sofá — Eu sou o chefe desta família, e deves fazer o que eu mandar.

Seu olhar ameaçador cortou-me por dentro.

— Isla, conduza-a para seus aposentos. — ordenou meu pai a governanta — E não sairá de lá até segunda ordem.

Segui para meu quarto acompanhada de Isla em lágrimas. Não queria acreditar na reviravolta que a vida me trazia. Aquela madrugada de outono seria mais fria e solitária que a próxima estação. 

Passaram-se os dias e recebemos uma carta de Mia, contando as novidades que ocorria com ela. Não estava muito diferente de nós. Lutando por sua felicidade. No dia seguinte, escrevemos uma resposta a ela e enviamos uma carta a Nalla também. Nossa amiga desafortunada havia se mudado para Derbyshire para trabalhar na casa da família Bellorum. 

Cada uma de nós com sua novidade e contratempo do destino. Com a distância, não conseguiríamos nos ajudar fisicamente e somente as cartas poderiam nos motivar a não perder as esperanças. 

Assim, a sorte estava lançada para as quatro amigas.

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Quando queremos que o tempo acelere, mais ele caminha vagarosamente. Para meu desespero, minha mãe já estava aprontando meu enxoval. Seu desejo era realizar a cerimônia no próximo verão, assim poderia ter minha lua de mel em Paris, como sempre sonhou para mim. As coisas acontecendo em minha vida e eu trancada no quarto, somente autorizada a sair para receber as constantes e entediantes visitas de meu agora noivo.

— Outra vez. — disse ao entrar na biblioteca onde ele me aguardava — Pergunto-me se não há mais nada de interessante para fazer.
— Vejo que amanheceu de mau humor. — comentou ele mantendo seu olhar fixo em mim.
— Ver você me faz ficar de mau humor. — confessei com serenidade. 

Adentrei mais e me sentei na chaise.

— Deveria ser mais grata. — disse ele.
— Como? — o olhei confusa.
— Deveria ser mais grata por me ter como noivo, a maioria das donzelas dessa cidade me cobiçam. — completou ele.
— Admiro sua auto estima, mas faço parte da minoria que não liga para vós. — retruquei rindo de leve.
— Seu sorriso é belo, como você. — ele lançou-me um olhar mais intenso.
— Não estou sorrindo, estou rindo de sua cara. — dei de ombros e voltei meu olhar para o sol de entrava pela janela.
— Garota indomável. — sussurrou ele ao se aproximar de mim, sentando ao meu lado — Será mais fácil se aceitar a realidade e se entregar a mim.
— Lord Baker, jamais o deixarei tocar em mim. — me levantei deixando o tom de sarcasmo em minha voz — Tenha em mente que nosso casamento, não passará de aparências, pelo menos valerá a pena para vós por saldar as dívidas de vosso pai.

Manter um casamento por conveniência como meus pais era meu pior pesadelo. Entretanto, o destino tinha-me reservado esse sofrimento. Algo tão preocupante que não conseguia nem mesmo dar apoio a Jenie com sua dolorosa sina de amar o amigo comprometido. Mesmo ela dizendo estar bem.

— Senhorita Sollary. — disse Isla ao bater na porta — Permita-me entrar?
— Sim, claro.

Ela abriu um pouco mais a porta, revelando carregar algo na outra mão. Adentrou o quarto e fechou a porta, então colocou a bandeja com meu jantar em cima da escrivaninha.

— Agradeço. — disse mantendo-me sentada na poltrona, observando-a.
— Senhorita. — ela me olhou com carinho — Posso falar-lhe por um momento?

Isla em certos momentos me tratava com mais carinho que minha própria mãe, algo que me deixava intrigada. Por várias vezes pensei que pudesse ser a filha bastarda da empregada e do senhor. Não seria uma surpresa se minhas desconfianças fossem reais.

— Diga Isla, o que desejas? — mantive o olhar nela, curiosa.
— Saber se está bem. Com tudo que vem acontecendo. — revelou.
— Na medida do possível, estou bem sim. — forcei um sorriso.
— Não é o que seu olhar demonstra. — retrucou ela — Minha família era muito pobre, quando conheci vosso pai, me apaixonei no mesmo instante por ele, mas jamais alguém como eu seria a altura dele. Filho de comerciante, e uma indigente, mas ele se apaixonou por mim também, porém, foi forçado a se casar com sua mãe.
— Por que está me contando isso? — perguntei não entendendo.
— Confesso que é errado viver essa vida, ser a outra. — seu olhar estava triste — Mas eu o amo, e o fato disso acontecer com seus pais, não significa que acontecerá com vós. Pode ser feliz em sua vida de casada.

Eu não podia culpá-la. Isla precisava do emprego para ajudar sua mãe doente e seus irmãos. Trabalhar na casa de meus pais era seu socorro financeiro.

— Como poderei ser feliz? Isla, não és mais inocente, lord Baker é um libertino, não acredito que possa me amar.
— E o que é o amor para vós?
— Tenho certeza que o que meu pai faz com vossa vida, não é amor. — rebati com firmeza — E sabendo a fama de conquistador do meu noivo, tenho certeza que se refugiará no quarto das empregadas todos os dias.
— Não se ele se apaixonar pela senhorita. — retrucou ela — Um homem quando está apaixonado e enlouquecido por uma mulher, jamais a deixa para se refugiar nos braços de outra.
— Não é o que vejo. — olhei com ironia fazendo-a refletir sobre sua situação com meu pai.
— Bem, saiba que este é o segundo motivo de eu não estar longe daqui. — confessou ela — Mas não vamos falar de mim, o foco aqui é a senhorita.
— E o que me aconselha?
— Que o faça se apaixonar por vós na noite de núpcias. — disse ela dando um sorriso tímido.
— Como se fosse fácil. — suspirei fraco — Não sou uma mulher tão atraente quanto gostaria.
— Acredite, qualquer mulher consegue ser atraente para seu marido.

Foi estranho escutar alguns conselhos de Isla. Todos que havia aprendido no tempo que trabalhou para a família Lewis antes de conhecer meu pai. 

Mais dias se passaram. Tanto eu e certamente Jenie, enviamos cartas as nossas amigas. Nossos desabafos em palavras nos traziam forças para aguentar os contratempos da vida. Nalla em sua carta, relatou que passava por alguns conflitos com o sr Bellorum, mas que tinha se apegado muito a pequena Molly, filha dele. Mia continuava em sua busca tendo Vincent Tenebrae como seu guia para encontrar o noivo perfeito para ela. Era engraçado imaginar que minha amiga poderia se casar com um padre, bem mais velho que ela. 

Minha irmã Jenie, continuava a sofrer por seu amigo de infância, ele havia retornado dos seus serviços no exército. E ela tinha se encontrado com ele algumas vezes, para ajudá-lo com os assuntos de seu casamento. Para piorar, Jenie havia viajado para a casa dos pais de Demeter em Bradford, a pedido de nossa mãe. A sra Dominos só confiava no bom gosto dela para ajudar-lhe nos preparativos do jantar oficial de noivado. E a louca aceitou a missão. Minha irmã era masoquista e definitivamente gostava de sofrer.

No geral, não estava fácil para nenhuma de nós.

- x - 

O convite de casamento de Mia para o final da primavera chegou de forma repentina. Surpreendendo-me ao ler que o noivo era o padre ajudante. Na carta que mandou junto ao convite, ela nos relatava tudo sobre a inusitada declaração de lord Tenebrae. Tanto eu quanto Jenie, ficamos felizes por ela finalmente ter encontrado o amor que tanto procurava. Seu casamento foi realizado em um domingo, uma ensolarada manhã de primavera, no castelo dos pais do lord Tenebrae. Uma pequena festa oferecida para os amigos íntimos. Era nossa primeira vez reunidas após a separação.

— Não acredito que puderam vir. — disse Mia ao nos abraçar — Sinto-me feliz por vê-las tão bonitas e coradas.
— A primavera trouxe alegrias, assim como seu casamento. — disse Jenie sorridente.

Nunca havia visto minha irmã com aquele brilho no olhar. O que me intrigava um pouco, pois elas estava de segredinhos escondidos para mim. Não mais contando-me sobre os encontros de ajuda com seu amigo.

— Estamos mesmo muito felizes por sua conquista. — disse Nalla.
— Quem bom que o sr Bellorum a deixou vir. — Mia sorriu para nossa amiga.
— Sim, foi um tanto conturbado, mas ele deixou sim. — o olhar de Nalla estava triste, apesar do sorriso em seu rosto.
— E você ? Se casará no início do verão. — Mia sorriu — Estou feliz pela data escolhida, já terei voltado de minha lua de Mel em Roma.
— Pois é, meu pai quem escolheu a data. — confirmei nada empolgada.
— Você vai para Roma? — Jenie ficou boquiaberta — Meu sonho era conhecer esta cidade.
— Sim, foi um pedido de Vincent, ele quero me mostrar o monastério em que vivia. — explicou ela.
— Se casou com um padre. — brinquei de leve, lançando-lhe um olhar malicioso — Será que ele é virgem também?
? Olha os modos, que pergunta. — Jenie me repreendeu.

Nós quatro rimos daquilo. 
Era bonito e motivador ver a felicidade de nossa amiga. A primeira a se casar. Comecei a pensar, assim como ela que se surpreendeu ao aceitar o casamento partido de uma promessa de seus avós e encontrou a felicidade. Talvez eu pudesse também me surpreender com Baker. 

Minha mãe sempre dizia que eu era intensa como o verão se tratando do meu gênio. E sim, uma dama questionadora como eu sempre queria ter razão em tudo. Meu lado racional dominava sempre e me ajudava em meus argumentos. Mas naquela batalha eu havia perdido. 

Casar-me com lord Baker não havia sido o problema. Mas encará-lo em nossa primeira noite de casados, isso sim me deixava apreensiva. Assim que saímos da pomposa festa de casamento organizada por minha mãe, segui com meu agora marido para a casa que meu pai havia nos presenteado. Nunca havia visto um lugar mais limpo, organizado e luxuoso. Dois criados nos aguardavam para nos ajudar.

— Donna, já pode se retirar. — disse assim que ela me ajudou a terminar de me trocar.
— Sim senhora. — ela fez uma breve reverência e se retirou.

Dei alguns passos até o espelho e alisei a camisola de seda. Presente inusitado de dias antes do nosso casamento. Pergunto-me se ele tinha alguma intenção pecaminosa ao fazer isso. Minutos mergulhada em meus pensamentos, o barulho da porta se abrindo me despertou. Virei meu corpo e o observei entrar com tranquilidade e fechar a porta. Seu pijama também de seda era da mesma cor que o meu. Proposital? Certamente sim.

— Vim apenas para lhe dar boa noite. — disse ele mantendo a serenidade no olhar.
— Como assim? — o olhei confusa — Onde vais em nossa primeira noite?
— Posso ser um libertino, mas nunca forcei uma mulher a se deitar comigo. — iniciou ele mantendo a suavidade, mesmo com o olhar sério — Minha esposa não será a primeira.
— Impressionante. — cruzei os braços — Mas é claro que sempre terá o quarto das criadas.

Insinuei abertamente sem piedade. Não confiava nele.

— Então é isso que acha que farei? — seu olhar ficou um pouco mais intenso — De libertino a marido infiel, é isso que acha de mim?
— Prove-me o contrário, e terá tudo de vossa esposa. — eu caminhei até ele de forma sinuosa, deixando meu olhar um pouco malicioso — Te darei uma noite de bônus, pois nosso casamento deve ser consumado para que seja validado.

Eu me inclinei para mais perto e o beijei de forma intensa e doce. Um risco a se correr, mas levaria os conselhos de conquista que Isla me dera adiante. Não sabia bem o que estava fazendo, mas quanto mais eu me entregava ao meu marido, mais ele pedia permissão para saciar seu desejo de mim.

Na manhã seguinte, mantive-me deitada ao acordar. Demorou um pouco para meu corpo ainda sonolento chegar ao lugar e me sentir disposta a levantar. Com os olhos fechados, senti a mão de acariciar meus cabelos. Nossa noite de verão havia sido ainda mais calorosa que imaginava, principalmente com suas carícias. Me remexi na cama espreguiçando e abri os olhos lentamente, para me acostumar com a claridade. Me deparei com um sorriso fofo e um olhar carinhoso vindo dele, que já se aproximava para me beijar.

— Perdoe-me mas não. — toquei seus lábios com o dedo indicador, dando um sorriso maléfico — Eu disse que teria o benefício de uma noite apenas. 
— Está mesmo dizendo-me isso? Depois da noite que tivemos? — seu olhar demonstrou a indignação sentida.
— Achou mesmo que em uma noite conquistaria-me? — me aproximei um pouco mais dele, para seduzí-lo — Terá que fazer bem mais do que isso para ter-me novamente.
— Não podes fazer isso comigo? — um tom de frustração soou de sua voz.
— Já estou fazendo, senhor meu marido. — me afastei dele e levantei-me da cama, me espreguiçando um pouco.

Logo senti suas mãos envolverem minha cintura, aproximando meu corpo do dele. Confesso que senti meu coração acelerar um pouco.

— Não me peças para imaginar-me sem te tocar. — em um movimento virou-me para olhá-lo.
— Terá que se imaginar então, faça um esforço. — pousei minha mão em seu tórax o olhando com seriedade, afastando-o um pouco — A não ser que reveja suas palavras e me force algo que eu não quero.

Mantive a segurança em mim, até que ele se afastou. Eu não conseguia acreditar que em uma noite havia deixado totalmente encantado por mim, mas gostava da ideia de continuar seduzí-lo.

— O que quer que eu faça? — seu olhar estava mais atento.
— Já disse, prove-me que pode viver sem a vida de libertinagem, que pode ser o homem de uma única mulher. — disse tranquilamente.
— Acha que não consigo ser fiel a minha esposa? — retrucou ele.
— Confesso que vossa pessoa não me transmite credibilidade e segurança. — cruzei os braços — Agora, poderia deixar-me sozinha em meus aposentos? Tenho certeza que o quarto ao lado será confortável a vós.

Ele respirou fundo e se retirou. Não me contive em deixar um sorriso de satisfação sair em meu rosto. Mais do que nunca, precisaria manter o foco em meu plano de conquista. 

Os meses passaram comigo observando o comportamento de , enquanto discretamente eu o provocava de forma sinuosa. Era divertido ver seu olhar intenso de desejo reprimido para mim. Que infelizmente fazia meu coração acelerar ainda mais. Não negaria que nesta altura meus sentimentos pareciam se inclinar a ele, porém racionalmente não admitiria e nem deixaria-me levar por seus frequentes pedidos de carinho, ao bater em minha porta todas as noites.

A neve havia caído de forma surpreendente naquele dia, deixando tudo ainda mais frio. Tarde de inverno, escolhemos a biblioteca de nossa casa para passar o tempo, ele lendo pela décima vez o jornal do dia, e eu com um livro qualquer de história da arte nas mãos. Voltei meu olhar para ele que tentava se concentrar na leitura. De repente, lembrei-me de nossa primeira noite e o pulsar do meu coração foi mais forte. 

Talvez, estivesse com saudade de seu beijo arrebatador. 

— Me queres longe, mas não consegue deixar de me olhar. — comentou ele fechando o jornal e movendo seu olhar para mim.
— Não estou a te observar. — desconversei — Que presunçoso.
— Então por que me olhas assim? — ele se levantou da cadeira e lentamente se aproximou de mim — Me deseja tanto quanto eu te desejo.
— Sua auto estima está mesmo elevada hoje. — fechei o livro e me levantei da poltrona — Mas continua enganado.

Deixei o livro na mesa de apoio ao lado e passei por ele para sair. Entretanto, sua mão direita me parou no caminho, ao tocar em minha cintura. Prendi a respiração de imediato, então soltei um suspiro sentindo meu coração acelerar.

— Então diga estas palavras novamente, olhando em meus olhos. — ele se aproximou mais, com seu charme sedutor — Diga que não me quer.
— Eu… — respirei fundo, sentindo sua mão deslizar por minhas costas — Não…
— Diga. — ele se aproximou ainda mais — Diga que não me quer.

A quem eu queria enganar. O feitiço virou-se contra o feiticeiro, e sentia-me apaixonada por ele. Havia duas escolhas diante de mim: negar o óbvio, ou deixar-me ser guiada por aquele amor imprevisível que se colocou em minha vida. 

E deixando a razão de lado, joguei-me ainda mais em seus braços movendo meu corpo para beijá-lo. 

Iniciaria o mais intenso e malicioso momento de nossas vidas.

Elevaria nosso amor tão ardentemente que até mesmo a neve do lado de fora derreteria.

 

Épocas quentes, quando você abriu meus olhos
Toda a minha vida, eu só preciso de você
E eu preciso reconhecer, 
Que mesmo se você disser que não me quer ou me fizer sofrer
Você vai ser a única pessoa pra mim.
- Hot times / SM The ballad

 

Escolhas: Esta não é a história que eu quero lembrar, é a história que eu quero viver.” - by: Pâms



FIM?!



Nota da autora:
Hello gente, olha eu aqui com mais uma loucura de fazer pequenas sagas com histórias intercaladas. Assim como foi em BatB, aqui está a saga 4 estações do amor, espero que gostem das outras 3 histórias.
Bjinhos...
By: Pâms!!!!
Jesus bless you!!!




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*para mais fics vocês encontram na minha página da autora!!


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